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sexta-feira, 10 de outubro de 2025

COMO É QUE PORTUGAL NÃO FOI ABSORVIDO PELA ESPANHA

 Na realidade, esta questão é um bocado misteriosa para mim, que não sou historiador e tenho ideias demasiado esquemáticas do que foi o Condado Portucalense e todas as relações entre famílias reinantes, de Portugal, Castela e restantes reinos ibéricos, que tanta influência tiveram na evolução da geografia política da Península Ibérica. 

O que me apraz sublinhar é que o estado de guerra não era de todo o mais comum entre os reinos vizinhos de Portugal e Castela. Antes pelo contrário, as casas reais estavam aparentadas por uma série de casamentos entre príncipes dos dois reinos, forma como eram seladas ou consolidadas as alianças, nessa época.  Apenas uma visão maniqueísta coloca os dois reinos ibéricos em contenda permanente. 

Lembremos que o grande período de hostilidade aconteceu no final do Séc. XVI, quando o rei D. Sebastião de Portugal morreu em combate na batalha de Alcãcer Quibir (Marrocos) e foi sucedido pelo Cardeal D. Henrique, o qual não possuía descendência. 

As cortes estabeleceram que o legítimo herdeiro do trono era Felipe IIº de Espanha, tendo os seus exércitos invadido Portugal e derrotado uma fraca resistência militar, fiel ao candidato português ao trono (D. António Prior do Crato, «bastardo» real) e durante 60 anos foi o domínio dos Felipes na coroa de Portugal, não fusionada com a de Espanha, mas mantidos os dois reinos separados, com à cabeça, o mesmo monarca. 

Esta situação agradava a uma parte da aristocracia portuguesa. Por isso não houve grande resistência em Portugal durante a maior parte do período. Foi devido a uma série de acasos felizes que a conjura de 1ª de Dezembro de 1640 teve sucesso. Um facto importante, foi que o exército castelhano estava ocupado - nesse preciso momento  - a reprimir uma insurreição na Catalunha. Esta foi um fracasso, mas o resultado foi que, entretanto, Portugal sob o novo monarca, D. João IV,  teve tempo de organizar um exército próprio e fazer face às incursões espanholas. A guerra «de baixa intensidade» que se seguiu, durou bem até ao reinado de D. João V. Só no  reinado deste monarca português se chegou a uma paz estável com Espanha, com os casamentos de príncipes herdeiros. Nesta ocasião, foi celebrado o casamento entre o monarca espanhol e D. Maria Bárbara de Bragança princesa real, que se tornou assim Rainha de Espanha. 

Porém, os interesses de Espanha e Portugal continuaram a entrecvchocar-se no continente Americano. Houve combates na América do Sul por causa da delimitação dos territórios das colónias pertencentes a Espanha e a Portugal. Posteriormente, em 1801, na «Guerra das Laranjas» Portugal foi invadido pelo exército espanhol, por iniciativa do primeiro-ministro Godoy e nas boas graças do Consul vitalício, Napoleão Bonaparte.  

Durante a terrível guerra civil espanhola (1936-39), participaram forças portuguesas, de um lado e do outro: são conhecidas participações diretas de comunistas e de anarquistas nas milícias republicanas; do lado falangista, também houve voluntários. Esta guerra ocorreu já durante a ditadura de Salazar (1932-1968). Ele e o seu regime eram totalmente favoráveis aos insurrectos comandados por Franco. Quando algum «rojo» atravessava a fronteira para Portugal, era quase certo que seria apanhado, entregue aos falangistas e executado.  

No período pós-25 de Abril de 74, houve grupos (ELP, MDLP) de portugueses contra-revolucionários (grupos armados, praticando atos terroristas)  que se acolheram em Espanha, onde ainda vigorava o regime falangista. 

Mais tarde, aquando da adesão de Portugal e Espanha à então CEE, havia um certo preconceito dos eurocratas e dos principais países membros formando então «o Mercado Comum», em colocar Portugal e Espanha «no mesmo barco». Isto porque viam maior vantagem na adesão da Espanha com a sua indústria, agricultura e relações com a América-Latina. 

Porém, acabaram por encontrar uma fórmula, em que as indústrias portuguesas com maior potencial foram entregues, como «prenda de casamento da CEE» ao país vizinho. Os espanhoís puderam desenvolver em Portugal uma estratégia agressiva de aquisições em vários sectores, na indústria, nas pescas, no imobiliário, etc. O resultado foi o acentuar da «terceiro-mundialização» de Portugal, como se pode verificar até hoje. 

Nos períodos em que Portugal fez face a Espanha, em geral, tinha o apoio duma grande potência, como o Reino Unido ou a França. Também nestas circunstâncias, Portugal teve de ceder muito a seus aliados, não só no seu império colonial, como em relação ao comércio da metrópole: por exemplo, os britânicos conseguiram obter exportações em exclusivo de uma série de artigos para o Reino lusitano  e obtiveram o exclusivo do cultivo e exportação dos vinhos do Porto, da transformação das lãs da Covilhã, etc. 

Pode dizer-se que o Portugal do século XVIII já tinha características de neocolónia, embora fosse - ele próprio - um império colonial. Mas o colonialismo português foi, quase sempre, subordinado a interesses estrangeiros até ao final do período colonial. Com efeito, eram numerosos os empreendimentos agrícolas, industriais e mineiros, nas colónias portuguesas, entregues a parceiros da OTAN (EUA, Reino Unido, França, Bélgica...). Também na metrópole,  durante o período da ditadura de Salazar, as grandes empresas com lucros assegurados eram britânicas, alemãs, estado-unidenses, francesas e doutros países. 

O regime de Salazar e Caetano oferecia as bases estratégicas (as bases aéreas das Lajes, Açores e de Beja) às forças armadas de países da OTAN. Estas, tinham, graças a estas bases,  a possibilidade da sua aviação alcançar pontos estratégicos no Médio Oriente. Em contrapartida, Portugal recebia destes países apoio diplomático dentro  da ONU e noutras instâncias, assim como armamento.

As armas, aviões, carros de combate, etc. fornecidos, eram muitas vezes em segunda mão ou modelos que já não eram usados pelos países doadores (por exemplo, aviões da guerra da Coreia, dados pelos americanos). 

As guerras do período colonial foram guerras «proxi», em que os soldados eram portugueses, mas a grande maioria do equipamento provinha de aliados da OTAN. Quanto aos interesses defendidos, estes eram claramente os dos grandes empórios estrangeiros e da política hegemónica dos EUA, em confronto com o campo socialista e os movimentos anti-coloniais. 

Portugal, em conclusão, é um país muito dependente, quer dos seus parceiros da UE, quer dos seus aliados mais fortes da OTAN. Configura-se uma situação neo-colonial, em que é  mais vantajoso para os senhores feudais (o grande capital internacional) que Portugal permaneça como país nominalmente independente. 

terça-feira, 7 de outubro de 2025

GAZA: AS MENTIRAS PROPALADAS PARA ENCOBRIR O CRIME DE GENOCÍDIO


 Escutei várias vezes com atenção este vídeo do «Le Quotidien Global». No seu conteúdo, este relato é dos mais objetivos que tenho até agora ouvido sobre Gaza, a Palestina, Israel, o regime de Netanyahu. Também é notório que os poderes ocidentais, foram apoiantes ativos, sobretudo EUA e Reino Unido, da campanha de terror contra civis, desde o primeiro momento. 

Quando se faz a apologia da ação militar de Israel em Gaza, está-se a criar clima favorável a todos os atos que depois cometeu. Seus apoiantes, chefes de Estado e governo, de vários países ocidentais deveriam também ter um lugar reservado no banco dos reús, no Tribunal Penal Internacional.

