Muitas pessoas aceitam a situação de massacres de populações indefesas em Gaza e noutras paragens, porque foram condicionadas durante muito tempo a verem certos povos como "inimigos". Porém, as pessoas de qualquer povo estão sobretudo preocupadas com os seus afazeres quotidianos e , salvo tenham sido também sujeitas a campanhas de ódio pelos seus governos, não nutrem antagonismo por outro povo. Na verdade, os inimigos são as elites governantes e as detentoras das maiores riquezas de qualquer país. São elas que instigam os sentimentos de ódio através da média que controlam.
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sábado, 28 de outubro de 2023

«LEIS DO MERCADO»? EU DIGO-VOS O QUE SÃO.

 A hipocrisia dos intitulados políticos e economistas ocidentais, faz com que as pessoas vivam na doce ilusão de que as coisas estão a melhorar, globalmente. Há alguns «recuos», mas a exploração dos trabalhadores não é aquilo que era noutros tempos. A sério?!?


Em boa lógica, as pessoas - quase todas - vivem em estado de denegação. Pois a intensificação da exploração do trabalho e a depredação dos recursos ambientais, abrangem cada vez mais zonas do globo, são cada vez mais impiedosas para os povos indígenas e para o próprio sustento do ecossistema Terra. Esta é a verdadeira face da globalização.

Por exemplo, a quantidade enorme de gadgets que as pessoas adquirem, nas partes do mundo mais afluentes, têm  um tempo «de vida útil» muito curto. Cada vez mais curto (pensem nos computadores, nos smartphones, etc.) . Nestes gadgets de «high-tech» estão inseridos componentes minerais que são extraídos de inúmeros locais, mas quase todos eles situados no Terceiro Mundo. As chamadas «terras raras» são um bom exemplo. Na realidade, não são assim tão raras, pois o elemento mais raro deste grupo é mais abundante na crosta terrestre, que o ouro. Só que o ouro é explorado quando se encontra em veios, mas tal não acontece com as «terras raras». Para se concentrar o suficiente de um dado elemento pertencente a este grupo, é preciso extrair toneladas e toneladas de terra e de rocha, formando imensas escombreiras. O solo fica estéril durante muitos anos. O processo de concentração e refinação destes «metais raros» também é muito poluidor, criando-se enormes lagos envenenados contendo os subprodutos tóxicos destes processos. 


A China é o principal produtor de «Terras Raras»; porém não é por possuir concentrações favoráveis desses elementos, visto que eles estão mais ou menos dispersos - em concentrações semelhantes - por toda a crosta terrestre. Aquilo que é diferente, é que na China as «regulamentações ambientais» estão quase ausentes. Igualmente, as condições salariais e de higiene são deploráveis, mas as autoridades chinesas têm tudo sob controlo. As pessoas sensíveis aos direitos humanos e à ecologia (a maior parte, vivendo no conforto híper tecnológico) não se inquietam muito também com as zonas do interior da China e seus habitantes. 

O mesmo, ou pior, se passa com a exploração na República Democrática do Congo dos minérios estratégicos para a indústria eletrónica e componentes obrigatórias em qualquer bugiganga digital que utilizamos. A depredação da floresta tropical-equatorial e a transformação de crianças em escravos das minas, não é dos séculos passados, é de agora!

Sem esquecer  a louca corrida para explorar todo e qualquer depósito de Lítio (incluindo na Serra da Estrela, um Parque Natural de primeira importância no centro-norte de Portugal), para alimentar a indústria automóvel EV, para consumo (e paz de espírito) dos cidadãos dos países ocidentais: Estes são ricos, ecologistas, preocupados com questões sociais, mas só dentro do perímetro das suas sociedades e das paisagens abrangidas pela sua visão estreita!  

Então, a questão do mercado resume-se aos termos seguintes:

- Os mercados hoje são internacionais, globalizados, numa escala sem precedentes.

- O que é consumido pelos países afluentes (Norte América, Europa Ocidental, Austrália) em termos agrícolas mas, sobretudo, industriais vem - na sua grande maioria- de países do Terceiro Mundo

- As razões principais disto são: a enorme discrepância salarial, da ordem de dez vezes menos nos países pobres em relação aos ricos. A total ausência ou o não cumprimento de normas de proteção do ambiente e depredação constante dos recursos.

- Além disso, as multinacionais que exploram os recursos minerais nesses países, têm capacidade para corromper e/ou vergar a vontade dos governos locais. Estes, preferem fechar os olhos, a terem uma perda de rendimentos sob forma de «royalties» e também perderem muitos postos de trabalho, caso as multinacionais saiam. 

- Portanto, os mercados de matérias-primas e do trabalho não são de todo «livres», pelo menos no sentido comum do termo. Seria um mercado livre, se um comprador e um vendedor (quer em termos individuais, quer coletivos) têm ambos uma certa capacidade de negociação e o preço (quer de mercadorias, quer da mão-de-obra) é o resultante dessa negociação. 

- Os recursos da minoria da população mundial que beneficia desta situação, são fruto da superexploração do trabalho no Terceiro Mundo;  da completa rapina e destruição de recursos naturais dessas partes do Globo.

Uma análise económica honesta dos custos globais, deveria ter em conta os factos evidentes que eu mencionei acima. Mas, a narrativa dos economistas contemporâneos é quase toda uma enorme falácia, para adormecer as consciências. Digo isto, porque sei que eles sabem: os economistas ocidentais sabem perfeitamente os factos acima apontados.

Não há leis do mercado, no sentido de «Leis da Física», ou de outra ciência exata, ou natural. A «lei» do mercado é somente a imposição violenta da exploração.



quinta-feira, 12 de outubro de 2023

CRÓNICA (Nº17) DA IIIª GUERRA MUNDIAL: QUALQUER QUE SEJA O SEU RESULTADO ...

 ... NO IMEDIATO, O SISTEMA ECONÓMICO E FINANCEIRO MUNDIAL irá sofrer um grande abalo; o «Cisne Negro» tão falado. 

