A série de assassinatos (ou tentativas de) a que vimos assistindo e continuaremos a assistir, são operações da CIA, do MI6, doutros serviços da OTAN (+ Mossad de Israel + Serviços da Ucrânia), que contratam «homens de mão» para atentados terroristas. Desde 07 de Outubro de 23 assistimos a um horrível massacre contínuo de população inocente às mãos do exército IDF de Israel, cometendo crimes de guerra. Mas, também há uma multiplicação de atos de terrorismo contra alvos especiais, pelo «Grande Hegemon».
Mostrar mensagens com a etiqueta Estado. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Estado. Mostrar todas as mensagens

sábado, 15 de dezembro de 2018

OS QUE ESTÃO POR DENTRO JÁ SE PREPARAM PARA A CRISE

No imobiliário, tal como noutros mercados, há quem esteja discretamente a desfazer-se de activos, demasiado arriscados... 
Como para cada venda há um comprador, interessa saber quem são os compradores? 
- Estes são, em grande maioria, os actores institucionais... Ou seja, o grande público afinal, indirectamente, que pôs suas economias nos fundos de pensões, etc. e nem suspeita do que andam a fazer com o seu dinheiro. 
São pessoas pobres e da classe média, que contam com o dinheiro de suas pensões e de instrumentos de poupança. Esse dinheiro simplesmente não vai existir quando for mais necessário. São eles que vão levar pela medida grande, quando vier a crise. 

Todos os grandes actores sabem que a crise está aí, mas não vos dirão isso, nem mostrarão qualquer preocupação em público. 
Porém, os seus actos falam mais alto: eles estão a precaver-se, ao venderem os activos mais arriscados, a comprar metais preciosos e outros activos não financeiros sub-cotados.

                          

Os que embarcaram na bolha especulativa das cripto-moedas estão encerrados numa espiral descendente. Muitos, desde 2017, acumularam perdas da ordem de 80%. 
                         

A inflação (a hiper-inflação, no fim) é a «saída» para os Estados e as empresas sobre-endividados. É a ruína para as pessoas pobres e da classe média.

QUANDO OUVIR A EXPRESSÃO «THE GREAT RESET», PENSE QUE SE TRATA DA MAIOR TRANSFERÊNCIA DE RIQUEZA EM TODA A HISTÓRIA, DOS MAIS POBRES EM DIRECÇÃO AOS MAIS RICOS.

terça-feira, 11 de dezembro de 2018

ENQUANTO A VERDADE É NEGADA, O ESTADO PROFUNDO AVANÇA


              Image result for huawei 5g

Enquanto a verdade é negada ao público americano e internacional em geral, o «Estado Profundo» da nação que se auto-classifica como «indispensável» continua a manobrar com total impunidade.

Em múltiplas ocasiões verifica-se que Trump foi ultrapassado pelo «Estado profundo», nomeadamente em relação à sua política de apaziguamento com a Rússia, sabotada múltiplas vezes, sendo a última o incidente marítimo no estreito de Kerch, com navios de guerra ucranianos entrando em águas territoriais russas, uma manobra destinada a provocar um aumento de tensão ao nível não apenas local, mas a bloquear qualquer movimento de países europeus e  de  Trump no sentido de aliviar a política de sanções
Estas sanções, como sabemos, têm sido talvez piores para os países europeus e aliados dos EUA, do que para a Rússia propriamente. Esta política tem propiciado que Putin leve a cabo a modernização do arsenal estratégico russo, o aumento da operacionalidade das forças armadas, o reforço da aliança com a China em todos os domínios, incluindo o militar, a aceleração da «desdolarização» da economia russa. 

