Muitas pessoas aceitam a situação de massacres de populações indefesas em Gaza e noutras paragens, porque foram condicionadas durante muito tempo a verem certos povos como "inimigos". Porém, as pessoas de qualquer povo estão sobretudo preocupadas com os seus afazeres quotidianos e , salvo tenham sido também sujeitas a campanhas de ódio pelos seus governos, não nutrem antagonismo por outro povo. Na verdade, os inimigos são as elites governantes e as detentoras das maiores riquezas de qualquer país. São elas que instigam os sentimentos de ódio através da média que controlam.
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sábado, 17 de setembro de 2022

A GRANDE ARMADILHA DA FINANÇA

                       A armadilha da finança, com computador e isco de dólares gratuitos 


Quando estamos a presenciar, nas bolsas, um movimento em alta (mercado altista ou «bull market»), na realidade, estamos a presenciar um movimento de descida do dólar e das restantes divisas ocidentais. O paradoxo é fácil de explicar: Sabemos que o dinheiro «fiat», não é mais do que crédito, do que dívida. Essa dívida é tanto mais procurada quanto os países emissores da referida dívida sejam considerados seguros, no que respeita a assumirem os seus compromissos. Ora, ninguém pode ignorar que os EUA e Europa estão a viver, há muito tempo, numa bolha artificial causada pelos respetivos bancos centrais. O volume da dívida é avassalador e, essencialmente, incobrável: Considera-se ser incobrável, quando atinge valores da ordem de 100% do PIB. Hoje, no Ocidente, existem vários Estados endividados a 130% ou mais do PIB. As obrigações soberanas de ambos os lados do Atlântico têm de subir, pois há cada vez menos investidores (são sobretudo institucionais: bancos, fundos de pensões, hedge funds) que desejem tomar essa dívida dos Estados. Os Estados têm pois que subir os juros oferecidos, sem o que não conseguirão compradores para sua dívida.

                                       