Embora a situação estivesse a ser incubada desde há alguns anos, com a deriva direitista e fundamentalista do governo de Israel, «punindo» os árabes, fazendo incursões constantes na esplanada das mesquitas, em Jerusalém, incluindo no interior da mais importante, a mesquita de Al-Aqsa

O propósito dos sionistas é (desde o princípio da proclamação do Estado de Israel e mesmo antes) expulsar o máximo de árabes, de forma a que o território da Palestina seja exclusivamente povoado por judeus. Este é o seu objetivo declarado. Porém, o mundo árabe está cada vez mais saturado da arrogância do Estado de Israel e compreende que as nações árabes estão em vantagem, se houver unidade entre elas. Mas, quanto às consequências desta guerra, qualquer que seja o seu desfecho, sempre trágico para as vítimas civis palestinianas e israelitas, estas são totalmente previsíveis:

- Uma subida do preço internacional do petróleo

- O acentuar da fratura do mundo em dois blocos assimétricos: o chamado Ocidente, ainda com a maioria do capital financeiro, mas com uma minoria populacional; e os países do Sul, cada vez mais próximos dos BRICS e do eixo Moscovo-Pequim- Teerão    

          

- Um acentuar da inflação alimentar, sobretudo no Terceiro Mundo, e sua maior dependência das exportações de cereais da Rússia. Um aprofundar das relações recíprocas dos países dos BRICS+ e dos países candidatos, ou com boas relações com aqueles.

- A venda, em maior quantidade, de bonds do Tesouro dos EUA, que funcionam como a forma habitual de armazenamento dos dólares, pelos diversos países (a chamada de-dolarização). Estes bonds acabam por ser adquiridos pelo próprio Tesouro dos EUA e/ou pelo Banco central, a Fed, chegando-se rapidamente a uma situação como no Japão; o banco central japonês é o único comprador de bonds do governo. 

A inflação também vai ser maior nos EUA (e restantes países da OTAN). A capacidade dos EUA exportarem a inflação, como o fizeram até agora, vai estar diminuída.

- Vai haver aceleração das trocas comerciais entre países, não usando o dólar. Até agora estavam estes intercâmbios limitados aos países dos BRICS e a outros, sujeitos a sanções brutais pelos EUA. Agora, vai haver muito mais trocas comerciais usando as divisas dos países respetivos e os défices na balança de transações serão compensados por transferências de ouro.

- A crise será mundial e múltipla (económica, financeira, monetária, política e social): Nenhum país ou conjunto de países, sairá vencedor. No entanto, os países que têm algo de sólido a oferecer, como matérias-primas ou produtos industriais, vão sofrer relativamente menos do que os que se financeirizaram, ao longo dos últimos 30 a 40 anos. Estes (EUA, Europa ocidental) já não são viáveis sem a drenagem constante de energia, matérias-primas e força de trabalho dos países do Terceiro Mundo. 

-Se não houver escalada nesta guerra,  que desembocaria fatalmente no uso de armamento nuclear numa fase ou noutra da mesma, o Mundo irá transitar para nova configuração geopolítica, a multipolaridade, o que não significa igualdade entre as nações, mas abre a possibilidade dos mais fracos jogarem com várias hipóteses de alianças.


terça-feira, 3 de outubro de 2023

PORTUGAL, «O TERCEIRO MUNDO DA EUROPA»

Portugal é um país totalmente dependente. A sua estrutura produtiva é cada vez mais estreita, não conseguindo autossuficiência sequer em termos alimentares, apesar das excelentes condições naturais para a agricultura

Portugal, após alguns laivos de políticas desenvolvimentistas nos anos imediatos pós-25 de Abril de 74, teve uma sucessão de governos conformados com a divisão internacional do trabalho, favorável aos grandes potentados. 

Bairro da Serafina em 1970, arredores de Lisboa (foto do arquivo de José Pacheco Pereira )

 Bairro de lata «Pedreira dos Húngaros» em Algés, perto de Lisboa



Casa em ruína (Portugal); uma imagem frequente tanto em ambientes urbanos, como rurais

O alinhamento total e incondicional com a Europa da UE e, em termos geoestratégicos, com a OTAN (dominada pelos EUA) é tido, pelos políticos do sistema e empresários, como uma necessidade e um bem. Pensam egoisticamente que, estando Portugal subordinado às grandes potências capitalistas,  isso lhes traz - a eles, do sistema - a garantia de tranquilidade no plano social, eliminando quaisquer hipóteses de agitação sócio-laboral ou surpresas eleitorais, como a subida ao poder de governos de Esquerda. Por outro lado, este tem sido o papel tradicional da «burguesia compradora». No presente, este papel traduz-se em investir apenas no sector terciário, o turismo sobretudo, com hipertrofia da economia parasitária e especulativa. 


Isto é bem visível com o nível atingido pela especulação imobiliária. Neste sector, após a transitória paralisia causada pelos confinamentos da pandemia do Covid, há cerca de dois anos atrás, tem havido mais do que um «boom»: É uma «fúria do imobiliário», com construção desenfreada de condomínios de luxo, em especial nas zonas litorais mais caras, cobiçadas por estrangeiros endinheirados. Ao mesmo tempo, verifica-se uma carência aguda de casas a preço abordável, até mesmo para a classe média. Hoje,  a maioria das pessoas não aufere rendimentos suficientes para comprar uma casa a crédito. Ficam afastados da compra de casa, porque o seu nível de ordenado não chega para obter o necessário crédito bancário. 

A planificação urbana, os PDM (Planos Diretores Municipais), ficaram «na gaveta». Não há qualquer restrição verdadeira, quer relativa a sobrecarga de construção, quer para canalizar investimento para habitação social. Hoje em dia, tornou-se banal, que seja ignorada e violada impunemente legislação ambiental, em particular, aquela visando a proteção da paisagem e ambiente natural. Este desprezo do ambiente resulta - sem dúvida - da corrupção ativa, exercida por interesses empresariais. Os candidatos, nas campanhas eleitorais, arvoram-se em «defensores ambientais intransigentes». Mas os autarcas e outros políticos, depois de eleitos, têm uma tendência curiosa para esquecer, quando se trata de aprovar os projetos de novos edifícios, quando estão em jogo chorudos capitais.  

