quinta-feira, 18 de novembro de 2021

JEAN-JACQUES HUBLIN, sobre mudança climática e evolução da espécie humana

                                           


Consequências para a espécie humana do fim do período glaciar



J-J Hublin é um dos mais distintos paleoantropólogos franceses vivos.
Ele exemplifica, nesta curta intervenção, toda a complexa relação do homem com o clima.
Ele demonstra que esta relação não é passiva, pois o homem sabe adaptar-se às condições, através de estratégias de caça, do uso de certos instrumentos, das roupas quentes (em ambientes glaciares) mas, sobretudo do relacionamento cultural, fundamental para manter as comunidades em «boa saúde», ao permitir que as pessoas duma etnia ou cultura se reconheçam reciprocamente, não só pela língua comum, como por adornos e sinais diversos, que são como os «cartões de identificação» dos grupos pertencentes ao mesmo clã.
A maneira como ele aborda a arte rupestre também é muito interessante. Segundo Hublin, esta preenche uma função importante, enquanto marcação do território, afirmação da identidade de grupo, pela pertença simbólica ao mesmo animal-totem.


Ver, em complemento, «A Arte nas Origens»

terça-feira, 16 de novembro de 2021

VELASQUEZ E O JOGO DE ESPELHOS

Se o século XVII teve alguns génios em pintura, Velasquez é certamente um deles. Tentarei explicar porquê.

A arte, nos reinos europeus, no período que vai do Renascimento até meados do século XVII, é toda ela figurativa e simbólica. O cânon era dado pela civilização greco-romana, considerada o pináculo inultrapassável de elevação estética. 

A própria estética estava imbrincada com o sentido moral, visto como muito mais elevado que o saber técnico. Este, o saber técnico, seria elemento fundamental para alcançar a maestria, mas não o único pois, necessariamente, a elevação moral tinha de perpassar nas obras. Elas tinham de ter uma componente exemplar. 

As grandes obras tinham de ser modelos, não apenas estéticos, como de conduta. O tema duma obra como «Las Meninas» era imediatamente compreendido pelos contemporâneos. Retratava a família real e a corte, em torno da infanta, a única descendente sobrevivente.  

O génio do pintor está no arranjo da cena: Aparentemente, capta um momento do seu trabalho, enquanto pintava o retrato do casal real. O espelho no fundo reflete a imagem desfocada, mas perfeitamente identificável, do rei e da rainha, que estariam no plano donde nós observamos o quadro. 

A chave deste quadro está encerrada na cena, ela própria. 

Poucas pessoas se perguntam porque razão este quadro foi intitulado «Las Meninas», ou seja, as aias da princesa. Não seria mais apropriado designá-lo como «A infanta visitando Velasquez, enquanto pintava o casal real»? - Sim e não. 

O nome «Las Meninas» é apropriado, porque elas estão realmente no primeiro plano e descrevem uma espécie de anel protetor em torno da infanta. Elas próprias estão rodeadas pelas figuras do anão e da anã, com o cão, o mastim pachorrento e, mais atrás, dois vultos; uma mulher, com hábito de religiosa e um homem.

No umbral da porta aberta, uma silhueta de homem austero, criado ou nobre, junto ao espelho refletindo o casal real.  

Tudo está arranjado para dar a impressão de espontâneo, mas encerra um significado e simbolismo discretos. A própria ambiguidade dos planos em que está construída a obra, a sensação espacial que daí se desprende, traz complexidade, tanto na leitura da ótica física da cena, como de sua ótica simbólica,  do «recado implícito» que transmite. Nem uma, nem outra são simples: A obra está estruturada com grande maestria técnica, mas não é o exercício de virtuosismo gratuito que muitos descrevem. 

A tela transporta uma imagem fulcral, a de Velasquez que, ao se auto retratar, quis demonstrar algo. Ele, que estava ao serviço do monarca Filipe IV, implicitamente colocava-se ao serviço da herdeira do trono e  fazia-o como alguém orgulhoso de servir. 

Não é por acaso que ostenta no gibão a Cruz de Cavaleiro da Ordem de Santiago: Está a dizer que seu trabalho é o de um Cavaleiro, não de mero prático, de artesão afortunado, premiado pelo seu rei. Com sua presença, está a afirmar seu dever e compromisso de servir a infanta, tal como as duas «Meninas» o fazem, mas de outro modo. 

