Muitas pessoas aceitam a situação de massacres de populações indefesas em Gaza e noutras paragens, porque foram condicionadas durante muito tempo a verem certos povos como "inimigos". Porém, as pessoas de qualquer povo estão sobretudo preocupadas com os seus afazeres quotidianos e , salvo tenham sido também sujeitas a campanhas de ódio pelos seus governos, não nutrem antagonismo por outro povo. Na verdade, os inimigos são as elites governantes e as detentoras das maiores riquezas de qualquer país. São elas que instigam os sentimentos de ódio através da média que controlam.
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domingo, 16 de julho de 2023

CRÓNICA ( Nº14 ) DA IIIª GUERRA MUNDIAL

                             


Temos de aceitar uma vez por todas que, apesar da guerra na Ucrânia ser uma carnificina como não houve muitas, o cenário principal desta Terceira Guerra Mundial joga-se em planos muito diferentes do mero confronto militar. É um confronto total: Nada mais óbvio, a meu ver, que a luta de uns (BRICS e associados) para arrancarem a hegemonia do dólar, por um lado. Por outro, os EUA e seus aliados, a fazerem tudo para guardar essa hegemonia, incluindo - mas não exclusivamente - através da guerra «cinética» ou dita convencional, fazendo pairar a ameaça de guerra nuclear.

 (Ver minhas crónicas anteriores: Crónica Nº13 da IIIª GUERRA MUNDIAL)

Li alguns artigos (ver links em baixo) e tentei resumir, neste escrito, o que aprendi com eles.



Alasdair Macleod chama-nos a atenção para o anúncio - feito pela Rússia - de que estaria para breve uma nova divisa, da responsabilidade dos BRICS, que seria apoiada no ouro. Os media ocidentais, tentaram - como de costume - ignorar ou minimizar a importância deste passo, anunciado para ser oficializado dentro de tempo muito breve, na cimeira dos BRICS de Johannesburg. Os BRICS,  entretanto, vão-se alargando, a sua estrutura está a fazer a junção com outras instituições da globalização «alternativa», a Organização de Cooperação de Xangai e a União Económica Euroasiática. Trata-se - nada menos - da maioria da Ásia (incluindo países do Médio-Oriente), além de países de África e América Latina. Ao todo, serão uns 61 países (se a minha contagem está certa), a formarem este novo bloco, em torno do núcleo inicial dos BRICS.

A segunda peça, é de autoria de Marcel Salikhov, o diretor do Centro de Peritagem Económica da Escola Superior de Economia de Moscovo, inicialmente publicada no Valdai Discussion ClubEste documento lê-se como sendo uma planificação estratégica para acabar com a hegemonia do dólar. O autor di-lo, sem esconder os objetivos, com a segurança de alguém que sabe ter apoio e colaboração dum conjunto de especialistas monetários de vários países. Estes países constituíram a «Grande Aliança Informal»  que se alargou e consolidou, perante a constatação de que os EUA e seus vassalos não hesitavam em deitar pela borda fora as «regras internacionais», como as do FMI e do Sistema Monetário Mundial (Por ex.: O estatuto especial dos bancos centrais e dos seus ativos), ou a utilização de sanções unilaterais como meio de chantagem política sobre regimes não afetos aos senhores hegemónicos (Aliás, indo contra o espírito e a letra dos tratados da ONU e da OMC).  

Quem quiser, pode compreender -pela leitura do artigo - quais os passos propostos para a derrota do dólar enquanto instrumento bélico, usado para subjugar os Estados, exercendo sobre eles uma chantagem permanente, com o abuso do seu estatuto de «moeda de reserva».

Finalmente, o artigo do jornal on-line britânico Off-Guardian, por Riley Waggaman, correspondente em Moscovo. O rublo digital nasceu oficialmente, tendo a Duma (o parlamento russo) votado a lei na Terça-feira passada (a 11 de Julho de 2023). Note-se - de passagem - o silêncio, a falsa indiferença da media corporativa

O que me parece importante fazer sobressair é que este lançamento do rublo digital não é desgarrado, mas coordenado com o lançamento sob forma digital duma divisa própria dos BRICS. A China, por sua vez, já possui instrumentos técnicos para lançar o Yuan digital em grande escala. Já o fez, a nível experimental, em várias províncias.

Quem está imbuído de conceitos keynesianos, ou deles derivados, tem tendência a desprezar o papel monetário do ouro. Porém, agora, o ouro surge «em todo o seu esplendor». Qualquer país que queira aderir ao «novo clube», quer use um nome novo, ou o nome tradicional da sua divisa própria, precisa de ter um certo grau* de cobertura em ouro nas suas reservas bancárias. Isto tem  a sua lógica: Os países podem fazer comércio entre si usando moedas nacionais respetivas; mas, as trocas deverão ser periodicamente ajustadas pois, por coincidência somente, o valor das exportações dum país, cobriria exatamente o valor das importações do outro. 

[* Não se trata de convertibilidade automática em ouro, dum padrão-ouro como existiu no séc. XIX, até à Iª Guerra Mundial (1914-1918): Nessa época, as notas de banco eram literalmente certificados de ouro. O seu possuidor tinha direito de as trocar pela quantidade correspondente em ouro ao balcão dum banco comercial.]

O resultado de os membros, e da própria organização dos BRICS alargada, terem a sua divisa comum e as divisas digitais dos vários países (rublo, yuan, ...) com o «backing» do ouro, é que esvaziam as moedas digitais  que os países ocidentais pretendem lançar como versões digitais das divisas «fiat». Estas últimas, não são garantidas por nada, a não ser pela «confiança» nos bancos centrais e nos governos que as emitem!


ARTIGOS EM QUE ME BASEEI:

https://www.goldmoney.com/research/the-bell-tolls-for-fiat

https://www.informationclearinghouse.info/57678.htm

https://off-guardian.org/2023/07/15/the-digital-ruble-its-finally-here/


PS1 : Nomi Prins, em entrevista ao KWN, reforça os aspetos da mudança tectónica, referida no meu artigo acima. Veja e leia:

https://kingworldnews.com/nomi-prins-just-warned-what-is-about-to-be-announced-will-shock-the-world/



terça-feira, 30 de maio de 2023

CRÓNICA ( Nº13 ) DA IIIª GUERRA MUNDIAL

      Trabalhadores completam uma ponte, simbolizando as novas rotas da seda em Pequim

Pepe Escobar:

 https://sputnikglobe.com/20230526/pepe-escobar-eurasian-heartland-rises-to-challenge-the-west-1110600622.html


Quem assimilou a «Arte da Guerra» de Sun Tzu, sabe que a melhor maneira de vencer é não ter que dar combate. Traduzindo e explicitando em pormenor: tornar evidente aos olhos dos adversários, que encetar combate equivale a ser destruído, derrotado, esmagado sem apelo. 