O incidente com a prisão no Canadá, por pedido expresso dos americanos, sobre a cidadã chinesa, Meng Wanzhou, directora executiva da Huawei, filha do principal accionista da mesma, tem contornos demasiado escabrosos. 
O pretexto de que a Huawei tem relações comerciais com o  Irão, seria risível, se não fosse uma negação patente da lei e direito internacionais. Com efeito, a referida directora da Huawei não cometeu nenhum crime, nem face às leis americana ou canadiana nem face à lei internacional, para ser colocada nesta posição. É, portanto, o equivalente ao nível de Estados de uma tomada de refém por bandidos. Reflecte este acto exactamente aquilo em que se tornaram os EUA, desde que os neocons fazem a lei, ou seja, desde as presidências de Bill Clinton, G. W. Bush, Obama e agora de Trump.

Em termos de lei internacional, os EUA deve ser considerado um «Estado pária», um «rogue State», pois as convenções e regras internacionais, quer as que regem relações ao nível dos Estados, quer de empresas tanto entre elas, como com Estados (direito internacional privado), estão a ser postas em causa flagrantemente pelos EUA, os quais só as invocam quando isso lhes convém para a sua retórica. 
Para cúmulo, também as convenções internacionais que protegem os cidadãos do arbítrio dos Estados, são espezinhadas, agora. 
Com esta política, os Estados-vassalos, particularmente na Europa, terão as maiores dificuldades de se alinharem e mesmo serão forçados a entrar em contradição com a política dos EUA. Já o fizeram em relação à retirada unilateral dos EUA do acordo com o Irão.  

Face a tanta falta de senso político e mesmo de senso comum, há que tentar compreender a razão e lógica subjacentes a isto tudo. Parece-me que o Estado profundo tem forçado Trump a aceitar políticas contrárias às suas crenças e à vontade que exprimiu na campanha eleitoral, que foram uma das razões porque foi eleito, sendo a outra, o facto de uma vasta camada de eleitores estar farta de ser humilhada por uma «elite» bem pensante (liberal de esquerda), que apoiava Clinton. 

Podemos criticar severamente as incoerências das posições e dos actos praticados por Trump, sem dúvida. Sem dúvida, ele tem responsabilidades. 
Mas, parece-me que ele está sujeito a chantagem. Parece-me que muito do que se passa por detrás da cena tem a ver com isso. Parece-me que o «Estado profundo» dispõe de meios eficazes de exercer chantagem. Usou essa chantagem com a pretensa cumplicidade russa na sua campanha e eleição de 2016, quando, na verdade, foram Obama e Hillary que deram aos russos a concessão (perigosa, em termos de defesa dos EUA), o acordo dito do urânio, segundo o qual os russos efectuariam a refinação do combustível nuclear, destinado às centrais nucleares americanas. 
Sabemos que o Estado profundo americano tem no seu passado o assassinato de um presidente (JF Kennedy) e de muitos outros destacados cidadãos (Martin Luther King, Malcolm X, etc, etc), para não falar do golpe de Estado, encoberto de ataque terrorista, do 11 de Setembro de 2001
Este Estado profundo não é «reformável» e nem creio que seja possível aplacá-lo. 
Trump tem sido obrigado a ceder em aspectos vitais da política americana. A própria composição do governo tem sofrido alterações no sentido de colocar homens e mulheres de confiança dos neocons, como John Bolton, enquanto garantes de que as políticas de Trump não tomem caminhos demasiado contrários aos desígnios estratégicos deles. 

Sem dúvida, os EUA são efectivamente um país de «partido único» como diz Chomsky, com duas alas, os Democratas e os Republicanos... Eu acrescentaria que por detrás da cena quem tem realmente a chave do poder nos EUA são os neocons, sendo estes voluntariamente, agentes do complexo militar industrial e securitário, agentes dos lobbies do armamento, da agro-indústria, da indústria farmacêutica e, sobretudo, da grande banca, de «Wall Street», os interesses financeiros, que possuem directa ou indirectamente uma enorme fatia dos EUA.