Este quadro fez correr «rios de tinta» e fará correr muitos mais, estou convencido. Afinal, esta obra realiza, de um modo que Velasquez nunca sonhou, a perpetuação da memória do tempo em que a Espanha era governada pela monarquia dos Habsburgo. 

Impressiona-me pensar que posso ver as figuras do rei, da rainha, da infanta, dos nobres, etc. na sua «palpável humanidade». Mas, ao mesmo tempo, penso como eram figuras tão poderosas. Detinham uma fortuna quase impossível de avaliar, dominavam metade do planeta, com seus povos e nações. Não é estranho que sua aparência no quotidiano chegue até nós, como se estivéssemos no palácio real?  

Velasquez era um génio. Como todos os génios, transcendeu as circunstâncias históricas de sua época. Por isso hoje, também, suas obras podem iluminar (no sentido de educar) as pessoas.  


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Nota: Possuem interessante informação, estes dois vídeos sobre o quadro. 

https://www.youtube.com/watch?v=WKRKrpz09Fk

https://www.youtube.com/watch?v=Ylc7ESyVK7Q

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

NADA, ABSOLUTAMENTE NADA.

Sinceramente, não gosto mesmo nada do regime instaurado na Bielorrússia. Mas, perante os polícias polacos que estão a bloquear a saída de refugiados de guerras causadas ou onde tiveram papel as potências europeias ocidentais em aliança com os EUA, o que dizem os defensores dos direitos humanos ocidentais? Nada, absolutamente nada.

O que dizem os defensores dos direitos humanos, sobre o que se está a passar na Áustria, perante a óbvia instauração por ordem do governo, duma espécie de «gulag» para os não-vacinados. Uma ordem que os coloca num estatuto de «infra-humanos» (retiram-lhes mesmo os direitos mais elementares)? Nada, absolutamente nada.

O que dizem os defensores dos direitos humanos sobre os ocultados massacres americanos na Síria, de centenas de crianças e de mulheres e outros crimes de guerra? Nada, absolutamente nada. 

Há vários anos que a guerra no Iémen destrói este país. 

Ela é apresentada como «conflito interno», porém as forças pró-governamentais são reforçadas por contingentes sauditas e dos emiratos. Têm apoio ocidental (britânicos, americanos, franceses, etc.) em armamento, «conselheiros», mercenários, tropas especiais. O que dizem os membros de organizações que inscrevem a paz e os direitos humanos nos seus estatutos e programas? Nada, absolutamente nada.

Conclusão: 

- Se não dizem nada, absolutamente nada, são claramente coniventes com esses crimes. 

Escolhem encobrir estes crimes e denunciar seletivamente outros. Estes últimos, até podem ser reais, até podem ser muito graves. 

Porém, a credibilidade da denúncia, a razão verdadeira dos protestos, a sinceridade da solidariedade, ficam logo postas em dúvida, senão mesmo, desmascaradas pelos próprios, ao encobrirem, dum manto de silêncio, os horrores que os seus Estados cometem. 

Ao não mexer um dedo nestes casos, enquanto fazem campanhas obstinadas para denunciar crimes (reais ou supostos) cometidos por regimes noutras partes do Mundo, negam-se a si próprios enquanto defensores dos direitos humanos. 

Não agem, quando as circunstâncias o justificam, junto dos seus governos e opiniões públicas: Mas seria aí, onde poderiam ter maior eficácia. 

A sua verdadeira agenda é outra, não é o interesse genuíno pelas pessoas oprimidas. Antes, estão a utilizar diversas situações como pretexto para fazer campanha contra certos regimes. 

São o «braço civil» na guerra híbrida levada a cabo pelo «Ocidente», pelo «Império» dos EUA, contra todos os que não lhe são submissos. 

Estas ONGs são generosamente subsidiadas por agências especializadas, como a NED (dos EUA), ou «programas» de instituições europeias (Parlamento Europeu, Comissão Europeia, etc.), da ONU e de suas agências. 

Não são a expressão da «sociedade civil», autonomamente organizada, como querem fazer crer: São totalmente dependentes no plano financeiro (e portanto, também no plano da ação política) de governos ou magnates como George Soros («Open Society Foundation»). 

Se alguém duvidar da veracidade do que afirmo, que investigue por si: verá que não estou a exagerar.

PS1: Leia AQUI a transformação da Austrália em pesadelo fascista. Outro caso em que a atitude dos defensores dos direitos humanos ocidentais se resume a nada, absolutamente nada!