Também é necessário retirar aos chefes da potência adversária todo o desejo e possibilidade prática de, num gesto de desespero, se lançarem numa luta suicida. É fútil esgrimir com força superior, formada por uma coligação de forças bem equipadas, bem treinadas, bem resolutas, que não se deixam dividir por intrigas. 



Em complemento VEJA O VÍDEO SEGUINTE, QUE RESUME MUITOS ASPETOS DA COMPETIÇÃO ENTRE OS EUA E A CHINA:


... E o testemunho de um jornalista que esteve perto da frente de combate de Bakhmut...


 PS1: Há aqui um fator de autoderrota. No futebol, chama-se «golo na própria baliza», mas não é apenas «um golo»; são muitos. 
Todas as pessoas que observam a geoestratégia mundial concordam que tudo aponta para o descalabro do Império. 
É como uma doença escondida que se desenvolve durante anos,  sem sintomas significativos. Mas, quando começa a ser sintomática, é uma devastação na Administração do Estado, nas Forças Armadas, na economia, na liderança política. Leia:

terça-feira, 25 de abril de 2023

A economia global entre Caríbidis e Cila

 



Os bancos centrais andaram durante muito tempo a jogar com a quantidade de dinheiro (aqui, entenda-se divisas fiat). Inicialmente, puderam iludir as pessoas, incluindo economistas sofisticados, de que se tratava de suprimir as oscilações periódicas da economia, dando aos mercados a quantidade de dinheiro que eles precisavam para não entrarem em deflação.
 Segundo a ortodoxia dos banqueiros centrais e dos governos ocidentais, a existência de um «pouco» de inflação era benéfica e saudável. Mas, esta inflação acontecia num contexto de atividade industrial muito deprimida, após a grande crise financeira de 2008.
 Depois, baixa ou alta, a inflação é trituradora dos rendimentos das pessoas, principalmente dos assalariados e pensionistas. O aumento do custo das coisas básicas e elementares era muito maior do que de coisas que se podem considerar «não essenciais». 
É o rochedo chamado «Cila», que representa a inflação. Os turbilhões na proximidade do rochedo, iam tornando a economia cada vez mais deprimida, sobretudo no que toca aos investimentos produtivos, por oposição aos especulativos. 
O resultado de se lançar «dinheiro fiat» (sob forma eletrónica, principalmente) para os mercados, acentuava os redemoinhos, perto de Cila. Não resolvia a questão de fundo: estimular a produção de bens e serviços e não as atividades especulativas (o casino das Bolsas).
Na tentativa de manter o «status quo» e de não prejudicar os ricos detentores de grandes empórios financeiros (Banca comercial, fundos de investimento...), vieram com a falaciosa teoria de que aqueles «criavam riqueza». Na verdade, ao apostarem na financeirização, desencaminham a riqueza. Os capitais investidos em especulação financeira não participam realmente em atividades produtivas da economia. 
Mas, depois de 2008, os banqueiros centrais e os governos, fingiam que acreditavam nesta teoria, para verter somas abismais aos banqueiros que tinham sofrido perdas. Estas perdas eram expectáveis, pois eles tinham jogado no «alavancar» dos fundos que geriam. 
O que aconteceu foi aquilo que qualquer pessoa com bom-senso poderia prever: Em vez de investirem, eles próprios, ou de emprestarem o dinheiro recebido para crédito à produção, foram aparcá-lo em contas na FED ou noutros bancos centrais, que forneciam à banca comercial juros muito pequenos, mas sem risco. Outra parte do dinheiro recebido pelos bancos, foi para jogar na bolsa (incluindo a auto-compra das ações).
Como era inevitável, a inflação monetária e o estímulo de atividades especulativas, fizeram aumentar a massa monetária, atingindo extremos tais, que os capitais disponíveis globalmente eram, pelo menos, 20 vezes o PIB mundial. Ao certo, não sabemos, porque uma parte importante desses capitais está investida em derivados,  instrumentos que não são registados nos balanços de instituições de crédito, mas que pesam na solvabilidade destas.
A subida dos juros de referência pela FED (seguido pelos outros bancos centrais ocidentais), implicava o aumento do custo do crédito e a diminuição correlativa do valor das reservas. Os bancos comerciais têm em reserva, principalmente, obrigações do tesouro do seu próprio país ou de outros (uma obrigação vale tanto mais quanto o seu juro for mais baixo). 
Os 4 bancos que faliram recentemente nos EUA, assim como o Crédit Suisse (um banco «sistémico»), não conseguiram corrigir a tempo o desequilíbrio causado pela perda do valor dos seus ativos em reserva. Caríbidis será o nome simbólico da enorme parede de pedra; o «rochedo» das taxas de juro crescentes e as consequências nefastas para as instituições bancárias, obrigadas - por lei - a ter parte das reservas em obrigações (bonds) do Tesouro. 

A expressão proverbial, recorrendo à mitologia grega, diz que alguém (ou instituição) «vai de Caríbidis para Cila», para exprimir que ambas as alternativas vão desembocar no naufrágio, ou no desastre total. É, portanto, fútil e perigoso nos mantermos dentro dos parâmetros dos que querem ir de Caríbidis para Cila, ou vice-versa.

