NB: Esta recolha vem na sequência de uma anterior, onde reuni as obras compostas desde 2016, no início da escrita do blog «Manuel Banet, Ele Próprio», até finais de 2021.
Não estão incluídos aqui textos de outra natureza, como os de filosofia, política ou economia. Incluí aqui alguns textos de estrutura não versificada, pois os considero prosa poética.
O conteúdo desta página irá sendo atualizado, à medida que vão sendo colocados mais textos poéticos no blog.
Manuel Banet
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37/ SALMOS PARA O SOLSTÍCIO DE INVERNO
É MUITO PERIGOSO PROVOCÁ-LO;
SUAS IMPRECAÇÕES ECOAM NO TEMPO
SAIBAM QUE SALADINO ESTÁ VIGILANTE
COM ALÁ E TODA A IRMANDADE.
SERÁ DO RIO ATÉ AO MAR
QUE SE TINGIRÃO AS TERRAS
DE SANGUE JUDEU, ÁRABE, BERBER
TERRAS ONDE HÁ DOIS MILÉNIOS
NASCEU O NOSSO SALVADOR
(SIM, O NOSSO SALVADOR:
PARA OS «CAVALEIROS»
OLIGARCAS DE HOJE,
É TIDO COMO RELIGIÃO
DE POVOS ATRASADOS,
LÁ DA IDADE MÉDIA)
SÓ SEGUEM O DEUS DÓLAR
O DEUS DOS BANQUEIROS
TUDO O RESTO, VARRIDO:
HUMANISMO, VARRIDO
COMPAIXÃO, VARRIDA
VIRTUDE, VARRIDA
HONRA, VARRIDA
LEALDADE, VARRIDA
SE ALGUMA FÉ TIVEREM
ELA TEM COMO DEUS, BELZEBU.
(NÃO CREIO QUE SEJA LÚCIFER,
O PORTADOR DA LUZ:
COSTUMAM CONFUNDIR TUDO
E TROCAR OS NOMES.
EU NÃO ACREDITO,
PORQUE OS QUE HOJE TRIUNFAM,
SÃO PORTADORES DE TREVAS,
NÃO DE LUZ.)
ESTAMOS REALMENTE
NO CORAÇÃO DAS TREVAS
HOLOCAUSTO BRUTAL, ABSURDO
SOFRIMENTOS INFINITOS
DE INOCENTES, SACRIFICADOS
PELOS CRIMES DE SEUS EXECUTORES
PARA OS GENOCIDAS SACRIFICADORES
DE CRIANÇAS, NÃO HAVERÁ PERDÃO;
QUALQUER QUE SEJA A RELIGIÃO
É PORTADORA DE PADRÃO ELEVADO
DE JUSTIÇA, DE NOBREZA DO CORAÇÃO
NÃO HÁ RELIGIÃO OU ÉTICA
EM TUDO O QUE É FEITO
PELO DINHEIRO,
PELO OURO NEGRO,
PELO PODER DESPÓTICO
SOBRE OS OUTROS
(O NATAL DE HOJE,
ESTÁ CONFINADO
AOS CRISTÃOS DO LEVANTE
QUE SOFREM NA INDIFERENÇA
DOS PAÍSES «CRISTÃOS»
RICOS E CORRUPTOS)
OS CRISTÃOS DA SÍRIA, DO EGIPTO,
DA PALESTINA, INCLUINDO ISRAEL
DA TURQUIA, DA JORDÂNIA, DO IRAQUE
VIVEM COMO BONS VIZINHOS COM MUÇULMANOS
INFELIZMENTE, VIERAM FALSOS CRISTÃOS
OS VERDADEIROS APÓSTATAS,
PARA ESMAGAR, VIOLAR, DESMEMBRAR
E INCENDIAR SUAS TERRAS E CIDADES
JAMAIS HAVERÁ PERDÃO, NO MEU ESPÍRITO,
PARA O MAL QUE FIZERAM OS FALSOS CRISTÃOS.
ELES, QUE SE DIZEM CRISTÃOS E FAZEM
O CONTRÁRIO DO QUE JESUS PREGOU
SÃO OS MAIORES INIMIGOS DA RELIGIÃO,
DEUS LHES PERDOE, SE ESTE FOR O SEU DESEJO,
MAS EU PREFIRO ESTAR DO LADO DA RAZÃO
DA JUSTIÇA, DA BONDADE, DA HUMANIDADE
O MEU NATAL É DE DOR E TRISTEZA,
SÓ HOMENS E MULHERES
DE CORAÇÃO AUTÊNTICO, ME ALUMIAM!
OS HIPÓCRITAS, POR MAIS LUZES QUE
ACENDAM EM SEUS LARES E IGREJAS
ESTÃO MERGULHADOS NAS TREVAS.
- Tu, que olhas sobranceiro
Os humildes que sofrem
Labutam e lutam
Por sustento de miséria
- Tu, que te julgas superiorPorque o mereciasQuando afinal poucoTens de juízo e saber- Tu, que te orgulhasDe ser escravoExibes como adorno,As grilhetas mentais- Tu, ricaço estás afinalNu, sem resguardoNo meio da sociedadeQue sustenta teu fardo- Tu, esqueces depressaA quem tudo devesFicas mais frágilAinda mais exposto- Tu, serias cómicoNa tua brutezaMas és responsávelPor tantos males- Vai pró InfernoAí tens teu lugarCorre, ocupa-o!É bem quentinho.
35/ QUASE PÓSTUMO
Quase póstumo
Ainda assim querendo ser
Ingénuo outra vez nascer
Em segredo olhando
Crepúsculos de madrugada
E ventos cantando
ao ouvido aquela
Canção antiga
Não sei a letra
Mas fala de sereias
E de sementes
Reminiscências
De quando fui
Noturno corujando
Em diálogo com
Filtradores de orvalho
Mas não era eu
Afinal, tempo sonhado
Ou vida imaginada
Se foi tudo um filme
Não sei, podia sê-lo
Ser outra história
Às vezes cómica
Ou triste
Ou irónica
Ou trágica
Ou banal
E tudo...
