domingo, 25 de setembro de 2022

SE A CHINA IMPLODIR...

    15 Set. - Protesto em Shenzen, de investidores em Evergrande

Tenho acompanhado atentamente nestes últimos anos a situação económica interna da China, embora eu esteja longe deste imenso país, o mais populoso e a segunda maior economia, ao nível mundial. Este país realizou muitos «milagres» passando de país pobre, para um dos mais desenvolvidos e onde muitos milhões foram arrancados à pobreza. Porém, este desenvolvimento também exacerbou desequilíbrios, como o fosso entre ricos e pobres, que não cessa de se alargar (é um dos maiores a nível mundial), o enorme volume de construção para alojar milhões, vindos das zonas rurais do interior para as grandes cidades costeiras e muitas outras questões, que fragilizam a economia do gigante da Ásia. 

Talvez o maior problema económico atual da China seja a existência de um setor imobiliário que durante anos cresceu à custa da psicologia dos chineses: Com efeito, os chineses são dos povos mais poupadores do mundo. As famílias têm esse comportamento, interiorizado por séculos de cultura. Ora, perante a ausência de segurança nos produtos financeiros, visto que na China ainda são mais voláteis e perigosos que nos países ocidentais, os chineses viram no imobiliário um investimento seguro e «sólido» e usaram-no como meio de guardar as suas poupanças, mas também de crescer, nomeadamente pedindo emprestado a bancos locais. 

Por sua vez, estes bancos locais são propriedade ou estão associados aos governos regionais e estes têm interesse em que o imobiliário continue a desenvolver-se: Vai trazer muitos outros negócios, vai implantar novas indústrias, vai fixar as pessoas a essas províncias, etc. 

Mas, os negócios das grandes imobiliárias consistem em «esquemas de Ponzi» (ver o vídeo abaixo) e muitas pessoas ficaram com apartamentos inacabados nas mãos (invendáveis, portanto). Como elas tinham pedido empréstimos a essa banca local, é evidente que estes empréstimos ficarão por pagar. 

Não sei até que ponto e durante quanto tempo, o Banco central da China (por ordem do Partido Comunista) poderá continuar a colmatar as enormes perdas dos referidos bancos. Se eles não fossem recapitalizados, mais de metade já estaria em falência total. 

Os blocos de apartamentos inacabados, ou sem condições de habitabilidade, nas chamadas cidades-fantasma, são um monumental desperdício de matéria, energia, de trabalho e capital. Estes grandes blocos de apartamentos têm sido implodidos. 

O ruir destas aventuras especulativas das grandes imobiliárias, de que «Evergrande» é somente o exemplo mais conhecido no Ocidente, tem muitas implicações, quer ao nível da banca local, quer da confiança dos cidadãos chineses nas instituições e  vai fazer com que os grandes investidores dos países ocidentais saiam da China, onde estavam investidos em setores de ponta, de alta tecnologia. 

Não será exagero pensar que a economia capitalista dinâmica da China, nestes últimos decénios, em que tudo era facilitado para que houvesse um máximo de investimento (sobretudo estrangeiro) na economia, arrisca transformar-se numa economia em marasmo, onde a confiança de investidores chineses e estrangeiros desapareceu e onde o Estado central acaba por sabotar - ele próprio - o Yuan, multiplicando a impressão (eletrónica) monetária, no afã de «resolver» os problemas graves e estruturais da economia, inundando-a com dinheiro frescamente impresso. Estratégia aliás adotada pelos países ocidentais, com os resultados desastrosos que já são visíveis, mesmo pelas pessoas mais míopes! 

Neste vídeo, a apresentadora explica em resumo toda a amplitude da bolha imobiliária chinesa e por que razão se trata realmente dum Esquema de Ponzi. 

A conexão com as economias dos países ocidentais continua a ser muito forte, facto que é obscurecido pelas tensões aos níveis político e de geoestratégia. 


[O documentário é falado em francês. Pode-se acionar a legendagem automática em francês para melhor compreensão.]


 

sexta-feira, 23 de setembro de 2022

REFERENDOS NAS REGIÕES RUSSÓFONAS DO LESTE E SUL DA UCRÂNIA

 Tenho acompanhado a crise e a guerra na Ucrânia por consulta regular de fontes credíveis, na circunstância de um claro viés a favor da Ucrânia e contra a Rússia, independentemente do que seus governos façam, por parte da media ocidental. Nisso, estão a descredibilizar-se, no longo prazo. Mas, no curto prazo, estão a participar ativamente na guerra de propaganda, ou guerra psicológica, lançada pelas forças da NATO, com especial virulência desde que Putin e a Rússia se afastaram da agenda neoliberal e adotaram posições de defesa da Rússia, do seu povo e dos seus recursos vitais. 