A «solução» dos banqueiros e dos oligarcas é a de causarem o máximo de perturbação na economia, na economia produtiva, para as pessoas - desesperadas -se renderem à «hidra de sete cabeças» ou outros monstros, que são as «moedas digitais emitidas por bancos centrais» (CBDC)
A solução para a gente comum, os não beneficiários do casino da finança globalista, é completamente diferente: Passa por uma reforma do sistema monetário mundial, onde não exista uma moeda de reserva enquanto tal, mas onde as moedas nacionais sejam usadas nas trocas. Os diferenciais, serão saldados em ouro ou noutro metal precioso (Prata, Paládio, Platina). 
Assim sendo, não haverá nação, por mais poderosa que seja, que possa impor-se às outras, como têm feito os EUA. O seu domínio em todas as transações em dólares, deu-lhes a possibilidade de confiscarem importantes somas e imporem sanções TOTALMENTE ILEGAIS. São atos de pirataria financeira, que têm afetado negativamente as relações comerciais entre países. Aliás, esta é uma das principais causas de haver muitos países, aliados dos EUA, a quererem entrar para os «BRICS».

segunda-feira, 17 de abril de 2023

O BANCO DOS BRICS FAZ EMPRÉSTIMOS EM DIVISAS DOS PRÓPRIOS PAÍSES


Nunca será demais sublinhar, como o faz Ben Norton ,  que a dominação neocolonial dos países do Sul tem sido mantida pelos dispensadores de «ajudas» em dólares, World Bank/IMF. Estas instituições são responsáveis pelos planos de austeridade, as reestruturações e privatizações em múltiplos países, que se veem obrigados a pedir empréstimos. Têm sede em Washington e estão sob controlo dos EUA, desde a sua criação em 1944, em Bretton Woods.

O facto de ser possível - agora - países do chamado «Terceiro Mundo» obterem empréstimos que não sejam em dólares, vai permitir que eles se desenvolvam. Oiça as explicações de Ben Norton. São muito claras e dão uma perspetiva de como a desdolarização vai ocorrer na prática, graças ao NDB (New Development Bank) presidido pela ex-presidente do Brasil, Dilma Russeff.

 

sexta-feira, 7 de abril de 2023

A DESDOLARIZAÇÃO ACELERA-SE

Para mim, e para muitas pessoas independentes, este movimento de desdolarização era inevitável. Porém, a velocidade a que a situação mudou, surpreende, tanto em termos monetários como das alianças geoestratégicas, tanto no sentimento das pessoas como no distanciamento de governos em relação aos EUA e ao dólar.
É que os EUA, nos últimos anos, acumularam erros estratégicos, fazendo com que inimigos e amigos se colocassem numa postura defensiva e acolhessem com grande interesse as propostas do bloco emergente, em que Rússia & China são pilares centrais, com os BRICS e com mais de uma centena de países, que entretanto aderiram a projetos das Novas Rotas da Seda.
Basta ver a perda de influência rápida dos EUA, primeiro na África a sul do Sahara e depois no Médio Oriente. Tendo os EUA - há duas décadas, apenas - uma situação hegemónica, agora, excetuando seus «vassalos/aliados», já não conseguem hoje impedir que os Estados procurem novas parcerias.
Nestas, procura-se a reciprocidade, os acordos «win-win» mas, sobretudo, sem interferências nos respetivos regimes políticos e no respeito pela soberania dos Estados, sejam eles fortes ou fracos, grandes ou pequenos.

Proponho ao leitor, que consulte os dois artigos abaixo, um de autoria de Alasdair Mcleod e o outro de Matthew Piepenburg. Dão-nos o contexto, assim como muita informação sobre a mudança tectónica em curso e esclarecimentos sobre o que já transparece sobre a nova arquitetura monetária mundial.
Creio que os povos do Sul têm a ganhar com a mudança, pois a utilização do dólar como moeda de reserva foi permitir que os governos americanos, sem escrúpulos, abusassem do privilégio.
Se eles não tivessem transformado o dólar em «arma de guerra», da guerra económica (ilegal e ilícita) e das sanções contra aqueles que lhes resistiam, talvez conservassem, por mais algum tempo, o predomínio do dólar, quer em termos de comércio internacional, quer em termos de moeda de reserva.
Assim, com a sua agressividade militar e a não menos brutal guerra económica, podem ainda fazer muito mal, mas não conseguem mais do que obter como «aliados», os que foram sujeitos a chantagem permanente.
Como conseguiram manter o dólar, nos últimos tempos? Pela força das bases militares que têm espalhadas nos 4 continentes e pelo terrorismo económico e financeiro, dos congelamentos e rapina de ativos dos Estados e particulares de países não submissos.
Estamos a viver uma mudança de paradigma, um momento histórico de mudança estrutural.



    Desde 2016, que o ouro é cotado e transacionado em Yuan, na bolsa de Xangai

https://www.goldmoney.com/research/time-to-trash-triffin

 https://goldswitzerland.com/golden-question-is-the-petrodollar-the-next-thing-to-break/





segunda-feira, 20 de março de 2023

FIM DO SISTEMA CAPITALISTA TAL COMO O CONHECÍAMOS?



 https://goldswitzerland.com/this-is-it-the-financial-system-is-terminally-broken/ (*)

(*) Egon Von Greyerz é o gestor da empresa Matterhorn Asset Management.

O que escrevo a seguir, não se trata de uma profecia, embora pareça. É antes uma CONJETURA, COMO NAS MATEMÁTICAS: «O teorema está demonstrado ou não está» ... A realidade é esta, ou não é. 

Von Greyerz não é um «revolucionário», mas antes alguém prudente, sensato, que inspira confiança aos investidores. Se lerem o artigo acima, depressa compreenderão que aponta para algo gravíssimo, tanto mais que ele está nos antípodas do sensacionalismo e do catastrofismo, que são atitudes infelizmente corriqueiras nos dias presentes.

A construção dum sistema monstruoso, ou seja, o edifício financeiro assente sobre crédito, e crédito sem ter nada de sólido como garantia, tinha - num dia ou noutro - de estoirar. Isso já se tornara inevitável, aquando do «default» de Nixon em relação ao Acordo de Bretton Woods em 1971. Mas, como todas as coisas complexas, a realidade pode ser iludida durante algum tempo, mas acaba por vir à superfície.

Agora, as pessoas que não se importaram com os sérios avisos da minoria de pessoas com nomeada e respeitadas (caso de Von Greyerz, e de alguns outros) e que continuaram a jogar no casino corrupto e viciado das bolsas mundiais, vão ter que sofrer perdas enormes ou mesmo, entrar em falência. 

     Gráfico retirado do artigo:

Note-se que a falência do Crédit Suisse, é qualitativamente diferente das precedentes das últimas semanas nos EUA. Agora trata-se dum banco sistémico, ao contrário dos bancos de depósito que faliram nas semanas passadas. Estes, eram de pequena ou média dimensão, no mercado dos EUA. 