[Baden Powell, Vinícius de Moraes] «QUEIXA»

«O samba, que coisa mais rica»! E assim, temos uma nova semana. Para nos alegrar, trouxe a música excelente do Brasil, com inspiração popular e erudita, fundidas na síntese originalíssima de Vinícius de Moraes. O poeta «branco mais negro do Brasil», como ele assim se designava.

Ele teve muitos músicos e interpretes talentosos a trabalhar com ele. Fizeram sobressair a música interna dos seus poemas, ficando para a posteridade como obras-primas do reportório da Música Popular Brasileira. Baden Powell foi um deles; um dos grandes compositores da música brasileira a ter intensa colaboração com Vinícius.

Ouve este samba!
[Quanto ao resto, deixa]
 «que essa queixa não tem solução»



                                                 https://www.youtube.com/watch?v=ElfKmHVDGOo

QUEIXA

Cavaco, pandeiro, cuíca
Ganzá, tamborim, violão
E o samba, que coisa mais rica
E o surdo batendo no coração

Deixa
Porque hoje é tudo natural
Deixa
Que essa queixa, sim, é sempre igual
Quando a cidade amanhecer
É carnaval

Cavaco, pandeiro, cuíca...

Deixa
Toma um trago e lava o coração
Deixa
Que essa queixa não tem solução
Deixa
Porque quem quer saber
Não sabe não

Deixa
Porque hoje é tudo natural
Quando a cidade amanhecer
É carnaval

Deixa
Toma um trago e lava o coração
Deixa
Porque hoje é tudo natural
Quando a cidade amanhecer
É carnaval



Composição: Baden Powell / Vinícius de Moraes.

Aprecie a poesia de Vinícius nesta playlist:  VINICIUS DE MORAES

domingo, 14 de novembro de 2021

BRINCANDO COM O FOGO, ou como se liberta o génio mau da inflação

 É da natureza dos bancos centrais, em especial da FED, estarem sempre numa posição inadequada, contra-cíclica, em relação à economia. Por exemplo, agora estão com um atraso de muitos meses a tentar a viragem na política de «dinheiro fácil» através de «tapering», que é a desaceleração da impressão monetária, mas não a supressão da mesma. Esta impressão monetária não resolve nenhum problema real, verdadeiro da economia. Com efeito, o aumento da massa monetária total, ou em circulação, vai estimular a perceção dos intervenientes nos mercados, de que há maior riqueza, maior disponibilidade para gastar. Mas não se produziram mais bens nem serviços, não houve acréscimo de autêntica riqueza. É um mecanismo essencialmente psicológico, como, aliás, são de base psicológica muitas das movimentações que ocorrem nas economias. 

A razão pela qual os bancos centrais, em especial os «ocidentais», fazem sistemáticos erros de avaliação da situação económica mundial, é que funcionam com modelos lineares. Baseiam-se nestes modelos e numa visão teórica neokeynesiana. Assim projetam eles as tendências e baseiam o fundamental das suas decisões. O problema com isto, é que tais projeções não colam com a realidade. Se a economia fosse uma verdadeira ciência (não é!), estaria sempre a reavaliar a validade de seus modelos, de suas projeções, incluindo os fundamentos e pressupostos sobre os quais se construíram tais modelos e projeções. 

A realidade é outra: A FED e todos os bancos centrais ocidentais, que lhes seguem as passadas, vão dar sempre prioridade aos conceitos teóricos, sobre a realidade dos factos no terreno. Em todas as crises, especialmente as mais graves,  pode-se notar esse desfasamento. Isso significa que os bancos centrais, em vez de criarem condições para o retorno à normalidade, suas intervenções têm o efeito oposto, o de aumentar a amplitude dos ciclos económicos. 

A recente afirmação de Jerome Powell, de que o surto de inflação era transitório e que, portanto, não haveria nada de fundamental a mudar no rumo decidido pela FED, ilustra claramente a inadequação da política da FED, a qual só pode ter por base uma inadequada visão da realidade, ela própria devida a modelos não apropriados, baseados em teorias parciais, ou defeituosas no fundamental. 

Veja como Mohamed El Erian, numa curta entrevista AQUI, destrói a narrativa emanada da FED e do seu presidente, ao dizer que esta crise foi logo caracterizada por inflação devida a escassez da oferta. Referia as disrupções dos mercados de matérias-primas, bens acabados e, mesmo, de mão-de-obra, resultantes da crise estrutural e de conjuntura - os lockdown a pretexto do COVID - que a exacerbou. Os elementos que El Erian refere estavam patentes, não eram elementos ocultos que somente podiam ser detetados após muitos meses. 

