No entanto, não irei aqui repetir os argumentos do autor acima citado, convidando os leitores a lerem o original, porque o meu objectivo é de por em evidência a futilidade das «medidas» que têm sido tomadas no campo das políticas monetárias, ao nível global.
Com efeito, o «rearranjo das cadeiras no convés do Titanic, depois da colisão», analogia frequentemente usada para evidenciar a futilidade de certas medidas perante a avassaladora dimensão da crise que se está a abater - neste momento - sobre a economia mundial, é por demais apropriada, infelizmente.
Considere-se o facto das «elites» no poder (não apenas os governos, como bancos centrais, as organizações internacionais e regionais), nos quererem convencer que as medidas que estão implementando ou que preconizam vão ter uma real implicação no contexto de uma crise sistémica, como a presente.
Só para colocar em perspectiva a ilusão e futilidade das suas «medidas», consideremos a questão da digitalização das moedas (ou, pelo menos, as mais usadas para as transacções internacionais):
A digitalização vai resolver para eles - banqueiros e governos - o problema da «fuga» à visibilidade de transacções directas entre indivíduos. Ela ocorre, pelas razões mais diversas. Longe de ser veículo principal de transacções criminosas ou ilegais, a grande maioria das trocas em «papel-moeda» é do domínio da «economia informal». O canalizador que não entrega factura de uma reparação, se o cliente não a pede; o pequeno agricultor que vende à beira da estrada os seus legumes e frutas, etc. conseguem sobreviver, mas o seu negócio deixa de ser rentável no momento em que as transacções passam a ser digitais.
Na realidade, esta economia dita informal é vital e será fortemente afectada, mormente nos países pobres, chamados do Terceiro Mundo, onde nem sequer existe cobertura de energia eléctrica em todo o território e onde nas cidades a quantidade de interrupções do fornecimento eléctrico inviabiliza o uso - na prática - de equipamento electrónico.
Ora, o «Grande Reset» que nos querem impingir, tem como medida emblemática a digitalização absoluta das divisas. Nas economias mais afluentes, calcula-se que mais de 70% das transacções são efectuadas sem utilização de dinheiro físico. Das quantidades totais transaccionadas, a parte da utilização de dinheiro físico tem diminuído nos últimos anos. Como medida indirecta desse fenómeno, pode-se observar a cada vez maior percentagem de comerciantes que aceitam cartões como pagamento, assim como a estagnação do número ou diminuição de caixas automáticas, para levantamento de dinheiro em notas. Portanto, o público está familiarizado com a digitalização do dinheiro, a sua utilização quotidiana mostra-o.
Mas, a perversidade desta mudança reside noutro ponto...
Com efeito, têm sido feitos estudos, no FMI e noutras instâncias, sobre o efeito que teria a utilização de juros «muito» negativos (juros de -5 , -6 ou -7%) nas contas bancárias.
Este princípio de cobrar juros aos depositantes, tem como razão primeira a impossibilidade da banca comercial ser rentável com a estrutura geral dos juros que tem sido levada a cabo. Os juros directores - que comandam os restantes juros - estão num ponto de quase zero. Nesta situação, é impossível os bancos comerciais obterem rentabilidade real de operações de empréstimo. Para colmatarem isso, os bancos têm feito uma política de cobrança de taxas, pelos mais diversos serviços; estas, são vistas pelo público como extorsão, pois as operações são hoje automáticas: na imensa maioria, não envolvem trabalho humano de qualquer espécie.
Os bancos centrais querem empurrar as pessoas a consumir e não a fazer quaisquer poupanças. O «mantra» de que é preciso «estimular» a economia, para que ela tenha uns 2% de inflação anual, é a política decorrente de empréstimos, sem conta e medida, sem haver qualquer correspondência do lado dos bens e serviços produzidos. Devido a essa política, os Estados (as empresas e indivíduos também) estão metidos num ciclo vicioso. As economias do «mundo ocidental» estão cada vez mais enterradas em dívidas, que já são - em muitos casos - dívidas não cobráveis. Os Estados já estão na espiral descendente de terem de pedir mais e mais emprestado para cobrir os juros das dívidas que contraíram. Este comportamento insustentável verifica-se numa maioria dos países «ocidentais».