O acordo que levou à absorção do Crédit Suisse pela UBS, outro banco sistémico suíço, teve a garantia de empréstimo do Banco central suíço (BNS) até ao montante de 100 mil milhões de dólares. Repare-se que a UBS fechou o negócio de compra do Crédit Suisse, com uns «míseros» 3 mil milhões de dólares. Esta quantia, mesmo assim, seria demais para uma instituição falida, mas é provavelmente destinada a satisfazer aqueles clientes que ainda tinham ações do Crédit Suisse. Quanto ao resto, será impossível fazermos a avaliação dos riscos que a UBS vai ter de assumir (ao longo de anos) para dar conta dos muitos milhões empenhados em contratos de derivados  do Crédit Suisse e que a UBS tem de honrar.

Sabe-se que a banca na Europa está toda ela muito alavancada, sendo a paisagem realmente mais sombria do que a media financeira costuma pintar. Os grandes bancos nos EUA têm ainda alguma margem de manobra. Porém, isso não é um dado adquirido, pois existem demasiadas fragilidades no sistema: 

A extrema concentração do imobiliário para aluguer, nas mãos de duas mega empresas Blackrock e Vanguard (esta última, tem uma participação na Blackrock), faz com que a severa crise do imobiliário, sobretudo nos setores dos escritórios e comércio, tenha um impacto multiplicado. Mas, existem outros setores em crise, como o crédito automóvel, importante nos EUA, ou ainda as ruturas nas cadeias de abastecimento, efeitos das sanções contra a Rússia, a China e o Irão, conjugados com a realidade económica dum país desindustrializado, pelos seus próprios magnates. Quanto às indústrias tecnológicas, de que os EUA tanto se orgulhavam, estão em apuros, não só pela retração das vendas, como também pelos jogos financeiros. Estes incluíam, entre outros, a compra das próprias ações, para fazer brilhar estas empresas nas bolsas e assim atrair investidores.

Perante um Ocidente desindustrializado, sem aquele vigor do capitalismo industrial de outras eras, tem-se erguido e fortalecido um conjunto de países onde a indústria está no centro do investimento e tem demonstrado sua eficiência, inclusive nos domínios de ponta. O público ocidental tem uma ideia estereotipada, resultante da propaganda anti-chinesa e anti-russa, segundo a qual estes países não estariam à altura de competir, nestes domínios, com o «Ocidente». De facto, passa-se exatamente o inverso. Podemos ver isso, através do armamento mais sofisticado fabricado na Rússia e do programa aeroespacial Chinês, por exemplo. Esta propaganda ocidental - além de belicista, racista e reacionária - engana apenas quem quer ser enganado.

Se o mundo conseguir evitar um confronto global, com os seus riscos de guerra nuclear,  vai-se assistir  a uma nova era de capitalismo industrial, na China e nos países integrando a OCX (Organização de Cooperação de Xangai) e os BRICS, sobretudo. 

Não creio que ocorra uma mudança de paradigma no sentido dum socialismo, dum sistema socialista dominante. Mas creio que a situação das populações irá melhorar, sobretudo dos muitos milhões de excluídos nos países mais pobres. 

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PS1: Uma fuga dos documentos internos da UBS permite perceber a estratégia de «piratas» financeiros dos seus dirigentes, com a conivência das autoridades «fiscalizadoras» suíças: 

EXCLUSIVA: El documento interno de UBS



PS2: Com o aumento de 25 pontos-base nos juros, hoje (22/03/2023) anunciado pela FED, as contas públicas ficam ainda mais deficitárias. Os juros vão pesar mais 29%, em comparação com o ano fiscal anterior, com a agravante de haver diminuição na receita dos impostos.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

[ALASDAIR MCLEOD] AS INTENÇÕES DA RÚSSIA ESTÃO A CLARIFICAR-SE

Russia's Prime Minister Vladimir Putin holds an ingot of gold as he visits the precious metals safe vault of the Central Bank in Moscow January 24, 2011. 
REUTERS/Alexsey Druginyn

Reproduzo abaixo o sumário do artigo de Alasdair Mcleod «Russia’s intentions are clarifying ». É um artigo de fundo, cheio de informação, pelo que aconselho os leitores deste blog a lê-lo na íntegra (1). 
Eu traduzi para português algumas partes e coloquei neste espaço abaixo: 

Temos a confirmação das mais altas fontes de que a Rússia e a Organização de Cooperação de Xangai (SCO) estão a considerar usar o ouro para pagamentos no comércio pan-Asiático, substituindo plenamente o dólar e o euro.

[...]

Agora que a aliança ocidental está a juntar tanques e outro material para os ucranianos, promovendo ativamente novas batalhas, com a OTAN ficando quase diretamente implicada. É esta situação que irá conduzir a uma subida dos preços das matérias-primas, enfraquecer os mercados financeiros do Ocidente, fragilizar as finanças destes governos e, por fim causar, o colapso das suas divisas.

[...]

No Reino Unido, pelo menos, a media russa tem sido censurada, portanto o artigo de Glazyev no jornal russo Vedomosti não deverá estar acessível a leitores no Ocidente. Portanto, para facilitar a referência dos pontos principais, cito a tradução inglesa do artigo detalhado, que pode ser resumida como segue: 