Porém, o que a FED e outros bancos centrais fizeram, com a sua impressão monetária levada ao extremo, foi exacerbar o problema, criando um efeito inflacionário do lado da procura, além e por cima do existente, devido à escassez na oferta. 

A inundação de liquidez nos mercados não veio salvar coisa nenhuma na economia produtiva. Veio apenas insuflar ainda mais as já muito grandes bolhas nas bolsas e em todos os ativos. 

Além disso, houve um súbito aumento de dinheiro disponível, na economia do dia-a-dia, com o dinheiro distribuído às pessoas para compensar as paragens de trabalho forçadas («helicopter-money»). Foi uma medida tornada necessária pelos lockdown, mas os lockdown não eram necessários! 


Assim se destapou a lâmpada de Aladino e deixou-se o génio malévolo da inflação surgir e crescer, com o risco de tudo devorar na onda hiperinflacionária.

A conclusão a que chego é que os bancos centrais são estruturas de poder que se têm pautado por uma política claramente favorável aos muito ricos, os multibilionários, embora tenham o discurso de cuidar da economia para o bem do maior número. 

Isto não pode surpreender alguém convicto da natureza depredadora, parasitária do capitalismo de hoje, com as enormes disparidades de riqueza, logo de poder. 

O diálogo AQUI entre Slavoj Zizek e Yanis Varoufakis demonstra-o: Não há capitalismo, no sentido clássico. Há um domínio dos muito poderosos donos de plataformas (Facebook, Amazon, Google, etc.) que possuem literalmente o campo todo, o chamado «mercado». Este deixou de ser propriamente um mercado, no sentido clássico do termo. Por isso, Varoufakis utiliza a expressão «tecno-feudalismo», outros usam outras expressões, mas vem a dar no mesmo: A realidade é que estamos numa nova era, onde nada é favorável aos pequenos capitalistas e aos trabalhadores, onde tudo está nas mãos de corporações gigantes, monopólios ou oligopólios, que tudo controlam.


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

[Trevor Pinnock] J.S. BACH, PARTITA Nº6, BWV 830

As imagens que acompanham a música são obras da época barroca. Mas, além disso, não têm relação com a música aqui reproduzida. Uma das obras é bastante célebre: representa o deus Apolo e os ferreiros na forja de Vulcano, de Velasquez.

A Partita nº6 BWV 830 de J. S. Bach, pertence à coletânea de 6 partitas, que integrava o Clavierübung ou «Exercícios para o Teclado». Cada uma delas tem particularidades estilísticas próprias: Quer nas danças estilizadas que compõem a sucessão (=suite ou partita), quer na respetiva peça introdutória, de natureza diferente em cada uma das seis partitas. Por exemplo, na nº6 é uma Toccata mas, na nº4 é uma Ouverture à la Française. 
O Clavierübung tinha explícitas funções pedagógicas. Não devemos esquecer que Bach foi professor-mestre direto, não apenas de seus filhos, como de vários outros músicos, que contribuíram para a preservação da música do Mestre. 
Eu gosto especialmente desta sexta Partita (outro nome para «Suite»). Encontro nesta tantas maravilhas melódicas, harmónicas e contrapontísticas, que seria fastidioso aqui fazer o seu inventário. Muito melhor é apreciar esta música! Boa audição. 

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

CRISES ABENÇOADAS (PELOS PODERES)

Atribui-se a Winston Churchill a famosa frase « Nunca deixeis uma boa crise ser desperdiçada». Ao longo da história, as classes dominantes sempre usaram as crises - toda a espécie de crises - para tirarem vantagem sobre as populações, sobre as que eles governavam. Vantagens tanto em termos materiais, como uma maior extração de renda, através de mais impostos ou taxas, como em aumentarem o controlo, a maior capacidade de exercerem repressão, de intimidar e dissuadir os competidores ou os contestatários.

Foi no contexto da II Guerra Mundial, que Churchill disse a célebre frase; tratava-se do momento em que as cartas eram redistribuídas, as peças eram reorganizadas no xadrez político e económico mundial.
Desde então, não têm faltado momentos de crise: a guerra contra as drogas, a guerra contra o terror, a histeria do COVID e a chamada «crise climática». Todas elas, têm servido de pretexto para quem nos governa (e oprime), se tenha aproveitado para abocanhar um pouco mais de poder, à custa das nossas liberdades e garantias, da nossa subsistência económica.

