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terça-feira, 3 de outubro de 2023

PORTUGAL, «O TERCEIRO MUNDO DA EUROPA»

Portugal é um país totalmente dependente. A sua estrutura produtiva é cada vez mais estreita, não conseguindo autossuficiência sequer em termos alimentares, apesar das excelentes condições naturais para a agricultura

Portugal, após alguns laivos de políticas desenvolvimentistas nos anos imediatos pós-25 de Abril de 74, teve uma sucessão de governos conformados com a divisão internacional do trabalho, favorável aos grandes potentados. 

Bairro da Serafina em 1970, arredores de Lisboa (foto do arquivo de José Pacheco Pereira )

 Bairro de lata «Pedreira dos Húngaros» em Algés, perto de Lisboa



Casa em ruína (Portugal); uma imagem frequente tanto em ambientes urbanos, como rurais

O alinhamento total e incondicional com a Europa da UE e, em termos geoestratégicos, com a OTAN (dominada pelos EUA) é tido, pelos políticos do sistema e empresários, como uma necessidade e um bem. Pensam egoisticamente que, estando Portugal subordinado às grandes potências capitalistas,  isso lhes traz - a eles, do sistema - a garantia de tranquilidade no plano social, eliminando quaisquer hipóteses de agitação sócio-laboral ou surpresas eleitorais, como a subida ao poder de governos de Esquerda. Por outro lado, este tem sido o papel tradicional da «burguesia compradora». No presente, este papel traduz-se em investir apenas no sector terciário, o turismo sobretudo, com hipertrofia da economia parasitária e especulativa. 


Isto é bem visível com o nível atingido pela especulação imobiliária. Neste sector, após a transitória paralisia causada pelos confinamentos da pandemia do Covid, há cerca de dois anos atrás, tem havido mais do que um «boom»: É uma «fúria do imobiliário», com construção desenfreada de condomínios de luxo, em especial nas zonas litorais mais caras, cobiçadas por estrangeiros endinheirados. Ao mesmo tempo, verifica-se uma carência aguda de casas a preço abordável, até mesmo para a classe média. Hoje,  a maioria das pessoas não aufere rendimentos suficientes para comprar uma casa a crédito. Ficam afastados da compra de casa, porque o seu nível de ordenado não chega para obter o necessário crédito bancário. 

A planificação urbana, os PDM (Planos Diretores Municipais), ficaram «na gaveta». Não há qualquer restrição verdadeira, quer relativa a sobrecarga de construção, quer para canalizar investimento para habitação social. Hoje em dia, tornou-se banal, que seja ignorada e violada impunemente legislação ambiental, em particular, aquela visando a proteção da paisagem e ambiente natural. Este desprezo do ambiente resulta - sem dúvida - da corrupção ativa, exercida por interesses empresariais. Os candidatos, nas campanhas eleitorais, arvoram-se em «defensores ambientais intransigentes». Mas os autarcas e outros políticos, depois de eleitos, têm uma tendência curiosa para esquecer, quando se trata de aprovar os projetos de novos edifícios, quando estão em jogo chorudos capitais.  

A corrupção atingiu os que estão  ou ambicionam estar no poder. Isto inclui uma esquerda que gostava de arvorar sua suposta superioridade moral. Agora, já não é «esquerda de causas», mas a «esquerda que causa nojo». O restante da esquerda é insuficiente para catalisar a mudança. Além disso, esta tem sido incapaz de avaliar corretamente a situação em que se encontra e tem-se deixado dividir por querelas internas, alimentadas por rancores do passado. 

Por todos estes motivos, Portugal é «o porto seguro» dos capitalistas e capitais exteriores. Eles estão tranquilos, com o atual governo de Portugal e com as forças políticas com representação parlamentar. Também são favorecidos pela falta de preparação dos militantes sindicais catapultados para os cargos de direção nos sindicatos.

Assim, pode ler-se, em artigos dos jornais de negócios dirigidos à classe empresarial dos países mais ricos (Norte da Europa, América do Norte, e outros), que Portugal é realmente competitivo em relação a muitos outros países do Terceiro Mundo, não apenas pela estabilidade política, como também pelo baixo preço da sua mão-de-obra e pelas condições que o governo oferece aos investidores estrangeiros. Na realidade, não existe regulamentação restritiva, na prática, ao investimento estrangeiro. Neste país, também a exportação de capitais e dos lucros gerados não sofre qualquer limitação, de facto.    