Não é a quantidade irrisória do aumento da taxa de juro de referência da FED (ou do ECB) que vai mudar algo substancial. Na realidade, o aumento dos juros de referência dos bancos centrais segue sempre a tendência altista dos juros no mercado geral de obrigações (que inclui as obrigações de empresas).
Estamos perante um dilema impossível de resolução. Porque, sendo a dívida pública (e privada) tão elevada, havendo obrigação de inscrever nas contas públicas dos Estados os juros das obrigações que emitiram, é evidente que se chegou ao ponto onde já não se pode manter esta situação com o simples «renovo» («roulement») da dívida, ou seja, pagar dívidas que chegam a termo, com empréstimos frescamente obtidos.
Existe uma acumulação de dívida. Ela vai subindo de forma praticamente contínua, dada a degradação da situação económica em geral (crise devida à desindustrialização no Ocidente). Além disso, há circunstâncias particulares (crise do COVID, guerra na Ucrânia e as sanções contra a Rússia) que surgem, fazendo com que os governos despejem a rodos mais e mais euros ou dólares. Com isso, estão a adiar, no melhor dos casos (e podem até apressar), o colapso inscrito não «nos astros», mas nos factos económicos puros e duros. Nunca uma crise da dívida poderá ser resolvida com a acumulação de mais dívida.
Se o valor de uma moeda é realmente correspondente àquilo que uma determinada unidade dessa mesma moeda consegue comprar, então o dólar e todas as moedas «fiat» existentes têm perdido valor. A inflação não deve ser vista como fenómeno de «aumento dos preços» das mercadorias, mas como perda da capacidade aquisitiva da divisa. Assim, os que têm um rendimento fixo - sejam assalariados, ou pensionistas - vão perdendo o seu poder de compra de maneira acelerada, pois - geralmente - não possuem suficiente força para obrigar os patrões a fazer os ajustamentos devidos aos montantes de seus salários e pensões. Mas, para o Estado e para os grandes capitalistas que são, em geral, grandes devedores, a inflação é uma benesse pois, graças a ela, o que realmente terão de pagar, quer em juros, quer o montante próprio da dívida, vai representar cada vez menos em valor real, até se tornar irrisório.
Em todos os casos, as divisas fiat vão sempre diminuindo de valor: umas vezes, de modo suave e dificilmente quantificável e outras, de modo brusco, aquando de crises económicas (como agora).
Mas, no Ocidente, a classe política e os governos estão exclusivamente interessados no curto prazo. Eles fazem o raciocínio seguinte:
- os eleitores têm de estar contentes e satisfeitos no curto prazo;
- assim, irão votar em nós e manter-nos no poder nas próximas eleições;
- no curto prazo, a injeção de dinheiro na «economia» (= nos bancos e nas bolsas) irá criar uma «sensação de crescimento»;
- o estado real da economia deve ser camuflado, para evitar o descontentamento popular;
- os défices das contas públicas vão-se aprofundando, mas a dívida só será paga pelas gerações futuras, quando nós tivermos morrido, ou quando estivermos reformados.
A «economia da dívida» gera um enorme travão ao crescimento autêntico e induz à estagnação, porque implica  um desinvestimento no que seja inovador e produtivo. O que os Estados têm feito, essencialmente, é uma gestão cosmética das finanças, para poderem agradar aos eleitores. Claro que isto também agrada muito aos grandes capitalistas financeiros, que sabem obter vantagens da situação, mesmo quando se lamentam na comunicação social.
Assim, entrámos num período de «stagflation» (inflação com estagnação), ou seja, temos o pior dos dois mundos. Porém, esta situação não se irá manter por muito tempo. É praticamente uma certeza, que se irá entrar - não a longo prazo - numa espiral hiperinflacionária.
A situação da economia mundial é não previsível, no curto prazo; mas, nas suas grandes linhas, há coisas que são certas. Considera a seguinte metáfora: Não há maneira de sabermos exatamente o trajeto duma bola, quando atirada ao ar; mas, todos os trajetos possíveis estão condicionados pela gravidade e, portanto, sabemos que a bola irá acabar por cair no chão.
O mundo financeiro não é nada sem a economia real. A finança é uma espécie de parasita da economia real e consegue sugar muita energia e produtividade, causando prejuízo à sociedade, em geral, aos que trabalham, que investem o seu esforço e criatividade.
Porém, as pessoas são atraídas para o casino das bolsas, para o lucro sem esforço e sem contribuir com algo (além do dinheiro, que é somente um símbolo). Como todo o mundo da finança, as bolsas, as atividades especulativas, não criam - em si mesmas - nem «um grama de valor».
Então, de onde vêm os grandes lucros gerados? Eles têm de vir de algum lado: por um lado, foram arrancados a muitos ingénuos que foram atraídos pelo casino bolsista e ficaram depenados. Mas, a maior quantidade de valor foi desviada, roubada do nosso bolso e sob os nossos olhos:
- Desde as isenções fiscais aos muito ricos e às grandes empresas, até às «privatizações», ou seja, o roubo organizado ao património das empresas públicas, pago durante gerações com os nossos impostos. As «joias da coroa» do setor público, são empresas do Estado, que dão lucro garantido ou que, potencialmente, poderão fazê-lo.
O Estado fica com as empresas não rentáveis. Mesmo o governo mais favorável aos interesses privados aceita isto. Compreende que é essencial manter a funcionar esses serviços, para a própria sobrevivência da sociedade e do Estado. O interesse dos capitalistas numa privatização deste tipo de empresa estatal é muito baixo: Só pode ser estimulado com a garantia de benesses constantes, da parte do Estado, que assim torna «rentáveis», empresas que não têm, ou deixaram de ter rentabilidade. Pense-se no caso dos caminhos-de-ferro: A rede ferroviária, pouco ou nada rentável, é dificilmente privatizável. Mesmo quando há privatização, é frequente ser parcial. Os carris continuam a pertencer a uma empresa estatal, enquanto os comboios, incluindo os de alta velocidade, são privados ou pertencem a parcerias público-privadas.
Mas, para voltar ao tema deste artigo: A finança está interessada em extrair valores seguros de empresas dos setores industriais, estatais, ou do imobiliário*. Ela sabe quais são os investimentos que terão um bom valor, após o «Reset», ou seja, após a queda programada das moedas que conhecemos, a sua colocação fora de circulação e a instauração da moeda digital sob controlo dos bancos centrais.
Para se capitalizar ao máximo, a alta finança tem atraído os capitais pertencentes a pessoas da classe média, que irão perder o seu património, com a vã esperança de se tornarem «ricas». O jogo é portanto de predação, só que esta não se traduz em guerras diretas (até agora...) entre imperialistas; haverá, quanto muito, guerras por procuração. Sob capa da crise financeira e das outras crises, trata-se duma guerra aos pobres: «Não terás nada e serás feliz». Mas, o que Klaus Schwab e seus epígonos não nos dizem, é que os super-ricos, caso triunfe o tal «Great Reset», irão ficar com tudo. Tendo em conta esta tomada de controlo económica, pode-se facilmente prever quais os seus reflexos políticos: Seria o advento dum totalitarismo planetário.
Felizmente, o fiasco do neoliberalismo** é cada vez mais notório; não consegue mobilizar o entusiasmo dos povos. Mas, como os muito ricos malthusianos têm grande poder de influência, graças à media e aos governos (que eles compraram), não se deve «baixar a guarda», mas expor o mais possível as manobras desta oligarquia para que ela fique cada vez mais isolada.