Quando a media corporativa perpetua as mentiras típicas da propaganda de guerra e não faz nenhum esforço para desfazer aquilo que propalou, sabemos que a sua missão deixou de ser (há muito tempo, na verdade) de divulgar as notícias o mais próximo possível da realidade e de modo objetivo, neutral, não enviesado.

Ás numerosas pessoas que há dois anos me diziam que o Hamas tinha cometido atrocidades, eu respondia que a saída de 7 de Outubro para fora da prisão de Gaza, FOI UM ATO MILITAR  e que numa circunstância assim, os militantes palestinianos tinham que se preocupar - em exclusivo - em neutralizar as forças inimigas da IDF (forças armadas de Israel) que mantinham o cerco da Faixa de Gaza. 

As barbaridades atribuídas aos gerrilheiros palestinianos eram construções da propaganda sionista, destinada a virar a opinião pública mundial contra os palestinianos. Compreendi logo isso e depois veio a ser confirmado plenamente, com provas irrefutáveis. 

De facto, os objetivos mais importantes da operação da resistência palestiniana foram alcançados. Mostraram que Israel (o seu governo, as suas forças armadas) era opressor, sem qualquer preocupação com os aspectos humanitários, com prazer sádico em matar e humilhar uma população indefesa. 

O objetivo declarado pelo governo de Netanyahu de «liquidar o Hamas», não apenas não foi conseguido, como a posição do Hamas se fortificou no seio do povo palestiniano, como também a nível internacional. Além disso, a questão do estatuto da Palestina enquanto Estado independente, nunca se colocou com tanta força como agora. 

Não sei, evidentemente, o que o futuro trará, mas creio que é importante que Gaza fique como símbolo da barbárie contra um povo indefeso e que resiste desde 1948. 

Com efeito, foi vítima da histórica injustiça que lhe foi feita, quando a ONU reconheceu o Estado de Israel e deixou «no vácuo» a questão do reconhecimento dos territórios palestinanos, conforme prometido, enquanto território nacional dos palestinianos.

O 7 de Outubro de 2023 será lembrado como um gesto de libertação, de coragem dos resistentes, não apenas do Hamas, como doutras organizações da Resistência palestiniana. 

A resistência de todo um povo - os palestinianos de Gaza e dos restantes territórios - ficou demonstrada. Os habitantes de Gaza recusaram abandonar a cidade que tinha sido transformada em ruínas, assim como todas as infraestruturas e recursos (hospitais, escolas, mesquitas, igrejas cristãs, etc), intencionalmente bombardeadas e demolidas pelos  israelitas.

É terrível o peso que devem sentir muitos judeus, pelo mundo fora, perante a perpetuação de crimes em massa, que só têm paralelo no horror e desumanização que os nazis fizeram ao povo judeu, logo em 1933, mas que se foi intensificando como morticínio em massa, nos finais da IIª Guerra Mundial. 

Mas, o sofrimento da população palestiniana durante estes anos todos, desde antes da implantação do Estado de Israel, deveria ensinar a todos que não se pode aceitar um Estado étnico (um Estado que apenas reconheça como cidadãos de pleno direito os de uma dada etnia) e/ou um Estado com religião oficial (em que é crime criticar a religião e onde as leis são moldadas para se conformar com um credo religioso), nem um Estado que discrimine como não-cidadãos quem aí vive desde há séculos e séculos. Chama-se neste último caso, «apartheid», nome dado ao regime de segregação racial promovido pelos brancos na África do Sul, que só acabou na década de 1980.

Não tenho nenhuma compaixão pelos sionistas e seus comparsas: andaram a atear campanhas de ódio, de propaganda do mais vil conteúdo, para «justificar» os horrores cometidos quotidianamente, nestes dois anos de matança. Não chamo a isto «guerra», pois os alvos principais dos sionistas eram civis e os palestinianos resistentes armados, não tinham meios para contrariar, de modo eficaz, os atos do exército inimigo.

O meu horror e tristeza não ficam confinados ao regime monstruoso de Netanyahu e seus apoiantes internos e externos: 

É que nós temos vivido numa bolha de ilusões, nos regimes ocidentais, de «democracia liberal»; de que estes tinham valores e que os assumiam. Não! Apenas usaram, durante mais de um século, uma «indignação» fabricada, para lançar campanhas contra seus opositores, encobrindo os crimes deles próprios contra forças anti-coloniais, anti-capitalistas, pró-socialismo, pró-autodeterminação, que surgiram neste século e meio, em todos os continentes e nos países-sedes coloniais e imperiais. 



sexta-feira, 3 de outubro de 2025

HIPOCRISIA DO RECONHECIMENTO DO ESTADO DA PALESTINA


Como refere o artigo de Kit Knithly no «Off-Guardian», as potências ocidentais decidiram reconhecer o Estado da Palestina e advogarem a «solução» dos dois Estados. 

- Mas, a que preço? Com que intenções? Terão assim assegurado que muitas pessoas, seus cidadãos, irão esquecer a sua inação vergonhosa, durante quase dois anos de genocído pelas forças armadas de Israel contra o povo indefeso da Faixa de Gaza? 

Pensam, os governantes ocidentais, que a nova Palestina ficará erradicada dos «elementos terroristas» ... Leia-se, dos diversos grupos que têm efetuado ações de defesa armada contra os atos de agressão e barbárie de Estado de Israel. Nunca será demais insistir: Os responsáveis nos países do Ocidente, tinham conhecimento dos planos genocidas de Netanyahu, muito antes de Outubro de 2023. 

Cala-se a história sombria do conluio da grande finança com os governos imperialistas, incluindo o governo nazi, para a saída dos judeus da Europa e sua instalação na Palestina, terra árabe conquistada aos otomanos na 1ª Guerra Mundial, sob mandato britânico, desde o final da 1ª Guerra Mundial: 

Na declaração Balfour (1917), diretamente sugerida pelo banqueiro Rothchild ao primeiro-ministro britânico em 1917, prometia-se uma terra que não era britânica, mas árabe, para satisfazer a ambição sionista de «dar terra própria» ao povo judeu. Mas, esta generosa «oferta», à custa de território alheio, tinha como contrapartida, satisfazer a premente necessidade britânica de que os EUA entrassem na guerra. 

E assim foi: Bernays e muitos outros nos Estados Unidos, orquestrando uma enorme campanha, lograram mudar a opinião do povo americano, que se tinha manifestado, até então, como anti-guerra. Conseguiu o lóbi judaico obter essa reviravolta graças a uma parte substancial dos «opinion makers» nos jornais, maioritariamente nas mãos de magnates judeus da grande finança. 

Infelizmente, a conivência da classe plutocrática no Ocidente em expoliar a terra dos que sempre lá viveram, os palestinianos, ainda é considerada tabu. Desenvolve-se um complexo de culpa, que faz com que muitas pessoas tenham medo de «passar por anti-semitas». Ora, os semitas tanto são os judeus naturais do Médio Oriente, como as populações palestinianas e outras, nesta região. 

Os supostos «semitas» que vieram em massa povoar as terras do que depois se tornou o Estado de Israel são - na imensa maioria não semitas- de origem Khazar, ou seja, povos do sul do Cáucaso. O império Khazar existiu na Idade Média, e converteu-se oficialmente ao Judaísmo: Depois dele se ter desfeito, as populações foram para diversos países do Leste europeu. Eis a razão de ter existido importante população judaica (Ashkenazi) nos países eslavos (Rússia, Polónia, etc) e nos germânicos (A Alemanha, nessa altura, dividida em muitos reinos e principados). 