Abaixo, transcrevo e traduzo uma parte do excelente artigo do excelente Blog «Moon of Alabama»:

https://www.moonofalabama.org/2022/09/historic-context-of-the-referenda-in-ukraine.html#more

[...]

" A divisão é consistente com as diferenças étnicas e linguísticas entre aquelas partes da Ucrânia.


maior

Em 2014, após o violento golpe fascista em Kiev, uma das primeiras leis que foram implementadas pelo novo governo removia o russo enquanto língua de uso oficial. Em vez de ultrapassar as diferenças entre etnias do seu povo, isso apenas reforçou a divisão predominante na Ucrânia.

A promessa eleitoral do atual presidente Vladimir Zelenski, de fazer as pazes com os rebeldes pró-russos das regiões do Don, pondo em prática as decisões dos acordos de Minsk 2foi recompensada com larga parte de votos do sul e do leste, para a sua eleição como presidente. No entanto, após ter sido ameaçado de morte por fascistas, Zelenski fez uma viragem de 180 graus e tem-se posicionado, desde então, como nacionalista ucraniano. Em consequência disso, perdeu todo o apoio popular das regiões do Leste e Sul da Ucrânia.

As regiões do Sul e Leste da Ucrânia de hoje, foram - durante séculos - parte do Império Russo. Foram somente adicionadas à República Socialista da Ucrânia no tempo de Lenine em 1922 e, no caso da Crimeia somente em 1954, por Nikita Khrushchev, ele próprio originário da região do Don.


maior

É verosímil que ocorra uma elevada votação e um voto maioritário para adesão à Federação Russa, o que apenas irá corrigir um desarranjo histórico, criado por essas transferências ilógicas."

PS1: Graças a Paul Craig Roberts podemos ler na íntegra e em tradução em língua inglesa a comunicação feita pelo Presidente Putin há alguns dias quando anunciou os referendos e a mobilização parcial dos reservistas. Encontra-se no link : https://www.unz.com/proberts/putins-address-to-the-russian-people-september-21-2022/

Abaixo, transcrevi a parte final deste discurso, que causou tanta celeuma, devido à distorção intencional pela media ocidental. A censura é a prova cabal de que não existe democracia, seja qual for o significado exato que se dê à palavra «democracia». Se ela jamais existiu, deixou de existir. 

Dear friends!

In its aggressive anti-Russian policy, the West has crossed every line. We constantly hear threats against our country, our people. Some irresponsible politicians in the West are talking about plans to organize the supply of long-range offensive weapons to Ukraine – systems that will allow strikes on Crimea and other regions of Russia.

Such terrorist strikes, including those using Western weapons, are already being carried out on border settlements in the Belgorod and Kursk regions. In real time, using modern systems, aircraft, ships, satellites, strategic drones, NATO carries out reconnaissance throughout the south of Russia.

Washington, London and Brussels are directly pushing Kiev to transfer military operations to our territory. Without hiding their intention any longer, they say that Russia must be defeated at all costs on the battlefield leading to the loss of all Russian sovereignty, the complete plundering of our country, and the destruction of Russian political, economic, and cultural existence.

Nuclear blackmail is also used. We are talking not only about the Western-encouraged shelling of the Zaporizhzhya nuclear power plant, which threatens an atomic catastrophe, but also about the statements of some high-ranking representatives of the leading NATO states about the possibility and admissibility of using weapons of mass destruction against Russia – nuclear weapons.

For those who allow themselves such statements regarding Russia, I would like to remind you that our country also has various means of destruction, and in some components – more modern than those of NATO countries. And when the territorial integrity of our country is threatened, we certainly will use all the means at our disposal to protect Russia and our people. It’s not a bluff.

Russian citizens can be sure that the territorial integrity of our Motherland, our independence and freedom will be ensured, I stress this again, by all the means available to us. And those who try to blackmail us with nuclear weapons should know that the same can happen to them.

It is in our historical tradition, in the fate of our people, to stop those who are striving for world domination, who threaten to dismember and enslave our Motherland, our Fatherland. We will do it now, and so it will be.

I believe in your support.