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(*) Não é por acaso que os fundos financeiros Blackrock e Vanguard (gigantes mundiais) se tornaram nos maiores proprietários de imobiliário para arrendamento, nos EUA. Nem que Bill Gates se tenha (recentemente) transformado no maior proprietário de terrenos agrícolas nos EUA. 
(**) O lema do neoliberalismo é o seguinte: «privatização dos lucros, socialização dos prejuízos» 

quarta-feira, 16 de março de 2022

QUEDA DA TAXA GERAL DE RENTABILIDADE DO CAPITAL; REALIDADE OU MITO?



Muitas pessoas têm uma pobre educação em ciência e estimam que as doutrinas marxistas se baseiam «na ciência». Ou até, acreditam que o marxismo é a «única interpretação verdadeira» da realidade social, económica e histórica. 
Sem dúvida, este complexo mental durou muito tempo, na Europa pelo menos, desde a fase do triunfo da revolução bolchevique, até aos tardios revolucionarismos marxizantes, com conotação "esquerdista": Trotskismo, Maoismo, Guevarismo,  Escola de Fanckfurt, Situacionismo, etc. 
Todas estas correntes têm algo do marxismo inicial, mas estranhamente, como aliás já tinha feito notar, enganam-se mesmo na essência do marxismo. Para se ser marxista hoje, seria antes de guardar o método, a metodologia, o primado da prática, não a fixação em dogmas. Esta fixação dogmática, auto-iludida é (ou foi) comum em regimes oficialmente «comunistas», como na URSS ou na República Popular da China e nos partidos e correntes comunistas, na sua confusão de «internacionais».

Primeiro, é preciso compreender o contexto geral em que Marx e seus seguidores produziram e difundiram suas doutrinas. Deve ter-se em conta os aspectos panfletários desses escritos, que não estão ausentes, mesmo e sobretudo, em textos de «polémica teórica». Mas, todas as discussões, com adeptos ou opositores, banhavam num mesmo paradigma, ou mentalidade predominante. Este contexto mental e ideológico, na época dos fundadores do marxismo, pode resumir-se numa palavra: «cientismo». 
O cientismo apropria-se dalguns resultados ou conceitos das ciências, para concatenar uma ideologia, supostamente «objetiva». Com isso, pretendem os polemistas «varrer» quaisquer objeções, invocando a «infalibilidade da ciência» (1).  
O cientismo, não é sinónimo de se ter em elevada estima a ciência e de querer estar o mais perto possível dos avanços práticos e teóricos das diversas ciências. Não; o cientismo é uma ideologia. Utiliza elementos da ciência (a sua embalagem, sobretudo) para fazer passar uma dada visão do mundo.
Entenda-se que eu NÃO digo que o marxismo, na sua análise do capitalismo, seja uma teoria completamente inútil, das que se pode «deitar para o caixote de lixo» ou, para «guardar na estante das obras que apenas conservam interesse para a história das ideias»! 
Mas, para tal, será necessário nos debruçarmos sobre a teoria marxista, contextualizando o seu teor às condições sociais e históricas em que surgiu, coisa que não irei fazer aqui, obviamente (2).