A corrupção atingiu os que estão  ou ambicionam estar no poder. Isto inclui uma esquerda que gostava de arvorar sua suposta superioridade moral. Agora, já não é «esquerda de causas», mas a «esquerda que causa nojo». O restante da esquerda é insuficiente para catalisar a mudança. Além disso, esta tem sido incapaz de avaliar corretamente a situação em que se encontra e tem-se deixado dividir por querelas internas, alimentadas por rancores do passado. 

Por todos estes motivos, Portugal é «o porto seguro» dos capitalistas e capitais exteriores. Eles estão tranquilos, com o atual governo de Portugal e com as forças políticas com representação parlamentar. Também são favorecidos pela falta de preparação dos militantes sindicais catapultados para os cargos de direção nos sindicatos.

Assim, pode ler-se, em artigos dos jornais de negócios dirigidos à classe empresarial dos países mais ricos (Norte da Europa, América do Norte, e outros), que Portugal é realmente competitivo em relação a muitos outros países do Terceiro Mundo, não apenas pela estabilidade política, como também pelo baixo preço da sua mão-de-obra e pelas condições que o governo oferece aos investidores estrangeiros. Na realidade, não existe regulamentação restritiva, na prática, ao investimento estrangeiro. Neste país, também a exportação de capitais e dos lucros gerados não sofre qualquer limitação, de facto.    

Enfim, Portugal é o paraíso com que sonham os capitalistas mundiais. Discretamente, os oligarcas do Brasil, da China, da França, do Reino Unido e de muitos outros países, decidiram investir em Portugal. Não foi, certamente, por amor às gentes e à sua cultura!

De facto, não conheço nenhum outro país que discrimine os nacionaiscomo este o faz. Os mais competentes portugueses têm sido preteridos para agradar aos estrangeiros. Uma razão para isso (não tem que ver com hospitalidade ou abertura) é os burocratas parasitas e  corruptos aproveitarem-se da inexperiência de estrangeiros recém-chegados.

Portugal inaugurou a política oficial, no governo de direita de Passos Coelho, de exportação de cérebros. Em geral, são portugueses jovens, com qualificações elevadas, que não conseguiam encontrar aqui lugar compatível com sua formação e expectativas, porque estes lugares estariam «ocupados». Isto acontece, tanto em instituições de investigação e universidades, como em empresas ou quaisquer outras instituições, desde que elas beneficiem da «proteção» do poder político. O volume de exportação dos quadros técnicos e científicos não parou de crescer. Por alturas do referido governo de Passos Coelho, haveria cerca de 50 mil cientistas com doutoramento ou grau mais elevado, permanentemente no estrangeiro, ou seja, residindo e trabalhando nesses países e não tendo intenção de regressar a Portugal, a não ser em férias. Eles formaram-se totalmente, ou em grande parte, aqui, com a participação económica e o esforço de suas famílias, comunidades e Estado português. Isto corresponde a desbaratar o mais precioso potencial de um país, o potencial humano. Estes jovens foram fornecer trabalho valioso às empresas e instituições estrangeiras, que reconhecem suas elevadas qualificações. Esta exportação de «massa cinzenta» orquestrada pelos órgãos superiores do Estado português, significa que parte dos indivíduos com maior capacidade e potencial criativo, não irão contribuir para o desenvolvimento do seu próprio país. Não foi por escolha deles, não é por desígnio próprio, mas porque foram mantidos fora dos empregos, depois de formados. Foram atirados para o estrangeiro... pois aqui (supostamente) não teriam lugar!   

As crises que assolam o Mundo também são ressentidas em Portugal. É difícil um pequeno país fazer frente às dificuldades originadas no exterior. Mas, se as dificuldades  aqui sentidas, tivessem apenas aquela origem exterior, como nos querem fazer crer, haveria razões para guardar alguma esperança. 

Mas, no caso português, é diferente: Os que ocupam, por turnos, as poltronas do poder, especializaram-se em aproveitar-se sempre, quer em tempos de crise ou de bonança. Eles estão em «altos cargos» a espremer o povo. Igualmente dilapidam - sem nenhuma preocupação - o património histórico e a natureza. Assim, vendem este território ao «metro quadrado»: os pedaços mais apetecíveis, quer para fins habitacionais, agrícolas ou industriais, vão parar aos que façam a maior oferta, normalmente estrangeiros.  

Para garantir o negócio, os governos de turno são vigilantes e céleres em usar meios de repressão sobre movimentos sociais que eles não controlem. Eles também exercem permanente e massiva influência sobre as mentes, através dos meios de comunicação, em grande parte possuídos ou participados pelo Estado. Assim, garantem que o povo se mantenha ignorante e possa ser explorado pelos muito ricos, estrangeiros ou nacionais.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

EFEITOS PERVERSOS DA SUBIDA DO DÓLAR




Infelizmente para a economia americana e para as economias dos países ocidentais, um dólar «forte» não resulta de uma renovada capacidade produtiva, de um renascer da atividade industrial, como se poderia ingenuamente crer, se apenas nos restringíssemos a medir a força relativa do dólar, em relação a outras divisas dos restantes países ocidentais.

De facto, os EUA estão no meio de uma crise, que se traduz por cada vez menor influência geopolítica, com a deserção da Arábia Saudita e da OPEP do arranjo, que data de 1973 e que deu origem ao «petrodollar». Este está na base do dólar ter sido - nestes anos todos- considerado, por amigos ou inimigos, como moeda de reserva internacional, que todos deviam possuir, pois só com dólares se podia adquirir petróleo.

Porém, a enorme produção de dólares durante todo o período de 2008 até agora, só se tem vindo a acelerar. A recente inversão de tendência da FED é apenas aparente, pois o «Quantitative Tightening», (ou seja, limitação, não redução, do aumento da massa monetária), apenas tem um efeito psicológico. De facto, a FED continua a fazer, através de «swaps» com os grandes bancos sistémicos, operações que se traduzem num aumento do crédito disponível.

Mas, por que razão a FED se sente obrigada a continuar com o «Quantitive Easing» (ou seja, impressão monetária) pela porta do cavalo?