CONCERTO Nº1 PARA PIANO E ORQUESTRA, DE PROKOFIEV [solista: Lugansky]


 Leia AQUI uma nota sobre o jovem Prokofiev e a génese deste magnífico concerto para piano!

quinta-feira, 22 de setembro de 2022

COLAPSO PROGRAMADO

A maior parte das pessoas concebe o governo do seu país e suas instituições públicas como dedicando-se ao bem público, a fazerem os possíveis para manter a economia em funcionamento, protegendo os cidadãos - tanto quanto possível - das tempestades vindas do exterior. Esta visão ingénua é que permite aos governos fazer suas manobras contra os interesses da generalidade das pessoas, em favor de uma pequena minoria. Esta pequena minoria não está sentada à roda de uma mesa, a congeminar criminosas conjuras, para extrair o máximo de vantagens dos seus respetivos países, causando a desgraça dos seus cidadãos. Não, esta pequena minoria de multimilionários tem as mãos «limpas» na aparência, pode até dar-se ao luxo de se apresentar com a cara da filantropia. Na realidade, ela tem os seus mais fieis servidores na classe política, mais precisamente, naqueles indivíduos desta casta, que não têm nenhum limite para satisfazer a sua ambição de «subir» aos postos de poder. São sociopatas, que apenas disfarçam com habilidosas mentiras, o papel que desempenham. Esta simulação é indispensável para justamente poderem levar a cabo esse papel de que estão incumbidos.