sábado, 8 de dezembro de 2018

COLETES AMARELOS: A OLIGARQUIA AMEAÇADA



Por uma vez, as pessoas comuns, do povo, podem afirmar a sua saturação de serem sistematicamente humilhadas, espremidas com taxas e impostos, para que uma classe rica e parasitária continue, mesmo nos momentos de «austeridade», a levar uma vida faustosa. 
Não será este um renovo da grande revolução francesa, de 1789 - 1793 cujos avanços permitiram o Estado moderno? Os valores em que se apoiam - hoje ainda - as constituições, não apenas da França, como em todos os Estados que se dizem democráticos? 
A esta distância histórica da Grande Revolução Francesa, acho que é mais que tempo que estes princípios comecem a ser postos em prática. 
É mais que tempo que a oligarquia que governa nos Estados europeus, ou no mundo inteiro, seja apeada, não para novos chefes emergirem, mas sim para uma nova forma de governo, sem chefes, o que seria afinal o sonho e a forma genuína de poder do povo.
Este movimento dura e aprofunda-se. Dura e alastra. Quem não é da oligarquia dos diversos países não tem nada a temer, antes deve regozijar-se e desejar que esta revolução pacífica alcance o máximo, não apenas em reivindicações materiais, como na verdadeira renovação do «contrato social».

