Muitas pessoas aceitam a situação de massacres de populações indefesas em Gaza e noutras paragens, porque foram condicionadas durante muito tempo a verem certos povos como "inimigos". Porém, as pessoas de qualquer povo estão sobretudo preocupadas com os seus afazeres quotidianos e , salvo tenham sido também sujeitas a campanhas de ódio pelos seus governos, não nutrem antagonismo por outro povo. Na verdade, os inimigos são as elites governantes e as detentoras das maiores riquezas de qualquer país. São elas que instigam os sentimentos de ódio através da média que controlam.

domingo, 29 de agosto de 2021

RESILIÊNCIA E AUTONOMIA

 [Ensaio, por Manuel Banet]

 

Tenho escrito frequentemente sobre estes tópicos, ao longo de 5 anos de existência do blog. Estes conceitos têm sido abordados por mim, de várias maneiras e sob vários ângulos. Tem havido, da minha parte, uma reflexão constante, ela própria alimentada por leituras muito diversas, que me têm ajudado a ver os problemas com maior lucidez e espírito prático.
Neste escrito, gostaria de fazer uma síntese das minhas descobertas e reflexões, com o objetivo prático da construção da autonomia e resiliência pessoais e coletivas, ou seja, de resistir à onda de totalitarismo que o mundo tem vindo a sofrer, nestes tempos conturbados.
Os dois conceitos, autonomia e resiliência, estão relacionados, mas não são inteiramente sobreponíveis.

Entendo por autonomia, a capacidade de gerarmos os meios de vida indispensáveis, sem ter de recorrer a fonte exterior à nossa comunidade, ou podendo estar dependentes de fontes externas para certos produtos e matérias-primas, mas onde nenhuma destas fontes detenha um poder avassalador sobre a nossa vida. Implica mantermos uma real possibilidade de substituir a importação por produção autóctone.
Ao nível individual, a autonomia implica não estarmos na dependência de outrem para conduzir a nossa vida, embora tenhamos ricas e diversificadas relações com os outros. Uma interdependência social equilibrada e diversificada é condição de autonomia, ao nível do indivíduo, na sociedade.

Quanto à resiliência, esta traduz-se pela capacidade de autorregeneração, perante uma séria perturbação da nossa capacidade de viver, de desempenharmos as tarefas habituais das nossas vidas.
Em geral, esta capacidade de resiliência é tanto maior, quanto os sistemas tenham múltiplas iterações dos mecanismos vitais: Quando um dado controlo, uma dada regulação do sistema vital falha, intervém outra forma de controlar, de regular este mesmo sistema. Isto passa-se ao nível dos organismos, da fisiologia dos seres vivos. Também ocorre nos ecossistemas, embora seja menos frequente o uso do termo de resiliência, nestes. Mais frequentemente, fala-se de adaptabilidade, de flexibilidade...
Ao nível das sociedades humanas, a resiliência pode ser observada, também. Embora, tal como para os ecossistemas, seja menos frequente a utilização do termo. Por exemplo, quando sociedades afetadas por guerras ou catástrofes naturais, «renascem das suas cinzas», com grande vigor, diz-se que são resilientes. Estas sociedades, embora estabeleçam laços amistosos e comerciais com várias potências, elas têm a sabedoria de não se deixar transformar em neocolónia de nenhuma delas.
Quanto à resiliência ao nível individual, o termo tem sido mais aplicado quando alguém é vítima dum grave trauma, de ordem física e/ou psíquica, que supera, vencendo assim circunstâncias que poderiam implicar a morte ou, pelo menos, uma vida muito diminuída. Exemplos: os atletas para-olímpicos; pessoas que sofreram maus tratos na infância e conseguem superar estes traumas; pessoas sobreviventes duma catástrofe, ou duma guerra e que conseguem superar os traumas. Mas, podemos alargar o conceito, não envolvendo necessariamente trauma físico ou psíquico. Ele pode ser de ordem económica ou social. Note-se, porém, que um forte ataque à capacidade de subsistência do indivíduo é, quase sempre acompanhado, por perturbações físicas e psíquicas, por vezes severas.

A crise que vivemos hoje é uma crise sistémica, portanto é tanto económica, como social ou moral. Todos os níveis operam e interagem uns sobre os outros. A gravidade deste momento não pode ser exagerada, ela tem sido devastadora para as sociedades, para as comunidades e para os indivíduos. Não é meu objetivo, neste escrito, detalhar como se chegou a este ponto. Eu, aliás, abordei esta questão em muitos outros escritos. Aqui, pretendo essencialmente chamar a atenção para as alternativas, de autonomia e resiliência, nos indivíduos e nos coletivos.
A nossa visão do sistema económico-político-social, não pode ser redutora, não pode simplesmente «ignorar» um fator, seja ele qual for. A ignorância pode falsear a nossa avaliação, no momento mais crítico.
Para concretizar o que quero dizer, imaginemos a analogia com a condução automóvel: O condutor de um automóvel, recebe a informação visual «pelo canto do olho», de que alguma coisa se está a mover. Ora, esta coisa pode ser algo inócuo, por exemplo, um pedaço de papel ou de plástico que se move pelo efeito do vento, mas pode ser algo muito perigoso também; imagine-se outro veículo, que se aproxima a grande velocidade. Porém, visualmente, no instante em que o condutor se apercebe desse objeto, representa algo muito minoritário, no campo de visão total. Mas, o cérebro do condutor tem de focalizar a atenção, durante um momento pelo menos, na imagem desse objeto em movimento. Só uns escassos milissegundos depois, o cérebro decide «vou fazer algo em relação a isto, ou não vou». O cérebro do condutor tem de decidir se esta visão periférica pode ser, ou não ser, um perigo. Há um mecanismo automático de análise do objeto e da própria situação, tudo a um nível subconsciente.
A resposta que adotamos, é resultante de várias componentes. Eu penso que podemos agrupar essas componentes em três níveis, sem simplificar excessivamente.
1) A nossa «visão», a discriminação do que compõe a cena, em si mesma (acuidade sensorial).
2) A nossa avaliação interior da mesma, em termos de sobrevivência, a perceção do perigo (instinto).
3) A resposta elaborada, fundamentada na experiência vivida prévia, baseada no conhecimento prático e teórico de situações análogas (raciocínio).
Note-se que, mesmo quando não respondemos a um dado estímulo, quando inibimos a resposta de forma semiconsciente ou consciente, estamos a decidir não responder. Isto é, portanto, algo diferente da ignorância real do acontecimento.
É possível treinarmos capacidades envolvidas nos três níveis acima citados:
A) Acuidade sensorial: por exemplo, a capacidade de discriminação auditiva aumenta com treino de audição de música clássica e sobretudo, com a prática de música, mesmo se apenas a um nível amador. Neste exemplo, não melhoramos fisicamente o nosso sentido da audição, melhoramos a nossa capacidade em discriminar mentalmente entre os sons, com maior subtileza do que na ausência de educação. Podemos aplicar o mesmo raciocínio aos restantes sentidos…
B) O instinto não é - por definição - algo que se possa adquirir/aprender. No entanto, é possível estarmos atentos aos sinais do corpo. Estes são de transmissão automática, em si mesmas. Frequentemente, desencadeiam respostas instintivas. Estas estão a querer comunicar-nos algo de vital. Devemos escutar os nossos instintos, o que não significa segui-los cegamente, como é óbvio. Ser-se «instintivo» não é sinónimo de rude ou primário; pelo contrário, pode ser uma característica de pessoas mais sensíveis aos outros, capazes de maior empatia.
C) O raciocínio é algo que não se desenvolve meramente na esfera da lógica, da matemática. No nosso intelecto jogam muitas outras forças, que nos levam a efetuar escolhas não totalmente racionais, mas que racionalizamos. A possibilidade de melhoramentos reside na compreensão destes mecanismos do intelecto. O «mago ilusionista» distrai-nos a atenção com algo, enquanto efetua a operação oculta, o «truque mágico». Uma parte de nós próprios é como esse «mago ilusionista», quando raciocinamos. Os nossos desejos, sobretudo os não conscientes, são determinantes nas nossas escolhas, mas não nos apercebemos. Sabermos isso, infelizmente não evitará que tal continue a acontecer. Mas, permite-nos evitar os escolhos da autoilusão. É importante estarmos conscientes para a tendência, muito comum, de acreditarmos ser verdade, aquilo que nós desejamos que seja.
Consoante a maneira como vemos o mundo, assim teremos maior ou menor poder de resposta aos desafios deste mundo. Esta resposta, será mais ou menos adequada, em termos de sobrevivência. Mas, para além do nosso desempenho como observadores e da compreensão global das situações, também é importante sabermos dar a resposta adequada. Podemos compreender teoricamente uma coisa e, no entanto, a resposta não se dar, ou dar-se de forma inapropriada, ou com atraso demasiado grande para ser eficaz.