Aquilo que os mais poderosos bancos centrais têm estado a fazer, coordenadamente, também é conducente a um colapso. A impressão (eletrónica) non-stop de divisas, para suprir as situações criadas pelos governos, é um exemplo nítido. Estão a fazer em simultâneo, aquilo que seria contraditório, em teoria, com a impressão monetária (fator inflacionário): A subida das taxas de juro, pelos bancos centrais (efeito deflacionário) vai provocar a contração brutal da economia real. Esta, já tinha sido muito afetada pelos «lockdown» e pelas outras restrições aquando da «pandemia do século» e, logo de seguida, pela guerra Russo-Ucraniana. Como sabemos, esta foi instigada e alimentada com um fluxo constante de armamentos para a Ucrânia. Na realidade, para irem parar em 90%, ao mercado negro, sendo o seu destino final mais provável, os grupos terroristas internacionais. Mas a «generosidade» do Ocidente não se limita ao envio de armamento. Tem enviado biliões e biliões de dólares e de euros que - numa grande parte - vão parar às contas no estrangeiro de Zelensky e dos neonazis do seu governo e de  plutocratas como Kolomoyskyi. Este «apoio» à Ucrânia, é como despejar o dinheiro dos nossos países ocidentais «na sargeta», e eles - os «nossos» governantes - sabem-no melhor que ninguém.
Como classificar, senão como assassinato premeditado, o que o governo alemão e outros governos ocidentais têm feito, em relação à energia dos seus próprios países? Eis o facto ocultado aos cidadãos (a verdade é a primeira baixa de uma guerra): Não foi Putin que decidiu cortar o fornecimento de gás aos seus clientes ocidentais. Foram os próprios a inviabilizar a continuidade do envio de gás pelos gasodutos, recusando fazer a manutenção e reparação dos aparelhos de bombeamento, como estava contratualmente fixado. Além disso, é absurdo pensar que os russos desejassem interromper o fornecimento de combustíveis à Europa ocidental, dado que continuaram a fornecer gás, até há bem pouco tempo: Se fosse essa a intenção do governo russo, teria logo cortado o gás, em Fevereiro ou Março deste ano, como retorsão às sanções selvagens feitas pelos países da NATO contra a Rússia. Só uma propaganda desenfreada da media pode ter afirmado o oposto. Com efeito, não foi a Europa Ocidental que decretou um embargo a toda a importação de energia da Rússia??
E, quanto a fertilizantes químicos, a situação é trágica e grotesca: Grande parte dos fertilizantes químicos usados no Ocidente, é importada da Rússia. Quanto ao fertilizante fabricado localmente, é feito a partir do gás natural russo. O corte drástico (pelas sanções da UE) da importação de fertilizante, conduz à baixa drástica da fertilidade dos solos. Vai cair-se numa situação análoga à do Sri Lanka*, em países ditos «mais desenvolvidos». Estes mesmos, acabaram por ficar com mais de 90% dos cereais, provenientes da Ucrânia e destinados, em princípio, a evitar situações de carência alimentar em África e noutras partes do Terceiro Mundo. Lembremos que, para desobstruir a exportação de cereais ucranianos, houve uma negociação, em que o Secretário-Geral da ONU, Guterres, desempenhou um papel de relevo.
Os multimilionários têm os seus homens e mulheres de mão, quer nos governos, quer em órgãos de «governança» internacional (Comissão Europeia, ONU, FMI, etc). Eles tiveram a surpresa de um cenário imprevisto, de resiliência da economia russa. Hoje, é claro que as sanções brutais contra ela, tiveram o efeito oposto.
Outros aspetos importantes da estratégia ocidental também foram um fiasco: a ausência do pretendido isolamento internacional da Rússia, a não caída da China na armadilha da ida de N. Pelosi a Taiwan, o acelerar da construção dos BRICS, da Organização de Segurança de Xangai, o fortalecimento dos laços russo-chinês, etc. Por fim, não se pode exagerar a importância da construção da nova moeda de reserva mundial, fazendo com que o mundo não esteja mais sujeito à hegemonia do dólar.
Perante este panorama, o Império tinha de reagir. Houve uma clara subida de tom e conteúdo agressivo nos discursos de Joe Biden, ameaçando a Rússia e a China. 
Também se conhece a conversa telefónica entre Scholz e Putin, em que o primeiro aconselhou o presidente russo a procurar a paz, devolvendo todos os territórios conquistados, não apenas os territórios do Donbass, as repúblicas autoproclamadas, como até mesmo a Crimeia, integrada na Federação Russa desde 2014 por referendo. «Aconselhar» isto a alguém que não tem nenhuma intenção de ceder neste ponto e que está - de facto - em condição de defender eficazmente esses territórios de população russófona, pode ser interpretado como «fútil», ou como provocação. Poderá mesmo ter acelerado a decisão de efetuar referendos (para integração na Federação Russa) nas referidas regiões.
A situação tem piorado tanto, que estamos agora numa prática ausência de diálogo entre grandes potências. Esta situação é inédita, pois no tempo da URSS, houve sempre muita prudência, de parte a parte, para não quebrar o contacto, mesmo em situações de agravamento das tensões (por ex. : crise dos mísseis em Cuba).
Parece inegável que a maioria dos que votaram nos presidentes e governos dos países da NATO não deseja a guerra. Aliás, é provável que o mesmo se passe com muitos cidadãos russos. Então, porque motivo tudo conduz à continuação da guerra? Porque razão há clara ameaça dela se intensificar, se alargar e se tornar nuclear?
- Não acredito que o «Estado Profundo» nos EUA, os grupos de neocons incrustados nos vários departamentos do governo e em agências como a CIA, sejam poderosos ao ponto de ditar a orientação da Administração Biden. Quanto muito, eles poderão exacerbar algo que é instilado da «retaguarda» pelos interesses corporativos (por ex.: indústrias de defesa e outras).
Provavelmente «think tanks» como a RAND (e outros) têm influenciado a Casa Branca a adotar uma estratégia para enfraquecer a UE. Do ponto de vista da hegemonia americana, a Europa representa uma «concorrente amiga»; caso continuasse a receber o gás e o petróleo russos baratos, poderia ultrapassar economicamente os EUA. Ela também é vista como concorrente devido ao seu elevado nível tecnológico.
Ora, segundo a doutrina seguida nos últimos 30 anos (ver PNAC, Wolfovitz e Brzezinski ), os EUA não devem permitir que um poder fique ao nível de concorrer diretamente com o poderio americano, não só em termos militares, como de economia. Faz todo o sentido que a NATO, dominada pelos americanos, tenha forçado a rutura com os russos. Em finais de 2021 a diplomacia russa tentava negociar um arranjo que satisfizesse todas as partes. Este esforço diplomático foi completamente sabotado pelos EUA e por outros países da NATO.
Assim, os europeus foram fazer mais uma guerra «por procuração» em benefício do Império americano, sendo os ucranianos a carne para canhão (no sentido literal). As populações da Europa ocidental foram sujeitas a uma campanha terrorista de condicionamento psicológico, o que permitiu às «elites» desencadear as medidas agressivas contra a Rússia e seus aliados, assim como o apoio sem restrições ao regime ultra-direitista de Zelensky. Isto permite-lhe, a esta «elite» governamental, impor uma austeridade inédita aos seus povos, não motivada pela necessidade, mas porque as sanções contra a Rússia, segundo eles, «irão, no longo prazo, ter efeito»!


A lógica profunda disto tudo, é que se está a acelerar a imposição da Nova Ordem Mundial, mas não a dos sonhos ingénuos da «globalização feliz». Será - como eu previ, desde Fevereiro passado - uma nova Guerra Fria: Os dois blocos irão repartir o Mundo (e a Europa será partida a meio) entre o eixo Euroasiático, aos quais se associarão certos países do Terceiro Mundo, enquanto o Eixo Atlântico (também envolvendo potências como Japão, Coreia do Sul, Austrália, Nova Zelândia), terá uma NATO alargada para lá da Europa e América do Norte.