De todas as crises, as mais acarinhadas pelos Estados e governantes são as guerras, pois permitem que, diante do perigo, a população fique esmagada, numa postura de submissão e que trema de medo. Perante o perigo de invasão ou derrota, submete-se «voluntariamente», da  forma mais abjeta. A população, condicionada por toneladas de propaganda, vai em massa saudar e engrossar as fileiras dos que vão «sacrificar-se pela Pátria».

Há outra frase célebre, esta devida a Randolph Bourne: "A guerra é a saúde do Estado." A mentalidade implícita na mesma explica a utilização, pelos governantes, dos termos bélicos: Tudo é uma guerra, a «guerra contra a droga», a «guerra contra o terror», a «guerra contra a pandemia viral», a «guerra contra o aquecimento climático», etc.
O facto das pessoas serem gregárias, num certo sentido, não as devia inibir de pensar criticamente, de se distanciarem dos aspetos emotivos de certas situações e de tentar compreender as lógicas subjacentes aos poderes, aos seus discursos e, sobretudo, aos seus desempenhos.

Boris Cyrulnik, um distinto médico e investigador dos mecanismos associados com a superação dos traumas (inventor do conceito de «resiliência») fala de pensamento "preguiçoso". É uma forma de pensamento que faz com que o indivíduo se sinta de novo confortável, depois de sentir angústia, medo, desamparo. Este é o pensamento que permite ao indivíduo ser reconhecido pelos outros como seu parceiro, como outro da sua espécie, dentro do rebanho. Para o indivíduo que experimentou grande angústia, que sentiu medo, o facto de permanecer junto com outros, fá-lo sentir-se protegido, fá-lo sentir-se forte, capaz de enfrentar as dificuldades. É natural, faz parte da condição humana, mas é explorado de todas as maneiras possíveis pelos poderes. Eles, simplesmente, desencadeiam o medo, a aflição, a angústia nos indivíduos, para os desestabilizar, para estes se agregarem ao rebanho, à manada. No final do século XIX, Gustave Le Bon já tinha descrito com rigor os mecanismos de condicionamento, que levam as massas a comportar-se de maneiras que seriam impossíveis de imaginar em indivíduos isolados.
Os poderosos não usam apenas o medo, usam também a ganância, a ambição, a inveja e outros sentimentos mesquinhos para com os semelhantes. Têm feito isto com enorme desplante, usando os ensinamentos de Edward Bernays, servindo-se de toda a panóplia de coerção desde campanhas «de imagem», até ao extremo da «lavagem ao cérebro», para conseguirem conformidade, adesão e submissão dos súbditos.

Na era do globalismo, a dominação duma classe já não se pode meramente confinar (nem é observável) às fronteiras de um Estado. É frequente ver os dirigentes dos diversos Estados «dobrar o joelho» diante das instituições do globalismo, nas cimeiras que são afinal cerimónias, teatros. Porém, estes teatros do poder são indispensáveis. Tal como nos tempos em que reis se faziam coroar, em grande pompa e mandavam pintar seus retratos com mantos de arminho, fronte cingida de coroa de ouro com pedras preciosas e empunhando um cetro. Hoje, os dirigentes de grandes e pequenos Estados vão procurar legitimação nas cimeiras, estes espetáculos de poder, para mostrar ao «vulgo» que ele não tem lugar aí, que deve submeter-se às decisões tomadas pelas personalidades "protagonistas" das ditas cimeiras.