Nos nove meses antecedendo Setembro, o excedente da Rússia com os membros da EAEU, mais China, Irão, Turquia, UAE, etc. era de um equivalente a $198.4biliões, para $123.1biliões para o mesmo período do ano passado. Por outras palavras, as sanções ocidentais não conseguiram suprimir os rendimentos do petróleo da Rússia, meramente redirecionando os rendimentos vindos dos países recetores.
O excedente comercial com os membros da SCO permitiu às companhias russas liquidar as dívidas externas, substituindo-as com empréstimos em rublos. [Glazyev não menciona este ponto, mas um retorno do padrão ouro iria reduzir os custos de empréstimo substancialmente (Nota de A. Mcleod)]
A Rússia tornou-se o terceiro maior país a usar renminbi (yuan, a divisa da China) para pagamentos internacionais, que dão conta de 26% das transações em divisas estrangeiras da Federação Russa. A parte de pagamentos e divisas dos próprios membros, parceiros de diálogo e associados do SCO, está crescendo, substituindo o dólar e espera-se que continue a crescer.
Visto que tais divisas estão sujeitas a taxas de câmbio e a possível risco de sanções, a melhor maneira de evitar esses riscos é comprar ouro não-sancionado da China, da UAE, da Turquia e possivelmente do Irão, e de outros países, em troca pelas divisas locais.
O ouro adquirido pelo Banco Central Russo pode ser armazenado em bancos centrais de países amigos para maior liquidez e o resto ser repatriado para a Rússia.
O ouro pode ser um instrumento único para combater as sanções ocidentais se for usado para atribuir os preços das principais mercadorias internacionais (petróleo, gás, alimentos, fertilizantes, metais e minerais sólidos). Isto seria a resposta adequada aos tetos de preços do Ocidente. E a Índia e a China podem tomar o lugar de plataformas de comércio global em vez de Glencore or Trafigura”.
O ouro (juntamente com a prata) esteve durante milénios no centro do sistema financeiro global, conferindo uma medida honesta do valor de moeda-papel e de ativos financeiros....Ele foi cancelado há meio século, ligando o petróleo ao dólar, mas a era do petrodólar está a acabar. A Rússia, junto com os seus parceiros do sul e do leste, tem a oportunidade única de sair do barco da economia centrada no dólar e na dívida.
A URSS, ao assinar mas não ratificar o Acordo de Bretton Woods, o «Rublo de Ouro 2.0» desempenhou um importante papel na industrialização soviética no pós- IIª Guerra. Agora, as condições para um «Rublo de Ouro 3.0» desenvolveram-se, objetivamente.
As sanções contra a Rússia voltaram-se como boomerang para o Ocidente. Agora, tem de fazer face á instabilidade geopolítica, ao aumento de preços para a energia e outros bens [isto significa mais inflação nos preços].
Em 2023, [vai haver uma mudança de] investimentos arriscados, de instrumentos financeiros complexos, para ativos tradicionais, primariamente o ouro. O banco Saxo prevê um aumento do ouro para $3,000 por onça, o que conduzirá a um aumento substancial dos valores e quantidades das reservas de ouro. Importantes reservas de ouro irão permitir que a Rússia “conduza uma política financeira soberana e minimize a dependência em relação a credores externos”. [Note-se que além das reservas oficiais, sabe-se que a Rússia possuí pelo menos mais umas 10 mil toneladas - mais do que é declarado oficialmente pelo Tesouro dos EUA]
Os bancos centrais estão a aumentar as suas reservas de ouro. A China tem uma proibição de exportação para todo o seu ouro minerado. Segundo o Shanghai Gold Exchange, os clientes retiraram 23 mil toneladas de ouro. A Índia é considerada a campeã na acumulação de ouro…. O ouro tem estado a fluir de Oeste para Leste...Estará o ouro do Oeste garantido, ou está empenhado através de «swaps» e de «leasing»? O Oeste nunca o diz e Fort Knox nunca consente em ser auditado.
Nos últimos 20 anos, a mineração de ouro na Rússia quase duplicou. A produção de ouro pode representar um aumento no PIB, de 1% para 2 ou 3% do PIB... No presente, a produção de ouro está prevista (ano de 2022) subir de 300 toneladas, para 500 toneladas… dando à Rússia um rublo forte, um orçamento sólido e uma saudável economia. [Note-se que nesta declaração, Glazyev revela que a maior parte do aumento do rendimento da mineração, será quando tal rendimento seja medido em dólares.]

[Sumário do Artigo de Alasdair McLeod pelo próprio:]

«Confiamos aos bancos centrais a garantia da integridade da rede de bancos comerciais. No mínimo, quando há produção acelerada de divisas e ocorre inflação do crédito, esperamos que venham apoiar o sistema financeiro titubeante, sobre o qual assenta a aliança ocidental, o que apenas pode ser feito de uma maneira - a expensas das respetivas divisas.

Que a aliança ocidental esteja a mergulhar numa crise de dívida, por ela própria fabricada, é inegável. A sua geoestratégia, a cargo do poder hegemónico de ontem, já resultou em tiro pela culatra, em benefício dos seus inimigos. Agora chegou o tempo para a Rússia dar o golpe de misericórdia financeiro. Isto porque a Rússia vai usar a cobertura da agressão ocidental e as consequências para os seus mercados, para realizar o disparo. A Rússia está a pensar para diante, enquanto a aliança ocidental, está em modo de  rancor belicoso.

Tal como não foram medidas de antemão as consequências do banimento da Rússia do sistema SWIFT, as consequências de uma nova fase da guerra na Ucrânia são descartadas. No início, pelo menos no ocidente, um movimento da Rússia em direção ao ouro poderia ser visto como a resposta defensiva para proteger o rublo e as exportações russas na Ásia. Um ataque deliberado às divisas-fiat do Ocidente não será suspeitado. A evidência será vista no preço do ouro a aumentar para além das expetativas.

A Rússia não fará anúncios formais sobre padrões ouro, porque não há necessidade disso. Nem a China: Em vez disso, irão anunciar qual o aumento das suas reservas de ouro. Tendo deixado cair a hipótese duma divisa da EAEU formada por um cabaz de divisas nacionais, como forma de substituir o dólar enquanto meio de pagamento,  a SCO (Organização de Cooperação de Xangai) irá adotar de facto o ouro, em seu lugar.

Inicialmente, o aumento do preço do ouro em dólares não irá criar alarme nos meios ocidentais: Afinal de contas, o ouro foi desmonetizado. Ele será seguido por desmentidos da sua importância. Mas, tal como Sergey Glazyev escreve no seu artigo, em Vedomosti, o ouro irá ser usado para cotar todas as principais matérias-primas (petróleo, gás, alimentos, fertilizantes, metais e minerais sólidos). Assim sendo, estes preços serão estáveis e haverá baixos juros, enquanto os preços e juros irão subir, em termos de dólares. Nessa altura, o público mais vasto  ficará consciente de que não são os preços que sobem, mas o dólar que está a colapsar. 