Estes Ashkenazi não têm os genes típicos das populações Sefarditas, os judeus de origem ibérica. Estes, que vieram do Mediterrâneo,  têm parte importante de ascendência dos judeus da Palestina, que se dispersaram em toda a bacia Mediterrânea, após a destruição de Jerusalém, pelo exército do império romano em 70 A.C. 

É verdade que os judeus foram mantidos em ghettos, nas cidades da Europa cristã medieval e que, devido aos interditos que pesavam sobre eles, estavam proíbidos de exercer certas profissões. Mas, graças à interdição para os cristãos, de receber juros em operações bancárias de empréstimos, a atividade bancária era tolerada para os judeus, que acabaram por desenvolver redes bancárias de grande dimensão, na altura. Eles tinham uma relação ambivalente com o poder civil e com a igreja católica: Forneciam dinheiro e crédito bancário, a príncipes e papas. Mas, estes - de vez em quando - desencadeavam ondas de fanatismo religioso contra eles. 

Foi assim que, nos finais do século XV, em Espanha e Portugal, os judeus foram forçados a converter-se (muitos, superficialmente aceitando o baptismo cristão, iam seguindo - em segredo- os ritos judaicos: os marranos) ou, em alternativa, a exilarem-se: Muitos foram para o Norte de África, para os Países Baixos, ou o Império Otomano, ou ainda para outros países. 

Evidentemente, os autóctones da Palestina não tinham qualquer responsabilidade nestas intolerâncias contra os judeus. Sob o Império Otomano, os judeus gozavam de relativa liberdade, eram estimados e respeitados, podiam exercer livremente a sua religião. Havia conselheiros judeus na corte Otomana e tinham posições de destaque nas instituições académicas. 

Só a crueldade e o cinismo podem fazer "pagar" ao povo palestiniano pelos males dos quais, nem eles, nem seus antepessados, são responsáveis. Eis um enorme crime contra todo um povo, que o Ocidente nunca assumiu e que não se pode perdoar (pelo menos, aos seus responsáveis). Querem agora arrasar mais de 20 séculos de História, com medidas cosméticas que não irão jamais cancelar os problemas, mas projetá-los nas vidas das gerações presentes e futuras. 

Na realidade, só a generosidade natural das pessoas, sem a interferência da idologia ou de poderes, sejam eles quais forem, poderá resolver os problemas, cancelando injustiças e ódios, de forma a que as comunidades possam viver enquanto vizinhas, em paz e sem se odiarem, sem pretender dominar as outras.

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PS1: A pirataria do Estado de Israel continua. Agora capturaram 500 pessoas da flotilha para Gaza, no alto mar, em águas internacionais. Não há muita media a dar conta do sucedido. Vejam:

https://consortiumnews.com/2025/10/01/watch-live-feed-from-sumud-flotilla/


PS2: Veja como os governos ocidentais traem os esforços dos membros da frota de paz e fazem como se não tivessem obrigações enquanto signatários de convenções de direitos humanos e de leis, que Israel está constantemente a violar: 

https://www.youtube.com/watch?v=KKK2ztmlE4Y

quarta-feira, 1 de outubro de 2025

A «LÓGICA» DA GUERRA




A «lógica» da guerra não é muito complicada de se perceber. Mas, para tal, é necessário fazer tábua rasa dos argumentos sobre «quem fez isto, quem fez aquilo» e deixar de se atribuir responsabilidades, consoante as simpatias ou antipatias pessoais, ideológicas e outras.

Com efeito, a guerra é um encadeamento de atos preparados meticulosamente, determinados pelos poderes, que estão convencidos de que precisam dessa guerra para chegar aos seus fins. Só que estes fins nunca são claros, nem são enunciados de forma que permita ao comum dos mortais entender o que se passa. O processo atual da guerra está relacionado, como sempre, com uma disputa pela hegemonia. Antes, a hegemonia era relativa a um espaço limitado geograficamente. Mas, a partir da 1ª Guerra Mundial, de forma reeiterada com a 2ª Guerra Mundial e desde então, com a chamada «Guerra Fria», tratava-se de um jogo global, destinado a obter o controlo dos principais recursos do planeta, ou seja, alcançar  a hegemonia mundial. 

Nos dias de hoje, a hegemonia que esteve nas mãos dos EUA e seus aliados/vassalos da OTAN, durante algum tempo (desde 1991 até à primeira década do século XXI), tem sido posta em causa. Tal controlo tem escapado cada vez mais aos ocidentais. Antes, muitos deles possuíram colónias ou eram senhores de países neo-coloniais.

Tem-se registado a perda de influência no comércio mundial, dos países do «Ocidente» e o aumento de utilização de divisas próprias pelo Sul Global, neste comércio e destronando o dólar. No desenvolvimento industrial e na capacidade de inovar em domínios de ponta, os países formando o «coração» dos BRICS, têm mostrado o seu dinamismo. Este tem sido tal, que exercem uma atração sobre os múltiplos países do «Sul Global». Surge a esperança de um contexto internacional mais equilibrado. Um sem número de fatores mostram que o Sul Global e os BRICS são uma força económica e estratégica em ascenção e que o chamado Ocidente, está em decadência, em colapso mesmo, a julgar pelas revoltas que se multiplicam. 

Tipicamente, nos países cujos governos estão ameaçados, a oligarquia que os domina transforma as leis e dispositivos legais, reforça os instrumentos de repressão, de modo a que a cólera dos descontentes não se transforme em insurreição. Para guardarem as aparências, vão impor estas restrições com um pretexto, que é o mesmo, desde sempre: O inimigo externo, os agentes de subversão a soldo desse inimigo externo, a necessidade de mais despesas militares e de cortes nos orçamentos sociais, para fazer face à ameaça (que pode ser puro delírio) .

A UE, sob a batuta de Ursula Von der Leyen, está em estado de quase ruptura; certas oligarquias nacionais não estão dispostas a «ir para o fundo com o navio» e já começaram a criticar as medidas tomadas pela presidente (não eleita) da Comissão Europeia. 

As sondagens de opinião mostram que os povos não têm confiança nos seus líderes; sabem que têm sido utilizados como rebanho de ovelhas, sujeitos a lavagem ao cérebro, sobre «os maus dos russos, o terrível Putin, etc.» 

A guerra é a saída para a oligarquia eurocrática, porque assim poderá impor as restrições que quiser às liberdades e ao funcionamento das instituições nos seus países, poderá espremer ainda mais os trabalhadores e a classe média, para obter os fundos necessários para as forças armadas. Terá um meio muito prático para calar quem discorde destas medidas, acusando essas pessoas de serem agentes do inimigo, traidores que merecem a condenação à morte. Deste modo, será fácil intimidar os que, não estando de acordo com as políticas, não se sintam dispostos a desempenhar o papel de mártires. 

Nós todos podemos saber qual o momento em que uma dada guerra é desencadeada. Penso que todas as pessoas atentas concordam que as palavras de guerra estão em todas as bocas dos responsáveis políticos europeus.  Mas, ninguém pode prever quando uma guerra, seja ela qual for, irá terminar. 

As consequências mais terríveis duma guerra são para os pobres, para os trabalhadores, para as pessoas que não contribuíram para o estado de coisas presente. Por isso, é justo que a guerra - em si mesma- seja criminalizada: Os que a desencadeiam ficam nas suas poltronas, gabinetes, salas de imprensa, a fazer o papel de «chefes de guerra», como se fossem eles a lutar no campo de batalha. Entretanto, no verdadeiro campo de batalha (e fora dele, em «danos colaterais» envolvendo os não-combatentes), as pessoas são mortas, feridas, feitas em pedaços, mas pouco ou nada se fala delas; só para lhes dirigir palavras ocas de agradecimento, quando elas deram o que tinham de mais precioso, a própria vida. 