Apenas quero dirigir a minha atenção para um ponto, que aparece sempre, como se fosse uma verdade inapelável, uma «lei» das sociedades, da economia, da história. Estamos perante um fenómeno de assimilação acrítica, de «cientismo marxista». 
Com efeito, dificilmente nas fileiras marxistas se vê algum questionar do estatuto filosófico da «lei». Sobretudo do modo como é transposto das ciências físicas e naturais (Física, Química, Biologia...) para as ciências humanas: Economia, Sociologia, Psicologia, História. 
Este mecanicismo, aliás, fica completamente posto a descoberto com a constatação de que os conceitos supostamente científicos nunca são formulados de modo a que possam ser postos à prova da experiência («falsificáveis», segundo a terminologia de Carl Popper): 
Isso não é feito, pela simples razão de que não se trata de formular uma hipótese científica,  algo que é perfeitamente aceite no domínio da ciência, mas antes de impor uma afirmação dogmática que coloca o marxismo no mesmo plano que uma religião.

A questão da «lei» da taxa de lucro geral decrescente (3) do capitalismo é um absurdo, pois não existe qualquer maneira de medir propriamente essa taxa geral. 
Nós podemos avaliar a rentabilidade do capital num determinado projeto; podemos - fazendo extrapolações e inferências - alargar este conceito à rentabilidade geral num setor produtivo, mas será absurdo estar a calcular, por exemplo, a rentabilidade do capital investido em todos os setores e em diversos momentos históricos, num país ou em vários países.
Porque querer atribuir uma rendibilidade geral ao capital, que tem imensas vertentes (capital financeiro, capital fundiário, capital industrial, etc.), não faz sentido.  É como pretender decidir sobre o «gosto da fruta, em geral», juntando o sabor do ananás, da laranja, da pêra, do alperce, da uva, etc!
Aliás, se um capitalista deseja máxima rentabilidade para o capital investido, isso não significa que ele não seja capaz de diferenciar seus investimentos, em prazos mais largos, ou mais curtos. A lógica dum investimento no setor imobiliário, não é igual à dum investimento na bolsa de ações. Ora, não só a duração, como as rentabilidades típicas para estas 2 categorias, são muito diferentes.

A questão de se saber qual a rentabilidade geral do capital investido, quando olhada de perto, coloca imensos problemas, a começar por se determinar se o próprio conceito faz sentido. Só fará, caso se possa medir tal rentabilidade com critérios minimamente aceitáveis (consensuais). Aliás, no mundo real há imensos problemas que não são solucionáveis com generalizações. A complexidade do real é algo que não entra na cabeça de pessoas dogmáticas. 

Mas, as palavras pomposas dão a aparência de «explicação científica» a muitos ingénuos. Esta pseudo-explicação da "queda da taxa geral do rendimento do capital ao longo do tempo", é simplesmente um mito. Tanto mais que o capitalismo soube transformar-se e operar em domínios de atividade que ontém - já para não falar de há dois séculos atrás - não eram sequer conhecidos, ou sonhados. 

Admitindo que, geralmente, o propósito do capitalista individual seja o de maximizar a taxa de lucro, a verdade é que muitos capitalistas (e justamente, os maiores) têm a prudência de diversificar e colocar parte dos investimentos em algo, que possa ter um retorno mais baixo, mas que confere segurança. Correntemente, há todo um ramo da matemática e estatística aplicadas (ver as obras de Nassim Taleb, por exemplo) que se dedica a avaliar o risco e a ponderar a hipótese de lucro, com esse risco.  