O incentivo constante a gastar, a não poupar, tem efeitos nefastos, também, nas famílias: em certos países, uma grande parte não possui capacidade de acorrer a qualquer pequeno imprevisto. Um estudo recente indicava que 40% das famílias, nos EUA, não dispunha sequer de uma soma de 500 dólares em caso de imprevisto. Mas, na economia dos países também tem efeitos graves, pois é das poupanças acumuladas que se forma a massa de capital necessária para os empreendimentos, investimento produtivo e reprodutivo. Também aqui, a renúncia em estimular o comportamento de poupança das pessoas, por um lado e, por outro, o constante comportamento despesista por parte dos Estados, conduz inevitavelmente ao aumento de impostos. Estes são uma punção à economia real, é dinheiro quase todo usado em despesas e muito pouco em investimentos, que trariam aumento de riqueza.
Assim, com dinheiro digital a 100%, a economia real não vai sofrer nenhum impulso. Vai tornar-se imperioso gastar todo o dinheiro que se ganhou. A formação de poupança nas famílias não irá ocorrer. Não haverá dinheiro disponível para investimento. Entretanto os bancos ficarão aliviados, pois poderão impunemente fazer uma punção periódica nos salários e pensões, sem qualquer problema. Será exactamente tão fútil e perverso como a preocupação do comandante do Titanic, em impedir que a "ralé" da terceira classe se misturasse com os da primeira.
O investimento produtivo, feito pelos Estados ou pelas empresas, esse sim, seria o caminho para se desfazer o ciclo vicioso. Seria o caminho da responsabilidade monetária, onde não houvesse possibilidade de traficar o valor do dinheiro. A inflação é a salvação dos governos, porque ficam obrigados a pagar o mesmo, mas - de facto - essas quantias em dívida (e os próprios juros no caso de taxas fixas) vão sendo cada vez menos expressivas. Historicamente, demonstra-se que os governos, em situações de aperto, recorrem à impressão monetária. Mas, esta impressão não pode ocorrer, sem que seja muito óbvio o jogo, se houver um padrão ouro. Por isso, os governos não gostam dele. Porém, o padrão ouro funcionou muito bem internacionalmente e foi o garante da estabilidade monetária de 1815 (fim das guerras napoleónicas) até 1914 (rebentar da Iª Guerra Mundial), para falarmos apenas dos tempos mais recentes em que havia papel-moeda em circulação. Só a política económica e monetária keynesiana, que tem tido um papel hegemónico nos governos, nos bancos centrais e noutras instituições do mundo «ocidental», tem levado o sistema monetário e económico para este território de constante aumento descontrolado da massa monetária.
Muitos dos problemas económicos actuais decorrem da visão neo-liberal, keynesiana, que tem dominado: desde o endividamento, a desorganização da produção, até à guerra monetária e comercial, com o risco real de guerra física em larga escala.
PS1: O Guia para o Grande Reset de James Corbett fornece muitas pistas para compreender o que se está a passar.
4 comentários:
https://mises.org/wire/printing-money-constant-or-stable-rate-wont-prevent-boom-bust-cycles Frank Shostak demonstra como os bancos centrais são os responsáveis pelos ciclos de expansão-contracção da economia devido à sua criação de dinheiro «ex nihilo».
Se quer saber aquilo que tem sido o verdadeiro «great reset», aquilo que a media mainstream não lhe diz:
https://www.youtube.com/watch?v=nTv1-uIisAY
Veja o artigo de David Brady que nos decifra o discurso de Giorgieva do FMI, anunciando um «novo Bretton Woods» de um modo que não se encontra no «mainstream»:
https://www.sprottmoney.com/blog/IMF-Confirms-Massive-Stimulus-Ahead-Globally-David-Brady-22-October-2020
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