Não existe guerra justa, porque as guerras são fabricadas pelas oligarquias e destinam-se a ter os súbditos bem controlados. Os pretextos ideológicos, políticos, económicos, etc. são apenas pretextos. As somas gastas na guerra não servem para produzir mais riqueza, só servem para armas e munições e estas, ou ficam armazenadas, ou são utilizadas. Neste segundo caso, vão causar mais destruição de vidas e do que foi construído por gerações de trabalhadores pacíficos. Nenhum país pode melhorar sua economia com o chamado «Keynesianismo de guerra». É uma forma de levar as pessoas a acreditar que a guerra possa fazer sentido económico. Mas isto é uma enorme falácia!


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Relacionado:

Veja o vídeo de 09 de Outubro de 2025 e repare como os factos relatados confirmam o que eu disse no artigo acima.

quarta-feira, 24 de setembro de 2025

O último a saber ...



 «O último a saber» é a expressão que se aplica, proverbialmente, para se referir ao marido enganado. 

Mas, neste caso, não se trata do marido enganado, trata-se antes da grande maioria do público nos países «ocidentais», que incluem os do Ocidente (Europa e América do Norte) e países que se situam na Ásia (Japão, Coreia do Sul) e na Oceânia (Austrália, Nova Zelândia). 

Porque, aquilo que está em jogo é uma mudança do sistema monetário, o «Great Reset». O sistema financeiro mundial, desde há vários anos, pelo menos desde a grande crise financeira de 2008, que quase se tornou a crise definitiva do capitalismo, está em ruptura. As moedas dos vários países, foram desenhadas para se irem desvalorizando. Assim, iam possibilitando que os governos e grandes empresas entrassem em dívida, mesmo de maneira crónica, sem grandes consequências para eles, pois estariam apenas obrigados a pagar dentro de X anos, numa divisa que perdeu - em termos reais - uma parte do seu valor. Mas, um sistema que queira conservar uma certa fiabilidade, uma certa estabilidade, tem de ser adossado a algo sólido. E dizer «algo sólido», em termos monetários, traduz-se em metais preciosos como garantia e - em particular - em relação ao ouro.

Desde cedo, que eu estava numa posição de descrença em relação ao sistema no qual vivíamos. Para mim, a crise de 2008 não foi a surpresa, mas foi-o seu «epílogo». Os grandes bancos, as multinacionais, as grandes fortunas, serem refinanciados apesar do que tinham desbaratado, em particular, na financiarização e desindustrialização (auto-induzida): Por exemplo, empresas industriais «convertidas» em empresas de gestão de capitais bolsistas. As injeções de dinheiro fresco, não correspondente a maior riqueza, nem a contrapartida de qualquer espécie, foram-se sucedendo sob o nome de «Q.E.». O pretexto falacioso, totalmente contrário ao mantra do «livre mercado» capitalista, era de que os grandes bancos, as grandes empresas, eram «demasiado grandes», para se deixar ir à falência. Esta extravagância na proteção aos mais ricos, em detrimento de todos os outros, induziu o comportamento de irresponsabilidade total, tanto nas finanças públicas, com nos grandes empórios monopolistas. Acentuou-se a divisão entre aqueles que tinham acesso ilimitado ao crédito barato, virtualmente com zero de juros, e todos os outros que, para comprar casa, carro, etc, tinham de pagar  empréstimos aos bancos, com juros que pesavam nos seus orçamentos.  

Entretanto, a crise do COVID pôs a nu a situação que já vinha de antes e se traduziu numa crise, em Setembro de 2019, com a subida brutal dos juros nos mercados Repo ( = mercados interbancários de empréstimos a muito curto prazo). 

Não sei a partir de quando as altas oligarquias deram ordens para accionar o seu «Grande Reset», mas o facto é que, logo a seguir ao «COVID», se preocuparam muito pouco com qualquer semblante de equilíbrio e preferiram gastar milhares de milhões numa guerra estúpida, cruel e destinada a ser perdida, mas que lhes permitiria travar os BRICS e as " Novas Rotas da Seda" ou «Cintura e Estrada» (Belt and Road Iniciative). Estas, correspondem à verdadeira globalização, a das mercadorias e das trocas comerciais em todo o planeta.

Agora, Honk Kong vai ter um depósito de ouro, para comerciar com o resto do mundo, sendo claro para o «Sul Global» e para os BRICS, que o ouro é o veículo de troca ideal para intercâmbios internacionais, não estando sujeito aos abusos do dólar, ou de qualquer outra moeda que viesse a suceder ao dólar, depois deste ser destronado. 

O público ocidental foi mantido no escuro, foi enganado vezes sem conta sobre o ouro e sobre a «subida» das moedas fiat, sobre os ativos bolsistas e doutros ativos financeiros sem substância no mundo real. Entretanto, paulatinamente, os bancos centrais iam comprando ouro às dezenas de toneladas (tanto os bancos centrais de países orientais, como ocidentais) e os muito ricos convertiam em ouro, ou em propriedades, uma grande parte dos ativos financeiros.

Agora, quem quiser comprar ouro (ou prata), terá de desembolsar uma soma bem maior do que há poucos anos atrás (ver gráfico* sobre o custo do ouro em dólares, no último decénio). Pois, o público ocidental é «o último a saber»...



* Custo do ouro em dólares, no último decénio



segunda-feira, 22 de setembro de 2025

A NOVA DESORDEM MUNDIAL [CRÓNICA DA IIIª GUERRA MUNDIAL, Nº 49 ]

 Não sei se algum título como este já existe, é provável - mas no caso deste escrito - entendo que se trata do título mais apropriado.

Senão vejamos; a liberdade é proclamada e negada, na prática. Não se pode defender um determinado ponto de vista perfeitamente legítimo e racional, sem se ter consequências gravosas, se este ponto de vista se traduz numa desacralização do poder.

Pelo contrário, podem cometer-se atrocidades, violações sistemáticas dos direitos humanos, impunemente, se forem cometidas sob a tutela e seguindo o guião da potência hegemónica. As coisas não mudaram, desde há cerca de 75 anos. Um adjunto do presidente dos EUA, Truman, fez-lhe notar que se estava a apoiar uns «bastardos» (já não sei de que país latino-americano); ao que Truman respondeu...«Sim; mas são os NOSSOS bastardos».

Hoje em dia, a ditadura totalitária de Zelensky tem as honras de governos ocidentais, enquanto vai prendendo os opositores, que «desaparacem», ou vai colocando para sacrifício inútil, centenas de milhares de soldados na mira de fogo das tropas russas, sobretudo vai construíndo - ele e seus associados - fortunas colossais, à custa do erário  público ucraniano (e nosso). Mas ninguém se preocupa, nas administrações que têm doado sucessivos  biliões, para onde vão estas somas. 

Os manifestantes que protestam contra o genocídio dos palestinianos, são dispersos à bastonada, são presos às centenas; isto tem lugar no suposto «modelo» da democracia e dos direitos civis, a Grã Bretanha. 

Em simultâneo, a indústria armamentista, nomeadamente, na UE, no Reino Unido e nos EUA, envia para Israel o que este precisa para efetuar o referido genocídio. Como podem os políticos  se apresentar como «observadores impotentes», durante estes quase três anos de genocídio, sabendo-se que um embargo de armas a Israel iria fazer parar rapidamente o Holocausto Palestiniano?

Claro que jogam os interesses económicos e a importância dos lobis pró-sionistas. Aliás, não devemos confundir estes com as comunidades judaicas: Estas podem estar completamente dissociadas da mentalidade suprematista e colonialista do governo de Israel. 