Outra questão associada ao referido mito, tem a ver com algo que muitos (pseudo?) marxistas parecem não conhecer: Refiro-me ao capital fictício. Se, no tempo de Marx, existia especulação, se alguns se dedicavam a extrair lucros, sem acrescentar algo à esfera produtiva, tratava-se de um fenómeno bastante marginal, ao fim e ao cabo. Estava-se no auge do capitalismo industrial, em que os industriais tinham a mão de cima, dominando as outras esferas do capital e, mesmo, o Estado burguês. 
Defino o conceito de capital fictício, como o capital que resulta da especulação e não tem origem num fenómeno de criação de riqueza verdadeira, sob forma de mercadorias ou de serviços...
Na fase terminal do capitalismo que estamos agora a viver, disparou o enriquecimento por parasitismo (cronyism). Este, é um privilégio dos muito ricos e é levado a cabo com a participação plena das maiores instituições financeiras, os bancos «sistémicos» e «hedge funds» de maiores dimensões (Blackrock, Vanguard, etc.). Tal desvio de capital para vantagem de alguns (muito poucos) observa-se ao nível de monopólios, com as chamadas «rendas de monopólio»(4), mas também ao nível das operações de QE (FED e bancos centrais do Ocidente), com a inundação dos bancos (ditos) sistémicos com biliões e triliões de dólares. Tais somas servem para que estes especulem com toda a panóplia de ativos financeiros, eles próprios, ou emprestem (a baixo juro) às grandes empresas, que fazem a retro-compra das ações, para as fazer subir artificialmente. Estas manobras especulativas vão inflacionar os ativos financeiros (ações, obrigações, derivados), mas não vão acrescentar nada à capacidade produtiva das empresas. Os ativos financeiros descolaram completamente da realidade, deixaram de ter qualquer relação com a rentabilidade e o valor real das empresas e países respectivos. 
Forma-se, assim, um excedente de capital fictício. Este, não apenas se acumula, como vai sendo utilizado para tomar o controlo sobre tudo o que seja «interessante», desde empresas, a terras agrícolas. O capital que, anteriormente, seria canalizado para atividade produtiva fica a acumular-se em atividades especulativas, sem reflexo direto ou indireto na produtividade. Os empreendimentos produtivos ficam menorizados (5), há um défice real de investimento nos setores produtivos. 

A conceção marxista tradicional considerava que o valor concentrado no capital, era uma espécie de «trabalho congelado», fosse ele fundiário, imobiliário, das empresas e fábricas, dos equipamentos, mercadorias... Mas, também, concentrado no capital financeiro, no dinheiro líquido e em todos os ativos financeiros (ações, obrigações, outros títulos). Esta teoria do valor aguentou-se mais ou menos bem, enquanto o capitalismo não atingiu a fase da «financeirização». 
O que aconteceu, com a financeirização, a partir dos anos 80 do século passado, foi o avolumar da predação do capital financeiro sobre todas as outras esferas da vida económica e social. Observando a evolução do PIB nos diversos países, as atividades típicas do sistema bancário e financeiro tomaram a dianteira sobre a parte de formação de riqueza tangível, ou seja, os setores industriais que satisfazem necessidades básicas das pessoas.  
Não admira que o próprio poder político tenha caído refém do capital financeiro omnipotente. Ele criou um mecanismo de auto-reforço, visto que conseguiu levar o governo e restantes órgãos do Estado a produzir legislação benéfica para eles, mega-empresas, a dar-lhes vantagens fiscais, isenções diversas, créditos bonificados, uma fiscalização de atividade quase ausente, etc. 
O capital financeirizado é como o Ugolino que devora os seus próprios filhos.  

Bronze de Jean-Baptiste Carpeaux: Ugolino e seus filhos 


Não seria bom que as pessoas que se auto-intitulam marxistas, se debruçassem sobre a metodologia de análise, sem dogmas? Que os conceitos fossem vistos de modo dinâmico, cuja evolução deve sempre acompanhar de perto a realidade social e económica? 
Não é fácil, embora fosse ideal, aplicar o método científico a áreas do saber que -por natureza- são muito mais difíceis de abranger, pela simples razão de que não podem (ou não devem, por razões éticas e deontológicas) ser sujeitas a experiência científica, delimitada, controlada e avaliada pelo experimentador (Economia, Sociologia, História, Psicologia)

Devemos dedicar-nos a aprofundar aspetos metodológicos e filosóficos do método científico. Lamento que alguns dos que se revestem da etiqueta de revolucionário, estejam bem mais precisados de descer das «nuvens revolucionárias» onde costumam situar os seus debates.
Não tenho nada contra as pessoas que sinceramente querem a revolução, pelo contrário. As que lutam e investem toda a sua energia na transformação do mundo. Se alguém pensa que o escrito acima tem uma centelha de desprezo pelos revolucionários de todas as sensibilidades, peço desculpa. O meu intento é o oposto, é o de clarificar. Porque vejo demasiada confusão mental em pessoas fundamentalmente honestas. Este escrito destina-se a ajudar ver a realidade das coisas. Se as pessoas virem a realidade sem vendas nos olhos,  serão mais capazes de um trabalho eficaz na construção da sociedade onde sejam abolidas a exploração do homem e a depredação da Natureza.    