O cintilar de prata à superfície do rio que flui para o mar
É efémero; eu sei
Mas o olhar, esse, é eterno
Se te concentrares e fixares
O instante como eternidade
Como universo parando para deixar
O instante ser na sua plenitude
Sem nada que o estorve
Sem outro modo de ser
Senão o ser em si mesmo
Compreenda isto quem puder
Vamos remando num universo sem limites
Mas cíclico e nossa insignificância
É eternidade
O ser é eterno deixa a sua marca
Não desaparece, transforma-se
Entenda isto quem puder
Eu apenas reflito o saber
Como o espelho reflete a luz
Nada misterioso, o espelho
34/ A BESTA ENRAIVECIDA
A Besta não é racional; pode morrer, mas mata primeiro
A Besta não distingue o bem do mal; é insaciável
A Besta tem fragilidades; e não é sermos destemidos
É cortar-se a energia, o financiamento e o crédito
Assim, cozerá no seu próprio sangue enraivecido
Pode escoucear, mas a cada gesto mais se esgota
Ninguém precisa da Besta; antes pelo contrário
Ela precisa de todos nós; vive do nosso suor
Resgatar um mundo humano: basta querer
Cortem todo o contacto, boicotem todas as relações
Cancelem negócios; o que perdem, depois ganharão
Outra Terra se construirá, sem Bestas desumanas
Ela é como a Hidra, mas afinal tem um número
Finito de cabeças; enquanto elas espalham fogo
Fiquemos abrigados; quando ele se esgotar
O seu grande corpo mole será impotente
Ela tem a astúcia de pôr uns contra os outros
Agora, o jogo está tão à vista, ninguém cai
Quando dá uma dentada, morde sua cauda
Esbraceja no ar como um abutre despenado
Grita impropérios e obscenidades
Enquanto martiriza incontáveis inocentes
Mas o veneno espalha-se no próprio corpo
E abafa, na Besta, os pulmões e o coração
Que em breve seja o seu momento final
A esperança e o alívio dos justos
33/ ARQUEOLOGIA
Recolha de 3 poemas de 1987 a 2016 ,
ATUALIZADA EM 2023
1- A Revolta dos Anjos
- Quem somos nós? Quem sou eu, quem és tu?
Somos instantes perdidos na imensidão do tempo
Somos transitórios como a carne
Somos menos estáveis que um grão de areia
Somos somente um elo duma cadeia que se estende desde um ser vivo primitivo…
… Somos tudo isso e temos vaidade em reclamar a imortalidade!
- Segui estrada fora… conheço-lhe os prazeres e os perigos…
… Toda a verdadeira caminhada é solitária
Que este pensamento não sofra contestação
… Bem louco seria aquele que emprestasse os pés, em vez das botas!
2- Quando…
… Todas as profecias se gastaram no vão desejo do amanhã
… As bocas se calaram no súbito ruir da noite em tom de incêndio
… As fontes secaram fechando as gargantas sedentas de cristal
… A Terra foi a enterrar no espaço sideral
3- Tudo…
… Nasce, cresce e morre;
Se transforma,
Se vai escoando, se vai esvaindo
Se vai crescendo, se vai desenvolvendo
Se vai… …
… E tu, pra onde vais?
Tu, alma desvalida
Feres onde, vida?
Vives onde, ferida?
Do chão até às nuvens
Clamam vidas
Em seus quatro sentidos
Na água também,
Que é túmulo e fonte de Ti,
- Ó Vida!
....
4- O depois...
Quando a Terra inteira foi a enterrar
Eu lá estava, transformado em poeira
De estrelas, olhando com meus irmãos
O Sol nuclear que se alevantou
Tudo iluminou de luz glauca
Cegando quem olhava de longe
Quando todas as profecias se cumpriram
Restou uma nuvem de pó denso, tóxico
Na Terra outrora transbordante de vida
Agora, enorme rochedo, imensa esfera
No vazio circula incansavelmente
Em torno do Sol indiferente
Mais estéril que a própria Morte
Dizem que o Universo
É feito de infinitos paralelos
Podem ter razão; mas cada um
Vai divergir do outro:
Se houver «outros eus»
Não serão «eu mesmo»
Se houver outros viventes
Não serão deste Mundo
Porque o aqui e agora
É o que me interessa
Neste oceano de vida
Eu nado e respiro
Como todas as outras
Vidas, assim percorro
O meu percurso.
5- Uma Simples Prece
Ó Vida: salva-te
E salva-nos
Da loucura
Dos humanos!
32/ O SOL
Ele não bate à janela
Introduz-se no quarto,
Sem cerimónias
Visitante não convidado
Não furtivo, pelo contrário,
O atrevido ilumina tudo
Com seus raios dourados
Muda cenários sombrios
E mesmo a melancolia
É sacudida pela luz irisada
Que suavemente escoa
Dos vidros reflexivos.
Ao Sol, a matéria sublima-se
Transmuta-se e explode
Em cores triunfantes
Anulando as sombras
E os pesadelos
Da minha mente.