Então, à medida que as moedas-fiat, dólar, yen, libra, euro, perderem o seu poder aquisitivo, não apenas em relação ao ouro, mas perante todas as matérias-primas, é inevitável que se façam comparações com o sucesso relativo do eixo Rússia-China, concretizado em organizações como o SCO, a EAEU, e os BRICS. Impulsionada pelos chineses aforradores, pelo investimento de capitais, pelo desconto nas energias e por dinheiro real( o ouro),  a Ásia irá prosperar.
Pouco ou nada, a América e os seus aliados da OTAN poderão fazer, para evitar isto»

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(1) O meu artigo de 23-01-2023, embora mais genérico, também aponta para as mesmas conclusões que o notável artigo de A. Mcleod.

domingo, 1 de janeiro de 2023

FUNDO SOBERANO RUSSO AUTORIZADO A SUBIR PERCENTAGEM DE YUAN ATÉ 60%

 https://www.reuters.com/markets/currencies/permitted-share-chinas-yuan-russian-wealth-fund-doubled-60-finmin-2022-12-30/


A Rússia foi exposta a uma severa guerra de sanções, que começou pouco depois do golpe de Estado pró-ocidental de Maidan, em 2014. Porém, com a invasão russa da Ucrânia, os países do Ocidente, liderados pelos EUA, fizeram uma brutal (e obviamente ilegal) confiscação dos fundos em divisas, presentes nos bancos ocidentais e pertencentes ao Banco Nacional da Rússia (o banco central, detentor de ouro e divisas em reserva) confiscando também os bens de pessoas individuais, apenas por serem russas.
Face a esta atitude de extrema hostilidade dos poderes ocidentais, a reação da Rússia foi totalmente previsível: Desfazer-se das divisas de países hostis, que tinham tido parte nesse roubo. Cerca de metade das reservas em divisas estrangeiras da Rússia, as que se encontravam em bancos ocidentais, foram «congeladas», mas - na realidade - com a intenção de nunca mais as devolverem, pois a UE e os EUA têm estado a fazer planos para «reconstrução da Ucrânia», utilizando os fundos russos «congelados» (ou seja, roubados).
Naturalmente, surge agora a decisão de aumentar para o dobro a participação de ouro (de 20 para 40%) e de yuan (de 30% para 60%) permitidos para esse fundo soberano nacional da Rússia. Sem dúvida, os países hostis à Rússia não poderão esperar um qualquer interesse da Rússia em (continuar a) exportar energia (gás natural e petróleo) para eles. Terão de se abastecer junto de outros, no mercado internacional.
A estratégia deles, países ocidentais, querendo impor ao mundo um preço máximo sobre o petróleo, falhou redondamente com o «não» da Arábia Saudita e dos países da OPEP.


Mas, note-se, este desfecho inicia uma nova era, onde as economias dos dois blocos - euroasiático e «atlântico» - estão praticamente divorciadas, a própria China estando mais interessada em exportar para países seus amigos, do que para seus adversários geopolíticos que têm designado (oficialmente) a China como a principal ameaça.
Mesmo que a guerra russo-ucraniana acabe e se estabeleça num acordo de paz, é muito provável que se mantenha a partição entre o domínio do «yuan-ouro», ou seja, onde as notas de crédito em yuan (incluindo as de pagamento da energia) sejam convertíveis em ouro; e a «zona dólar», com os EUA e seus aliados anglo-saxões (Reino Unido, Austrália, Canadá Nova Zelândia), assim como a União Europeia (quase todos, membros da OTAN). Note-se que as zonas monetárias vão estar imbricadas: Existirão países no «Ocidente», que continuarão a ter boas relações com o Eixo Euroasiático, tais como o Brasil (membro dos BRICS), a Venezuela, a Argentina e outros da América Latina e Caraíbas. O mesmo, em relação a muitos países, antes tidos como pró-ocidentais, nos continentes Asiático e Africano. 
Por outro lado, do Extremo Oriente ao Médio Oriente, por maior que seja o crescimento do comércio com a China, através das Novas Rotas da Seda, muitos países quererão manter boas relações com os EUA e o Ocidente, aos níveis económico e militar (armamento, sistemas de defesa, treino de tropas e cooperação em informação e espionagem,...).
Note-se também, que o Mundo, no decurso da 1ª Guerra Fria, experimentou severas restrições ao comércio internacional. Mas, o nível de sanções agora atingido, é tal que a chamada globalização vai apenas ser uma memória do passado. Com o comércio internacional sendo severamente atingido, haverá necessariamente um empobrecimento global. Isso irá também afetar todos os países que pretendem manter-se neutrais.
Creio que vai durar e ser muito significativo, dentro do conjunto de decisões monetárias, económicas e de defesa, o efeito desta decisão do Fundo Nacional russo. Vai estender-se muito para além do ano de 2023, que agora começa.
A guerra entre a Ucrânia (apoiada pela OTAN) e a Rússia, é um momento infeliz e transitório desta guerra mundial híbrida (a IIIª Guerra Mundial). Porém, tudo indica que esta medida não é de simples retaliação, face às sanções massivas dos países ocidentais: Será antes um mudar definitivo de rumo da Rússia, não apenas em termos de política monetária, mas também económica e geoestratégica.




segunda-feira, 21 de novembro de 2022

POR QUE RAZÃO A MEDIA CORPORATIVA OMITE ISTO?

UMA NOVA MOEDA DE RESERVA MUNDIAL ESTÁ NA FORJA

NO OCIDENTE, AS PESSOAS CONTINUAM A SER ENGANADAS 



O grande público tem sido condicionado a não investir em ouro ou prata. Apesar de o ouro e a prata, metais preciosos, serem desde tempos imemoriais escolhidos como «metais monetários» (incorporados em moedas). Para os «fazedores de opinião», todos eles alinhados com interesses que não revelam, estes não seriam senão «uma curiosidade» ou algo apenas para os «muito ricos»*.

No Ocidente, em particular, os investidores têm sido «treinados» a desprezar os referidos itens, com o pretexto de que «não produzem rendimento», o que aliás é falso. Os bancos centrais (sobretudo, mas não apenas) fazem leasing de ouro, desde há muito tempo: o leasing permite-lhes obter rendimento para cobrir as despesas de armazenamento e segurança associadas. Os gestores de portefólios costumam dizer aos clientes que seria prudente possuírem cerca de 10% (o número exato varia) de seus ativos em metais preciosos, supostamente para funcionar como «seguro». No fundo, eles - especialistas em precipitar os seus clientes ingénuos para o mercado de ações - querem guardar uma imagem «impoluta», mas também sabem de que o mais provável é os clientes terem perdas significativas.  Em contas dos bancos e sociedades de investimento o ouro desempenha um papel de caução, para os gestores financeiros: Para tomar o ouro dos clientes que tiveram «azar» no jogo da bolsa.
Mas no Oriente, China, Índia, etc. o ouro continua a ser considerado por todos a forma preferida de poupança.
Agora, multiplicam-se os sinais de que os bancos centrais orientais e em todo o mundo estão ativamente a comprar ou a resgatar ouro que estava cativo em contratos de leasing. Na semana passada, o próprio BIS (Banco Internacional de Pagamentos, de Basileia) anunciava discretamente que repatriava 500 toneladas de ouro.