Em todo o lado, a igualdade dos seres humanos perante a lei, a sua dignidade fundamental, estão postas em causa. Um assassinato irá fazer a primeira página dos noticiários, consoante a vítima seja judeu (sionista ou não) ou um arauto «cristão», em associação com o sionismo, ou consoante se trate de um árabe, que pode ser muçulmano, cristão, de outra religião ou mesmo, ateu. No caso do árabe, nem será referido na maior parte dos noticiários; se o for, será classificado de «terrorista» ou de membro do Hamas, para desencadear repúdio e não qualquer sentimento de compaixão no público.

A ordem moral é a primeira a desfazer-se, quando se inicia a derrocada da ordem política-económica-jurídica.

 Aquilo que se chama «civilização» é um estado de imposição duma falsa ordem, porque baseada na repressão: É isso que significam expressões como «Pax Romana», ou «Pax Americana». 

A ordem moral não pode subsistir quando os do topo da hierarquia são impunes, face às regras aplicadas ao comum dos mortais. Vejam-se os casos (abafados) dos escândalos sexuais em torno da figura de Jeffrey Epstein, ou a total impunidade dos criminosos que lançaram a operação COVID («vacina anti-COVID») para benefício das multinacionais farmacêuticas Pfizer, Moderna, Astra-Zeneca...

Apenas dois exemplos acima citados, mas haveria muitos mais, se contabilizarmos os que no establishment se especializaram em lançar guerras  (Afeganistão, Iraque, Líbano, Líbia, Palestina, Irão...) que têm causado milhões de mortes, incontáveis feridos e deslocados. Mas, a media corporativa reserva sempre o melhor acolhimento para estes senhores e senhoras. 

Em desespero, os antigos aliados de ontém do Ocidente, estão em massa a aderir aos BRICS ou, pelo menos, a  estabelecer acordos comerciais frutuosos com estes países, pois vêm que do lado Ocidental e Americano, só há a perspectiva de manter os países mais fracos sob o seu domínio, por todos os meios, incluindo militares.

 Mas, o comércio precisa de liberdade. Sobretudo, de liberdade de escolha; em dado país participar ou não num dado acordo. Também precisa de um conjunto de regras. Porém, estas regras (acordadas e ratificadas na OMC) são sistematicamente ignoradas ou violadas pelos mesmos que clamam pelo seu respeito.  

A utilização do dólar como arma, abusando do privilégio de ser a principal moeda de reserva mundial (uma herança do acordo de Bretton Woods, 1944), levou a que mais trocas sejam efetuadas nas divisas dos respetivos países, não envolvendo o dólar. O dólar deixou de ser visto como «porto seguro», como reserva nos Bancos Centrais, em muitos países:  Estes passaram a acumular ouro, o qual não pode ser instrumentalizado. Quanto muito, poderá ser expropriado ou roubado, num contexto de guerra, com invasão e tomada do ouro do banco central (como aconteceu na Líbia e noutros casos).

A «lei» da força, ela própria, está posta em causa quando os rivais dos EUA e dos países da OTAN, possuem armas ao mesmo nível, ou que ultrapassam as ocidentais. Em relação à guerra assimétrica, temos assistido aos danos severos causados por mísseis e drones das milícias Houthis (Iemene), a instalações militares e civis israelitas, assim como mantêm o bloqueio no Mar Vermelho, para a navegação destinada a Israel, incluindo porta-aviões dos EUA. Podíamos também descrever o efeito do uso maciço dos drones que - com uma tecnologia relativamente simples - conseguem ultrapassar defesas anti-aéreas de uns e de outros, no teatro da guerra Russo-Ucraniana.

O mundo está cada vez mais complexo e as armas mais perigosas (armas nucleares) estão sob controlo de psicopatas, nalguns casos. A determinação de Netanyahu, ou do seu sucessor, em fazer explodir bombas nucleares contra inimigos (Irão, principalmente) pode configurar a «alternativa Sansão». Ou seja, tal como na narrativa bíblica, trata-se de deitar abaixo todo o edifício (Israel), de modo que os seus inimigos também morram. É uma loucura completa, mas que está consignada em manuais de estratégia militar israelitas, pelo que não pode ser tomada ao de leve.


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Ps1: Jeffrey Sachs e a nova ordem  mundial 

https://youtu.be/97pxh5BifVU?si=H58F_pxUbI0pYdi_


PS2: ANGELA MERKEL atribui a países da OTAN a responsabilidade pelo rebentar da guerra na Ucrânia: 

https://youtu.be/g8iNwQTm6Mk?si=Aop9vp4Fq6dCJEpZ

quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Assassinos Silenciosos - Como a Política Ocidental Causou 38 Milhões de Mortes

 NOVO RELATÓRIO PUBLICADO NO PRESTIGIADO JORNAL MÉDICO «THE LANCET»

Veja o mais recente vídeo por Lena Petrova:


O que este estudo mostra, é que as sanções não são «alternativa pacífica» para a guerra. São antes uma forma de guerra através de outros meios.

terça-feira, 2 de setembro de 2025

ÍNDIA E CHINA RECONCILIADAS. CONFIRMADO NA CIMEIRA DA OCX

 Andrew Korybko explica como o "elefante e o dragão" voltam a dançar juntos:

The SCO Finally Condemned The Pahalgam Terrorist Attack


COMENTÁRIO DE MANUEL BANET:

Quando, em Janeiro deste ano, Trump e a sua equipa tomaram conta das rédeas da Casa Branca, parecia ser um momento favorável às relações bilaterais Indo-Americanas. Havia, pelo menos do lado de Nova Delhi, a esperança de que a atitude «equidistante» dos indianos em relação a disputas asiáticas, mormente com a China, valeriam à Índia  uma atitude mais condescendente da potência hegemónica. 

Mas, qual quê? 

Os indianos estão muito dependentes do petróleo russo para a sua economia, eles não podiam sancionar o principal fornecedor de energia para as suas atividades industriais e agrícolas, sem provocar imediatamente um colapso. 

Pensaram que os americanos teriam o bom senso de fechar os olhos em relação à aplicação das sanções contra a Rússia, pela Índia. Tanto mais que estes dois últimos países têm sido, ao longo de décadas, excelentes parceiros estratégicos, não apenas no petróleo, como em relação a centrais nucleares (de tecnologia russa), a armas e dispositivos (grande parte de origem russa) e ao grande volume de trocas comerciais. 

Mas os EUA, viam a situação de maneira totalmente diferente: Viam-na ao «modo imperial», ou seja, eles decretaram as tais sanções às exportações de petróleo russo e todos tinham de as aplicar, sob pena de ficarem eles próprios sujeitos a sanções «secundárias», apenas pelo facto de terem desrespeitado o «decreto» do Império (note-se que este é que é ilegal, face à lei internacional, pois sanções só podem ser válidas se sancionadas pelo Conselho de Segurança da ONU, o que - obviamente - não é o caso).

Assim, de uma penada, os americanos ficaram sem um país neutro, mas com possibilidade de se tornar aliado, integrando a «OTAN do Indo-Pacífico», a aliança militar (QUAD), destinada a bloquear a «progressão» chinesa no continente asiático. 

Pelo contrário, os indianos perceberam que - para eles - era vital sanarem as divergências com a China, cujo inimigo comum estava realmente disposto a intensificar a guerra económica (taxas de 50% nas tarifas alfandegárias para exportações indianas destinadas aos EUA) e, de provocação em provocação, ir até ao ponto de guerra «física», para manter a sua suzerania naquela parte do mundo.

Os chineses perceberam perfeitamente a situação da Índia. Devem ter aplanado o terreno o mais possível, para que os acordos em múltiplas áreas económicas e de defesa fossem firmados, enquanto as disputas territoriais - causas de fricção do passado - eram discretamente remetidas para resolução por via diplomática, excluíndo a repetição de episódios bélicos nos Himalaias.