31/ REFÚGIO PRECISA-SE
Perante a desrazão, a fúria destruidora
Tem de haver algo que contrarie a insanidade
Um antídoto contra a estupidez e crueldade
Um refúgio que acolha sem preconceito
Todas as almas doridas, seja qual for sua origem
Seja qual for seu pensamento, religioso ou não
Um abrigo que não questione a nação, a etnia
De cada pessoa que aí chegue e nele se recolha
Eu veria este lugar como um santuário de paz
Talvez situado em vários locais no Mundo
Não seriam somente físicos, tais refúgios
Mas locais de espiritualidade aberta
Apelo a quem tenha vocação verdadeira
Para ajudar na cura dos seus semelhantes
Não sei se já existem locais assim, mas sei
Que há urgência em construir estes refúgios
30/ AS PALAVRAS
A palavra ciciada ao ouvido do amor nascente
A palavra gutural num soluço de ódio demente
A palavra altaneira, de vazio cheia como vento
A palavra medida, calculando pelo sustento
A palavra jocosa, saída de lábio sorridente
A palavra erudita, que revela o ignorante
A palavra bolsada com raiva e desespero
A palavra mão estendida em franca amizade
A palavra cozinhada com subtil tempero
A palavra esquecida em provecta idade
As palavras são tão diversas como as gentes
Traiçoeiras ou puras, radiosas ou cinzentas
Quem só sabe palavras, da vida pouco sabe
Viver, não é lição escolar que se aprenda
29/ CÉUS DE OUTONO
Quando o frio e as primeiras chuvas
Esvaziam os locais de veraneio
Quando os matizes de cinzento
Se desfraldam nos céus
É nessa ocasião que passeio
A minha melancolia
Contando as gaivotas
Que na praia se aquecem
Os céus sempre mutáveis
Exibem o portentoso fresco
Que nenhuma mão humana
Pode representar com pincéis
E cores numa imensa tela
Quando o Sol se põe
Iluminam-se breves os flocos
D' algodão das nuvens,
Espetáculo grandiloquente
Onde os azuis e os roxos,
Os rosa e os laranja
Se casam em apoteose
Serena e lânguida
Em breve, o pano de veludo
polvilhado de luzes
Recobre o oceano e as falésias
Cenário dum novo drama
E a noite entra em cena
28/ VIAGEM CÓSMICA
O nosso rio da Lua serpenteia por um céu de estrelas
Não existe limite no firmamento só escuridão vibrante
Em nossos corações pequeninos estão encerrados universos
Pelo caminho de prata vogamos em silêncio
Recolhidos perante o mar cintilante aos nossos pés
Afinal somos estrelas, não somos só daqui
Viajamos em espaços vibrantes e sensuais
O vazio não existe, a nossa vida é eterna
Posso morrer num certo sentido, mas estarei
Em constelações e galáxias, num espaço-tempo
Insuspeitado. Olho o céu estrelado
Na noite, respiro o perfume
Das fragrâncias oceânicas
Num silêncio só entrecortado
Pelo murmúrio das vagas
Eternidade do momento que me possui
Sinto-me unido a Ti
Tranquilo como criança por nascer
No ventre de sua Mãe
27/ SE O POEMA FOSSE CONFISSÃO
Se o poema fosse confissão
Falsa seria. Seria pose, artifício
Porém, num certo sentido
Confessa o que a mente
Ignora
Reflexo e sombra, é o poema
Sopro sussurrado ao ouvido
Do poeta
Eu não tenho a vaidade
De ser o autor do vento
Da chama, da música
Ouvida ou sonhada.
Produzo um balbuciar
Olhando espantado
O maravilhamento
Deste Mundo
E confesso embaraçado
Que -afinal- os ditos versos
Propriamente de meu
Têm pouco, ou nada.
26/ RENUNCIEI A LER O REAL
Renunciei a ler o real com as lentes deformantes dos media
Mas leio todos os dias o meu jornal feito de pássaros e de formigas
Nos jardins e nas ruas do meu bairro
Renunciei a compreender os humanos como entes racionais
Mais racional é a onda no mar, ou o trovão no céu
Renunciei a encontrar as razões dos políticos
Como, de qualquer maneira, são sempre discursos
Para enganar o eleitor, nada se pode extrair deles
Mas, um animal não finge, nem esconde
Só exprime o que sente; como a criança pequena
Afinal, não renunciei a ler o real, devo autocorrigir
Porque o real é isso mesmo que leio; as produções
Dos humanos são apenas poluição de que nunca se fala
Muito perniciosa: a poluição mental
Ela a todos enjaula, tritura e embrutece
Só se mantêm livres os poetas, uns tipos estranhos
Mas, afinal sábios, prudentes, humanistas
[Eu a ninguém aconselho: quem quiser que escolha
Não despreze este escrito, pois pode ter mais sumo
Do que parece, à primeira vista.]
25/ DEIXAR O PASSADO MORRER?
Há quem diga, «deixa o passado morrer»
Mas, este estribilho não tem sentido
Além de afundar mais e mais a pessoa
Numa perplexa e obscura ignorância
Eu digo, «somos todos feitos do nosso passado»
Ele habita connosco e assim será até morrermos
Mesmo depois da nossa morte,
Venha lá o que vier, o passado não se apaga.
Permanece neste mundo como
Entalhe ou relevo do real
Esquecer o passado é como
Apagar a tua personalidade
Eu gosto do passado, porque ele
Tem a ver comigo e com os meus
Os falecidos também vivem em mim
Sem eles, o que seria eu?
Compreendo que não se deva ficar
Agarrado ao passado, cismando
Por aquilo que não pode voltar
Mas não devemos recalcá-lo
O relegar as memórias
Para um poço sem fundo
É um exercício violento
Destruidor da psique
Mais sensato é pegar nas recordações
Boas e más, conversar com elas
Dar-lhes espaço para respirarem
Transmutando os momentos
Maus, em lições de vida
E os momentos bons, em alegria
Recorrente.
Nunca sigas falsos sábios, feirantes,
Chupadores de sangue, que nos querem
Transformar em zombies e nos dominar
Busca sabedoria nos grandes sábios do passado,
Nos verdadeiros valores do presente...
E ouve o teu coração:
Ele te dirá, melhor que ninguém,
O que deves fazer e como ...
Murtal, Parede (24-06-2023)
24/ POESIA
E na Primavera tudo mudou
Tudo se tornou mudo
Bruma e silêncio
Outonal
Aqui ouvimos
Vozes de cantares
Jovens risonhos
Caminham
Ignoram o que acontece
Longe dos seus olhares
A vida floresce
Ao Sol dourado
Porque vens então
Angustiar-nos
Com teu
Agourento verso?
-Deixa, amor
Eles nunca aprenderão:
Que o fruto suculento
Guarda o pior veneno
Substância imaterial
No âmago da Inocência mesma
Se infiltra e corrompe...
E
chama-se
Indiferença
23/ História de fantasmas
Acordei no País dos sonhos
Percorri léguas e léguas de caminhos esconsos
Ou de amplas autoestradas
Para me encontrar frente a um espelho
Num palácio abandonado
Este espelho é a porta de entrada
Dos que permaneceram no limbo
Para o tal Reino, onde sonhar
Significa a Vida e viver
Só representa a necessidade
Contingente da jornada
O sócio desta sociedade
Ultra secreta não precisa
De senha ou sinal para
Reconhecer seus pares
Caminhando ou vogando
Por rios serenos entre sedas
Ondeantes ao vento
- Mas a morte, a morte que nos espera
E sempre nos alcança?