Uma vez enunciadas estas considerações gerais e apriorísticas, quero agora me debruçar sobre as duas propriedades (resiliência a autonomia) no concreto.

Começando pela autonomia:
- Como é que uma pessoa, uma família, um grupo, uma comunidade… podem conservar e aumentar seu grau de autonomia?
Penso que deve existir uma vontade consciente para isso acontecer. Os indivíduos devem estar conscientes e predispostos ao fazer determinadas escolhas. Logicamente, se alguém escolhesse por eles, estaria a contradizer o próprio princípio de autonomia. Mas, num plano menos trivial, as questões da motivação, da livre determinação, da convicção profunda que não deriva do exterior, parecem-me fundamentais. Todas as questões enunciadas na frase anterior relevam da educação, no sentido lato. A educação não é doutrinação, não é o inculcar de valores exteriores. Portanto, a autonomia é sinónimo de exercício da liberdade consciente, pelas pessoas, as famílias, as comunidades e todos os grupos, grandes ou pequenos, de seres humanos.
Esta autonomia vai de par com o debater, em coletivo, as questões que se colocam ao grupo, num modo respeitoso dos outros. Também isso se aprende. Nem sempre se vê tal comportamento. Algumas pessoas não se coíbem de manipular as restantes. Querer manipular os outros de forma disfarçada, é querer tomar o controlo, ou seja, exercer um poder sobre os outros. Isto é totalmente diferente do grupo exercer coletivamente o poder. O grupo que dá a si próprio regras de funcionamento, objetivos, um rumo estratégico, é um coletivo que atingiu a maturidade, no que respeita à autonomia, enquanto grupo. Ele saberá preservar a autonomia individual, reconhecendo e respeitando os direitos e necessidades de cada membro.
No século XIX, em particular, existiram inúmeras experiências de construção de sociedades baseadas na igualdade, na solidariedade e no respeito do indivíduo. Tais tentativas não foram em vão, embora, hoje em dia, haja tendência em apoucar esta rica experiência humana. Nós estamos numa época de involução social e não de progresso, neste domínio. De facto, temos estado a referir como surgiram as primeiras formas de socialismo efetivo, sobre a maneira como se exerceu e exerce.
O movimento cooperativo, sejam cooperativas de produção, de distribuição, agrícolas ou de produção artística, todas elas brotaram de um solo fértil em ideias e desejo de igualdade, equidade, solidariedade verdadeira. Por isso mesmo, as tendências autoritárias, difamaram tais experiências cooperativistas. A tática foi a de chamar «utópico» a este socialismo que foi, desde o início, o mais prático, o mais concreto, e cujos pioneiros eram operários. Isto é propriamente perverso. Mas as pessoas com verdadeiro desejo de autonomia têm muita vantagem em conhecer o socialismo genuinamente operário, as formas que este assumiu desde os alvores no século XIX e  sua evolução. Uma história e abordagem que os autoritários de toda a espécie preferem que seus seguidores ignorem.
É preciso ter uma perspetiva histórica. Além da compreensão aprofundada, ela também serve para mostrar que a realidade atual não pode ser pior que a dos pioneiros do século XIX, que construíram as primeiras cooperativas, os primeiros a associarem-se em sindicatos.
Estou convencido de que não há necessidade de se ir procurar uma fórmula nova, inédita, para abordar a questão de como se deve gerir, de modo democrático e igualitário, um grupo, uma cooperativa, uma associação. Não acredito que as transformações tecnológicas tenham o condão de modificar a natureza humana na sua essência. Podem, quanto muito, induzir determinados comportamentos e dificultar outros. Mas, justamente, o essencial é a escolha consciente dos indivíduos e esta escolha pode e deve ser feita em qualquer época histórica. Ela tem a ver com valores, com ética, não é tributária deste ou daquele grau de desenvolvimento das condições materiais numa dada sociedade. Isto tem de passar pela educação da autonomia. As «escolas de autonomia», de hoje como de ontem, podem tomar uma estrutura formal de sindicatos, de cooperativas ou de outras associações. Na medida em que sejam compostas por indivíduos imbuídos de um espírito de autonomia, o seu funcionamento tenderá a ser o reflexo coletivo dessa mentalidade.
A família, neste contexto, é a «cooperativa natural», por excelência. A tarefa de demolição da família, levada a cabo pelo capitalismo, desde os seus primórdios, tem muito a ver com a necessidade dele desarticular essa forma natural de resistência à normalização, à subjugação do indivíduo. O capitalismo ambiciona ver o indivíduo «livre»... de laços familiares. Mas o termo livre, aqui, não é no sentido habitual do termo, mas no sentido de «livre para ser explorado», para ser usado e abusado pelos donos do capital. A família foi, durante milénios, a «unidade económica básica», a «escola elementar de vida», para além da relação biológica.
As pessoas que não se coadunam com a mentalidade dominante, têm frequentemente dificuldades, pois muitas não possuem qualquer experiência prévia, ou demasiado escassa, de trabalho em coletivos. Um problema complexo que tais coletivos enfrentam é de conseguir abertura, sem diluição das características próprias. A abertura necessária para se crescer numericamente, pode originar a entrada de indivíduos com boa vontade, mas cuja educação está ainda longe do ideal de autonomia. O querer crescer a todo o custo, pode ter um efeito dissolvente na qualidade das relações e na autenticidade dos processos internos de um grupo. Mas, o inverso, ou seja, um funcionamento fechado, pode desencadear o aparecimento de práticas sectárias, mesmo quando a maioria não perfilha tal modo de funcionamento.
A forma de organização em rede, associando entre si estruturas, como cooperativas e outras coletividades, pode ter a sua oportunidade histórica, agora. No momento em que se dá o desmoronar da «economia de casino» e em que as pessoas irão sofrer tremendas dificuldades.
Se, nestas circunstâncias, as pessoas não aprendem ou reavivam seus conceitos de entreajuda, de autonomia e cooperação, então o seu futuro será, provavelmente, de escravatura. Penso que muitas pessoas já perceberam isto. Quanto mais se aprofundar a crise do capitalismo, mais a necessidade de autonomia se vai tornar patente. Nestas circunstâncias, a organização de estruturas do tipo cooperativo, em interação e em rede com outras, semelhantes, vai desenvolver-se. Não consigo imaginar de que modo subsistam durante muito tempo, as presentes formas predadoras de exploração dos humanos e do ambiente. Estas formas, o neoliberalismo, a financeirização da economia, levaram ao caos e à destruição humana e ambiental. Só podem desejar a continuação disso, os psicopatas do poder económico ou político.