Enquanto nas cerimónias dos tempos feudais, o povo era representado por alguns burgueses escolhidos, que participavam para demonstrar que «a Nação» estava com o monarca, agora são as ONGs (Organizações Não-Governamentais) que se desdobram para fazer o «folklore» e algumas críticas superficiais aos governos e Estados, ao mesmo tempo que vão comer à mão dos mesmos. As ONGs são fundamentais para o Estado e por isso, elas são toleradas. Em que é que são fundamentais? Pois além de representarem o «povo» nessas cimeiras cerimoniais, têm a virtude inestimável de fazer passar as políticas dos governos, como se estas pudessem ser um «progresso», um «avanço», uma «conquista» das pessoas comuns, das pessoas idealistas que se reveem nos ideais propalados pelas mesmas ONG's. É que o Estado, embora não pareça, está bastante desacreditado e, por isso, não tem ilusões de que consiga diretamente promover suas políticas. Isso foi assim com os ditadores dos meados do século XX, não apenas com Hitler e Estaline, também Mussolini, Franco, Salazar, Perón, etc. Eles faziam caucionar as suas políticas pelo povo. O povo era convocado pelos ditadores em grandes comícios, onde, por efeito  hipnótico, passava uma corrente do chefe carismático, para as pessoas. 
Hoje, os meios são diferentes, é preciso dar a ilusão de democracia, de que existem várias opções. Por isso, existem partidos diversos, mas não existe uma política diversa. São todos, pró-neoliberais, pro-globalistas, pró-vacinas obrigatórias, pró-combate ao aquecimento global, pró-zero_carbono, etc.
Para demonstrar seu compromisso, os «verdes» ou os «esquerdistas» (de ontem) insistem em assumir as diretrizes do grande capital. E não se ficam por aqui, pois vão mais longe, para impressionar as suas bases. Veja-se o entusiasmo com que adotam medidas de todo-vacinas, com os seus corolários de restrição das liberdades, de discriminação das pessoas; como adotam medidas que implicam um «imposto verde», uma «taxa-carbono». Na verdade, isso não é de espantar, pois estas pessoas são militantes de estruturas autoritárias (têm uma mente configurada para estas estruturas), querem mostrar que «se eles fossem poder, aí sim, isto iria ser a sério»...
Nisso, estes partidos, grupos e ONGs, por muito ambientalistas, anti-capitalistas, etc. que se proclamem, são, nada mais, que «uma roda» dos Estados. São parte integrante do aparelho de Estado alargado. A sua ambição máxima é participar no círculo do poder: Desejam participar - ao máximo possível - na definição das políticas dos Estados. 
Por isso, qualquer pessoa que se identifique, que siga, vote, apoie estes grupos, está na realidade a ser conivente com a perpetuação do sistema. Pode ser conivente sem o saber, sem ter consciência disso. Creio que mais de 90% dos simpatizantes estão nessa categoria. Mas, sabedores ou não, eles estão a colaborar numa política ao contrário daquilo que aspiram profundamente! 
Então, porque não abrem os olhos e não vêm as coisas com olhar crítico?

- Primeiro existe a propaganda, que é muito poderosa sobretudo, porque impede que tomem verdadeiro conhecimento dos factos e argumentos que venham contrariar as teses centrais dos seus líderes de opinião; depois, existe o efeito de grupo, o gregarismo, o medo de ser excluído do seu círculo de amigos; e, finalmente, porque a educação não é mais do que amestramento, as pessoas não são educadas a examinar criticamente os argumentos, mas a «decorar», isso significa que estão habituadas a papaguear o que ouvem sobre o «aquecimento climático», «a pandemia de COVID», etc. Mas, perante quaisquer discursos que divirjam de forma significativa do dogma, funciona o reflexo «identitário»: «estes, não são dos nossos; são os tais que, e que, etc.»

Claro que, em nenhum domínio, a propaganda pode dar soluções verdadeiras. Pode apenas reforçar os poderes. Mas, chega-se a um ponto em que a propaganda já não tem capacidade para ocultar. Neste ponto, dá-se o colapso, dá-se a perda total da confiança: Na economia, isso chama-se hiperinflação; na sociedade, chama-se revolução. As forças de repressão, nessa ocasião, estarão bem equipadas para reprimir com a brutalidade toda, a revolta do povo, que entretanto acordou e percebeu que foi espoliado, enganado, abusado. 
As classes possidentes é que fazem as revoluções. É um facto bem assente, basta pensar nas oligarquias, por exemplo, a francesa nas vésperas de 1789, ou a russa, nas vésperas de 1917.

Mas, nem tudo é negro, pois os globalistas têm tentado abarcar o mundo na sua totalidade. Ora, a complexidade deste mundo é tal, que me parece impossível eles obterem mais do que um domínio temporário e parcial, isto é, sobre as partes do mundo nas quais conseguem um certo grau de controlo. No longo prazo, sabe-se que todas as organizações que ultrapassam os limites da sua funcionalidade, com o seu gigantismo, com a extensão enorme das redes de comunicações e a fragilidade de todo o edifício do poder, acabam por soçobrar.