Enfim, Portugal é o paraíso com que sonham os capitalistas mundiais. Discretamente, os oligarcas do Brasil, da China, da França, do Reino Unido e de muitos outros países, decidiram investir em Portugal. Não foi, certamente, por amor às gentes e à sua cultura!

De facto, não conheço nenhum outro país que discrimine os nacionaiscomo este o faz. Os mais competentes portugueses têm sido preteridos para agradar aos estrangeiros. Uma razão para isso (não tem que ver com hospitalidade ou abertura) é os burocratas parasitas e  corruptos aproveitarem-se da inexperiência de estrangeiros recém-chegados.

Portugal inaugurou a política oficial, no governo de direita de Passos Coelho, de exportação de cérebros. Em geral, são portugueses jovens, com qualificações elevadas, que não conseguiam encontrar aqui lugar compatível com sua formação e expectativas, porque estes lugares estariam «ocupados». Isto acontece, tanto em instituições de investigação e universidades, como em empresas ou quaisquer outras instituições, desde que elas beneficiem da «proteção» do poder político. O volume de exportação dos quadros técnicos e científicos não parou de crescer. Por alturas do referido governo de Passos Coelho, haveria cerca de 50 mil cientistas com doutoramento ou grau mais elevado, permanentemente no estrangeiro, ou seja, residindo e trabalhando nesses países e não tendo intenção de regressar a Portugal, a não ser em férias. Eles formaram-se totalmente, ou em grande parte, aqui, com a participação económica e o esforço de suas famílias, comunidades e Estado português. Isto corresponde a desbaratar o mais precioso potencial de um país, o potencial humano. Estes jovens foram fornecer trabalho valioso às empresas e instituições estrangeiras, que reconhecem suas elevadas qualificações. Esta exportação de «massa cinzenta» orquestrada pelos órgãos superiores do Estado português, significa que parte dos indivíduos com maior capacidade e potencial criativo, não irão contribuir para o desenvolvimento do seu próprio país. Não foi por escolha deles, não é por desígnio próprio, mas porque foram mantidos fora dos empregos, depois de formados. Foram atirados para o estrangeiro... pois aqui (supostamente) não teriam lugar!   

As crises que assolam o Mundo também são ressentidas em Portugal. É difícil um pequeno país fazer frente às dificuldades originadas no exterior. Mas, se as dificuldades  aqui sentidas, tivessem apenas aquela origem exterior, como nos querem fazer crer, haveria razões para guardar alguma esperança. 

Mas, no caso português, é diferente: Os que ocupam, por turnos, as poltronas do poder, especializaram-se em aproveitar-se sempre, quer em tempos de crise ou de bonança. Eles estão em «altos cargos» a espremer o povo. Igualmente dilapidam - sem nenhuma preocupação - o património histórico e a natureza. Assim, vendem este território ao «metro quadrado»: os pedaços mais apetecíveis, quer para fins habitacionais, agrícolas ou industriais, vão parar aos que façam a maior oferta, normalmente estrangeiros.  

Para garantir o negócio, os governos de turno são vigilantes e céleres em usar meios de repressão sobre movimentos sociais que eles não controlem. Eles também exercem permanente e massiva influência sobre as mentes, através dos meios de comunicação, em grande parte possuídos ou participados pelo Estado. Assim, garantem que o povo se mantenha ignorante e possa ser explorado pelos muito ricos, estrangeiros ou nacionais.

domingo, 12 de julho de 2020

UM PAÍS EM RUÍNA, À BEIRA-MAR PLANTADO...