Razão têm os chineses, nas redes sociais, em chamar o presidente dos EUA, «camarada Trump»! Quem mais tem feito pelos interesses geoestratégicos da República Popular da China, senão o «camarada» e sua Administração?

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

CRÓNICA DA IIIª GUERRA MUNDIAL, Nº 48: Como os governos nos conduzem ao matadouro





A oligarquia que nos desgoverna, possui dois discursos, duas narrativas: - Uma, dirigida às massas, que se pode considerar obra de propaganda; é apenas o discurso conveniente para forçar a plebe a se curvar e aceitar os sacrifícios em nome da "paz, da democracia e da civilização ".

Claro que este discurso não tem nenhuma coerência com a acção política e governativa por eles realizadas. Nem tem que ter. Tal discurso destina-se a distorcer a realidade, a encurralar o espírito das pessoas num misto de afirmações falaciosas, que se substituem aos factos e de emoções que têm a sua raiz no medo resultante de representações fantasmagóricas do inimigo. Estas representações são, na maioria das vezes, projecções disfarçadas das intenções da oligarquia, mas atribuídas ao outro campo, aos inimigos.

- Mas, existe um outro discurso, que não consta nos media controlados pelo poder. Um discurso interno aos círculos da oligarquia. Este não se pode ler no sentido próprio. Ele nunca é explicito, nunca se traduz em palavras claras. Ele mantém-se restricto ao círculo fechado dos poderosos, nunca dai extravasa. Porém ele é legível para os analistas que não se deixam enredar em palavras, mas dedicam o seu tempo a analisar os factos; as acções concretas, não o palavreado que os criados do poder atiram como um manto, para encobrir as acções.

Laura Ruggeri avança com o conceito de «Thatcherismo de Guerra»; ela desmente que estejamos a regressar a um "Keynesianismo de Guerra " , como muitos têm afirmado de forma pouco rigorosa.

Penso que é um conceito com capacidade de nos revelar o verdadeiro intuito da classe dirigente, qual o seu verdadeiro objectivo em forçar a sociedade e a ecomia a se reconverterem, com explícita vontade de levar a guerra às fronteiras da Rússia.

Não irei adiantar mais, aqui, pois aconselho vivamente a leitura do artigo de Laura Ruggieri.




What we are witnessing in the West is not "Military Keynesianism", which was rooted in the post-World War II economic boom, but "War Thatcherism" — governments hype national security concerns to implement far-reaching neoliberal restructuring and fiscal austerity that would otherwise encounter significant resistance. This approach entails a deliberate reallocation of resources, shifting budget priorities from social welfare programs to military and defense-related expenditures — a reconfiguration of the economic landscape.

War Thatcherism involves more deregulation, privatization, and labour market flexibility (i.e. labour precarity and worker exploitation) under the pretext of national security threats while governments reduce their social obligations.

Take Germany as an example. Berlin is touting investment in defense R&D and manufacturing as a path to economic growth and competitiveness. It may promote growth in countries that have access to affordable energy resources, but this is definitely not the case of Germany, and the majority of EU countries, after losing Russian gas (“thank you, USA”)

Cuts to welfare programs will only exacerbate socioeconomic inequalities and undermine the foundations of societal cohesion, fostering alienation, resentment and dissent.

Dissent, whether expressed through protests, strikes, or other forms of collective action, provides authorities with a convenient justification for imposing draconian measures to curb political freedoms.

In the name of maintaining public order, EU countries will continue to expand surveillance, restrict the freedom of assembly, limit free speech, and enhance their repressive powers. These measures, invariably framed as ‘necessary to restore stability’, serve to bolster authority in the absence of true sovereignty and further erode whatever is left (very little!) of democratic norms and accountability.

▪️War Thatcherism is a fraudulent scheme that benefits transnational elites, impoverishes and enslaves Europeans. Once they are destitute, powerless and fully zombified, they can be turned into cannon fodder.

PS1 : VER TAMBÉM  ENTREVISTA DE SAHRA WAGENKNECHT:


segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Ex-Primeiro Ministro de Singapura sobre o estatuto de Taiwan


 Taiwan tem uma longa história. Uma história que antecede de milénios a presença do poder imperial chinês na ilha. 

Foi a partir de Taiwan e de outros pontos da costa asiática, que se deu o povoamento das ilhas dos arquipélagos da Polinésia e parte da Indonésia. Existem evidências, do ponto de vista antropológico, linguísticas e - mais recentemente - do ADN destes povos, que demonstram essa antiga dispersão. 

No século XV, antes dos portugueses terem aí chegado, Taiwan era parte do império chinês. Mas a população autóctone era muito maioritária. Os comerciantes vindos do continente e alguns membros da administração eram os poucos habitantes da etnia Han (muito maioritária, hoje, na China continental).

Com o tempo e o intercâmbio com os «bárbaros do sul» (nome dado aos portugueses), assim como com outros aventureiros e piratas que frequentavam as águas da região, a percentagem da etnia originária foi decrescendo e aumentando a da etnia Han, dominante no continente. 
Mas, uma transição mais acentuada ocorreu no final do século XIX, com a invasão e colonização nipónica da ilha. Os japoneses expandiram-se em Taiwan, tal como noutras paragens do Extremo-oriente, à procura de recursos e de posições estratégicas, que lhes permitissem consolidar o império «do Sol nascente». A colonização japonesa de Taiwan terá sido menos brutal que a doutros países e povos (como foi o caso da Coreia), mas deixou más memórias a muitos taiwaneses.

Na guerra entre japoneses e  americanos, no final da IIª Guerra Mundial, as tropas de ocupação japonesas foram obrigadas a render-se, em Taiwan, aos americanos. Estes entregaram o governo de Taiwan ao Kuo Min Tang. Na guerra civil entre os exércitos do partido comunista e nacionalistas de Chian Cai Tchek  as tropas derrotadas deste último refugiaram-se em Taiwan, sendo transportadas em navios de guerra americanos. 

Chian Cai Tchek foi um general que, inicialmente, se aliou aos comunistas soviéticos. Esteve próximo do nascente Partido Comunista Chinês mas, passado algum tempo, tomou a chefia duma facção nacionalista, que se confrontou de modo sangrento com os comunistas. Esta guerra civil decorreu em simultâneo com a invasão japonesa. A luta contra o invasor motivou algumas tréguas entre os exércitos chineses inimigos, mas não houve realmente uma frente duradoira contra o invasor. 
Os comunistas chineses acusam as forças nacionalistas de fazerem o jogo do invasor, ao não tomarem a ofensiva quando tinham oportunidade de o fazer, etc. É difícil avaliar os papéis de uns e de outros na terrível situação de guerra civil e no meio de uma invasão estrangeira. 

O certo é que  comunistas e nacionalistas foram jogetes das superpotências vencedoras da 2ª Guerra Mundial, os soviéticos e os americanos. Durante muitos anos, a China Popular não foi reconhecida oficialmente pelo «Ocidente», havendo uma delegação da «República da China» (de Taiwan) nas Nações Unidas. Apesar disso, os ocidentais faziam comércio com a China comunista  (através de Macau e de Hong Kong).

Quando Nixon e Kissinger fizeram a grande viragem, que permitiu que o governo da China Popular fosse reconhecido como o legítimo para toda a China e se abriam as portas da ONU, muitas instituições multilaterais receberam representantes oficiais da China Popular e os diplomatas de Taiwan perderam o estatuto de representantes da China, em virtude dos acordos Sino-Americanos e de tudo o que se seguiu.