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(1) Tivemos um ressurgir recente dessa mentalidade, que se revelou com os ataques contra os objetores da narrativa padrão, sobre a epidemia de COVID e sobre a forma adequada de a tratar.
(2) Leitura perfeitamente em linha, note-se, com a teoria marxista genuína (por oposição à «vulgata»)
(3) Entre uma infinidade de artigos que citam a mesma «lei», escolhi este. Ele é um bom artigo, de Colin Todhunter, mas enferma do preconceito aqui tratado: https://off-guardian.org/2021/11/15/saving-capitalism-or-saving-the-planet/
(4) «Rendas de Monopólio» a expressão é do Prof. Michael Hudson; não tem nada que ver com o sentido trivial de «renda de casa».
(5) O capital disponível é desviado para especulação (por exemplo, auto-compra de ações) ou acquisições predadoras sobre empresas concorrentes. Nem num caso, nem no outro, são contribuições para o aumento ou diversificação da produção, ou para a inovação tecnológica. Estes investimentos produtivos são preteridos porque resultam num retorno de investimento mais baixo, ou a mais longo prazo.

sexta-feira, 4 de março de 2022

REFLEXÃO - «O HUMANO MORREU»


 
O globalismo é a ideologia do triunfo do capitalismo sem freio, do capitalismo mundializado, explorando à vontade os povos do Terceiro Mundo, os quais ficam felizes por terem trabalho, mesmo pago a um décimo do trabalho equivalente dos ocidentais. Estes, como novo-ricos, têm sonhos e fantasias, adições e ilusões, exatamente como crianças mimadas que são. Os dirigentes esmeram-se em manter os seus súbditos (vulgo cidadãs/ãos) num estado de torpor «feliz», de embriagês consumista, de «aventuras» turísticas de pacotilha. Assim, deixam os grandes capitalistas e seus «gestores» (quer na empresa, quer no aparelho de Estado), fazer o que muito bem entenderem. 

A crise dita do COVID, entusiasmou e tornou ainda mais atrevida a classe dirigente globalizada, aquela que se revê no WEF de Davos. «Davos» é o leadership ideológico do globalismo, enquanto o seu núcleo duro são o capital financeiro, os grandes bancos sistémicos, mais Blackrock, Vanguard e outros «hedge-funds», com muito peso nas principais bolsas. Nesta economia totalmente financeirizada, a persistência da ilusão de riqueza é mantida pela pirâmide de Ponzi dos ativos financeiros, que parecem subir até ao céu, mas essa valorização é contabilizada em divisas que perdem cada vez mais o seu valor real, isto é, seu poder aquisitivo em mercadorias e serviços. Chega um momento, porém, em que é preciso, à oligarquia, fazer ruir o castelo de cartas: É o «Great Reset». A «pandemia de COVID» foi apenas o aperitivo.  

Neste mundo, cujos valores estão completamente invertidos, «um mundo ao contrário», o trabalho tornou-se «dispensável», numa larga medida: Pensam assim os muito ricos e agem em consequência. A partir do neolítico, houve guerra frequente nas sociedades; temos abundante prova e descrição disso, desde os reinos e impérios da antiguidade (Suméria, Babilónia, Egito, Hititas, Fenícios, Gregos, Romanos...). Mas, o «capital humano» não era completamente desprezado pelos reis, pois os escravos, as presas da conquista do outro povo, iriam enriquecê-los e à corte palaciana.  Hoje, os escravos já não são precisos: Os Senhores do Mundo estão apostados em reduzir estas «bocas a mais».

Hoje em dia, não consigo abrir uma página de um qualquer órgão de comunicação social «mainstream» ou de «rede social corporativa», sem sentir vómitos. Se os leio, faço-o com esforço, pois tornaram-se, não apenas manipuladores - sempre o foram - mas abjetos, arrogantes. Em resumo, penso que as pessoas que engolem essa "m... " desinformativa, sem pestanejar e até com imenso gosto, transformaram-se em «zombies». Como zombies que são, julgam-se normais. São normais, estatisticamente falando. E esta, é a verdadeira tragédia. 

Podia Nietzsche , no século XIX clamar: «Deus morreu»! Mas, eu diria que «afinal, foi o humano que morreu!». Vejo isso escrito, em enormes letras, numa parede... Dizia-me, há muitos anos, um falecido amigo, que «o inferno é nesta Terra». Estava cheio de razão. 

Este Mundo, não me custa nada dizer-lhe adeus.