A FED e Jerome Powell temem a possibilidade de congelamento do crédito, a grande ameaça da crise de 2008, que quase se transformou  em  rutura do sistema. Este congelamento ocorreu de novo em Setembro de 2019, com a subida dos juros para valores inéditos de 10%, do mercado «repo», ou seja, o crédito de curto prazo interbancário, antes - portanto - da epidemia do COVID. A partir de Setembro de 2019, a FED começou a fazer o papel de fornecedor de liquidez ao referido mercado «repo», sendo a crise do COVID aproveitada como pretexto para a FED despejar - de forma já não disfarçada - somas abismais nos bancos.

Quanto à subida das taxas de juro das obrigações, esta começou antes da FED e os outros bancos centrais do Ocidente decidirem uma subida das taxas de referência. Estas subidas oficiais foram avalizar aquilo que os mercados secundários já estavam a fazer. Portanto, não é por os presidentes dos Bancos Centrais declararem que vão subir as taxas de juros, que elas sobem. Passa-se o contrário, elas sobem primeiro nos mercados; os bancos centrais são obrigados a seguir a onda.

Com a subida das taxas de juros das obrigações, a situação tornou-se muito perigosa para os mercados financeiros, em particular, tendo em conta os montantes astronómicos de derivados, aos quais estão expostos os grandes bancos sistémicos, os fundos de pensões, as companhias de seguros e o negócio das hipotecas. O Banco de Pagamentos Internacionais (o banco central dos bancos centrais, com sede em Basileia) calcula que existiam, em Junho de 2021, o equivalente de 8.8 triliões de dólares investidos em derivados pelas entidades acima citadas. Destes instrumentos derivados, os mais comuns e que mobilizam maiores somas mundialmente, estão adossados a índices de taxas de juros. A subida rápida destas taxas de juros pode despoletar a venda em cascata e/ou situações de incumprimento. Como as instituições financeiras, bancos e outros, estão muito alavancados, é fatal que vários entrem em falência. Warren Buffet, há muitos anos, dizia que os derivados são «armas financeiras de destruição massiva».


O dólar forte é causador da aceleração da insolvabilidade duma economia ocidental largamente dolarizada. Basta pensar-se na imensa quantidade de dólares emitidos pelos bancos internacionais (não-EUA) e que circulam no sistema financeiro mundial. São impropriamente chamados «euro-dólares» pois, na realidade, são dólares emprestados, ou emitidos por entidades algures no mundo (não apenas na Europa!), fora dos EUA. No momento presente, em todo o mundo, as trocas comerciais e as transações financeiras são em mais de 60%, feitas usando dólares. Isto significa que muitos governos têm de comprar dólares no mercado internacional para poderem pagar prestações e juros das dívidas contraídas em dólares. Isto é particularmente verdadeiro para países frágeis do Terceiro Mundo. Nos mercados, a subida do dólar tem um efeito depressor das exportações dos EUA, enfraquecendo o débil tecido industrial dos EUA. O facto de muitas mercadorias serem importadas pelos EUA, com preços mais baixos, poderá ter um efeito no curto prazo, mascarando perante os eleitores o falhanço da política económica do governo Biden. Porém, creio que, mesmo esse efeito, vai ser anulado pelas ruturas de stocks, pelo aumento da inflação e pelo crescimento do desemprego. De qualquer maneira, a visão politiqueira a curto prazo, tanto em políticas económicas como em geoestratégia, têm sido uma característica da presente administração.

A política de manter um dólar alto tem efeito dramático em países como o Japão, acelerando a sua monetização da dívida e sobretudo obrigando-o a colocar à venda as «Treasuries» americanas, mas para poder fazer face a um custo acrescido (em dólares) das importações. Quando vemos isso em relação a uma economia ainda muito forte, embora também altamente endividada, faz-nos lembrar as economias da Europa, em particular de Portugal, que estão muito endividadas também e que têm uma estrutura produtiva bem mais frágil.

A política económica americana tem sido impiedosa para com os seus aliados, quer estes sejam da Europa Continental, quer do Reino Unido, quer do Japão. Como os poderes dos EUA dispõem do instrumento dólar, usam-no como arma de guerra. São eles que estão a cavar a fossa do seu próprio poderio. Isso não deveria surpreender um estudante da História. Os impérios, em geral, falham pelas medidas que tomam, relativamente a seus súbditos ou vassalos. Não são submersos por uma vaga de invasões de outros poderes, senão quando já estão internamente muito fracos, incapazes de manter o funcionamento do sistema. É exatamente o que estamos a viver agora.




ALGUMAS CITAÇÕES RELATIVAS AO TEMA:

Rising interest rates are also a sea-change for derivatives, and particularly for the banks exposed to them. Interest rates swaps, of which the Bank for International Settlements reckoned there were $8.8 trillion equivalent in June 2021, have been deployed by pension funds, insurance companies, hedge funds and banks lending fixed-rate mortgages. They are turning out to be a financial instrument of mass destruction.

https://www.goldmoney.com/research/banking-crisis-the-great-unwind




As the USD rises in strength on the back of Powell’s impossible Volcker-revival and tangled derivatives, other Dollar-desperate nations from Argentina to Japan find themselves with not enough Greenbacks to pay their debts or settle trades, wires and oil purchases, which thus forces them to print (i.e., debase) more of their local currencies to make USD-denominated payments.

But Japan takes the cake for debasing its own currency all on its own, as no nation has ever loved a money printer and currency-debaser more.

This might explain why Japan is leading the charge in dumping its USTs into the FOREX markets, which only adds more pressure to rising yields and hence rising rates.

Thanks Kuroda—just one more central banker with a mouse-clicker gone mad… Perhaps he’ll be next in line for a Nobel Prize?

But Japan is not alone, as other nations dump the once sacred UST just to keep their currencies afloat…

https://goldswitzerland.com/how-an-illiquid-dollar-ruins-the-world/





"... Rates rising have absolutely frozen the real estate market. If you own a property, who is going to buy it? Rates have gone from 3.25% to more than 7%. I am on the record that once we saw a 3% yield on the 10-Year Treasury, you would start to see a tightness in credit. Now, we are over 4%. What few people are talking about is what has this already done to the derivatives market?

...Think about how big the derivatives market is. Total credit worldwide is $350 trillion, but you have derivatives pushing $2 quadrillion. I have said this all along, derivatives will blow up. Warren Buffett has called them financial weapons of mass destruction. They are far bigger than central banks can fix.”

Holter goes on to say, “The real economy runs on credit. Everything you look at, everything you touch and everything you do every day has many uses of credit to get to the final product or situation..."


" So, once credit freezes up, it’s completely game over. In a past interview, I said they are pulling the plug. They have to pull the plug because, mathematically, the debt cannot be paid. The derivatives cannot perform. So, they have to pull the plug. They also have to do one other thing, and that is they have to kick the table over. What will the false flag event be? I have no idea...

They have to kick the table over so they can say our policies were working, but whatever this event will be stopped them.”



[...]
Equally important are the global ripple effects of the US Fed’s increasingly desperate and distorted actions. The strong USD policies intentionally and currently used by the Powell Fed have had a crippling and destabilizing impact on global currencies, from developed to developing, as the rest of the world has been forced to import US inflation and debase their own currencies to settle trillions in imposed USD transactions. In short, as the USD rises, the rest of the world’s currencies (and hence economies), friend and foe alike, are forced to suffer. As Matthew quips: “With financial and political allies like the U.S., who needs enemies?”



quinta-feira, 22 de setembro de 2022

COLAPSO PROGRAMADO

A maior parte das pessoas concebe o governo do seu país e suas instituições públicas como dedicando-se ao bem público, a fazerem os possíveis para manter a economia em funcionamento, protegendo os cidadãos - tanto quanto possível - das tempestades vindas do exterior. Esta visão ingénua é que permite aos governos fazer suas manobras contra os interesses da generalidade das pessoas, em favor de uma pequena minoria. Esta pequena minoria não está sentada à roda de uma mesa, a congeminar criminosas conjuras, para extrair o máximo de vantagens dos seus respetivos países, causando a desgraça dos seus cidadãos. Não, esta pequena minoria de multimilionários tem as mãos «limpas» na aparência, pode até dar-se ao luxo de se apresentar com a cara da filantropia. Na realidade, ela tem os seus mais fieis servidores na classe política, mais precisamente, naqueles indivíduos desta casta, que não têm nenhum limite para satisfazer a sua ambição de «subir» aos postos de poder. São sociopatas, que apenas disfarçam com habilidosas mentiras, o papel que desempenham. Esta simulação é indispensável para justamente poderem levar a cabo esse papel de que estão incumbidos.