Hoje em dia, a polémica é alimentada pelos americanos, ao darem o dito por não dito (em relação à promessa de não expansão da OTAN para Leste, também faltaram aos compromissos): 
- Segundo os acordos de 1971, há só uma China; essa entidade é representada pelo governo de Pequim. Oficialmente, continua a ser  esta a posição dos EUA e da imensa maioria dos países representados na ONU, salvo uns poucos, que ainda mantêm relações diplomáticas com Taiwan. 

Em Taiwan, existe um governo de um partido diferente daquele que tem governado nos decénios passados. Este partido, o DPP, diz oficialmente perseguir o objetivo da independência de Taiwan. Ora, este partido tem uma maioria estreita nas eleições e conta com forte oposição do Kuo Min Tang (o partido fundado por Chian Cai Tchek), que não aceita a política separatista.

A economia da ilha está fortemente interconectada com a China continental. As matérias-primas, em particular alimentares, são importadas em grande parte do continente. As indústrias de microinformática e semicondutores, como a empresa TSMC, têm como principal destino de exportação a China Popular. Há grandes investimentos de capitais de Taiwan, na China continental. Para muitos milhares de pessoas e para a economia de Taiwan, um corte de laços comerciais com a China continental seria uma catástrofe.

A ambição americana é acirrar as inimizades, provocar o governo de Pequim a intensificar medidas que possam ser vistas como «estrangulamento» da ilha, para criar condições dum conflito aceso, em que eles (EUA) iriam socorrer o governo taiwanês, «ameaçado pelos totalitários». Até agora, esta manobra não tem surtido efeito, quer pela sabedoria e experiência acumulada de chineses, de ambos os lados do Estreito de Taiwan, quer porque as simulações do Pentágono têm mostrado que, numa confrontação militar, os EUA, inevitalvemente, iriam perder.

Ver também:


sábado, 23 de agosto de 2025

DMITRI ORLOV FALA SOBRE A GUERRA NA UCRÂNIA - O GOLPE FINAL


 Para Dmitri Orlov não há dúvida que a sociedade ucraniana está destruída, para além de qualquer recuperação, pelo menos, na duração de nossas vidas. Já o falecido Gonçalo Lira e outros, apontavam o facto da demografia ter atingido um ponto de não retorno. 
Os neocons americanos e demais imperialistas, têm um plano de «repovoar» a Ucrânia com emigrantes de países que eles também destruíram ou ajudaram a destruir. Estes proporcionariam trabalhadores manuais para os projectos industriais, agrícolas e, sobretudo, de mineração (lítio, metais estratégicos...). Quanto à agricultura, com os solos mais férteis comprados por grandes empresas de agronegócio, seria baseada em adubagem química e aplicações de insecticidas, em culturas OGM. 
Não me espanta nada que , depois da destruição física deste povo, venha a fase da colonização, no duplo sentido de exploração dos autóctones e de importação de emigrantes e de colonos, de países africanos e do Oriente próximo. 

A Rússia não está interessada em ser «sócia» nesta empresa de neocolonização, por duas razões simples de se perceber: 

- 1º Seria acusada de  explorar e escravizar os ucranianos, levantando mais rancor, alimentando prováveis movimentos de sabotagem ou de guerrilha anti-russa. 

- 2º A imensidão da Rússia e a quantidade de riquezas minerais inexploradas são largamente suficientes para garantir um futuro de bem-estar para a população, se as referidas riquezas ficarem em mãos nacionais russas e controladas pelo poder político, de forma a não serem sujeitas à predação de capitalistas nacionais e internacionais.  

De qualquer maneira, aconselho-vos a ouvir Orlov. Dmitri foi viver nos EUA com os seus pais, quando menino e regressou à pátria russa há poucos anos. Tem numerosos livros, um dos quais é particularmente interessante, pois estabelece o paralelo entre a decadência e colapso do império americano e do império soviético: 

- Ele prevê que o caos e miséria nos EUA ultrapassem a catastrofe dos anos 1990 da Rússia pós-soviética, de predação pelos oligarcas (locais e internacionais). Nos anos da presidência de Bóris Iéltsin, a Rússia sofreu uma «hecatombe» populacional, devido ao brusco desaparecimento das estruturas sociais que sustentavam a população mais pobre, mais idosa...


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ALGUNS ARTIGOS SOBRE DMITRI ORLOV, NESTE BLOG:


DMITRI ORLOV SOBRE O PRESENTE E FUTURO


Dmitry Orlov & Jeffrey Sachs: DUAS VOZES DE PAZ



sábado, 16 de agosto de 2025

UMA DAS OBRAS REVOLUCIONÁRIAS, QUE MAIS TEM EXPOSTO O CAPITALISMO


 Estou a falar-vos da «Beggars Opera» de John Gay, com música de Christoph Pepusch, estreada em Janeiro de 1728. A gravação aqui apresentada, foi gravada em 1991, na Igreja St. Paul em New Southgate, Londres, Reino Unido.

Esta peça de teatro musical, que foi um sucesso em Londres na época, mostra os caracteres de personagens com a crueza satírica duma crítica social, a mais impiedosa que este século produziu.

ACONTECE QUE ESTE SÉCULO XVIII, FOI...

- O século do triunfo do capitalismo mercantil

- O século das «Luzes» e da liberdade de crítica nos países que não estavam sujeitos à Inquisição

- O século em que se deu a secessão da colónia americana da coroa britânica, em resultado da guerra revolucionária, com a independência dos Estados Unidos.

- O século em que eclodiu a Revolução Francesa, com todas as suas peripécias épicas e sangrentas.

Esta peça serviu de inspiração à dupla Brecht-Weill para a famosíssima «Ópera de Três Vinténs» (1928).

Ambas as óperas possuem uma estrutura mais aproximada ao teatro popular: Ambas têm numerosas partes faladas (não com recitativos cantados, como era norma na ópera «séria»). As partes cantadas são de sabor popular, com letras e melodias fáceis de memorizar. Os acompanhamentos evocam música de fanfarra ou de teatro de rua, sublinhando a natureza «reles» dos personagens (um sub-mundo de criminosos, prostitutas, proxenetas, receptadores, agiotas... ) por oposição ao que se considerava ser assunto próprio da ópera, como as paixões de «altos personagens», como os reis, os príncipes e os heróis...

A contribuição destas obras para a transformação da visão sobre o teatro e a ópera, pode ser avaliada pelo facto destas terem tido, em quase 300 anos, uma carreira notável nos palcos, no cinema, nas gravações em disco e na adesão do público, incluindo público «popular» não apreciador de obras musicais eruditas.

                                              


quinta-feira, 14 de agosto de 2025

OS FINANCIADORES DO NAZISMO


 Um notável documento, detalhado e rigoroso, sobre as principais personagens alemãs, americanas e de outras nacionalidades, que financiaram Hitler e o seu partido Nazi, viabilizando a sua ascenção ao poder, a consolidação do III. Reich e o seu apoio económico, militar e diplomático antes e durante a II Guerra Mundial.


Ver também: 




terça-feira, 12 de agosto de 2025

EMIGRAÇÃO E NACIONALIDADE NO PASSADO E NO PRESENTE

NENHUM TERRITÓRIO É PERTENÇA DUM GOVERNO


 Na realidade, os territórios em que não existe acesa contestação sobre «a quem pertençam» os mesmos, são a imensa maioria. Alguns são contestados, são reivindicados por dois ou mais povos; nestes casos, existe geralmente um governo, reconhecido internacionalmente, que «gere» o referido território e uma parte da população repudia esse governo, nega-lhe legitimidade para governar no referido território.