                               São João do Estoril - Portugal

Quase todos os dias percorro a pé várias centenas de metros que separam minha casa do apeadeiro de S. Pedro do Estoril. 
No meu percurso, encontram-se três grandes propriedades em ruínas. São mansões, vastos espaços outrora ajardinados, que nada mais são hoje, do que espaços abandonados. 
Vivo nesta zona há mais de vinte anos, pelo que sei que há muitas décadas se perpetua o estado lamentável destas propriedades abandonadas. 
Quantas e quantas outras existem, na minha freguesia? No meu conselho? No meu distrito? No meu país? - Francamente, não sei! 
Mas tenho a certeza que a zona do Estoril, com grande proximidade à praia, à Av. Marginal, à estação de comboio e às zonas de comércio, sem dúvida, tem óptima localização. Mas os terrenos, com as tais ruínas, não estão à venda! 
Ou se estão, não constam em anúncios ou tabuletas indicando isso. Mesmo, quando outros prédios devolutos são postos à venda, são anunciados a preços de tal modo fora do razoável, que ninguém vai tentar comprá-los. Por outras palavras; são frequentes lotes de terreno ou imóveis, colocados formalmente no mercado, mas para os quais se pedem valores completamente fora dos parâmetros desse mesmo mercado. 
Portugal é um país muito lindo e muito belo. Também é muito apetecível para uma casta de parasitas, que vivem da especulação e se abrigam debaixo da manta larga da corrupção, do tráfico de influências, do favoritismo, como sabemos. Por exemplo, o livro «Corrupção» de Eduardo Dâmaso, ajuda-nos a perceber a extensão em Portugal do problema estrutural da corrupção, de que estou falando.
A especulação com terrenos e com imobiliário é um factor de severo atraso, mesmo dentro dos parâmetros mais estritos de uma economia de mercado, vulgo capitalismo! 
Nas sociedades capitalistas mais desenvolvidas não é permitido, dentro da malha urbana ou sub-urbana, mormente nas zonas ditas de «prestígio» social, que se eternizem ruínas monstruosas, inestéticas, perigosas em termos de segurança, até mesmo de saúde pública. 
Como é possível manter ou tolerar, décadas a fio, algo que não está a desempenhar um papel de utilidade como habitação, ou comércio, ou hotelaria, apenas desfeando uma zona, uma paisagem, um centro urbano, dando-lhe um aspecto de decadência. Poderia confundir-se certas zonas urbanas de Portugal como resultantes de guerra, como se tivessem sido bombardeadas!

As pessoas apenas se importam com a sua propriedade, com a sua vivenda, o seu jardim, o passeio em frente da porta ... tudo o resto, deixa-as indiferentes, ou não lhes ocorre que o entorno tenha incidência directa na sua qualidade de vida, no valor da sua propriedade. 
Esta indiferença patológica foi sempre um mistério para mim; tentei várias explicações:
- o atraso cultural, o facto de ser um povo excessivamente individualista, ou ainda um reflexo herdado dum longo regime fascista, em que as pessoas dissociavam a figura do Estado, a Coisa Pública, das suas próprias vidas... «O Estado são eles, nós temos a nossa vida e isso não nos diz respeito...» 
Uma certa tendência para a passividade, para o conformismo, ou mesmo fatalismo... Enfim, não posso explicar; é algo que está para além da minha compreensão. 
O que sei é que isto não existe noutras nações europeias ocidentais, com regimes - supostamente - idênticos, em termos de ordenamento jurídico geral. 
As forças políticas estão corrompidas e essa corrupção exprime-se pelo não exercício do poder, quando ele é requerido e necessário. Mas são capazes de exercê-lo, pelo contrário, de forma arbitrária e prepotente, impondo a sua vontade. Actuam como pequenos senhores feudais - pondo e dispondo - sem consideração pelos interesses dos munícipes, a não ser para aqueles que lhes subsidiam as campanhas eleitorais...
Parece incrível que as coisas se passem assim, mas um sintoma claro disso está bem à vista: basta ver os prédios, propriedades, edifícios que estão em ruína, no centro de cidades ou em zonas de grande interesse turístico, que, pela lógica capitalista, deveriam ser «postos a render».

A razão disto permaneceu obscura para mim, até que comecei a investigar mais a fundo.
- Muitas vezes, quando perguntava a alguém, recebia a explicação do «desentendimento entre herdeiros», como causa para tal ou tal palacete ou vivenda estar - há décadas - em ruína e ninguém comprar e reconstruir, ou fazer algo de novo nesse espaço. 
Isso são explicações que surgem como forma de não explicar nada. Não digo que pontualmente, não possa haver casos em que esteja - de facto - envolvida uma herança. Mas, uma propriedade mal gerida ou abandonada é-o na mesma, quer o título de propriedade esteja nas mãos de um só ou de vários!
- Não! Os verdadeiros motivos são outros:
Os municípios e o Estado têm o poder de expropriar qualquer bem ou propriedade, por utilidade pública. Neste conceito (nada revolucionário, amplamente usado no tempo de Salazar!), as propriedades abandonadas, em ruína, são obviamente expropriáveis porque são um prejuízo e um risco, a vários títulos: é frequente haver incêndios nestes locais, que se propagam; são insalubres, fonte de contaminações de bactérias, vírus e parasitas; muitas vezes, são usadas como «caixotes de lixo». Os vizinhos dessas ruínas estão a ser obviamente prejudicados de múltiplas maneiras.