PS1: Confirma-se plenamente o que eu escrevi no início de Agosto: «Os supostos erros destes últimos anos, acima referidos, não são erros, são estratégias para conduzir as populações a aceitarem passivamente a imposição da Nova Ordem Mundial. Este é um projeto de fundo das classes dominantes dos países «Ocidentais». »

PS2: Os empresários europeus estão já a pensar transferir as indústrias sediadas na UE para os EUA, devido à subida exponencial dos custos energéticos. Assim, a desindustrialização da Europa acentua-se e os EUA são de novo industrializados... Leia:


PS3: Desenganem-se os que pensam que o dólar está «forte» porque sobe relativamente a outras divisas (libra, euro, yen) ocidentais. Não será isso uma «vitória pírrica»? A descapitalização súbita nestes aliados dos EUA, vai provocar um agravamento da crise económica.  Neste mundo interconectado, a fragilidade num ponto, transmite-se instantaneamente aos outros. O próprio dólar, no médio/longo prazo,  tem-se desvalorizado muito em relação ao ouro: desvalorizou-se de 92%  desde que em 1971 Nixon retirou o dólar da relação fixa ao ouro, resultante dos acordos em BrettonWoods. 

PS4: Na Alemanha, os preços da lenha subiram, numa base anual, de 87%, enquanto o aumento geral dos preços foi de 7,9%:

PS5: Piepenburg defende que a FED irá destruir a economia mundial com a sua insistência nos aumentos da taxa de juros. Leia o porquê, neste artigo : https://goldswitzerland.com/the-feds-strong-usd-policy-a-recipe-for-systemic-implosion/

 
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* O Sri Lanka passou de país autossuficiente em géneros alimentares, a um estado de grave deficiência, porque o seu governo (corrupto) decidiu a conselho de «peritos» ocidentais passar sem transição para uma agricultura «biológica» (sem fertilizantes químicos). Resultado: Queda brutal da produtividade e fome, que resultou em revolta.

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

TERESA TENG, «DIVA» DA FORMOSA, CEDO DESAPARECIDA



 Teresa Teng (1953  1995), foi na sua curta vida idolatrada por vários povos do Oriente, não apenas da Formosa (onde nasceu), na China continental ou em Hong Kong, mas também em Singapura, Malásia, Indonésia e Japão. 

A sua extraordinária voz expressiva, assim como a sua capacidade de comunicar facilmente com o público nos espetáculos, explicam em parte o seu sucesso. Mas, creio que a qualidade dos arranjos e inteligentes orquestrações de canções tradicionais e canções pop, foram também responsáveis pelo seu sucesso. Gravou canções em mandarim, cantonês, vietnamita, indonésio, japonês e inglês

Embora o seu talento a tenha projetado desde muito cedo para a celebridade, a sua carreira foi interrompida pela morte aos 42 de idade, devido a ataque de asma quando em férias na Tailândia, em 1995. Mas, nunca deixou de estar presente no povo chinês, que continua a cultivar a sua memória - geração após geração.

Nesta pequena seleção incluí canções em inglês, mandarim, cantonês e indonésio. Escolhi doze vídeos, dos mais de 200, gravados ao vivo ou em disco, que se podem ouvir/ver no Youtube. 

CLICA NO TÍTULO ABAIXO, PARA OUVIRES:

 TERESA TENG, FORMOSA




segunda-feira, 19 de setembro de 2022

A ILHA FORMOSA (TAIWAN) E PORTUGAL

 

Eu prefiro a designação «Formosa» dada a essa ilha dos mares do Sul da China pelos portugueses, no século XVI, quando tinham alcançado com suas frotas mercantes esses mares e tinham ajudado o Império do Meio a ver-se livre de piratas que enxameavam a costa. Os portugueses eram força ínfima, face à força considerável do Império da China. Este Império, no seu auge de poderio era generoso para com estrangeiros, desde que estes fossem não hostis. Ofereceu à coroa portuguesa o estabelecimento de um entreposto de comércio, num ponto da costa. Assim, Macau (Cidade do Nome de Deus), nunca foi uma colónia portuguesa, mas um porto franco. No contexto político regional de então, a aliança estabelecida entre o Reino de Portugal e o Império da China foi - antes de mais - construída sobre a base pragmática do interesse mútuo. Era a primeira versão marítima das Rotas da Seda. As Rotas da Seda terrestres passavam, como é sabido, pela Ásia Central e Médio Oriente, transportando preciosos bens nos dorsos de dromedários. 