Aquilo que os mais poderosos bancos centrais têm estado a fazer, coordenadamente, também é conducente a um colapso. A impressão (eletrónica) non-stop de divisas, para suprir as situações criadas pelos governos, é um exemplo nítido. Estão a fazer em simultâneo, aquilo que seria contraditório, em teoria, com a impressão monetária (fator inflacionário): A subida das taxas de juro, pelos bancos centrais (efeito deflacionário) vai provocar a contração brutal da economia real. Esta, já tinha sido muito afetada pelos «lockdown» e pelas outras restrições aquando da «pandemia do século» e, logo de seguida, pela guerra Russo-Ucraniana. Como sabemos, esta foi instigada e alimentada com um fluxo constante de armamentos para a Ucrânia. Na realidade, para irem parar em 90%, ao mercado negro, sendo o seu destino final mais provável, os grupos terroristas internacionais. Mas a «generosidade» do Ocidente não se limita ao envio de armamento. Tem enviado biliões e biliões de dólares e de euros que - numa grande parte - vão parar às contas no estrangeiro de Zelensky e dos neonazis do seu governo e de  plutocratas como Kolomoyskyi. Este «apoio» à Ucrânia, é como despejar o dinheiro dos nossos países ocidentais «na sargeta», e eles - os «nossos» governantes - sabem-no melhor que ninguém.
Como classificar, senão como assassinato premeditado, o que o governo alemão e outros governos ocidentais têm feito, em relação à energia dos seus próprios países? Eis o facto ocultado aos cidadãos (a verdade é a primeira baixa de uma guerra): Não foi Putin que decidiu cortar o fornecimento de gás aos seus clientes ocidentais. Foram os próprios a inviabilizar a continuidade do envio de gás pelos gasodutos, recusando fazer a manutenção e reparação dos aparelhos de bombeamento, como estava contratualmente fixado. Além disso, é absurdo pensar que os russos desejassem interromper o fornecimento de combustíveis à Europa ocidental, dado que continuaram a fornecer gás, até há bem pouco tempo: Se fosse essa a intenção do governo russo, teria logo cortado o gás, em Fevereiro ou Março deste ano, como retorsão às sanções selvagens feitas pelos países da NATO contra a Rússia. Só uma propaganda desenfreada da media pode ter afirmado o oposto. Com efeito, não foi a Europa Ocidental que decretou um embargo a toda a importação de energia da Rússia??
E, quanto a fertilizantes químicos, a situação é trágica e grotesca: Grande parte dos fertilizantes químicos usados no Ocidente, é importada da Rússia. Quanto ao fertilizante fabricado localmente, é feito a partir do gás natural russo. O corte drástico (pelas sanções da UE) da importação de fertilizante, conduz à baixa drástica da fertilidade dos solos. Vai cair-se numa situação análoga à do Sri Lanka*, em países ditos «mais desenvolvidos». Estes mesmos, acabaram por ficar com mais de 90% dos cereais, provenientes da Ucrânia e destinados, em princípio, a evitar situações de carência alimentar em África e noutras partes do Terceiro Mundo. Lembremos que, para desobstruir a exportação de cereais ucranianos, houve uma negociação, em que o Secretário-Geral da ONU, Guterres, desempenhou um papel de relevo.
Os multimilionários têm os seus homens e mulheres de mão, quer nos governos, quer em órgãos de «governança» internacional (Comissão Europeia, ONU, FMI, etc). Eles tiveram a surpresa de um cenário imprevisto, de resiliência da economia russa. Hoje, é claro que as sanções brutais contra ela, tiveram o efeito oposto.
Outros aspetos importantes da estratégia ocidental também foram um fiasco: a ausência do pretendido isolamento internacional da Rússia, a não caída da China na armadilha da ida de N. Pelosi a Taiwan, o acelerar da construção dos BRICS, da Organização de Segurança de Xangai, o fortalecimento dos laços russo-chinês, etc. Por fim, não se pode exagerar a importância da construção da nova moeda de reserva mundial, fazendo com que o mundo não esteja mais sujeito à hegemonia do dólar.
Perante este panorama, o Império tinha de reagir. Houve uma clara subida de tom e conteúdo agressivo nos discursos de Joe Biden, ameaçando a Rússia e a China. 
Também se conhece a conversa telefónica entre Scholz e Putin, em que o primeiro aconselhou o presidente russo a procurar a paz, devolvendo todos os territórios conquistados, não apenas os territórios do Donbass, as repúblicas autoproclamadas, como até mesmo a Crimeia, integrada na Federação Russa desde 2014 por referendo. «Aconselhar» isto a alguém que não tem nenhuma intenção de ceder neste ponto e que está - de facto - em condição de defender eficazmente esses territórios de população russófona, pode ser interpretado como «fútil», ou como provocação. Poderá mesmo ter acelerado a decisão de efetuar referendos (para integração na Federação Russa) nas referidas regiões.
A situação tem piorado tanto, que estamos agora numa prática ausência de diálogo entre grandes potências. Esta situação é inédita, pois no tempo da URSS, houve sempre muita prudência, de parte a parte, para não quebrar o contacto, mesmo em situações de agravamento das tensões (por ex. : crise dos mísseis em Cuba).
Parece inegável que a maioria dos que votaram nos presidentes e governos dos países da NATO não deseja a guerra. Aliás, é provável que o mesmo se passe com muitos cidadãos russos. Então, porque motivo tudo conduz à continuação da guerra? Porque razão há clara ameaça dela se intensificar, se alargar e se tornar nuclear?
- Não acredito que o «Estado Profundo» nos EUA, os grupos de neocons incrustados nos vários departamentos do governo e em agências como a CIA, sejam poderosos ao ponto de ditar a orientação da Administração Biden. Quanto muito, eles poderão exacerbar algo que é instilado da «retaguarda» pelos interesses corporativos (por ex.: indústrias de defesa e outras).
Provavelmente «think tanks» como a RAND (e outros) têm influenciado a Casa Branca a adotar uma estratégia para enfraquecer a UE. Do ponto de vista da hegemonia americana, a Europa representa uma «concorrente amiga»; caso continuasse a receber o gás e o petróleo russos baratos, poderia ultrapassar economicamente os EUA. Ela também é vista como concorrente devido ao seu elevado nível tecnológico.
Ora, segundo a doutrina seguida nos últimos 30 anos (ver PNAC, Wolfovitz e Brzezinski ), os EUA não devem permitir que um poder fique ao nível de concorrer diretamente com o poderio americano, não só em termos militares, como de economia. Faz todo o sentido que a NATO, dominada pelos americanos, tenha forçado a rutura com os russos. Em finais de 2021 a diplomacia russa tentava negociar um arranjo que satisfizesse todas as partes. Este esforço diplomático foi completamente sabotado pelos EUA e por outros países da NATO.
Assim, os europeus foram fazer mais uma guerra «por procuração» em benefício do Império americano, sendo os ucranianos a carne para canhão (no sentido literal). As populações da Europa ocidental foram sujeitas a uma campanha terrorista de condicionamento psicológico, o que permitiu às «elites» desencadear as medidas agressivas contra a Rússia e seus aliados, assim como o apoio sem restrições ao regime ultra-direitista de Zelensky. Isto permite-lhe, a esta «elite» governamental, impor uma austeridade inédita aos seus povos, não motivada pela necessidade, mas porque as sanções contra a Rússia, segundo eles, «irão, no longo prazo, ter efeito»!


A lógica profunda disto tudo, é que se está a acelerar a imposição da Nova Ordem Mundial, mas não a dos sonhos ingénuos da «globalização feliz». Será - como eu previ, desde Fevereiro passado - uma nova Guerra Fria: Os dois blocos irão repartir o Mundo (e a Europa será partida a meio) entre o eixo Euroasiático, aos quais se associarão certos países do Terceiro Mundo, enquanto o Eixo Atlântico (também envolvendo potências como Japão, Coreia do Sul, Austrália, Nova Zelândia), terá uma NATO alargada para lá da Europa e América do Norte.

PS1: Confirma-se plenamente o que eu escrevi no início de Agosto: «Os supostos erros destes últimos anos, acima referidos, não são erros, são estratégias para conduzir as populações a aceitarem passivamente a imposição da Nova Ordem Mundial. Este é um projeto de fundo das classes dominantes dos países «Ocidentais». »

PS2: Os empresários europeus estão já a pensar transferir as indústrias sediadas na UE para os EUA, devido à subida exponencial dos custos energéticos. Assim, a desindustrialização da Europa acentua-se e os EUA são de novo industrializados... Leia:


PS3: Desenganem-se os que pensam que o dólar está «forte» porque sobe relativamente a outras divisas (libra, euro, yen) ocidentais. Não será isso uma «vitória pírrica»? A descapitalização súbita nestes aliados dos EUA, vai provocar um agravamento da crise económica.  Neste mundo interconectado, a fragilidade num ponto, transmite-se instantaneamente aos outros. O próprio dólar, no médio/longo prazo,  tem-se desvalorizado muito em relação ao ouro: desvalorizou-se de 92%  desde que em 1971 Nixon retirou o dólar da relação fixa ao ouro, resultante dos acordos em BrettonWoods. 