- Quem lucra com este abandono? 
Em termos de oferta e procura, se houver uma diminuição do espaço disponível, se houver menos edifícios ou zonas edificáveis no mercado, as que estão, efectivamente, à venda vão aumentar de preço ou este irá manter-se alto, devido ao efeito de escassez artificial daí decorrente. Este efeito, será tanto mais acentuado, quanto a zona for mais cobiçada, como é o caso de zonas turísticas, ou de «prestígio».
Os bancos concederam empréstimos que, numa parte grande, consistem hoje em «malparados», ou «incobráveis»: estes empréstimos, feitos em períodos de expansão do crédito, foram muitas vezes garantidos com propriedades sobre-valorizadas. Este fenómeno é corrente, devido à corrupção existente dentro das próprias instituições bancárias. 
Se um imóvel, dado como garantia, fica nas mãos de uma instituição bancária, esta pode tentar vendê-lo. Mas os bancos - em si mesmos - não estão vocacionados para «negócios imobiliários». Então, criam ou têm participações em fundos imobiliários, com múltiplas propriedades. Destas, algumas estão à venda, outras apenas mantidas «em stock». Servem como reserva de valor, o que permite à entidade financeira fazer especulação. Note-se, estamos a falar de entidades financeiras. Os activos (imobiliários) detidos em carteira, permitem-lhes alavancar, ou seja, pedir emprestado somas equivalentes a várias vezes o valor que dão como garantia. Tais negócios são habituais, no sector bancário e no imobiliário empresarial. Assim funciona grande parte dos negócios, neste país.
Finalmente, os proprietários de terrenos, vivendas, andares ou prédios,  podem - aqui, nesta terra - tratar esse capital como se fosse uma «relíquia de família», um «objecto pessoal», uma forma de «investimento passivo»: sobretudo, porque não existe qualquer penalização - na prática - se uma propriedade for deixada ao abandono. As leis, elas  existem, mas não se aplicam ou, quando se aplicam, é numa dose mínima, que não se pode coadunar com a boa gestão urbana. 
É um complexo de causas que tem a ver com o atavismo do povo, por um lado e, por outro, com a cobardia e venalidade de agentes das Autarquias e do Estado. Isto envolve muita gente; há uma espécie de «conspiração do silêncio». Não querem ser eles a tomar a medida «desagradável» de expropriar, mesmo que a boa gestão dos espaços urbanos o imponha. 
Neste cantinho da Europa, as pessoas - em vez de se indignarem com o estado em que ficaram os centros das cidades e outras zonas mais prestigiadas, em vez de atribuir isso à corrupção reinante, à incompetência, ao compadrio, à criminalidade de colarinho branco -  aceitam facilmente este estado de coisas. 

Neste contexto actual de «pré-campanha» autárquica, não apelo ao voto, seja em quem for. Apelo - sim - a que os cidadãos se unam em associações de vizinhos, examinem os casos concretos de propriedades abandonadas, que existem em todos os municípios deste país, os tornem visíveis, publiquem, falem deles e exijam que os candidatos se pronunciem. O poder autárquico, seja ele qual for, deve actuar - dentro da lei - para restituir ao espaço urbano sua função e dignidade. 
Com efeito, deixar que se mantenham vivendas, palácios, prédios, terrenos ao abandono, não é «respeitar o direito sagrado à propriedade privada»; é permitir que se faça uso abusivo de um bem privado, mas que não deixa de ter uma componente social
Se somos proprietários de um andar, um prédio, uma moradia, etc., isso não acontece no meio dum deserto! Somos donos dessa propriedade num centro urbano ou rural, numa freguesia... Mas, as infraestruturas, os acessos, os serviços, a valorização dessa mesma propriedade, são resultantes de toda uma série de bens e serviços da colectividade
Os vizinhos têm o poder de accionar os tribunais, quando os proprietários ou a autarquia deixam ao abandono propriedades, visto que isso está a afectar directamente a sua qualidade de vida.  
Se esta causa fosse para a frente, haveria mais trabalho, sendo possível restituir a utilidade social das propriedades, mediante reconstrução ou restauro, para serem transformadas em habitação, hotelaria, comércio, ou edifícios culturais; em qualquer dos casos, iriam gerar riqueza na comunidade em que se inserem. 
Se houvesse esta mudança na percepção do público em geral, o próprio poder político central teria de responder. Não poderia deixar ficar as coisas como estão.
Enquanto o despertar não ocorrer, vai-se perpetuando o grotesco e triste espectáculo no país: 
                  um país em ruína, à beira-mar plantado... 