Era a Rota das Especiarias dos portugueses, que se estendia até às ilhas ricas em especiarias que hoje são parte da Indonésia. Este comércio era muito perigoso, devido aos piratas que infestavam os mares. Sabem-no os que leram a «Peregrinação» de Fernão Mendes Pinto - um relato autobiográfico de viagens pelo Oriente tão vívido e rigoroso, que continua a ser um precioso repositório de dados sobre os reinos do extremo-oriente da época e sobre o relacionamento dos portugueses com eles.

Mas, a Ilha Formosa - para darmos um salto até ao século XX - parte integrante da China histórica, foi refúgio do Kuomintang, ou seja, do partido nacionalista que combateu contra o Partido Comunista da China na guerra civil, que se traduziu pela derrota dos nacionalistas e pela proclamação de República Popular da China, em 1949. No decurso dessa longa guerra civil e de libertação contra os invasores japoneses, os do Kuomintang não foram sempre adversários dos exércitos imperialistas japoneses, havendo casos em que o exército comunista teve de combater ao mesmo tempo dois inimigos, os nacionalistas e os japoneses. 

                              Chiang Kai-shek, quando jovem 

O refúgio da ilha Formosa, para Chiang Kai-shek e o seu derrotado exército do Kuomintang, foi tornado possível pela assistência - o salvamento - dos americanos, que eram seus aliados. 

Os americanos - em 1945 - tinham já vencido militarmente o exército imperial japonês e, apesar de tudo, cometeram o maior crime contra a humanidade, em Hiroxima e Nagasaki. Note-se que os japoneses tinham previamente dado múltiplos sinais diplomáticos de que desejavam render-se aos americanos, por medo de serem invadidos e ocupados pelo exército soviético. O apoio americano ao Kuomintang deu-se no contexto da nascente Guerra Fria, perante uma União soviética vitoriosa, que eles temiam se alastrasse pelos territórios do extremo-oriente. 

Aliás, já em finais da IIª Guerra Mundial, a luta entre Partido Comunista e Kuomintang assumiu rapidamente o significado de luta entre a URSS e os EUA, uma das guerras por procuração (proxi wars) que marcaram o pós-II Guerra Mundial. O período de 1945-1991, não foi um período de paz, nem de «Guerra Fria» sequer, mas uma sucessão ininterrupta de guerras regionais, bem «quentes» e mortíferas, com exércitos ou grupos de guerrilha, pertencentes a fações opostas, apoiadas pelas forças da NATO e dos EUA, por um lado;  pela URSS + outros membros do Pacto de Varsóvia e pela China Popular, por outro. 

A sabedoria da civilização multimilenar chinesa, explica -em grande parte - que a China continental não tenha nunca invadido Taiwan/Formosa, como não invadiu Hong-Kong, nem Macau. A sabedoria filosófica do Confucionismo, conjugada com o Taoismo de Lao Tseu, deu o saber teórico e prático de como conduzir os assuntos do Estado, sendo a Arte da Guerra  do general Sun Tzu  a obra literária de estratégia -política e militar - mais conhecida, no Ocidente.

Eu acredito que as pessoas com responsabilidades políticas, de um e outro lado do estreito, que separa a Ilha Formosa da China Continental, tenham em conta os interesses respetivos dos povos, que governam. Acredito que resistirão às provocações e manipulações dos imperialistas anglo-americanos, que nunca param de se imiscuir em assuntos internos dos chineses. Se o povo da Ilha Formosa se considera parte da «China eterna», independentemente do que pense sobre o regime que vigora em Pequim, se o regime do Partido Comunista da China Continental respeita a sua própria palavra solene dada perante todo o povo (e internacionalmente), então os respetivos líderes encontrarão uma solução que será pacífica e que pode até ser um modelo de conciliação nacional. 

- Será sonhar demais? 

- Não me parece, pois a civilização chinesa, a mais antiga e sábia civilização que superou tantos momentos críticos da sua história, tem muito caminho para percorrer no futuro. 