Mas, se não virmos as coisas de modo superficial, verificamos que não existe nenhum decreto, seja ele proveniente de «lei natural» ou «divina», que legitime a pertença de um dado território para um determinado povo, ou nação. Apenas, o argumento da tradição, a continuidade no povoamento, ou seja, o facto da imensa maioria dos autóctones ter nascido no referido território, tal sendo também o caso dos seus parentes e antepassados. Será este o significado etimológico de «pátria»: "minha pátria é a terra de onde são meus pais e onde eu nasci"...

Isto não exclui que certas pessoas se estabeleçam e vivam num determinado território, sendo reconhecido o direito de que os indivíduos - em certas condições, mais ou menos restritivas - possam adquirir a nacionalidade. Trata-se claramente de uma decisão política, de um ato político, por oposição a uma circunstância «natural», inerente ao estado das coisas. Lembremos que, durante a revolução francesa de 1789 e anos seguintes, a cidadania francesa foi conferida a indivíduos de variadas nações, que vieram apoiar o governo revolucionário. A Assembleia Nacional francesa achou por bem conferir-lhes o estatuto de cidadãos. Estiveram neste caso polacos, irlandeses e indivíduos doutras nacionalidades... Portanto, do ponto de vista político, muitos países reconhecem o direito de aquisição da nacionalidade a indivíduos não nascidos nesse território. São automaticamente nacionais os que nasçam no território dessa nação. A nacionalidade também é dada logo ao nascimento, a quem nasça no estrangeiro, de pai e mãe dessa nacionalidade. 

No caso de aquisição de nacionalidade por estrangeiros, é preciso que satisfaçam certas condições, as quais variam de país para país, determinadas pelas respectivas entidades políticas ... Note-se que aqui entra em jogo uma dupla vontade: A do indivíduo, que procura adquirir a nacionalidade; a da entidade política, que a concede. 

Tudo isso terá sido mais ou menos bem concebido pelos legisladores, sobretudo ao longo dos últimos duzentos anos, partindo do princípio de que a emigração seria um fenómeno marginal (em termos estatísticos), que as pessoas deixavam o seu país de origem com uma clara intenção de obter trabalho no outro país, e que finalmente eram propriamente «sangue novo» que se ia acrescentando a um rítmo que não subvertia o conjunto das características étnicas, culturais e mesmo políticas da nação receptora dessa imigração.


 

Porém, no nosso século e nos finais do século passado, a imigração já não é  constituída por fluxos «naturais» de pessoas. Há muitas causas para a emigração, a mais frequente sendo económica, mas mesmo esta pode resultar  dum empobrecimento acelerado de um país em consequência de uma guerra civil prolongada (veja-se o caso da Síria), pode ser devido a uma ruptura por fenómenos naturais (reativação de vulcões, terremotos violentos, alterações climáticas, etc.) com efeitos catastróficos nas condições de vida, até da própria habitabilidade num dado território. Ou seja, as condições na pátria dos indivíduos que aí viviam, tornaram-se muito insatisfatórias ou mesmo impossíveis de se viver. É natural que emigrem para outras paragens, de modo a terem a possibilidade de ganhar a vida, em termos humanamente decentes. Muitos destes casos dramáticos acabam por cair nas garras de redes de tráfico de seres humanos, submetidos aos mais bárbaros e cruéis tratamentos, enquanto as entidades dos países ricos costumam fingir que não sabem, ou que nada podem fazer.  

No caso da emigração de pessoas oriundas de países em catástrofe, os países de acolhimento são, ou as ex-metrópoles coloniais, ou outros países afluentes. Estes países já têm muita riqueza. Parte dela tiraram-na, no passado e com prolongamentos no presente, dos enormes benefícios obtidos com a exploração colonial (casos de Portugal, Espanha, Holanda, França, Grã Bretanha, Bélgica, Alemanha...). As migrações em massa não são um fenómeno natural, de modo nenhum. São resultantes do empobrecimento das regiões de onde são oriundos estes imigrantes, resultando de guerras fomentadas e atiçadas pelas potências coloniais e neocoloniais, da exploração desenfreada das riquezas desses países, ou mesmo pelas alterações climáticas antropogénicas. Em qualquer dos casos, «a culpa» não é certamente dos povos vítimas de tais situações catastróficas.  

Porém, existe outro género de emigração, cujo efeito pode ser muito pernicioso para os países de origem desses emigrantes, embora não haja tão grande visibilidade como os fluxos migratórios em massa. Refiro-me à migração «dos cérebros» isto é, de pessoas, em geral bastante jovens, que atingiram um nível elevado como estudantes e como jovens profissionais, a quem lhes é dada a oportunidade de integrarem uma entidade pública ou privada noutros países, onde terão melhores condições salariais e de carreira que no país de origem. Acontece que o país de origem é mais pobre que o país de destino, mas está a fornecer gratuitamente os melhores jovens, já formados e capazes de dar o melhor de si nas suas atividades respectivas, aos países que realmente não precisam de mais cientistas, médicos, engenheiros ou técnicos superiores. Então, estes países ricos aceitam-nos, porque assim mantêm a supremacia técnico-científica sobre os países mais fracos, além de que desenvolvem ao máximo suas potencialidades na investigação e desenvolvimento a baixo custo, visto que não precisam de subsidiar os cursos universitários ou as especializações dos imigrantes intelectuais que  chegam.  Eles já estão parcial ou totalmente  formados.    

Muitos portugueses e portuguesas jovens têm - ao longo das últimas décadas - procurado no estrangeiro o emprego e as condições de vida que não encontram na sua pátria. Esta, tem-se mostrado muito incapaz de absorver o forte desenvolvimento ao nível educativo (em todos os níveis do ensino), que é - do meu ponto de vista - uma real conquista do regime saído  do 25 de Abril de 1974. As/os jovens têm obtido no presente e em percentagem bem maior do que há 30 ou 40 anos atrás,  diplomas que lhes dão habilitações para um trabalho especializado, técnico e superior, com os quais estão capazes de exercer profissões diversas. Eles/elas, pela sua qualidade, esperam obter uma remuneração semelhante à dos colegas de outros países europeus. Em demasiados casos, não existem condições para fornecer emprego adequado a estes jovens. Eles são empurrados para fora do país. Com o maior desplante, um ex-primeiro ministro dum governo de centro direita, Pedro Passos Coelho, propôs há uns anos... «eles que vão para o estrangeiro, se aqui não encontram emprego».

Naturalmente, muitos jovens portugueses acabam por instalar-se definitivamente nos países de acolhimento. Aí encontram condições de trabalho compatíveis com a sua formação, aí fundam família e encontram os meios de realização pessoal e profissional que não encontraram no seu próprio país. A pátria portuguesa é madrasta para os seus melhores filhos e filhas. Mas a burocracia rançosa, que vive de cunhas e do proteccionismo político,  tem aqui - em Portugal - a sua terra de eleição.

O abandono do país pelas elites verdadeiras e a investida do mesmo por pseudo elites, que são apenas a medíocre turba da política, tornam este país equivalente a um país do Terceiro Mundo, com uma agravante: O não reconhecimento do facto, leva a que seja mais difícil desencadear o processo de desenvolvimento e  mobilizar vontades, sem exclusões. 

Nos outros países que têm o mesmo fenómeno de «fuga de cérebros», nota-se a perpetuação do ciclo da dependência, tal como em Portugal. Esse ciclo caracteriza-se pelo não desenvolvimento autónomo, que gera a necessidade de importação de tecnologia e de peritos, assim como de capitais estrangeiros, e esta situação envolve  sempre uma dependência política, dos mais fracos em relação aos mais fortes. Uma vez que o governo dum país foi capturado, de um modo ou de outro, por potência(s) estrangeira(s), a tendência é para o agravamento desta dependência e para o marasmo do sub-desenvolvimento.