PS 1: Uma amiga minha enviou-me e decidi incluir a reportagem de Graça Henriques neste artigo, porque vem ilustrar ao pormenor tudo aquilo que eu referia no meu artigo, «Um País Em Ruína À Beira Mar Plantado»»: 


   

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

OS INCÊNDIOS FLORESTAIS DE GRANDES PROPORÇÕES: UMA FATALIDADE?

No fim de semana passado (6 e 7 de Outubro) no Parque Nacional de Sintra-Cascais , deflagrou um incêndio de grandes proporções. Não irei aqui especular sobre as causas próximas e se a origem do incêndio foi ou não criminosa. O facto de que na zona havia projectos de aproveitamento turístico, com investimentos já efectuados e aprovação (?) dos mesmos pelas autoridades camarárias - como foi relatado por alguma imprensa - será talvez um factor a considerar no inquérito da polícia judiciária. Porém, o meu objectivo é antes o de chamar a atenção para as causas profundas, por oposição às causas próximas.
O domínio florestal, mormente o que é propriedade do Estado ou das Autarquias, deveria ser um domínio que primasse pelo cumprimento das regras de boa gestão da floresta. Ainda por cima, havendo uma classificação de «parque nacional» associada a muitas destas áreas florestais estatais, é de todo indesculpável e criminoso, à luz da lei vigente, pois são criminosos os comportamentos de «deixa-andar», de não intervenção, muito antes das matas e florestas arderem. 


                                         [a- caminho pedestre, Sintra] 




                                     
                                        [b- zona ardida na Beira Interior]


                                    
[c - árvores autóctones, Mata do Buçaco]





Assim, o Estado e órgãos políticos estão directamente postos em causa, não por alguns «exaltados anarquistas», mas por eles mesmos, por manifesta e claramente violarem e ignorarem suas próprias leis! O Estado e órgãos políticos do mesmo, desde o governo central às autarquias, são efectivamente os responsáveis. Mas, não são os únicos: infelizmente, neste país a população ainda está a um nível de analfabetismo político muito primário, pois acaba por se satisfazer com «medidas» e promessas, solenemente anunciadas depois de cada fogo maior, que vão supostamente prevenir os fogos mas que, ou não são cumpridas, ou não têm real impacto ao nível da prevenção.

A hipocrisia consiste em atribuir exclusivamente a mãos de criminosos, a pirómanos, ou até ao desleixo de pessoas que deixaram uma fogueira mal apagada... a responsabilidade do que se passa. Não que seja falsa a existência desses casos; sabemos que eles existem, numa certa percentagem. 



Mas a responsabilidade de cuidar da floresta, de manter as matas limpas, de promover a renovação das espécies, aumentando a diversidade, reduzindo as áreas plantadas com eucalipto e pinheiro e aumentando as áreas com árvores folhosas autóctones, é colectiva: vai dos proprietários privados de terrenos florestais, das autarquias e do Estado central, aos cidadãos em geral, que deveriam exercer enorme pressão para que sejam realizados os trabalhos de manutenção e correcta gestão florestal. 
Do ponto de vista ecológico, evidentemente a questão é de primeira importância, mas também do ponto de vista económico: como emprego directo e indirecto, como fonte de matérias-primas importantes. Note-se que o eucalipto e o pinheiro são madeiras com pouco valor, o primeiro serve apenas para fabrico de pasta de papel e o segundo para carpintaria, sobretudo. 
Os terrenos plantados com estas espécies são maioritariamente deixados ao abandono, vê-se um crescimento de forma desordenada, tendo plantas com os mais variados tamanhos, não havendo espaçamento entre as várias árvores, nem recolha do restolho, nem corte e remoção do mato rasteiro, tudo isto formando uma enorme pira de combustão, pronta a incendiar-se quando as condições climáticas sejam favoráveis.  
Haveria, por isso, que desenvolver um programa de replantação com espécies autóctones, menos susceptíveis ao fogo, com maior valor comercial e conferindo maior diversidade ecológica.
Muito poderia ser transformado, com enormes vantagens. Mas a opção dos parasitas que nos governam é sempre de produzir «lindas e boas» palavras, mas fazer o menos possível! 
Porém, os investimentos estatais ou os incentivos fiscais, de crédito bonificado, etc. para que privados invistam seriamente na renovação da floresta portuguesa, poderiam ser uma enorme alavanca para o desenvolvimento do país. 
O turismo, que tanto é acarinhado, teria muito  a ganhar. Actualmente, os turistas típicos já não são do género de ficar nas praias, no litoral apenas, durante toda a sua estadia: gostam de fazer excursões no interior, de visitar lugares com beleza natural, de fazer caminhadas em floresta...