Onde pára ela?
- Ela caminha ao nosso lado
Sem receio. Nós sabemos
Que ela é Rainha
E não a repudiamos
Viver em sonho e caminhar
Por suas veredas é distinção
De poetas. Eles comunicam
Fraternamente a seus pares
As rotas que tomaram,
As paisagens por onde passaram,
As histórias que ouviram
Para eles, dizer a verdade não custa
As mentiras que possam dizer
Não o são para os outros irmãos
Todos descodificam fórmulas
Ou sortilégios, são línguas
Correntes, banais
Se alguma vez acordam
Precisam logo de retomar
A onírica estrada,
Seja por que meio for
A realidade do real é-lhes fatal
Definham, acorrentados
Às medíocres rotinas
São aves ou peixes
Embora aparentem pertencer
À espécie humana
Mergulham na profundeza
Dos mares, ou planam
Muitos metros acima do solo
Ou talvez sejam outra
Espécie em gestação
A que substituirá
Mulheres e homens
Comuns de hoje;
Não sabemos
No meio do ruído
Das multidões
Estão silenciosos
E quando poderosos
Pretendem prestar-lhes
Homenagem, erguem
Estátuas e monumentos
Mas não leem sua poesia.
22/ NAS TRINCHEIRAS,
UMA FLOR TEIMOSA NASCEU
Nas trincheiras, uma flor teimosa nasceu
Ela queria o que sempre fora terreno seu
Não podiam botas cardadas vencer seu vigor
Ela sobreviveu como semente ao rigor
O Inverno aqui é a estação dormente
A Primavera é quando germina a semente
Haverá uma fecunda descendência
Que em paz encontra a resistência
Que podem os canhões obliterar?
Querem a Natureza dominar?
- Só homens loucos fazem a guerra
Há só uma Terra, só uma raça humana
Vencedores ou vencidos, acabam por morrer !
Mas as humildes flores, de todas as cores
Em festivo triunfo, erguem ao Sol
Doador da Vida, o fruto de seus amores!
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Páscoa, 9 de Abril de 2023
21/HOJE, QUERO-TE FALAR
... ao som de «Deve ser Amor» do álbum Recorded in Rio de Janeiro Herbie Mann , João Gilberto, António Carlos Jobim
Hoje quero-te falar
Da nostalgia do tempo
Do tempo que não vivi
E que ressinto
Como se fosse este
O tempo certo
Para me espairecer
Nada poderá fazer
Aquele que persegue
O tempo sem descanso
Eu prefiro ficar
No doce remanso
Apreciando aquele
Charme indefinido
Que se desprende
De uma canção
De uma foto
Duma recordação
Pudera eu voltar
Ao tempo antigo
E que faria?
Seria como pássaro
Fora do céu, ou peixe
Fora de água?
Tomaria logo
O jeito de falar e de ser
Nesse tempo doirado
Que não foi meu?
Há quem viva em sonho
Eu vivo em recordação
Tenho na arte
Mas a arte que me toca
O refúgio mais seguro
A barreira estanque
Contra a fealdade da vida
Outros terão as suas
E não lhes levo a mal
Mas eu gosto demais
Do passado, por opção
Não deixo de olhar
O presente, mas pouco
Só para ficar à tona
Só para não tropeçar
Só o passado que amo
Não se esfuma
Ele dá a batida
Certa do coração
20/ EVOCAÇÃO
Livre como o ventoAquele movimento
Ondulando e correndo
Pela praia até ao mar
Corpo espairecido
Em força e graça
Quebrando as ondas
De espuma branca
Lábios tremendo
Num rosto molhado
E um sorriso
Não ensaiado
Não pensámos então
Que abraços e beijos
Estavam na orla
Da nossa ilusão
Soubéssemos isso
E que jeito teria?
Tudo o que fomos
Seria varrido
Pelo vento insolente
Ao unir dor e prazer
No breve tempo
Que me prende
Do vento, não temo
Mais o seu uivar
Nem das ondas
Seu rouco bramido
Afinal vento e mar
Cantam-me ao ouvido
A mesma canção
Que tu escutavas
19/Pela Paz Agora
Não te esqueças nunca que Ele e somente Ele, possui o destino. Tudo o que os poderosos deste mundo conseguem fazer, é espalhar o sofrimento. Mas não podem destituir o Poder verdadeiro que reina sobre todos.
Não duvides se és crente numa religião, numa fé, seja ela qual for. Tens Deus como teu Senhor. Não te esqueças nunca da razão pela qual tu vieste ao mundo.
Foi a mesma pela qual todos os viventes aqui estão. Só Ele tem o poder da vida no Universo. É Ele que molda a vida e o próprio Universo, que são Deus.
Por isso, reza pela Paz que só existe se for de todos, só haverá paz quando as pessoas como tu tiverem a coragem de dizer que não há inimigo...
Que somos todos irmãos e irmãs e que qualquer guerra é sempre injusta, pois quem mais sofre são os inocentes, de um e doutro lado.
Face à guerra só há uma forma de se ser humano: É rejeitá-la com todo o coração. Se queres a paz, promove-a, não promovas a guerra.
Esta é promovida por quem não tem escrúpulos, nem sentimentos, nem obediência a Deus. Até mesmo os que falam como se fossem devotos. Os que sabem a verdade, que percam o medo!
Sem pretender culpabilizar uns ou outros, denunciai a guerra como o maior dos pecados, pois todos os restantes estão contidos naquele:
O pecado de desobedecer a Deus, à clara lei de Deus, que todos os povos aprenderam a respeitar através das suas religiões e, mesmo os não religiosos, respeitam quando se maravilham com a Natureza
Pois ela é divina, como tudo no Universo. Serão os humanos tão estúpidos, que deitem a perder milhões de anos de evolução e milhares de anos de civilizações e culturas de múltiplos povos?
A guerra sempre foi intolerável, mas especialmente agora, a guerra usando tecnologias sofisticadas que o génio e criatividade humanas deveriam ter reservado às invenções benéficas e não destrutivas.
Esta época é mais estúpida, mais cruel, mais imoral que todas as anteriores.
Seremos salvos desta catástrofe, por vontade de Deus, que abra o coração de todos os humanos.