Há um número elevado de bancos centrais a comprar ouro, em quantidades record. Por exemplo, a Turquia, o Uzbequistão e outros países asiáticos, reforçaram recentemente, em muitas toneladas, as suas reservas em ouro. A razão para isto, é que os candidatos aos BRICS e à OCX (Organização de cooperação de Xangai) estão ao corrente dos esforços daquele grupo para lançar uma moeda de reserva digital. Eles querem ter um «bom lugar à mesa».
É praticamente certo que a nova moeda, digital, não seja a moeda nacional de um país. Pelo contrário, há muitos indícios de que irá basear-se em matérias-primas (petróleo, metais raros, cereais, etc.) e nas reservas de ouro de cada interveniente. Cada interveniente terá um peso relativo no cabaz de divisas, de acordo com os seus recursos naturais e do ouro que possua. Assim se prevê será a nova moeda, simultaneamente: Funcionará como reserva dos bancos centrais e nas trocas internacionais.

Isto equivale a uma mudança tectónica na política mundial, não apenas em termos estritamente monetários, mas também em termos geoestratégicos. Pois, esta nova unidade internacional monetária vai retirar a hegemonia de moeda de reserva ao dólar, o privilégio que os EUA usaram e abusaram durante mais de 70 anos.

Como todos sabemos, as guerras económicas, de sanções que os EUA levam a cabo, são contra a legalidade internacional. Só poderia haver sanções legais (o que não significa que fossem justas), se fossem decretadas pelo Conselho de Segurança da ONU. Pois bem, esta transformação do dólar em instrumento de guerra (económica) é o que exaspera todos, incluindo seus fiéis aliados (como a Arábia Saudita, entre outros).

Como confirmação do que está acima, alguns bancos centrais já estão a fazer as contas. A Holanda tem uma quantidade relativamente avultada de ouro no banco central. Seu presidente veio «sugerir» que se poderia reavaliar esse ouro, deixando de ser contabilizado a 35 $/onça. Este era o valor que vigorava até 1971, quando Nixon unilateralmente retirou a convertibilidade do dólar em ouro. Será esta cotação que ainda está nos livros de balanço dos bancos centrais ocidentais**. Se o banco central holandês «pensa nisso», também outros bancos da eurozona pensarão, nomeadamente o português.

Mas, entretanto, a roleta do grande casino tem de continuar a rodar, os especuladores vão continuar a obter lucro, os «cripto- trafulhas» a fazer seus golpes, etc. O público não pode pôr-se a comprar ouro e prata, senão estes subirão demasiado cedo, antes do tempo conveniente para os banqueiros centrais; e lá desaparece o lucro dos bancos «sistémicos», emissores de «ouro-papel» (contratos de futuros)!

A viragem para uma moeda de reserva internacional, digital e baseada em matérias-primas estratégicas e no ouro, está em vias de se concretizar. Tecnicamente, estará já pronta para ser lançada. O único senão, é as reservas em dólares, consideráveis, que certos países, como a China, o Japão, Arábia Saudita, e outros possuem. Terão de se conformar a perder bastante.

O que se pode prever?
 - O valor do dólar vai se desencher como um balão que encontrou um alfinete na sua trajetória. Nessa altura, muitos dólares voltarão ao «ninho», em grande quantidade. Os EUA serão inundados pelo seu principal produto de exportação (e quase exclusivo: o outro, são armas). O dólar vai ficar como moeda dos EUA, sem que as pessoas no mundo inteiro queiram especialmente essa divisa, pois ela foi «queimada» pela sua emissão intemperada (os famosos QE) e a sua utilização, como parte do arsenal de guerra dos EUA.

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*Na realidade, está ao alcance de muitas pessoas: Custo de 1 grama de ouro hoje (21/11/2022), cerca de $ 56.  
**Hoje, a cotação da onça de ouro (~31.1gr.) é cerca de $ 1740.

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PS1: Preço do ouro em dólares ajustados à inflação: Pode-se ver que o ouro consiste num bom investimento para fazer face à inflação.


(A linha contínua azul clara representa a produção anual de ouro, a linha quebrada azul escura representa o preço do ouro em dólares ajustados ao seu valor de 2021.)

domingo, 6 de novembro de 2022

O GRANDE JOGO: COMO SERÁ O NOVO SISTEMA MONETÁRIO MUNDIAL?

 

                https://mybaseguide.com/installation/fort-knox/community/inside-fort-knox/

Durante mais de seis mil anos, o ouro foi um metal monetário, junto com a prata. O que significa isso? Que as civilizações deram sempre um valor a tais metais preciosos e incluíram estes metais nas suas unidades monetárias, sobretudo nas mais valiosas. Assim, o mundo viveu debaixo de um «padrão-ouro» durante muitos séculos. Mais recentemente, houve a introdução do papel-moeda, com as características de um certificado convertível em ouro. Há um século, a unidade Dólar era confiável, pois se podia ir a um banco e trocar os dólares por uma quantidade fixa de ouro. Nessa altura, era verdade que os dólares eram «tão bons como o ouro».  

Porém, com a excessiva impressão de notas bancárias (certificados dando direito a determinada quantia em ouro, nominalmente), as principais potências «abastardaram» as suas divisas, imprimindo muito mais do que aquilo que possuíam sob forma de ouro, no banco central. O desfeche veio com a repudiação unilateral do Acordo de Bretton Woods, por Nixon em 1971, com o pretexto de que o dólar (a moeda de reserva mundial) estava a ser «atacado por especuladores» e «provisoriamente, tinha de ser desindexado do ouro». Até essa data, os outros países podiam trocar os seus dólares, que possuíssem em reserva nos seus bancos centrais nacionais, por ouro - na proporção de 35 dólares US/ onça de ouro.