Não serei eu a inocentar os que ateiam fogos com objectivo criminoso, nem tão-pouco os que por desleixo deixam que fogos acidentais de grandes proporções se declarem... Mas, afinal de contas, existem outros criminosos, nos governos sucessivos, nas vereações camarárias, assim como em muitos gabinetes do aparelho estatal, que deveriam ser responsabilizados. 
A conivência com um crime é crime; a indiferença com que se trata o património de todos, crime é....e também a gestão danosa, ou fraudulenta, ou incompetente. 
Enquanto ficarem impunes estes crimes e sobretudo, enquanto a população não acordar da sua letargia  e não tomar em mãos a resolução dos seus problemas, vamos continuar a assistir a incêndios como o de Pedrógão Grande e do Pinhal de Leiria, em 2017, ou como em 2018, de Sintra-Cascais !!!



terça-feira, 31 de julho de 2018

RICARDO ROBLES: AO QUE TU CHEGASTE!

 A ganância é uma paixão humana, mas as pessoas com a postura pública de Ricardo Robles, não podem desculpar-se nisso, pois têm responsabilidade perante os seus eleitores e perante as muitas centenas de milhares de pessoas que têm sido desalojadas ou obrigadas a migrar para a periferia porque o negócio da locação turística e a especulação imobiliária tomaram conta da capital.
Robles não tinha o direito de fazer o que fez, não por ser ilegal, mas sim porque está em contradição flagrante com o programa e ideias defendidas pelo seu partido, o BE, para a Câmara de Lisboa. 
A direita pode usar o pretexto para atirar farpas e enlamear não apenas o  ex-vereador bloquista, não apenas o BE na sua direcção, como até fazer processos de intenção ao PCP que, neste caso, não tem absolutamente nada que ser envolvido. 
Mas com raiva e mesquinhez, certos plumitivos atiram-se, como «gato a bofe», maneira de dizer... a tudo o que «cheire a comunismo» e a «esquerda».

A tragédia do regime em deliquescência transcende em muito a figura deste vereador, lutando enquanto vereador por algo que ele próprio sabotava nos seus negócios privados. 
Poderia parecer o guião duma novela política, se não fosse a exacta realidade. Mas as figuras que circulam nos corredores alcatifados do poder, independentemente da sua ideologia, acabam por perder o senso comum, acabam por pensar que tudo lhes é permitido. Infelizmente, Robles não é o primeiro nem será -provavelmente - o último apanhado a fazer o contrário do que defende.

A democracia não pode ser um jogo verbal, em que as pessoas envolvidas não têm que dar «o corpo ao manifesto». Não podem fazer como cidadãos privados, o que condenam em termos públicos. 
Mas como isto está constantemente a acontecer, em maior ou menor escala, o sistema político acaba por ficar podre até à medula, corrompido de forma irreversível. 
A democracia não pode ser este regime partidocrático, em que uma «classe» se considera acima da lei, acima da própria moral. Lamento, mas não encontro, nem na esquerda, nem na direita, nem no centro... diferenças substanciais. 

O desafio para a cidadania é fazer uma democracia de participação, em que as pessoas eleitas o são, não porque foram escolhidas no interior de um colégio eleitoral interno aos partidos (no melhor dos casos), mas como MANDATÁRIOS, cujo desempenho do mandato é periodicamente posto à avaliação dos eleitores, não de  quatro em quatro anos, mas sim em reuniões presenciais e/ ou virtuais no mínimo, uma vez por trimestre. 
Este modelo de democracia funciona em pequena escala, há muito tempo, mas também foi ensaiado em escala muito maior, na grande cidade ou em províncias inteiras, envolvendo dezenas ou centenas de milhares de pessoas.
Mas o povo está apático, está descrente da democracia, sob qualquer forma. 
Irá, com certeza, acolher, mais dia menos dia, o próximo ditador... como sendo um salvador da pátria! 

- Os Ricardos Robles e companhia, que enxameiam a democracia pós 25 de Abril, podem-se orgulhar de terem participado na «inevitável ascensão» do novo Salazar!!!