Que os que têm poder, o usem sabiamente para espalhar profundo sentimento de repúdio contra a guerra
Pois quando os povos quiserem, ela virá, a Paz, quaisquer que sejam os obstáculos. Mas, os líderes espirituais têm o dever de a promover, por todos os meios, a Paz.
18/Versos senescentes
Acompanha-me a sorte, por mais escuro que seja o caminho
Tenho regressado ao que realmente importa a um homem
Já não jovem, nem com ilusão que o tomem por tal
Mas a sorte veio-me bater à porta e eu abri-lhe a porta
Serei discípulo dela até ao fim da vida (e mais não quero)
Só preciso de aperfeiçoar-me naquilo que seja possível
De tal forma, que essa sorte se mantenha a meu lado
Diria uma bênção, mas eu não sou presunçoso
Em todo o Universo, sou menor que uma molécula
Tenho também duração infinitesimal
Mas tenho sorte porque posso abraçar a certeza
Em todas as dimensões do espaço e tempo
E quando o faço, não com cálculos, nem instrumentos
Apenas a plenitude eterna do instante, apenas
O maravilhamento face ao Universo
- Como é possível esquecer o amor
de que todos somos feitos?
17/ODE À MÚSICA
A música sempre, eterna companheira
Nos momentos tristes ou alegres
Desta vida, o que nos vale és tu
Não sou de exclusivismos, todo o som
De qualidade me pode preencher
Me impressiona,
Mas tem que ter alma
Para envolver-me e seduzir-me
16/IDADE de SAPIÊNCIA
O azul do céu não me impede de sentir o fresco vento norte
A idade de prata e ouro é quando olhas o céu e vês
O voo da ave inscrito
A bruma matinal escorrendo pelo vale
A certeza de que a terra é redonda e que se entretém
Rodando sobre si própria
Indiferente às travessuras dos humanos
Não nos traz aquela vertigem!
A ti entrego este sonho cerrado
Sob as pálpebras fechadas
Abertas ao mundo interior
Aquele que conta e contém
Todo o universo numa gota
De bruma que se condensa
Essa gota uni em verso a ti
No ser sem tempo, que és
De tal domínio não há fuga
Mas também que fazer
Lá fora, remando entre estrelas?
Trazei-me a gota reflexiva
Das aves eu sempre serei
Adorador, sem asas coloridas
Extasiado pela sua sombra
Que me faz sentir invejoso
E depenado e descamado
Mas sempre maravilhado
Outrora dava importância
A outras aventuras
Mas a Terra é redonda e
Gira em torno do Sol:
Mau ano, bom ano
Sempre será uma certeza!
Murtal, Parede 17 Dezembro de 2022
15/QUERO SER ANIMAL
Sim, amanhã, a esperança
Sim, amanhã, a paz
Mas, hoje, tudo recoberto
Dum véu de tristeza
Todos olvidados do dever
A humanidade perdeu a bússola
Os humanos não têm cura
Esqueceram seu Deus,
Ou pior; por Ele se tomam!
Não quero mais ser humano:
Quero ser animal, só animal
Estar bem dentro do meu ser
Instinto seguro de animal
Me guie a cada passo
Quero perder toda a ilusão
De ser racional, alucinação
Mortífera do orgulho
Que enche o peito dos imbecis
Ser menino, não! Pois ele, afinal
É homem em potência,
Tem caprichos, tem birras
Homem-menino julga-se tudo
Permitido, não tem juízo
Ser animal é obedecer
À Natureza e esta, o que é
Senão o Seu Criador?
É obedecendo à Natureza
Que se cumpre o trilho
Tudo o mais são bazófias!
É filosofia de trazer por casa
É ser covarde e cruel
É ser humano no pior sentido
Ser animal é estar em harmonia
Consigo próprio, aceitar
A verdade eterna
De nossa incompletude
O animal vive no instante
O seu ser é eterno
Não se projeta no futuro
Felicidade, só assim possível!
14/RECADO ÀS GERAÇÕES FUTURAS,
SE AS HOUVER
Supondo que as palavras não morreram, o que é uma audaciosa aposta, eu sei, quero deixar um RECADO deste mundo, às gerações que vierem; se elas existirem!
Não quero fazer-lhe sermões de moral. Sei lá que vivências serão as dos humanos, quando num futuro distante, for estudado «o século XXI»?
O século em que a estupidez e ganância dos poderosos quase despoletou o Apocalipse nuclear?
Se as gerações futuras puderem ler este texto, significa que afinal não se chegou a esse ponto.
Creio que a lição a tirar pelas gerações futuras será: Como evitar armadilhas semelhantes?
- O meu recado é o seguinte:
Nunca deixem vossos problemas, as questões graves, em mãos alheias!
A perversidade de tal sistema - a delegação sistemática do poder a uma minoria - acaba por desembocar em guerra. Pois esta é a maneira de uns poucos se manterem no controlo, obrigando todos os outros a obedecer!
13/UM POEMA É SONHO
Um poema é sonho...
Não vás procurar racionalidade e lógica
Mas de facto o sonho tem um fio condutor
Esquece as quadras e as rimas
Escolhe a música que brota
Do interior das palavras
E as palavras que são música
E que fluem do peito e da alma
Canção aflorando na memória
Seja alegre ou nostálgica
Ela irrompe e arrasta-nos
Para terras nunca exploradas
Poeta, seja a música que te guie
E deixa para compêndios de filosofia
Os discursos racionais, demonstrativos
O que tem a demonstrar o cântico
Da ave, senão "olha; estou aqui!"
Assim seja o poema, belo e puro
Melodia natural como um rio!
12/FORASTEIRO À BEIRA MAR
Forasteiro à beira mar
Longe está meu pensamento
Outrora ensinou-me o vento
Outrora ensinou-me a amar
Indivíduos nos envaidecemos
Não nos ligamos jamais ao ser
Esquecidos de que irrompemos
Em Universo dum único Ser
Aos meus pés a maré vem
Mas não sou o rei da lenda
O horizonte mil sóis tem
Mil luas e uma legenda
Num tempo esquecido
Alguém olhou e adorou
O canto espairecido
Por cima das ondas soou
Basta um gesto, um olhar
De beleza o coração cheio
Pode na certeza se firmar
Do passado imenso veio
11/ BALADA DAS CONTRADIÇÕES*
Quem diz do branco cisne, que é corvo negro
É meu amigo, com enganos me defende
Diz todo o mal de mim, assim me elogia
Sensato parece quem procede com loucura
De todos bem acolhido, por todos escorraçado
Perto da fogueira treme de frio
Muito deseja o que mais despreza
Se faz elogios rasgados, com eles insulta
Quem nos trai, ao nosso lado se posiciona
De todos bem acolhido, por todos escorraçado
Quereis saber, cavaleiro, a verdade?