O poder de compra de 1 dólar desde a criação da FED até hoje retirado do vídeo seguinte: https://www.youtube.com/watch?v=95-twYwB4c8

A desdolarização teria sido instantânea não fosse o acordo com os Sauditas, em 1973 (Acordo entre os EUA e Reino da Arábia Saudita) segundo o qual os preços do petróleo seriam exclusivamente em dólares (aparecimento do chamado «petrodólar»). Os sauditas e os outros Estados membros da OPEC, encheram-se então de dólares, aos quais deram sobretudo o destino de Obrigações do Tesouro dos EUA (Treasuries), os quais são uma forma segura e que dá um pequeno rendimento, de guardar os dólares.  Instaurava-se assim um ciclo, em que os compradores de petróleo forneciam dólares às monarquias do Golfo, estas compravam Treasuries, que são uma forma de financiar a economia americana. As obrigações são títulos de dívida, neste caso dívida do Tesouro dos EUA, portanto dívida «soberana». As "treasuries" vieram a encher também os cofres de outros países, nomeadamente, Japão e China.

Agora, chega-se ao ocaso do dólar como moeda de reserva mundial. A Rússia, há uns anos começou a despejar as suas "treasuries" e a reforçar outras divisas e ouro, nas reservas do seu banco central. A China, não subiu quase nada o seu stock de "treasuries", apesar de continuar a ter um enorme excedente nas trocas comerciais com os EUA. Os dólares obtidos foram canalizados sobretudo par financiar projetos de países terceiros, nomeadamente os que aderiram ao projeto das Novas Rotas da Seda. O próprio Reino da Arábia Saudita, sentiu o vento mudar e agora já aceita outras moedas que não o dólar para pagar o seu petróleo. Sobretudo não aceita que os americanos os pressionem para aumentar a produção de petróleo, sendo contrário ao seu interesse direto baixar os preços. Os americanos queriam forçar a diminuição do preço do crude no mercado mundial, «punindo» assim a Rússia: Mais um fracasso diplomático, estratégico e económico, para os EUA.

Os povos estão sujeitos à ditadura do dólar, quer queiram quer não, pois ele reina ainda com  cerca de 60% das reservas de moeda dos bancos centrais do mundo e um pouco mais do que isso, ao nível das trocas financeiras e comerciais internacionais.  Porém, um forte dólar, não significa «boa saúde» do sistema. Antes pelo contrário, significa que todos os parceiros da «zona dólar», mesmo os mais próximos aliados, são castigados por uma inflação que importam, têm de comprar mercadorias com um dólar alto. Mas os EUA exportam seus dólares: São os emissores de dólares em quantidades nunca vistas (mais dólares em poucos anos, do que em toda a história dos dos EUA). O dólar em papel ou, mais frequentemente, seu substituto eletrónico, é o quase exclusivo «produto de exportação» dos EUA.

Esta situação não pode durar por muito mais tempo. Os povos, inclusive o americano, estão a sofrer com uma inflação em crescendo, mas  não podem fazer grande coisa ao nível individual, pouco mais do que «apertar o cinto». Mas, os Estados têm zero incentivo para conservar dólares em reserva, caso tenham a possibilidade de diversificar noutras reservas. Acontece que têm essa possibilidade, é o ouro: em 2022 (e ainda não acabou o ano) os bancos centrais globalmente aumentaram suas reservas em ouro em cerca de 700 toneladas (números oficiais). Muito ouro não contabilizado nessas 700 toneladas fica na posse de particulares. Muito do ouro adquirido por Estados não é declarado, mas mantido em segredo para anunciar quando politicamente conveniente (caso da China, mas não é o único).

É inevitável que se vá para um novo sistema monetário. A aposta dos Bancos Centrais Ocidentais e obviamente, dos governos e dos grandes interesses corporativos no Ocidente é de que haja uma digitalização a 100% do dinheiro em circulação. Esta seria a forma deles terem o controlo sobre tudo, literalmente: não só sobre quanto os cidadãos recebem, como quanto e onde o gastam e  mesmo com possibilidade de sua retenção, caso os cidadãos não sejam dóceis! Este tipo de deriva totalitária, tem o próprio BIS por detrás, como tenho vindo a chamar a atenção dos meus leitores. 

Mas, um grupo de países decidiu recentemente fazer uma nova unidade monetária de reserva,  juntando as suas divisas em cabaz, adossado ao ouro e a matérias-primas (a mais óbvia sendo o petróleo): Ele é protagonizado pelos BRICS e por países que se têm vindo a aliar a este bloco, que já conta com a maioria do população mundial. A sua força será tal que o projeto anglo-americano/Ocidental de nova moeda de reserva mundial, exclusivamente digital, com respetivas moedas nacionais também digitalizadas a 100%, terá seus dias contados, talvez não possa vingar de todo, porque essa nova unidade monetária de reserva projetada pelos ocidentais, além de ser digital, não estará apoiada em nada de concreto, será uma divisa «fiat», como as existentes agora. 

É este o verdadeiro grande jogo. Tristemente, é por isso que morrem pessoas, em todo o mundo, umas na guerra, outras de fome e doenças. Isto parece-me absurdo, na medida em que tudo isso é, somente, para determinar quem deterá o controlo, o poder, a hegemonia do novo sistema monetário mundial: Será somente o grupo submetido ao império americano (unipolaridade), ou umas grandes potências (além da americana), que se estabelecerão, em parceria e em concorrência umas com as outras. Este último, seria o mundo multipolar desejado pela China, pela Rússia e por seus aliados.

PS1: Uma possibilidade, compatível com ambos os cenários acima referidos, é a revalorização dos ativos em ouro dos vários bancos centrais. Assim seriam "liquidadas" todas as dívidas dos bancos centrais a todas as entidades, incluindo os Estados, portanto aos contribuintes desses Estados. Não esqueçamos que a dívida de uns é o ativo de outros. A digitalização a 100% seria paralela a uma revalorização do ouro, o que daria a impressão (falsa!) de que "está tudo na mesma". Mas, na verdade, não estará porque a relação do dinheiro Fiat ao ouro (o dinheiro verdadeiro) corresponderia a uma grande perda de valor desse mesmo dinheiro Fiat, quer seja digital ou não!

PS2: O petróleo, a matéria prima mais importante em termos mundiais, está a aproximar o maior consumidor mundial (a China) e a Arábia Saudita (com a Rússia e países da OPEP). O interesse de Riade em fazer parte dos BRICS é inegável. Esta viragem não parece ter sido antecipada pelos EUA. 

PS3: Portugal está relativamente bem situado com 382 toneladas de ouro no seu banco central. Mas teria de resgatar uma parte (quanto?), que está «reservada» devido a operações de «leasing». Veja a tabela seguinte: