A Rússia foi exposta a uma severa guerra de sanções, que começou pouco depois do golpe de Estado pró-ocidental de Maidan, em 2014. Porém, com a invasão russa da Ucrânia, os países do Ocidente, liderados pelos EUA, fizeram uma brutal (e obviamente ilegal) confiscação dos fundos em divisas, presentes nos bancos ocidentais e pertencentes ao Banco Nacional da Rússia (o banco central, detentor de ouro e divisas em reserva) confiscando também os bens de pessoas individuais, apenas por serem russas.
Face a esta atitude de extrema hostilidade dos poderes ocidentais, a reação da Rússia foi totalmente previsível: Desfazer-se das divisas de países hostis, que tinham tido parte nesse roubo. Cerca de metade das reservas em divisas estrangeiras da Rússia, as que se encontravam em bancos ocidentais, foram «congeladas», mas - na realidade - com a intenção de nunca mais as devolverem, pois a UE e os EUA têm estado a fazer planos para «reconstrução da Ucrânia», utilizando os fundos russos «congelados» (ou seja, roubados).
Naturalmente, surge agora a decisão de aumentar para o dobro a participação de ouro (de 20 para 40%) e de yuan (de 30% para 60%) permitidos para esse fundo soberano nacional da Rússia. Sem dúvida, os países hostis à Rússia não poderão esperar um qualquer interesse da Rússia em (continuar a) exportar energia (gás natural e petróleo) para eles. Terão de se abastecer junto de outros, no mercado internacional.
A estratégia deles, países ocidentais, querendo impor ao mundo um preço máximo sobre o petróleo, falhou redondamente com o «não» da Arábia Saudita e dos países da OPEP.
Mas, note-se, este desfecho inicia uma nova era, onde as economias dos dois blocos - euroasiático e «atlântico» - estão praticamente divorciadas, a própria China estando mais interessada em exportar para países seus amigos, do que para seus adversários geopolíticos que têm designado (oficialmente) a China como a principal ameaça.
Mesmo que a guerra russo-ucraniana acabe e se estabeleça num acordo de paz, é muito provável que se mantenha a partição entre o domínio do «yuan-ouro», ou seja, onde as notas de crédito em yuan (incluindo as de pagamento da energia) sejam convertíveis em ouro; e a «zona dólar», com os EUA e seus aliados anglo-saxões (Reino Unido, Austrália, Canadá Nova Zelândia), assim como a União Europeia (quase todos, membros da OTAN). Note-se que as zonas monetárias vão estar imbricadas: Existirão países no «Ocidente», que continuarão a ter boas relações com o Eixo Euroasiático, tais como o Brasil (membro dos BRICS), a Venezuela, a Argentina e outros da América Latina e Caraíbas. O mesmo, em relação a muitos países, antes tidos como pró-ocidentais, nos continentes Asiático e Africano.
Por outro lado, do Extremo Oriente ao Médio Oriente, por maior que seja o crescimento do comércio com a China, através das Novas Rotas da Seda, muitos países quererão manter boas relações com os EUA e o Ocidente, aos níveis económico e militar (armamento, sistemas de defesa, treino de tropas e cooperação em informação e espionagem,...).
Note-se também, que o Mundo, no decurso da 1ª Guerra Fria, experimentou severas restrições ao comércio internacional. Mas, o nível de sanções agora atingido, é tal que a chamada globalização vai apenas ser uma memória do passado. Com o comércio internacional sendo severamente atingido, haverá necessariamente um empobrecimento global. Isso irá também afetar todos os países que pretendem manter-se neutrais.
Creio que vai durar e ser muito significativo, dentro do conjunto de decisões monetárias, económicas e de defesa, o efeito desta decisão do Fundo Nacional russo. Vai estender-se muito para além do ano de 2023, que agora começa.
A guerra entre a Ucrânia (apoiada pela OTAN) e a Rússia, é um momento infeliz e transitório desta guerra mundial híbrida (a IIIª Guerra Mundial). Porém, tudo indica que esta medida não é de simples retaliação, face às sanções massivas dos países ocidentais: Será antes um mudar definitivo de rumo da Rússia, não apenas em termos de política monetária, mas também económica e geoestratégica.
3 comentários:
Se há uma personagem detestável e detestada nisto tudo é a ex-chanceler da Alemanha. Leia a análise de John Helmer:
For Merkel’s “problem to be solved” and “pacify Russia” read the US and NATO war to destroy Russia. “Today we act like this under the pressure of war,” she added, “which I approve of.”
http://johnhelmer.net/the-neutering-bomb-paralyses-millions-of-minds-faster-than-novichok-leaves-hands-free/
A integração progressiva dos vários países nas Novas Rotas da Seda é talvez o processo mais dinâmico que ocorre neste princípio de seculo. O processo tem várias vertentes, desde o plano de engenharia, a economia, estratégia, diplomacia, até aproximação política. Leia abaixo:
https://www.unz.com/pescobar/why-bri-is-back-with-a-bang-in-2023/
Acabou a era unipolar em 2022 e começa a era multipolar no ano novo de 2023, diz-nos Pepe Escobar, na sua escrita certeira:
https://strategic-culture.org/news/2023/01/07/bye-bye-1991-2022/
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