Ninguém diz o que pensa, todos mentem
É amarga lição que não se dispensa
Um grande favor que devemos agradecer
De todos bem acolhido, por todos escorraçado
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*Inspirado na «Ballade du Concours de Blois» de François Villon
10/ ALGURES...
Algures, sobre a Terra
Existe um povo feliz
Um povo que está em harmonia
Consigo próprio e com seu Criador
Que cuida do jardim da Natureza
Com a simplicidade de um filho
Que cuida de sua Mãe.
Seus filhos e filhas crescem livres
Não sabem o que é opressão
Palavra ausente do seu vocabulário
Suas canções recordam gestas
Do passado tumultuoso que viveram
Os antepassados. Mas, de resto,
Não têm memória duma guerra
Sabem o que é a paz, porém
Isto parece impossível
Aos velhacos e perversos indivíduos
Que tudo escarnecemos, destruímos
Deitamos um manto de mentiras
Sobre inúmeros crimes hediondos
Somos de tal modo estúpidos
Que não sabemos o que é melhor
Para nós, para o nosso futuro
Mas somos orgulhosos dum saber
O saber técnico, que nem dominamos
E se não acreditam no que digo
Não faz mal, nem me surpreende
Também não irei dar-vos pistas
Seria a forma de destruir o povo
De que vos falo.
É possível que existam mais como ele
Eu quero acreditar que formam
O núcleo a partir do qual a humanidade
Algum dia, noutro século, ou milénio
Regresse à sua vocação primeira
E cuide do paraíso terreal
Ter a custódia, não é a posse,
Não é a propriedade
Daquilo que é de todos
Não há dúvida que isso é assim
Pelas Leis da Natureza e pela Razão
Pelas quais se guiam, sábios,
Os povos sem história, os povos felizes.
8/UNIVERSAL PÁSCOA
Na sepultura jaz
Corpo em cristal encerrado
De todos escondido, ignorado
Por amnésicos sacerdotes
Está encerrado no seu tempo
Que é afinal o presente eterno
Não se move, não sente
Está presente em ausência
Irradia na escuridão total
Ergueram-lhe templos
Inventaram preces e laudas
Entoaram coros e hinos
Mas nada disso faz diferença
Nem sequer os homens bons
Saberão, pois são afinal
Todos falsamente sapientes
A conjunção orgânica
Da Natureza inteira
Cria o eterno presente
Em constante mutação
Fonte geratriz de vida
Ela não vem da razão
Mas a razão é reflexo
Dela; pálido reflexo
Sentimentos de soberba,
Orgulho, ou vaidade
São como vendas
Nos olhos, ilusões
Em recôndito sepulcro
Guarda, regista sempre
A sua imobilidade
É somente aparente
Amorosamente
Conduz a Natureza
A cumprir o destino
Que lhe foi incumbido
Através dela e no Todo
Sua obra vai brotando
É este o significado
Universal da Páscoa
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(Murtal, 16 de Abril, 2022)
7/AZUL É O CÉU, NADA MAIS
Azul é o céu, nada mais
Nada mais que o céu azul
E para além do céu?
Nada mais, só o azul do céu.
Este azul me oprime, de tão leve que se pousa
Este azul «pan-color», de cartaz publicitário
Tão real como uma pincelada num muro
Este azul é mais agressivo do que um céu de chumbo
Que as nuvens ameaçadoras que nos trazem granizo
Este azul é inderrotável é impossível compor com ele
Pode ser que alguns o achem belo, eu não vejo nele
Senão monotonia de azul.
Mas aceito o seu veredicto, não vou argumentar
Saberei fazer como se ele não existisse
Como se por cima da minha cabeça
Não houvesse nada, absolutamente
Apenas existir sem pensar
Apenas estar sem impor
Apenas olhar sem ajuizar
Somente o céu azul me
Incomoda, bem sei porquê
Estou condicionado pela sua presença
Mas assumo ser diferente ou indiferente
Enfim, gostava de olhar a terra do céu
É isso que eu não farei tão cedo
Exilado no solo, como ave
Vendo suas irmãs voarem
Muito alto pra horizontes
De calor e abundância
Bandos de aves sem dono
As que riscam o azul do céu
Em volta do globo terrestre
Como eu gostaria de ser
Assim, o azul do céu
Não seria para mim
senão um meio de viajar
Uma autoestrada sem fim
Jogo também, complexo jogo
De orientação, de saber
Ancestral das rotas
E uma aventura inscrita
Na memória da espécie.
Ah, então eu poderia contar
As formigas humanas que
Olhavam para o nosso bando
Quando ele sobrevoava arrozais,
Ou prados, vilas ou lugares.
Já nem me lembraria muito bem
O que é ser um humano
Seria como uma memória vaga
Sonho ou pesadelo que passa
Com um batimento da asa
E talvez, nesse corpo novo
O céu se engalanasse
Num esplendor de tons vermelhos
-doirados, enquanto atravessava
O oceano, rumo ao paraíso das aves.
6/MEDITAÇÕES DE UM SOLITÁRIO
Estou certo de que existe esse inconsciente de que a psicanálise fala. Parece-me ser a emanação espontânea das pulsões, que todos experimentamos em nossas vidas. Freud hipertrofiou as pulsões sexuais, talvez devido ao seu próprio psiquismo e ao dos seus pacientes. As pulsões dominantes, porém, relacionam-se com o medo da morte, da perda da integridade física, com a conservação do indivíduo e da sua subsistência. No meio social afluente de Viena do início do século XX, as pessoas não se sentiam particularmente ameaçadas, na sua integridade física e na sua subsistência.
A histeria social desencadeia-se de modo semiautomático quando estão reunidas certas condições: A imaturidade, em indivíduos de ambos os sexos, na idade adulta, que foram condicionados a achar que tudo lhes é devido, sem terem de contribuir, de uma ou outra forma, para a sociedade. A ausência de referentes positivos, no que toca ao comportamento. Os referentes, são somente pessoas que enriqueceram ou que se tornaram muito populares. Junte-se a isto, uma infantilização deliberada e constante da cidadania, conjugada com o falsear do debate na média, através de técnicas de manipulação. Os elementos referidos acima, estão na base de 90% das formas de manipulação social das emoções.
As poucas pessoas que escaparam a essa "lobotomia social", seja qual for seu substrato ideológico, serão incapazes de ter uma influência regeneradora no seio da sociedade: Algumas adotarão um quixotismo que os impele a brigar dentro ou fora dos partidos tradicionais. Estas pessoas estão destinadas ou a serem relegadas para a marginalidade cívica, pelo chamado "assassinato de caráter ", ou - como alternativa - servirão como "idiotas úteis" de partidos.
Estamos a anos-luz dos regimes delineados nas constituições, dos vários países da Europa, embora tal não pareça: Pode-se ver tal degradação em países fortes ou fracos economicamente, grandes ou pequenos, com população culta ou inculta, homogénea ou plurinacional. Todos estamos perante o mesmo fenómeno, porque a difusão da falsa informação predomina, porque quem está no controlo os meios de informação não precisa de suprimir fisicamente os seus opositores, como nos regimes totalitários do passado. Basta que as suas vozes estejam sujeitas a blackout. Se isso não chegar, usam a difamação maciça nas redes sociais. Alternativamente, podem comprar vozes dissidentes, de maneira que aparentem continuar a sê-lo, mas sem causar real prejuízo.
O desfigurar dos sistemas de democracia liberal efetua-se por dentro. Seus sabotadores estão no seu centro. Conscientemente, ou não, fazem o papel de seus piores inimigos. Ao serem corruptos, ou transigirem com a corrupção, ao manterem-se graças ao clientelismo, ao comportarem-se como se fossem "monarcas de Direito Divino", em vez de assumir o papel de mandatários, etc.
Quando toda a política se degrada em politiquice, as pessoas íntegras, nos diversos quadrantes, afastam-se por si próprias, ou são arredadas. Os medíocres, os arrivistas, os oportunistas, os sociopatas têm então sua oportunidade de ouro, os seus momentos de glória.
Não se pode saber a forma exata da política no futuro. As classificações como fascismo, comunismo, democracia, nacionalismo, etc. não ajudam grande coisa. Sei que estamos num momento de viragem. Já o sentira há muito tempo, já o tenho exprimido várias vezes neste blogue. Porém, agora oprime-me pensar que as mais negras distopias são verosímeis.
Tudo o que há de mais abjeto vem à superfície, nestes tempos. A abjeção resulta do facto de que as pessoas estão completamente destituídas de valores, duma forma ou outra de moral. Devemos antes falar de ética, pois a moral invoca necessariamente conformidade com a sociedade. Ora, muitos - pensemos em Sócrates ou Jesus, e tantos outros no passado - foram considerados contrários à moral do seu tempo, ou à maneira de pensar dominante.
Perguntareis: Quem és tu para te fazeres difusor de sabedoria, duma visão profética, de soluções para os males que afligem a sociedade?
É uma pergunta legítima. «Eu sei que não sei» e que estamos, quase todos, num mesmo grau de ignorância. Mas, no meu entender, o estudar os fenómenos do passado, adotando um pluralismo deliberado, ou seja, não nos autolimitando a uma corrente de opinião, seja ela qual for, parece-me o melhor para não cairmos nas ilusões, nos cantos das sereias das ideologias.
O pior inimigo da nossa clarividência, do rigor do nosso pensar, somos nós próprios: Seria bom que as pessoas se debruçassem sobre o que dizem os mais eminentes intelectuais (que os há, sempre) do campo contrário ao nosso.
Acredito que os profetas da Bíblia e os outros, foram pessoas clarividentes, que tinham uma inteligência aguda do que se estava a passar nas suas sociedades e conseguiram chamar a atenção do seu povo.
Diz-se que não há bons profetas no seu próprio país; que os santos e os profetas são sempre de fora: Esta ideia tem por base um certo desprezo das pessoas, por tudo o que lhes seja demasiado familiar, não conseguindo distinguir valor, talento ou génio, em pessoas que estejam próximas. Será porque se desencadeia um mecanismo de inveja, a maior parte das vezes inconsciente e, portanto, mais forte?
Tudo o que vem do estrangeiro tem um certo fascínio, sobretudo se trouxer consigo a auréola do «sucesso». Isto passa-se a todos os níveis em Portugal, um país muito «aberto» ao exterior, mas muito pouco atento aos valores que brotam no seu seio. Mas, o contrário disto não é ter um comportamento xenófobo. Devia-se adotar uma avaliação crítica de uma produção, seja qual for a sua origem. Não faz sentido, nas letras, nas artes, nas ciências, haver «preferência nacional». Mas, também não faz sentido manterem os valores de um povo, de uma nação, injustamente ignorados, enaltecendo toda a bugiganga e fancaria que venha com o selo do estrangeiro.
5/ESCREVENDO PARA
UM DISTANTE FUTURO
Detesto que me ditem a moral, que imponham o que é bem ou mal!
Alguém que guarde a sua capacidade de pensamento independente, grande parte das mentiras que lhe chegam aos ouvidos, ou que lê, pode desmascará-las. Mas, para isso, é fundamental a aprendizagem do pensamento crítico, o estudo sério da filosofia, da história e muitos outros domínios do conhecimento. Com tais instrumentos intelectuais, uma pessoa dificilmente será sujeita a «lavagem ao cérebro». Esta reveste-se, muitas vezes, da forma de hipnose coletiva, como a que observamos na histeria do COVID e na histeria anti-russa.
Não devemos escolher qualquer um dos lados numa guerra. Ambos os lados têm culpas; sempre foi e será assim. É a guerra - em si mesma - que se deve ser impedida, contrariada. Numerosas pessoas, muitas delas contra a sua vontade, são envolvidas e instrumentalizadas pelas fações opostas.
Não transijo nem diminuo a humanidade dos outros: ponho-me no lugar dos soldados de ambos os lados: Matar e estar sujeito a morrer, por causa da gula de poder de uns e de outros; haverá destino que seja mais lamentável?
Agora sei qual o grau de alienação das pessoas. Pode-se dizer que cedem à pressão da constante propaganda de guerra. Mas, em muitos casos, o que observo é que se tornam veículos entusiastas dessa propaganda, esquecendo todas as suas supostas raízes liberais, humanistas, cristãs, etc. que afinal funcionavam como mera capa social.
Após o conflito, as pessoas que assumiram acriticamente as narrativas oficiais, vão autoabsolver-se com total hipocrisia, vão varrer para debaixo do tapete quaisquer incongruências entre as realidades e a ficção que construíram, ou que lhes foi inoculada pela media. É assim que constroem a sua boa-consciência.
A media foi designada como «o quarto poder», para significar que funcionava como contrapeso aos outros corpos do Estado (executivo, legislativo e judicial). De facto, ela transformou-se em corpo destinado a influir nos outros corpos, não no sentido de lhes contrapor uma hipotética «vox populi», mas como veículo do poder económico e sem o qual não seria fácil governar. A media está nas mãos de um punhado de bilionários ou de grandes empresas de capitais privados, mesmo nos países mais poderosos e com larga tradição de «democracia liberal». São os interesses concretos dos grandes capitalistas ou dos grupos económicos e financeiros que são preservados nas narrativas, cuidadosamente talhadas para moldar a opinião pública.
Eu escolho a «liberdade», diziam alguns. Mas, não existe liberdade, sequer. Agora, é mais que evidente que temos somente uma pseudo- liberdade, perante a mais monstruosa desigualdade. É isso que vemos atualmente. Alguns, têm o poder de moldar as opiniões, os sentimentos, a própria personalidade de milhões de indivíduos anónimos. Que a multidão de indivíduos tenha seu comportamento padronizado e conformista é o fim desejado por todo o aparato doutrinador: O governo e suas agências, a media mainstream (em mãos de magnates) e a escola, em todos os níveis de ensino, sendo mais perverso o ensino universitário e sua suposta «liberdade académica».
A minha náusea existencial resulta de constatar o facto de que as pessoas não evoluíram nada. São tão primárias e mesquinhas como nos séculos passados; talvez mais, até. Como roupagens que as vestem, as suas ideologias de pacotilha são mudadas ao sabor das conveniências. Não mudam por dentro, só superficialmente. Estas pessoas podem mudar facilmente de posições políticas, com única condição de que percebam que o vento mudou e que é mais favorável outra postura.
4/REGRESSO
Regresso ao conforto do porto de abrigo, depois de vaguear por serras e vales, no meio de vida selvagem, ou não domesticada, cheio de fervor pelo ambiente verdadeiro e real da biologia no seu esplendor, desde a árvore pujante e secular, à ave fugidia; desde o pequeno inseto, ao rochedo coberto de musgo.
Tudo resplandece de vida. Nada sai fora da Lei Natural da Palavra Divina, onde coelhos e perdizes espreitam entre ramas e tufos. Que se escondem de nós, intrusos. Eles, por instinto, nos sabem evitar.
Estou agora mais firme na convicção de deixar para trás a ilusão das coisas efémeras, objetos maravilhosos, mas de uso muito limitado no meio dos campos infinitos, ou das serras.
Mas, bem preciso de instinto e juízo seguro, na viagem exterior e interior, é disso que preciso, como Bússola, Canivete, Mapa em papel, Binóculos e Botas de caminhar. Talvez algo mais eu deva carregar, mas evitarei coisas inúteis, estéreis, demasiado frágeis, ou corruptíveis.
De que te serve aqui um relógio?
- SIM, PODEREI SER «MINIMALISTA»: QUANDO ENCHER A MOCHILA, QUERO QUE ELA SEJA O MAIS LEVE POSSÍVEL, PARA CONSERVAR A ENERGIA, PARA NÃO ME FATIGAR NOS PRIMEIROS QUILÓMETROS PERCORRIDOS.
Esta meditação vale também para as coisas do espírito. Temos muita bagagem na mente, mas pouca deveras essencial. A bugiganga mental, tal como a outra, impede-nos de movimentar o espírito com agilidade, é um estorvo: E julgamos ser ela uma parte indispensável do nosso pensamento!
Cada vez mais, quero pensar como o ser natural que sou, afinal de contas: Pensar com as moléculas do meu ser por inteiro, não com toneladas de lixo cinzento, que me foram impingidas e que eu comi, sem perceber.
Murtal, 19 de Fevereiro de 2022
3/ ELEGIA
Tu, que não morreste
Transporto por dentro
Teu secreto olhar
Por ele iluminado
Tu, sopro do vento
Sorris ao Sol fecundo
Às ondas deste mar
Se as olho, te vejo
A Natureza não esquece
Foi ela inteira em ti
Que resplandeceu
Alma que Deus tem
O Criador interrogo
Porque te deu vida
Porque cedo a colheu
Que sentido tem afinal
És o breve raio de luz
Que à Terra ilumina
Entre nuvens cinzentas
Tua vida não foi em vão
És a dádiva sem condição
Frutifica e dá semente
(Murtal, Parede, 29 de Janeiro 2022)
2/INVERNO
Assomam pássaros esbaforidos aos beirais das janelas
Ventos frescos varrem as nuvens e trazem perfumes agrestes
Tudo a renascer à minha volta no tempo certo da Primavera
Mas aqui o Inverno permanece, não me veio visitar, comigo mora.
Envolto em neve resplandecente abraça-me e seus frios lábios
Segredam amorosamente a cada instante da terna estação
- As memórias são teu vital sustento… o passado vive!
1/ IRRADIAÇÃO CÓSMICA
Sem princípio nem fim,
Sem fim nem princípio
Em frente de mim o infinito
Em mim a escura pedra
Da cabeça aos pés
A vida que teima
E vive em si e por si
Não importam as elucubrações
A energia que banha o meu ser
É a mesma que banha todos os seres
Desde os primórdios do Universo
Somos.
(Murtal, Parede 24-01-2022)
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