Em relação à resiliência, no sentido individual ou social, penso que o fundamental é procurar encontrar os meios pelos quais esta resiliência se exprime e se traduz em comportamento, no momento adequado. Vejamos como:
Quando se faz uma pesquisa na Internet, deparamo-nos com artigos e vídeos em quantidade abundante, procurando «ajudar-nos» a encontrar as saídas para as situações encontradas, sobretudo que envolvem aspetos da vida afetiva, mas também do foro profissional. Não digo que estejam todos a procurar atrair o cliente, para o convencer a frequentar um «curso», disto ou daquilo. Mas, geralmente, as suas propostas e soluções são parecidas, variando apenas os ingredientes, mantendo-se o essencial, que é «Sigam o que eu digo e serão felizes». Por mais que digam, não estão a proporcionar outra coisa, senão uma dependência, uma ilusão.
Mas, uma pessoa que esteja realmente desperta, consciente da necessidade de uma autonomia e resiliente, vai procurar outro tipo de ajuda. Vai tomar consciência de que suas dificuldades, ou problemas radicam num ataque geral contra o indivíduo, pelas forças trituradoras do capitalismo. A saída para a dificuldade ou problema passa, portanto, por se associar com pessoas confiáveis, que nutram os mesmos ou semelhantes sentimentos e pontos de vista, incluindo a recusa de utilizar meios violentos. Se as pessoas começarem a dar confiança umas às outras, e nenhuma às corporações e aos Estados, em breve serão construídas redes eficazes de solidariedade e entreajuda, não hipotecadas a interesses corporativos, nem às burocracias estatais.

Tentam impor-nos agora uma ditadura mundial, servindo-se de governos nacionais e de instâncias globalistas internacionais (OMS, ONU, FMI, OMC, etc.) Se o chamado «Great Reset» for bem sucedido, isso significa que a oligarquia mundial triunfou. Ela já detém, atualmente, a maioria dos bens financeiros e uma fatia substancial dos bens tangíveis – propriedade imobiliária, industrial, terras de cultivo, etc. Eles utilizam o pânico artificialmente criado pela média, em torno de uma infeção viral, bastante inócua em si mesma, mas transformada em "grande perigo do vírus mortífero". Isto permite que o grande capital, com toda a tranquilidade, se desfaça de ativos financeiros hipervalorizados que ainda detém e os transforme em ativos «sólidos» (não-financeiros). Entretanto, as pessoas que se deixaram iludir pela «bolha de tudo» e investiram em ações ou outros papéis (capital fictício) loucamente inflacionados, ficarão sem nada. Os multimilionários já estão agora múltiplas vezes mais ricos, beneficiários da crise artificial do COVID e vão ficar ainda mais.

A melhor resposta às ofensivas do grande capital, aliado com os Estados, parece-me ser dupla:
1ª O desmascaramento das suas manobras, de um modo claro, não demagógico, de forma a convencer o maior número possível sobre a sua realidade. Podemos chamar a isto «Operação O Rei Vai Nu». Quanto mais pessoas perceberem, mais estarão do nosso lado, mais se recusarão a fazer «o frete» ao grande capital, mais espalharão o saber sobre a conjura REAL, desmascarando os que querem calar toda e qualquer resistência, com a etiqueta de «teoria da conspiração». Com efeito, para uma trapaça resultar, o trapaceiro tem de convencer suas vítimas de que está tudo bem, de que seguindo este caminho estarão em segurança, etc. Desmascarar os trapaceiros é desarmá-los, é impedi-los de continuarem o seu jogo.
2º Construirmos a nossa vida, sem recorrer a essas grandes corporações.
Por exemplo, a criação de bancos cooperativos. Eles existem em vários países. Na Alemanha, por exemplo, captam uma fração significativa das poupanças (1).
Outra vertente, é a existência de unidades, familiares ou de maior dimensão, de agricultura biológica. Desenvolveu-se um mercado que, não apenas fornece produtos de qualidade certificada aos consumidores, mas também que está fora da agroindústria. Esta, continua a utilizar produtos fitossanitários cancerígenos, adubos que desequilibram os solos e os tornam cada vez menos aptos à agricultura e recorrem às sementes de plantas geneticamente modificadas, sujeitas a patente, redutoras da biodiversidade e escravizadoras dos agricultores (2).
As alternativas não são do agrado dos gigantescos poderes tecnológicos e financeiros, mas são perfeitamente viáveis e desejáveis. São de aqui e de agora; não são utopias. Talvez, isso seja um dos fatores mais decisivos, embora subestimado por alguns.
Curiosamente, o poder oligárquico toma isso muito a sério, porque sabe o potencial perigo que representa o que seja descentralizado e não submetido aos seus monopólios. Com efeito, quando se pensa bem nisso, na agressividade das ofensivas deles, em todos os domínios, parece mais uma desesperada «fuga para a frente». Eles sabem bem que não têm nada a oferecer de positivo às pessoas. Mas, precisam dar uma ilusão de serem «ecológicos», inovadores, apoiantes de soluções «verdes», e também indispensáveis filantropos, apostados em combater epidemias e erradicar a fome…