Eu sei que Portugal é mantido, politica e militarmente, na contemporânea «prisão dos povos», a Aliança Atlântica, mas a vocação dos portugueses sempre foi universal. Penso que o coração deste pequeno povo está com a China e com seu povo.

sábado, 17 de setembro de 2022

A GRANDE ARMADILHA DA FINANÇA

                       A armadilha da finança, com computador e isco de dólares gratuitos 


Quando estamos a presenciar, nas bolsas, um movimento em alta (mercado altista ou «bull market»), na realidade, estamos a presenciar um movimento de descida do dólar e das restantes divisas ocidentais. O paradoxo é fácil de explicar: Sabemos que o dinheiro «fiat», não é mais do que crédito, do que dívida. Essa dívida é tanto mais procurada quanto os países emissores da referida dívida sejam considerados seguros, no que respeita a assumirem os seus compromissos. Ora, ninguém pode ignorar que os EUA e Europa estão a viver, há muito tempo, numa bolha artificial causada pelos respetivos bancos centrais. O volume da dívida é avassalador e, essencialmente, incobrável: Considera-se ser incobrável, quando atinge valores da ordem de 100% do PIB. Hoje, no Ocidente, existem vários Estados endividados a 130% ou mais do PIB. As obrigações soberanas de ambos os lados do Atlântico têm de subir, pois há cada vez menos investidores (são sobretudo institucionais: bancos, fundos de pensões, hedge funds) que desejem tomar essa dívida dos Estados. Os Estados têm pois que subir os juros oferecidos, sem o que não conseguirão compradores para sua dívida.

                                       