PS4: Na Alemanha, os preços da lenha subiram, numa base anual, de 87%, enquanto o aumento geral dos preços foi de 7,9%:

PS5: Piepenburg defende que a FED irá destruir a economia mundial com a sua insistência nos aumentos da taxa de juros. Leia o porquê, neste artigo : https://goldswitzerland.com/the-feds-strong-usd-policy-a-recipe-for-systemic-implosion/

 
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* O Sri Lanka passou de país autossuficiente em géneros alimentares, a um estado de grave deficiência, porque o seu governo (corrupto) decidiu a conselho de «peritos» ocidentais passar sem transição para uma agricultura «biológica» (sem fertilizantes químicos). Resultado: Queda brutal da produtividade e fome, que resultou em revolta.

sábado, 27 de fevereiro de 2021

PARA ALÉM DO COLAPSO, A MUDANÇA TECTÓNICA

                              


         Desde o momento em que o sistema financeiro e económico entrou em roda livre, o colapso perfilava-se no horizonte.

Creio que, agora mesmo, estamos a vê-lo acontecer; ao dizer isto, eu não creio estar a ser um «profeta do Apocalipse».

Na minha vida, porém, já assisti A VÁRIAS MUDANÇAS DE PARADIGMAS e não das menores: 

- O abandono do sistema de Bretton Woods, com a retirada por Nixon, em 1971, da convertibilidade do dólar em ouro. 

- A introdução do petro-dólar, em 1973, negociada por Kissinger com o rei da Arábia Saudita e vigente até aos dias de hoje.

- A financeirização da economia nos países capitalistas afluentes, convertendo-os em economias de serviços, materialmente dependentes de países asiáticos (China, Indonésia, Paquistão, Vietname, Coreia do Sul, etc...) cujas economias se industrializaram e se tornaram grandes exportadoras.

- O colapso final e a desagregação da União Soviética e das suas repúblicas; seguida pela tentativa dos «conselheiros», provenientes de Wall Street, em colocar sob tutela o imenso território Euroasiático. 

- A ascensão e a consolidação de Putin e a restauração do poderio económico e militar da Rússia.

- O imenso sucesso da China com a adopção do capitalismo mais dinâmico de todo o planeta, embora conservando o férreo controlo do PCCh.

- O colapso do sistema financeiro baseado na dívida, em 2008, sendo as falências de Lehmann Brothers e de outros bancos, apenas epifenómenos. 

- O deitar pela borda fora das regras que balizavam a acção dos bancos centrais ocidentais, levando à criação monetária na origem da espiral inflacionista dos activos «em papel».

- A queda dos bancos centrais e governos ocidentais na sua própria armadilha, amarrados à política de insuflar as bolhas especulativas, para evitar um colapso imediato.

- Ao agirem assim, sacrificaram as moedas, ao ponto de estarem em risco de destruição, de perda total do seu valor. Porém, a sua substituição por uma moeda digital, emitida pelos bancos centrais, ou pelo FMI, não resolverá os problemas de fundo.

- Muito antes do «COVID», em Setembro de 2019, o sistema já dera sinais claros de disfunção terminal, com a FED a ter de intervir para sustentar o mercado «repo» (empréstimos inter-bancários, para superar limitações temporárias de liquidez).

- Enquanto a economia do Ocidente está de rastos, paralisada devido aos confinamentos/«lockdowns», a pretexto de e não causados verdadeiramente pela pandemia, assiste-se à predação do grande capital sobre o médio e pequeno capital. Os lucros dos grandes conglomerados aumentaram vertiginosamente: Ocupam os nichos de mercado deixados vazios por pequenas e médias empresas, que estão falidas.

-  O sistema mundial está a evoluir para um «duopólio»: o Bloco Atlântico e o Bloco Eurasiático. As consequências desta partição binária mundial são globais e de longo prazo. 

- Até o sistema mundial - com os aspectos geoestratégico, financeiro, produtivo, comercial - atingir novo equilíbrio, mesmo que somente meta-estável, o Mundo vai sofrer uma série de convulsões, crises e revoltas. Suas vítimas principais vão ser os povos: sobretudo, povos do Terceiro Mundo, os que menos têm; os que menos usufruíram da sociedade de consumo.

- Nos países afluentes - com o empobrecimento das classes médias - progridem as correntes fascizantes, capazes de tomar o poder eleitoralmente, ou - pelo menos - de exercer pressão sobre os partidos de direita e de centro «clássicos», que adoptam políticas xenófobas e muitos outros pontos do programa da extrema-direita, sem o reconhecerem abertamente.

- Apesar de tudo o que descrevi acima, o colapso em curso não deverá ser visto como um Apocalipse, o Dia do Juízo Final, a catástrofe global, o fim da civilização, ou da própria espécie humana. 

- Não! Todas estas mudanças são mais semelhantes a fenómenos geológicos: serão análogas aos movimentos tectónicos, com as configurações dos continentes a mudarem e em que novas oportunidades se abrem, ao mesmo tempo que se encerram episódios da História da Terra e das espécies.

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

A VERDADEIRA LIÇÃO DO TITANIC E O FALSO «GRANDE RESET»

                             
Charles Hugh Smith é um autor prolixo, tendo editado vários livros sobre matérias económicas e relacionadas, além do excelente blog «OF TWO MINDS». O presente escrito tem como ponto de partida o notável artigo: The Titanic Analogy

No entanto, não irei aqui repetir os argumentos do autor acima citado, convidando os leitores a lerem o original, porque o meu objectivo é de por em evidência a futilidade das «medidas» que têm sido tomadas no campo das políticas monetárias, ao nível global. 

Com efeito, o «rearranjo das cadeiras no convés do Titanic, depois da colisão», analogia frequentemente usada para evidenciar a futilidade de certas medidas perante a avassaladora dimensão da crise que se está a abater - neste momento - sobre a economia mundial, é por demais apropriada, infelizmente.

Considere-se o facto das «elites» no poder (não apenas os governos, como bancos centrais, as organizações internacionais e regionais), nos quererem convencer que as medidas que estão implementando ou que preconizam vão ter uma real implicação no contexto de uma crise sistémica, como a presente.