Como construir uma estratégia coletiva resiliente?
Nas segunda metade do século XVI, um filósofo, Étienne de la Boétie, escalpelizou a relação dos súbditos com os poderosos, de modo tão rigoroso que seu folheto «De La Servitude Volontaire» continua sendo uma referência essencial em filosofia política. Ele apresenta o argumento de que a servidão dos súbditos é voluntária, no sentido em que estes não são realmente obrigados a fazer a maior parte do que fazem, a sujeitarem-se abjetamente ao poder. Mas, com isso, estão a reforçar grandemente o poder que os oprime, os esmaga e lhes extrai o rendimento do seu trabalho.
As coisas não mudaram, na essência. Nós esquecemo-nos - em inúmeras ocasiões - que, ao escolher um determinado produto e não outro, estamos a dar força a entidades que detestamos, enquanto ao não consumirmos determinado bem ou serviço, que no entanto, é feito pelos nossos aliados naturais, estamos a negar-lhes apoio (3).
Multiplicando aqueles pequenos gestos, a população dos consumidores dispõe de um poder que, muitas vezes, ignora. Acaso as grandes empresas gastariam quotidianamente milhões com a publicidade, se não fosse essencial persuadirem os consumidores?
Somos coniventes, até mesmo quando nos deixamos iludir. Tome-se como exemplo as campanhas ditas de solidariedade social, organizadas por certas ONGs, com a conivência dos Estados: As percentagens das doações para ajudar populações pobres, ou pessoas sofrendo de doença incurável, ou para apoio à alfabetização de crianças, etc., e que vão efetivamente parar às pessoas em causa, são - muitas vezes - ridículas (da ordem duns 10 ou 20 %, apenas) enquanto o restante fica para aquelas ONGs, com muita capacidade mediática, que fazem sua publicidade de forma a desencadear compaixão nas pessoas comuns.
A redução da democracia ao voto, é um dos truques mais óbvios de todos os poderes estatistas. Mas nós sabemos que «votar» não é sinónimo de «participar», por mais que eles nos queiram convencer disso. Os poderes que nos governam querem que «nos mobilizemos para votar». Votemos, pois, de todas as maneiras:
- Votemos com a carteira, comprando o máximo de coisas e serviços exteriores aos grandes circuitos, aos grandes poluidores, aos exploradores do trabalho das crianças e dos baixos salários no Terceiro Mundo.
- Votemos com os pés, desertando os grandes espaços dos hipermercados e centros comerciais, preferindo o comércio de proximidade.
- Desertemos espetáculos alienantes e uniformizadores; votemos, fazendo desporto, jogging, camping, etc., e sem usar acessórios poluentes, não-biodegradáveis, o que não diminui em nada – pelo contrário – a qualidade do exercício físico e do contacto com a natureza…
- Votemos com os neurónios, desligando-nos da TV, das redes sociais e dos jogos vídeo: Todos eles servem para nos «agarrar», como uma droga (sim, de facto, têm um efeito aditivo…).
- Votemos de corpo presente, afirmando a nossa vontade, nas ruas e nas praças, onde as pessoas se manifestam e reúnem por objetivos confluentes.
- Votemos com a nossa participação ativa em associações: de vizinhança, ambientais, políticas, ou outras, dentro das quais estejamos dispostos a colaborar.
- Sejamos resilientes, sejamos ativos/ativas, esta é a mensagem, em resumo. Quanto a votar em tal ou tal partido, em tal ou tal candidato, podes fazê-lo se achares útil, mas que isso não seja alibi para não fazeres mais nada.

 _____________________

(1) Desempenham também um importante papel, mobilizando capital para investimento, em pequenas e médias empresas, normalmente na região onde estão implantados.

(2) Portugal, com solos muito menos contaminados que os dos países do centro e norte da Europa está em boa posição para desenvolver projetos rentáveis de agricultura biológica. Uma boa oportunidade para exportação de produtos de elevada qualidade.

(3) Pequenos comerciantes e consumidores têm interesses convergentes. Uma educação para o consumo responsável, não deve ser apenas virada para critérios ecológicos, mas também para contrariar práticas monopolistas na distribuição.



 

[Gostava de receber o vosso feedback sobre o conteúdo deste ensaio. A discussão está aberta a quem quiser nela participar. Pode fazê-lo nos comentários abaixo deste artigo, qualquer que seja a sua opinião, mas de forma respeitadora dos outros, sem insultar ou menosprezar. Obrigado!]

sábado, 28 de agosto de 2021

28 AGOSTO DE 1963 -DISCURSO DE MARTIN LUTHER KING

IMAGENS DO INÍCIO DO CÉLEBRE DISCURSO «I HAVE A DREAM...»


- Porque é que assassinaram o Pastor Protestante Martin Luther King, que advogava a luta não violenta pelos direitos cívicos dos negros e de todas as restantes pessoas oprimidas?
- Por que razão assassinaram tantos dirigentes e lutadores populares, em tantos países, na América Latina, em África e na Ásia, sujeitos a ditaduras instaladas com o apoio explícito dos EUA?
- Por que razão - no «Ocidente» - há indiferença em relação aos milhões de vítimas inocentes, os «danos colaterais» das guerras do império e que foram conscientemente atingidos pela máquina de guerra infernal?
- Por que razão mantêm em prisão, sem julgamento, sem prova de qualquer ilegalidade, Julian Assange?


Haveria um rol quase infinito de questões que eu poderia desenrolar. Porém, queria questionar meus leitores sobre o seguinte: Sentes-te confortável em viver num Estado que é responsável por tais crimes, ou que é conivente com eles?

Rejeitemos a propaganda que despejam sobre nós,  cidadãos e cidadãs das nações autointituladas «democracias liberais»: Compreendam por que nos enchem os ouvidos e o cérebro com a «excecional democracia», que seriam os EUA. 

Quem tiver um genuíno desejo de conhecer a verdade, encontrará as respostas. Eu não darei qualquer resposta, porque cabe a vós o trabalho, a responsabilidade de procurar e de encontrar as VOSSAS respostas. 
Tem de haver respostas válidas, para vós, mesmo sabendo que a conclusão é provisória, sujeita a revisão perante factos novos, desconhecidos.

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

RECORDAÇÃO DAS OLIMPÍADAS DE 2021


 As atletas abraçam-se espontaneamente, no momento em que partilham o pódium olímpico

A mais bela recordação - para mim - das Olimpíadas do Japão de 2021:
- Este abraço, da atleta ucraniana (Yaroslava Mahuchikh), que obteve a medalha de bronze do salto em altura, à sua colega russa (Mariya Lasitskene), que obteve a medalha de ouro, é para mim simbólico da fraternidade humana por cima de rivalidades nacionalistas e de guerrinhas de propaganda. 
O espírito dos jogos, como promotores da paz, ideia inicial da recriação moderna dos jogos gregos da antiguidade, está presente no coração de muitos dos atletas e do público, também. Isso faz-me ter esperança no ser humano. 

É verdade que um membro do governo ucraniano criticou a atitude da atleta Yaroslava. Mas, isso só mostra a mesquinhez, a estúpida raivinha nacionalista, de certos políticos. 

Muitas pessoas nestas duas nações (Ucrânia e Rússia) têm o coração dilacerado, pois existem muitas famílias mistas e muitas amizades profundas, de um lado e de outro da fronteira, como é natural. 

               

 Duas pombas de paz no meio dum mundo cínico de guerras fratricidas.

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

PODER TOTALITÁRIO E OBSESSÃO DE CONTROLO DO DISCURSO

Nomear: Ao dar-se um nome, está-se a definir o que determinado objeto, animal, ou pessoa, «são».