Não é a quantidade irrisória do aumento da taxa de juro de referência da FED (ou do ECB) que vai mudar algo substancial. Na realidade, o aumento dos juros de referência dos bancos centrais segue sempre a tendência altista dos juros no mercado geral de obrigações (que inclui as obrigações de empresas).
Estamos perante um dilema impossível de resolução. Porque, sendo a dívida pública (e privada) tão elevada, havendo obrigação de inscrever nas contas públicas dos Estados os juros das obrigações que emitiram, é evidente que se chegou ao ponto onde já não se pode manter esta situação com o simples «renovo» («roulement») da dívida, ou seja, pagar dívidas que chegam a termo, com empréstimos frescamente obtidos.
Existe uma acumulação de dívida. Ela vai subindo de forma praticamente contínua, dada a degradação da situação económica em geral (crise devida à desindustrialização no Ocidente). Além disso, há circunstâncias particulares (crise do COVID, guerra na Ucrânia e as sanções contra a Rússia) que surgem, fazendo com que os governos despejem a rodos mais e mais euros ou dólares. Com isso, estão a adiar, no melhor dos casos (e podem até apressar), o colapso inscrito não «nos astros», mas nos factos económicos puros e duros. Nunca uma crise da dívida poderá ser resolvida com a acumulação de mais dívida.
Se o valor de uma moeda é realmente correspondente àquilo que uma determinada unidade dessa mesma moeda consegue comprar, então o dólar e todas as moedas «fiat» existentes têm perdido valor. A inflação não deve ser vista como fenómeno de «aumento dos preços» das mercadorias, mas como perda da capacidade aquisitiva da divisa. Assim, os que têm um rendimento fixo - sejam assalariados, ou pensionistas - vão perdendo o seu poder de compra de maneira acelerada, pois - geralmente - não possuem suficiente força para obrigar os patrões a fazer os ajustamentos devidos aos montantes de seus salários e pensões. Mas, para o Estado e para os grandes capitalistas que são, em geral, grandes devedores, a inflação é uma benesse pois, graças a ela, o que realmente terão de pagar, quer em juros, quer o montante próprio da dívida, vai representar cada vez menos em valor real, até se tornar irrisório.
Em todos os casos, as divisas fiat vão sempre diminuindo de valor: umas vezes, de modo suave e dificilmente quantificável e outras, de modo brusco, aquando de crises económicas (como agora).
Mas, no Ocidente, a classe política e os governos estão exclusivamente interessados no curto prazo. Eles fazem o raciocínio seguinte:
- os eleitores têm de estar contentes e satisfeitos no curto prazo;
- assim, irão votar em nós e manter-nos no poder nas próximas eleições;
- no curto prazo, a injeção de dinheiro na «economia» (= nos bancos e nas bolsas) irá criar uma «sensação de crescimento»;
- o estado real da economia deve ser camuflado, para evitar o descontentamento popular;
- os défices das contas públicas vão-se aprofundando, mas a dívida só será paga pelas gerações futuras, quando nós tivermos morrido, ou quando estivermos reformados.
A «economia da dívida» gera um enorme travão ao crescimento autêntico e induz à estagnação, porque implica  um desinvestimento no que seja inovador e produtivo. O que os Estados têm feito, essencialmente, é uma gestão cosmética das finanças, para poderem agradar aos eleitores. Claro que isto também agrada muito aos grandes capitalistas financeiros, que sabem obter vantagens da situação, mesmo quando se lamentam na comunicação social.
Assim, entrámos num período de «stagflation» (inflação com estagnação), ou seja, temos o pior dos dois mundos. Porém, esta situação não se irá manter por muito tempo. É praticamente uma certeza, que se irá entrar - não a longo prazo - numa espiral hiperinflacionária.
A situação da economia mundial é não previsível, no curto prazo; mas, nas suas grandes linhas, há coisas que são certas. Considera a seguinte metáfora: Não há maneira de sabermos exatamente o trajeto duma bola, quando atirada ao ar; mas, todos os trajetos possíveis estão condicionados pela gravidade e, portanto, sabemos que a bola irá acabar por cair no chão.
O mundo financeiro não é nada sem a economia real. A finança é uma espécie de parasita da economia real e consegue sugar muita energia e produtividade, causando prejuízo à sociedade, em geral, aos que trabalham, que investem o seu esforço e criatividade.
Porém, as pessoas são atraídas para o casino das bolsas, para o lucro sem esforço e sem contribuir com algo (além do dinheiro, que é somente um símbolo). Como todo o mundo da finança, as bolsas, as atividades especulativas, não criam - em si mesmas - nem «um grama de valor».
Então, de onde vêm os grandes lucros gerados? Eles têm de vir de algum lado: por um lado, foram arrancados a muitos ingénuos que foram atraídos pelo casino bolsista e ficaram depenados. Mas, a maior quantidade de valor foi desviada, roubada do nosso bolso e sob os nossos olhos:
- Desde as isenções fiscais aos muito ricos e às grandes empresas, até às «privatizações», ou seja, o roubo organizado ao património das empresas públicas, pago durante gerações com os nossos impostos. As «joias da coroa» do setor público, são empresas do Estado, que dão lucro garantido ou que, potencialmente, poderão fazê-lo.
O Estado fica com as empresas não rentáveis. Mesmo o governo mais favorável aos interesses privados aceita isto. Compreende que é essencial manter a funcionar esses serviços, para a própria sobrevivência da sociedade e do Estado. O interesse dos capitalistas numa privatização deste tipo de empresa estatal é muito baixo: Só pode ser estimulado com a garantia de benesses constantes, da parte do Estado, que assim torna «rentáveis», empresas que não têm, ou deixaram de ter rentabilidade. Pense-se no caso dos caminhos-de-ferro: A rede ferroviária, pouco ou nada rentável, é dificilmente privatizável. Mesmo quando há privatização, é frequente ser parcial. Os carris continuam a pertencer a uma empresa estatal, enquanto os comboios, incluindo os de alta velocidade, são privados ou pertencem a parcerias público-privadas.
Mas, para voltar ao tema deste artigo: A finança está interessada em extrair valores seguros de empresas dos setores industriais, estatais, ou do imobiliário*. Ela sabe quais são os investimentos que terão um bom valor, após o «Reset», ou seja, após a queda programada das moedas que conhecemos, a sua colocação fora de circulação e a instauração da moeda digital sob controlo dos bancos centrais.
Para se capitalizar ao máximo, a alta finança tem atraído os capitais pertencentes a pessoas da classe média, que irão perder o seu património, com a vã esperança de se tornarem «ricas». O jogo é portanto de predação, só que esta não se traduz em guerras diretas (até agora...) entre imperialistas; haverá, quanto muito, guerras por procuração. Sob capa da crise financeira e das outras crises, trata-se duma guerra aos pobres: «Não terás nada e serás feliz». Mas, o que Klaus Schwab e seus epígonos não nos dizem, é que os super-ricos, caso triunfe o tal «Great Reset», irão ficar com tudo. Tendo em conta esta tomada de controlo económica, pode-se facilmente prever quais os seus reflexos políticos: Seria o advento dum totalitarismo planetário.
Felizmente, o fiasco do neoliberalismo** é cada vez mais notório; não consegue mobilizar o entusiasmo dos povos. Mas, como os muito ricos malthusianos têm grande poder de influência, graças à media e aos governos (que eles compraram), não se deve «baixar a guarda», mas expor o mais possível as manobras desta oligarquia para que ela fique cada vez mais isolada.

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(*) Não é por acaso que os fundos financeiros Blackrock e Vanguard (gigantes mundiais) se tornaram nos maiores proprietários de imobiliário para arrendamento, nos EUA. Nem que Bill Gates se tenha (recentemente) transformado no maior proprietário de terrenos agrícolas nos EUA. 
(**) O lema do neoliberalismo é o seguinte: «privatização dos lucros, socialização dos prejuízos»