Só para colocar em perspectiva a ilusão e futilidade das suas «medidas», consideremos a questão da digitalização das moedas (ou, pelo menos, as mais usadas para as transacções internacionais):

A digitalização vai resolver para eles - banqueiros e governos - o problema da «fuga» à visibilidade de transacções directas entre indivíduos. Ela ocorre, pelas razões mais diversas. Longe de ser veículo principal de transacções criminosas ou ilegais, a grande maioria das trocas em «papel-moeda» é do domínio da «economia informal». O canalizador que não entrega factura de uma reparação, se o cliente não a pede; o pequeno agricultor que vende à beira da estrada os seus legumes e frutas, etc. conseguem sobreviver, mas o seu negócio deixa de ser rentável no momento em que as transacções passam a ser digitais. 

Na realidade, esta economia dita informal é vital e será fortemente afectada, mormente nos países pobres, chamados do Terceiro Mundo, onde nem sequer existe cobertura de energia eléctrica em todo o território e onde nas cidades a quantidade de interrupções do fornecimento eléctrico inviabiliza o uso - na prática - de equipamento electrónico.

Ora, o «Grande Reset» que nos querem impingir, tem como medida emblemática a digitalização absoluta das divisas. Nas economias mais afluentes, calcula-se que mais de 70% das transacções são efectuadas sem utilização de dinheiro físico. Das quantidades totais transaccionadas, a parte da utilização de dinheiro físico tem diminuído nos últimos anos. Como medida indirecta desse fenómeno, pode-se observar a cada vez maior percentagem de comerciantes que aceitam cartões como pagamento, assim como a estagnação do número ou diminuição de caixas automáticas, para levantamento de dinheiro em notas. Portanto, o público está familiarizado com a digitalização do dinheiro, a sua utilização quotidiana mostra-o. 

Mas, a perversidade desta mudança reside noutro ponto...

Com efeito, têm sido feitos estudos, no FMI e noutras instâncias, sobre o efeito que teria a utilização de juros «muito» negativos (juros de -5 , -6 ou -7%) nas contas bancárias. 

Este princípio de cobrar juros aos depositantes, tem como razão primeira a impossibilidade da banca comercial ser rentável com a estrutura geral dos juros que tem sido levada a cabo. Os juros directores - que comandam os restantes juros - estão num ponto de quase zero. Nesta situação, é impossível os bancos comerciais obterem rentabilidade real de operações de empréstimo. Para colmatarem isso, os bancos têm feito uma política de cobrança de taxas, pelos mais diversos serviços; estas, são vistas pelo público como extorsão, pois as operações são hoje automáticas: na imensa maioria, não envolvem trabalho humano de qualquer espécie. 

Os bancos centrais querem empurrar as pessoas a consumir e não a fazer quaisquer poupanças. O «mantra» de que é preciso «estimular» a economia, para que ela tenha uns 2% de inflação anual, é a política decorrente de empréstimos, sem conta e medida, sem haver qualquer correspondência do lado dos bens e serviços produzidos. Devido a essa política, os Estados (as empresas e indivíduos também) estão metidos num ciclo vicioso. As economias do «mundo ocidental» estão cada vez mais enterradas em dívidas, que já são - em muitos casos - dívidas não cobráveis. Os Estados já estão na espiral descendente de terem de pedir mais e mais emprestado para cobrir os juros das dívidas que contraíram. Este comportamento insustentável verifica-se numa maioria dos países «ocidentais». 

O incentivo constante a gastar, a não poupar, tem efeitos nefastos, também, nas famílias: em certos países, uma grande parte não possui capacidade de acorrer a qualquer pequeno imprevisto. Um estudo recente indicava que 40% das famílias, nos EUA, não dispunha sequer de uma soma de 500 dólares em caso de imprevisto. Mas, na economia dos países também tem efeitos graves, pois é das poupanças acumuladas que se forma a massa de capital necessária para os empreendimentos, investimento produtivo e reprodutivo. Também aqui, a renúncia em estimular o comportamento de poupança das pessoas, por um lado e, por outro, o constante comportamento despesista por parte dos Estados, conduz inevitavelmente ao aumento de impostos. Estes são uma punção à economia real, é dinheiro quase todo usado em despesas e muito pouco em investimentos, que trariam aumento de riqueza.

Assim, com dinheiro digital a 100%, a economia real não vai sofrer nenhum impulso. Vai tornar-se imperioso gastar todo o dinheiro que se ganhou. A formação de poupança nas famílias não irá ocorrer. Não haverá dinheiro disponível para investimento. Entretanto os bancos ficarão aliviados, pois poderão impunemente fazer uma punção periódica nos salários e pensões, sem qualquer problema. Será exactamente tão fútil e perverso como a preocupação do comandante do Titanic, em impedir que a "ralé" da terceira classe se misturasse com os da primeira. 

O investimento produtivo, feito pelos Estados ou pelas empresas, esse sim, seria o caminho para se desfazer o ciclo vicioso. Seria o caminho da responsabilidade monetária, onde não houvesse possibilidade de traficar o valor do dinheiro. A inflação é a salvação dos governos, porque  ficam obrigados a pagar o mesmo, mas - de facto - essas quantias em dívida (e os próprios juros no caso de taxas fixas) vão sendo cada vez menos expressivas. Historicamente, demonstra-se que os governos, em situações de aperto, recorrem à impressão monetária. Mas, esta impressão não pode ocorrer, sem que seja muito óbvio o jogo, se houver um padrão ouro. Por isso, os governos não gostam dele. Porém, o padrão ouro funcionou muito bem internacionalmente e foi o garante da estabilidade monetária de 1815 (fim das guerras napoleónicas) até 1914 (rebentar da Iª Guerra Mundial), para falarmos apenas dos tempos mais recentes em que havia papel-moeda em circulação. Só a política económica e monetária keynesiana, que tem tido um papel hegemónico nos governos, nos bancos centrais e noutras instituições do mundo «ocidental», tem levado o sistema monetário e económico para este território de constante aumento descontrolado da massa monetária. 

Muitos dos problemas económicos actuais decorrem da visão neo-liberal, keynesiana, que tem dominado: desde o endividamento, a desorganização da produção, até à guerra monetária e comercial, com o risco real de guerra  física em larga escala.


PS1: O Guia para o Grande Reset de James Corbett fornece  muitas pistas para compreender o que se está a passar.