A Bíblia, no Livro do Génesis, é muito explícita ao indicar que Deus concedeu a Adão o poder de nomear todas as coisas da Criação. Na atualidade, antropólogos e historiadores das civilizações, debruçam-se sobre o universo do vocabulário de uma etnia, quer seja atual ou passada. Se não existe um termo próprio para designar um determinado objeto, ou conceito, isto é indicação de que ele, provavelmente, não faz (ou não fazia) parte do universo dessa etnia.
Ao nível individual, a riqueza ou a pobreza do vocabulário (na língua nativa) dum determinado indivíduo, está correlacionada estreitamente com o grau de educação por ele alcançado.
No romance celebérrimo «1984», Orwell descreve uma sociedade onde a própria língua (a Novilíngua) vai mudando, de acordo com as conveniências do poder totalitário. Ao ponto das pessoas não poderem exprimir de forma clara o que sentem ou pensam, pois não se encontram vocábulos apropriados no seu idioma.
A perda de referências culturais, com a perda da capacidade de se exprimirem e compreenderem a sua própria língua, afeta hoje muitos jovens. Embora não preocupe demasiado os poderes, mesmo nos estados mais ricos, esta é uma forma perniciosa de analfabetismo. Isto resulta do empobrecimento do universo linguístico-cultural e da renúncia da escola em realizar uma verdadeira formação humanista, o que implicaria a riqueza da língua a cultivar.
As «crianças-lobo» - crianças criadas por animais selvagens e que viveram fora de ambientes humanos durante anos - depois de recolhidas, ficam sempre com uma grande limitação em compreender o discurso dos outros e em articular a sua própria expressão verbal. A capacidade da fala e a compreensão linguística devem ser imperiosamente adquiridas numa fase precoce do desenvolvimento, sendo depois impossível superar completamente a ausência de contacto com a linguagem humana. Fica sempre um «handicap».

Se no vocabulário das pessoas não existem os vocábulos correspondentes a determinados conceitos, é fácil perceber que estes se tornem esotéricos, que as pessoas não poderão raciocinar devidamente, pois necessitam das palavras certas, não apenas para comunicarem, como também no próprio processo cognitivo.
O conhecimento atual sobre os mecanismos cognitivos permite ir muito mais longe do que as conhecidas áreas cerebrais de reconhecimento e de elaboração verbal. Os estudos sofisticados mostram que as áreas verbais, visuais, auditivas, etc. possuem conexões, ativadas quando se dá a locução, a audição ou a leitura.

Por todos estes factos, a censura, aberta ou velada, da utilização de determinadas palavras ou expressões, sob pretexto de serem «politicamente incorretas», é uma expressão de violência totalitária sobre determinadas pessoas, mas também sobre a sociedade em geral. A outra face da mesma moeda, é a sistemática aposição de qualificativos com uma carga emocional, moralizante e ideológica, evidente quando se designa determinado grupo, governo ou mesmo nação como «terrorista» , levando a uma série de automatismos de associação. Isto observa-se a outros níveis, também.
A «normalização do discurso» configura o primeiro estádio da tomada de poder totalitário, pois se trata de obrigar as pessoas que falam ou escrevem, a conformarem-se com um falso senso comum, com uma norma discursiva: Por exemplo, os países «ocidentais» são sempre qualificados como «democráticos», por oposição aos «orientais», etc.



Hoje, os mais poderosos meios de condicionamento são, com preocupante frequência, a «média mainstream» e a «academia» Estas arrogam-se o direito de qualificar todo o campo discursivo como «legítimo» ou não, como democrático ou não. Se for por eles considerado «marginal», é passível de exclusão. A liberdade de expressão não existe, se for apenas para alguns: São «autorizados» os discursos conformistas. Não podem por em causa a «ortodoxia», a dominação ideológica «bem-pensante».

Com a chamada crise do COVID, vieram ao de cima, nas sociedades ditas «liberais», estas tendências autoritárias. Multiplicaram-se os comportamentos de censura, de cobardia, de negação do outro.
Ao ponto em que a expressão «Direitos Humanos», quando pronunciada por certas pessoas, se tornou numa hipocrisia, num véu diáfano do seu autoritarismo.

terça-feira, 24 de agosto de 2021

[skwealthacademy] O OURO DO AFEGANISTÃO, UMA HISTÓRIA MUITO MAL CONTADA (PELOS OCIDENTAIS)


NOTA AOS LEITORES: Este artigo pode ser encontrado na íntegra no site correspondente assinalado, que é sob subscrição. A tradução e adaptação feitas aqui, não são do texto na íntegra, mas permitem dar uma ideia rigorosa do conteúdo.  

Original em artigo  de skwealthacademy # 184


O ouro está morto! A sério??

Não mais do que algumas semanas depois de escrever, aqui mesmo, neste boletim informativo, "a grande média financeira (GMF) sempre divulgou a narrativa de que o ouro está morto, de que o ouro é uma relíquia bárbara e o ouro NÃO é uma proteção contra a inflação", os maximalistas do Bitcoin vêm a público para proclamar essa mesma narrativa cansada, errada como sempre, de que estará "morto".

O ouro está morto... Quantas vezes já ouvimos essa narrativa ser difundida por bilionários proeminentes em dívida para com o sistema de moeda fiduciária que os ajudou a enriquecer e, nos últimos anos, por maximalistas bitcoin? O último a se juntar a essa narrativa anti-ouro é o maximalista bitcoin Scott Melker, mas ele será exposto como estando totalmente errado sobre tal narrativa em somente um ano ou alguns anos, a partir de agora. Todos nós sabemos que sempre houve um grupo constante de pessoas que jogou na descida do ouro, em todas as oportunidades que tiveram, incluindo os bilionários Warren Buffet, Charlie Munger, Michael Saylor e Mark Cuban, o visionário que se descreve como Harry Dent e os maximalistas do bitcoin. Aqui neste link, você encontrará a entrevista de um maximalista do bitcoin, proclamando "o ouro está morto". Aposto que daqui a mais uns anos, ou possivelmente até antes disso, essa proclamação parecerá tão tola quanto a fútil corrida de cinco anos de Harry Dent em tentar prever uma queda do preço do ouro para US $ 700 a onça troy. Apesar de errar a marca por mais de 75% em vários anos sucessivos, com sua queda no preço do ouro para US $ 700, Harry Dent continuou a fazer a mesma previsão anual, o que o fazia parecer completamente tolo, ano após ano, após ano após ... bem, acho que, recentemente, ele acabou por desistir de sua previsão de preço de $ 700.

Em qualquer caso, apesar da preocupação da média corporativa pela China ter o objetivo de desenvolver os ricos tesouros minerais do Afeganistão de cerca de US $ 3 triliões de minerais de terras raras, o que, a propósito, não recebeu qualquer crítica de exploração pela média de massa quando eram a França, a Alemanha e os Estados Unidos que tentaram, mas não conseguiram, desenvolver esses recursos minerais para os extrair, sem nenhum benefício para o povo afegão, vamos nos concentrar na história do ouro do Afeganistão, que foi muito mais esquecida do que a história dos minerais de terras raras. Se o fizermos, a narrativa de que o ouro está morto, preocupante para os investidores em ouro, será legitimamente exposta como destinada a encobrir o roubo do ouro de uma nação para evitar que caia “nas mãos erradas”.

Isso aconteceu no Iraque, com os militares dos EUA saqueando e apreendendo o ouro de Saddam, na Líbia com as enormes 143 toneladas de ouro da Líbia roubadas pelas forças da OTAN, na Ucrânia com os EUA enviando aviões de carga militares para transportar 33 toneladas de ouro ucraniano para cofres dos EUA, e com as mesmas operações realizadas em algumas outras nações também. O Afeganistão é a última nação a sofrer as mesmas consequências do saque de ouro pelo Ocidente, com os banqueiros centrais dos EUA afirmando que "congelaram" quase 22 toneladas de ouro do Afeganistão armazenadas nos cofres do Federal Reserve de NY, presumivelmente o subterrâneo na 33 Liberty Street e 580 5th Avenue em NYC, entre outras localidades. 

No entanto, a questão mais curiosa é por que razão o cartel bancário ocidental esteve tão interessado em apreender o máximo possível de um “ativo morto” nos últimos anos? Afinal, estamos a ser «informados» que as cripto-moedas são o futuro e que o ouro está morto. Além disso, por que motivo JP Morgan estava tão interessado em tentar extrair (e possivelmente roubar) o ouro do Afeganistão e correr riscos, numa aventura extremamente perigosa no desenvolvimento de operações de mineração de ouro em Qara Zhagan na província de Baghlan durante a ocupação militar dos EUA de 2001, até ao presente ano? Se o ouro é tão inútil, por que razão os banqueiros do JP Morgan arriscariam vidas humanas ao tentar minerar ouro no Afeganistão e a nomear um ex-militar do SpecOps, Ian Hannam, para liderar o caminho? E apesar do fato de que, às vezes, durante a ocupação, as tropas dos EUA e da OTAN podem ter sido capazes de forçar os Talibã, Ísis e Al Queda para fora de Baghlan, o risco de ataques terroristas era sempre latente, durante qualquer operação de mineração realizada dentro do Afeganistão. Nunca ouviu falar dessa história?

                            


A maioria das pessoas não conhece, mas só porque você nunca ouviu falar disso, não significa que não aconteceu. Em 2010, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos garantiu aos banqueiros do JP Morgan um contrato para iniciar a pesquisa e mineração de ouro na província de Baghlan. Estranho, porque nunca vi "mineração de ouro" listada em qualquer declaração financeira pública do JP Morgan como uma divisão operacional da empresa. Claro, como as aventuras do JP Morgan no Iraque devastado pela guerra provaram, os banqueiros do JP Morgan nunca perdem a oportunidade de explorar financeiramente uma nação devastada pela guerra. O empreendimento organizado para atingir esse objetivo foi designado de «Afghan Gold and Mineral company (AGM)», um nome que pretendia promover a imagem de propriedade afegã, e que provavelmente se traduzia, na realidade, em 100% de propriedade estrangeira de todos os despojos.

Sabemos, no entanto, que os interesses ocidentais sabiam desse ouro décadas antes da ocupação dos Estados Unidos em 2001, uma vez que os afegãos locais se envolveram na mineração artesanal de ouro em muitas regiões do Afeganistão, numa escala muito pequena e sabiam - há séculos - da existência de ouro em suas montanhas. Dusko Ljubojevic, um geólogo sul-africano que trabalha para a AGM, até admitiu isso: "Sabemos, pelos habitantes locais, que existe ouro e nossos próprios estudos mostram um bom potencial - agora precisamos explorar mais." A AGM foi apresentada como detida maioritariamente por Sadat Nadari, um magnata dos negócios afegão de 36 anos que possuía uma rede de supermercados e uma seguradora em Cabul, bem como vários interesses nos sectores da construção, de telecomunicações e distribuição de combustível.

Sadat também foi o ex-ministro do governo afegão para Assuntos da Paz e ex-Ministro do Desenvolvimento Urbano e Habitação, mas parece ter sido erroneamente nomeado, já que suas façanhas o teriam tornado mais apropriado para «Ministro da Exploração Financeira». Apesar da lei afegã proibir a qualquer alto funcionário do governo de licitar contratos de mineração, Sadat fez isso mesmo, de qualquer maneira em clara violação da lei, e mais tarde renunciou a seus cargos no governo para manter seus contratos de mineração, após protestos públicos de corrupção. Com grande ironia, a Wikipedia descreve Sadat como vindo duma família "espiritual", mais uma vez mostrando como a Wikipedia é inútil enquanto fonte de informações factuais, já que encobre as façanhas de negócios de Sadat, que o expuseram como explorador de capital humano e recursos minerais de sua própria nação, não como um grande líder “espiritual”.

No que diz respeito a quanto ouro foi roubado no Afeganistão por interesses bancários ocidentais, minerando sob a cobertura de ativos militares dos EUA, tais como os vigilantes helicópteros Black Hawk, isso é desconhecido. O máximo que pude encontrar em minha pesquisa foi que, sobre as quantidades desconhecidas de ouro extraído, o governo afegão recebeu “pouco ou nada”. No entanto, a credibilidade dessa afirmação está em questão, simplesmente devido ao fato de que todas as informações sobre se essa mina de ouro foi desenvolvida e se houve, ou quanto ouro foi extraído, parecem ser informações confidenciais. Outro artigo que descobri em minha pesquisa afirmava que o governo do Afeganistão anulou os contratos de mineração antes do desenvolvimento da mina de ouro, devido ao não-cumprimento de obrigações contratuais ocorridas. No entanto, devido à corrupção do governo fantoche instalado pelo Ocidente no Afeganistão, a dissolução dos contratos, um evento que aconteceu no final de 2019, não significa que a operação de mineração realmente não tivesse continuado e que nenhum ouro fosse extraído do solo do Afeganistão e secretamente transportado de avião para fora do país, com pagamentos ao governo fantoche para garantir o silêncio sobre estas questões.

 Pude descobrir histórias sobre dois incidentes envolvendo operações ilegais de mineração de ouro na província de Badakhshan, no Afeganistão, que relataram a morte de quatro pessoas num incidente e a morte de trinta, com mais quinze feridos, num segundo incidente, no início deste ano. No entanto, dado que uma empresa britânica liderada por Ian Hannam recebeu os direitos de minerar esse ouro pelo governo corrupto do Afeganistão, só Deus sabe se os empreiteiros britânicos estavam supervisionando essa operação ilegal de ouro ou não. Mais uma vez, para provar que toda a narrativa sobre a China cobiçando os US $ 3 triliões de minerais de terras raras do Afeganistão é uma narrativa totalmente política e tendenciosa, a existência desses minerais é conhecida há séculos, e não apenas descoberta durante a ocupação dos Estados Unidos, como os órgãos da media ocidentais mentiram e relatam falsamente. Com base em pesquisas geológicas realizadas por geólogos britânicos em 1890 e posteriormente por russos, americanos, alemães e franceses, o conhecimento de reservas significativas de petróleo, gás, carvão, prata, cobre, lápis-lazúli, ouro e minerais de terras raras é conhecido há décadas, ou mesmo há séculos, muito antes do início da ocupação dos Estados Unidos em 2001.

Assim, as manchetes estridentes que correram há mais de uma década atrás, de uma nova "descoberta" gigante de lítio, cobre, ouro e outros metais de terras raras, eram uma mentira completa da média corporativa, já que as pesquisas haviam exposto a existência dessa vasta riqueza de reservas décadas antes e como afirmado acima, os russos, americanos, alemães e franceses tentaram extraí-los, e banqueiros como JP Morgan meteram suas mãos sujas no jogo, tentando abocanhar um pedaço do enorme bolo. Os arquivos históricos da época de Alexandre, o Grande, com mais de 2.000 anos, documentam a existência  de mineração de ouro, prata e pedras preciosas na região do Afeganistão, pelo que relatar, como a média de massas fez, que essas descobertas e esse conhecimento são relativamente novos, é uma falsidade completa.

Além disso, sabe-se há centenas ou milhares de anos que, pelo menos, seis das 34 províncias do Afeganistão são ricas em ouro e acredita-se que também exista mais ouro noutras partes do país. O maior depósito de cobre do mundo também pertence ao Afeganistão, na província de Sar-e-Pol. Portanto, embora eu concorde que a China deva ser condenada por se aproximar duma organização terrorista como os Talibã, para poder extrair esses minerais, se essas histórias forem verdadeiras, é hipocrisia da mais alta qualidade que os meios de comunicação de massas calaram a boca quando uma série de interesses ocidentais se aventuraram por conta própria neste tesouro de minerais. Ninguém, são de espírito, realmente acreditava que qualquer nação ocidental, que durante décadas tenha extraído esses minerais do Afeganistão, tivesse dado a maior parte das riquezas ao povo afegão, convertendo o Afeganistão em Mónaco, St. Tropez ou Martha’s Vineyard.

Observe como a narrativa falsa que relatava, mais de uma década atrás, que uma “pesquisa do Serviço Geológico dos Estados Unidos de 2007 parece ter descoberto quase US $ 1 trilião em depósitos minerais no Afeganistão, muito além de quaisquer reservas anteriormente conhecidas e o suficiente para alterar fundamentalmente a economia afegã ”. Agora, transformou-se de “ descoberta ”de $ 1 trilião, erroneamente classificada em “ descoberta ” dum tesouro de $ 3 triliões, depois de ter ficado claro que os chineses iriam tentar sua extração, após o fracasso dos EUA. Esta quantidade de recursos foi magicamente reclassificada de US $ 1 trilião, para US $ 3 triliões recentemente, a fim de demonizar a ganância da China, embora o governo do Afeganistão tivesse estimado o valor dos minerais em mais de US $ 3 triliões, há mais de uma década. Quando os interesses ocidentais ainda buscavam explorar os minerais, a média ocidental rebaixou amplamente a quantia para apenas US $ 1 trilião, para minimizar a ganância dos interesses ocidentais em explorar exatamente os mesmos vastos recursos minerais afegãos, pelos quais a China está a ser demonizada, agora. 

Não se trata de tomar o partido de qualquer nação, em detrimento de outra, para quem tenha princípios intelectuais e morais. Todas as nações estão erradas ao tentar extrair recursos minerais doutra nação, sem que a extrema riqueza desses recursos vá beneficiar o povo da nação da qual os minerais estão sendo extraídos. Não importa se a nação é China, Canadá, França, Austrália, Alemanha, França, Rússia, Estados Unidos, Turquia ou qualquer outra nação. Errado é errado, mas a média hipócrita nunca apresenta as informações desta maneira.

A média de massas sempre demonizará outras nações por exatamente os mesmos comportamentos criminosos que as suas próprias cometem, e sempre desculpará estas, por idêntico comportamento repulsivo. Esta é uma questão a respeito da qual tenho um problema, porque enquadrar tais questões desta maneira não é apenas hipócrita, mas moralmente repreensível. Não há dúvida de que essas reservas eram conhecidas há décadas, antes das pesquisas feitas pelos Estados Unidos durante a ocupação e que todos os relatos de uma nova “descoberta” eram totalmente falsos. Talvez o único componente factual das histórias que correram naquela época, tenha sido que pesquisas mais avançadas foram capazes de colocar uma estimativa financeira mais precisa quanto ao valor dos vastos recursos minerais do Afeganistão.

[...]

Como os resultados das pesquisas geográficas mais recentes dos Estados Unidos continuam a ser uma questão de segurança nacional, provavelmente nunca saberemos quanto ouro existe no Afeganistão e quanto ouro pode ter sido extraído e exportado durante a ocupação dos Estados Unidos. Mas, a única coisa que sabemos é que muitas nações ocidentais estavam interessadas nas ricas reservas de ouro do Afeganistão e fizeram o possível para extraí-lo, com sucesso ou não. A todos os expatriados ocidentais já evacuados e agora em curso de evacuação do Afeganistão, desejo-lhes boa sorte nos seus esforços para saírem em segurança. No entanto, eu realmente gostaria de saber quantos deles eram funcionários da indústria de mineração, já que as dezenas de milhares sendo evacuados, não poderiam ser somente intérpretes das forças da NATO.

J. Kim

skwealthacademy CEO


____________________

PS1: Inicia-se nova era pós- invasão americana do Afeganistão. O estado de espírito dos imperialistas parece ser o que vingança, de querer castigar o povo afegão por ter feito sofrer a humilhante derrota ao poderoso exército e ao complexo militar industrial: https://www.moonofalabama.org/2021/09/why-us-plans-for-revenge-in-afghanistan-may-not-succeed.html#more

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

[Miguel Rincón] "Fandangos" ca. 1730

 

"Fandangos" Santiago de Murcia, Codex Saldívar, ca. 1730

É interessante estudar o caso do fandango: Uma dança popular, com raízes tanto em Portugal como em Espanha, inicialmente «mal vista pela igreja». Mas, devido à moda que se alastrou na corte, ela tornou-se uma das danças mais frequentemente estilizadas no século XVIII. Ao longo do século XVIII, muitos músicos, como Bocherinni, Domenico Scarlatti, ou o Padre António Soler, compuseram fandangos. Além das peças designadas como «fandango», a voz do baixo desta dança serviu para se comporem muitas variações, como o Ground in C de Purcell.
O instrumento mais utilizado foi a guitarra de 5 ordens, na qual Miguel Rincón interpreta os fandangos dum manuscrito do início do século XVIII.
A estrutura musical do fandango é bastante simples e possui afinidades com outras danças estilizadas ibéricas*, nomeadamente:
La Folia é, das danças ibéricas, a mais utilizada nos séculos XVII e XVIII, incluindo músicos não-ibéricos como Corelli, Marin Marais e outros. Ela própria deriva de Guardame la Vacas; no século XVI, esta canção foi transcrita para instrumentos de corda e de tecla, sob forma de «tema e variações».
Canários: uma dança popular desta época, cujo nome indicaria ter sido trazida do (ou associada de algum modo ao) Arquipélago das Ilhas Canárias.

--------
* Oiça várias danças estilizadas de Santiago de Murcia:



domingo, 22 de agosto de 2021

ASSIM VAI O IMPÉRIO


Uma ténue esperança desponta... Esperemos que não seja um efeito superficial, uma ilusão efémera.

Com efeito, a máquina de guerra implacável do império foi - de novo - revelada, na sua obscena exibição de força, naquilo que é, na verdade: um conjunto de mercenários, não só os que se podem designar propriamente como tal, como também as forças oficiais do aparato bélico do império.
Os generais foram derrotados pela enésima vez, mas também os estrategas de gabinete do Pentágono e da Casa Branca, ou os lóbis e «think tanks» que os manipulavam. Eles todos mostraram, uma vez mais, a inanidade do seu pensamento estratégico.


A política do caos, que foi a marca imperial durante dois decénios, pós 11 de Setembro de 2001, foi uma máquina de destruição, mas também corroeu as estruturas que garantiam a estabilidade do «Ocidente», assim como a confiança dos países na esfera de influência mais alargada da potência hegemónica.

No plano monetário também, está-se claramente a chegar ao fim de um ciclo. Agora, o dólar US como moeda de reserva mundial, já é visto como estando perto do fim.
Não se pode ignorar que os maiores atores do sistema monetário ocidental estão a procurar freneticamente uma saída para a enorme crise: O perigo real de colapso do sistema monetário e da montanha de uns 300 triliões de US dólares de dívida, que se acumularam sobretudo nas economias dos EUA e da Europa.


Estão em curso tentativas de lançar moedas digitais, pelos bancos centrais do Ocidente. Elas serão apenas variações das moedas «fiat» atuais, caso não estejam garantidas por algo de sólido, nomeadamente, o ouro.
A este contexto financeiro-monetário, soma-se ou potencia-se o desesperado esforço para descolar as economias ocidentais, financeirizadas, da dependência em relação às economias produtivas do Extremo-Oriente, em particular, da China.
Mas, esta tentativa é fútil. Ela irá provocar um maior empobrecimento nas economias europeias e norte-americanas, já muito depauperadas. Não se pode imaginar, senão no domínio da ficção, que as economias, esvaziadas durante os últimos decénios da sua componente industrial, poderão rapidamente readquirir sua capacidade industrial perdida.

As potências que vão moldar o futuro, goste-se ou não, são a China e a Rússia, com uma constelação de outros Estados, possuindo maior ou menor poderio económico e geoestratégico. Todos eles, estão a agregar-se em várias plataformas, com vista a potenciar mutuamente suas vantagens numa ordem multipolar, sem ter que prestar vassalagem a um «dono e senhor», como é o caso dos países sujeitos ao império, sejam eles fortes ou fracos.
Veja-se o estatuto real da Alemanha: Por maior que seja esta potência, do ponto de vista económico, ela continua a prestar vassalagem à potência hegemónica americana que, sob cobertura da NATO, ocupa o Centro e Oeste da Europa, há mais de 70 anos.


Não se deve, porém, desprezar o poderio dos EUA: Continuam a dispor dum poder temível, pois têm uma capacidade nuclear maior que qualquer outra potência e forças armadas hipertrofiadas. Possuem bases militares - cerca de 800, segundo estimativas prudentes - nos cinco continentes. 
Além disso, reservam-se o privilégio de acumular, sem contrapartida de qualquer espécie, uma dívida astronómica, tendo défices estatais e comerciais durante décadas a fio, graças ao controlo do sistema monetário internacional e da emissão de papel-moeda. 
Os EUA, graças ao seu poderio militar-económico, obtêm a submissão dos governos e políticos corruptos nos países-vassalos.

Mas, a política do caos chegou ao seu fim, no Afeganistão:
Assim como a experiência amarga do Vietname serviu de lição aos jovens americanos que deixaram de ver seu governo como essencialmente benéfico para eles e para os seus «aliados», também a experiência afegã está a mostrar aos americanos e ao mundo que o império tem pés de barro, que os políticos estão sempre a mentir e apenas querem dar a ilusão de que controlam as situações.


No entanto, estes políticos são completamente impotentes para inverter, ou somente travar, as tempestades que eles próprios desencadeiam e lhes vêm parar à porta. Uma economia em involução, nos EUA e nos países da sua órbita, vai desencadear múltiplos fenómenos políticos e sociais.

A crise do «COVID» tem-se revelado como a tentativa de controlar os cidadãos e os Estados, de forma a evitar poderosos movimentos de massas, decorrentes da situação de depressão económica, que se abateu sobre o Ocidente e que poderá arrastar-se durante várias décadas. Esta crise começou em 2008, mas tem sido camuflada pelas medidas cosméticas dos governos e bancos centrais. 


Os poderes precisam, neste contexto, de reforçar os mecanismos do controlo e repressivos. Mas, esta viragem autoritária, totalitária, quer se chame «Great Reset» ou outra coisa, tem uma grande limitação: A impossibilidade de obterem o consentimento dos cidadãos.
Nas democracias liberais, o consenso da cidadania era fundamental para o funcionamento - sem sobressaltos - da economia, até à burocracia de Estado e aos partidos políticos.
Com a coerção e patente violação das liberdades fundamentais, os poderes poderão obter a submissão pelo medo, mas não a adesão voluntária às suas políticas, usurpadoras dos legítimos direitos dos cidadãos. As pessoas comuns vão sofrer perdas, a todos os níveis: económico, de segurança e das liberdades.
Enquanto muitos no Ocidente sofrem as consequências da viragem autoritária, incluindo as campanhas de terror psicológico ao estilo da guerra-fria, o que se passa nos países do «eixo Euro-Asiático»? No sistema multipolar Euro-Asiático em construção, um número considerável de povos sairá da pobreza, terá capacidade de gerar a sua produção e desenvolvimento. Estas nações estarão, cada vez mais, «no centro». 
Pelo contrário, as democracias ocidentais decadentes, incluindo a potência hegemónica que as controla, estão em vias de «terceiro-mundialização».


É impossível prever precisamente como as coisas se vão passar, mas - de uma ou outra forma - a cidadania irá reagir: A dissociação entre governantes e governados origina, necessariamente, uma instabilidade. A casta política e a oligarquia que a sustenta, nunca irão devolver 'de mão-beijada' o poder retirado aos seus súbditos.

Neste contexto, as pessoas devem preparar-se, o melhor  possível:
Há dois conceitos que se deveriam pôr em prática, tanto ao nível individual, como das famílias e comunidades: os conceitos de resiliência e de autonomia, os quais estão ligados.
Prometo escrever sobre esta questão, sob um ângulo prático: «como enfrentar agora um mundo em completa transformação, aos níveis dos indivíduos, das famílias e das relações sociais».

---------------

PS1: Inicia-se nova era pós- invasão americana do Afeganistão. O estado de espírito dos imperialistas parece ser o que vingança, de querer castigar o povo afegão por ter feito sofrer a humilhante derrota ao poderoso exército e ao complexo militar industrial: https://www.moonofalabama.org/2021/09/why-us-plans-for-revenge-in-afghanistan-may-not-succeed.html#more