            https://www.youtube.com/watch?v=Skcq-yDca80

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

AS FORMAS DE GESTÃO DA ECONOMIA E SOCIEDADE NO SÉCULO XXI

As formas de gestão da economia e sociedade no século XXI têm, até agora, vivido de um prolongamento das formas herdadas do século 20. Isso não nos deve surpreender, mas devemos compreender as diferenças estruturais que existem entre a economia e sociedade digitalizadas de hoje e as de há 50 ou mesmo 20 anos atrás. Com efeito, a tendência maior durante o século 20 foi a da concentração, a ascensão de monopólios um pouco por todo o lado, em todos os países, em todos os sectores, só foi possível pela conivência ou mesmo instrumentalização do poder político. Além disso, havia uma forte procura de centralização de poderes administrativos, de concentração de poder nas mãos de uns poucos, quer se tratasse de «politburos» de países de capitalismo de Estado (ditos «comunistas»), quer de construções típicas do capitalismo do chamado «ocidente» como a União Europeia, com o seu colégio de comissários não-eleitos. A todos os níveis, desde o poder local ao internacional, observou-se uma concentração de poderes de facto, mesmo quando se procedia a «descentralizações», em boa verdade, formas de extensão e consolidação dos poderes dos grandes partidos e grupos de interesses que tinham capturado o Estado. 
Na realidade, a revolução digital veio tornar a tarefa de centralização do poder (aqui não distingo a economia e a política, pois estão intimamente ligadas) simultaneamente mais fácil e mais complicada. Mais fácil porque as redes digitais permitem abolir as distâncias físicas e comandar instantaneamente a partir de centros ou nódulos as diversas partes dos sistemas complexos que constituem as sociedades contemporâneas. Mas também uma dificuldade, na medida em que essa facilidade em estabelecer redes de toda a espécie também dá a possibilidade daquilo que é bastante insignificante hoje, «passando debaixo do radar» dos que controlam esta sociedade, possa ser amanhã forte concorrente ou mesmo desafiador do "status quo". Dificuldade também, porque a imposição da «verdade oficial» estará tendencialmente dificultada pelas inúmeras «entradas» no sistema, onde a multidão de anónimos pode simultaneamente fornecer e receber dados - toda a espécie de dados - sem ser através das entidades centralizadoras, controladoras. Para circunscrever tal perigo, para os poderes centralistas, erigiram-se em todas as grandes potências monstruosas estruturas colectoras de dados, como a NSA, que recolhe dados «em bruto» de todo o lado. A indiscriminada colheita é sucedida pela análise, realizada automaticamente, utilizando algoritmos sofisticados e permite a detecção de sinais, de frases significativas. As mensagens assim seleccionadas vão para uma análise mais fina. O processo ocorre em vários patamares até que, no topo, se recorre a peritagem humana. 
Porém, a crise económica, duplicada pela crise ambiental, está a sabotar este modelo centralizado. As probabilidades de uma grande crise estrutural do capital e do ambiente são muitas e só as pessoas ofuscadas, pela ideologia ou pela intoxicação de lixo informativo, não conseguem compreender a iminência dela. 
Por outras palavras, estamos em plena transição. Porém, as formas que podem tomar  as sociedades, as economias e as formas de controlo das mesmas, estão completamente mergulhadas  em espessa névoa. 
Os arautos do futuro, que periodicamente anunciam esta ou aquela transformação, em geral catastrófica, descredibilizam-se por errarem na maioria das suas previsões, mesmo num horizonte temporal bastante curto. 
Por outro lado, a crise das ideologias, nomeadamente, as que se convenciona chamar de «esquerda», resultam na apatia, na ausência de perspectivas, sobretudo das jovens gerações. Ao contrário das pessoas que foram jovens há 60, 50 ou 40 anos atrás, pois nessa época, as ideologias de cunho «revolucionário» tinham adesão garantida dos jovens, desejosos de uma transformação social, queriam ser protagonistas da mesma e procuravam aquilo que desejavam em termos de sociedade, o caminho para tal transformação. A decepção reiterada dessas esperanças devido a diversas circunstâncias, atirou a maior parte daquelas gerações para o cepticismo ou para o cinismo. 
O modelo de sociedade que sonharam afigurou-se não apenas ilusório, mas um logro completo, naqueles países que eram apontados como sendo realizações da nova sociedade, mesmo imperfeitas, com «arestas a limar». 
A impossibilidade de sustentação de um «capitalismo civilizado», onde houvesse uma certa protecção social, reconhecendo direitos económicos como parte integrante dos direitos humanos, foi a outra machadada nas suas ilusões: A social-democracia permaneceu (sobretudo na Europa ocidental) enquanto foi necessária para neutralizar o fascínio exercido pelo «bloco socialista», mesmo sabendo-se que neste vigoravam regimes totalitários. 
Mas, logo que o bloco soviético implodiu, foi tarefa bastante fácil das «elites» capitalistas, desmontarem peça por peça o Estado Social (Wellfare State), deixando apenas uma «carapaça vazia», uma série de «direitos» inscritos -mas letra morta - nas leis dos países. Nestes, a prática burocrática do Estado e das empresas, nega os referidos direitos, subordinando as funções sociais ao «mercado», ou seja, à lei do lucro. 
Mas esta transição está - ela própria - posta em causa, pela existência de uma crise do capitalismo, onde os episódios mais agudos de «crash» são apenas acentuações bruscas da sua perda global de operacionalidade. 
No meio desta «débacle», existem muitos tubarões que conseguem prosperar e edificar pequenos ou grandes impérios económicos. Porém, não se nota um crescimento vigoroso de um capitalismo empreendedor, como seria lógico esperar, se os arautos do neoliberalismo tivessem razão. 
Com efeito, eles constantemente afirmam que a economia tem estado «cativa» de forças «socialistas», ou seja, das protecções sociais para os mais pobres, os mais frágeis; que tem sido essa a causa dos fracos índices de crescimento da economia, do PIB, etc. 
Pois agora, que conseguiram um quase completo desmantelamento do Estado social, a produtividade global estagna e só não recua por causa de avanços na automatação, na informatização...Porém, apesar dessas aparências de «progresso», do ponto de vista social, como no entre as duas guerras mundiais do século vinte, constata-se que alarga o fosso entre os muito ricos e uma classe trabalhadora precarizada, sem protecção real na doença, no desemprego e na velhice.  
Agora, a rentabilidade do capital é inferior à da época em que os trabalhadores usufruíam de protecção e de capacidade para arrancarem melhores salários, contrabalançando, de certa forma, a parte do lucro nas empresas. 
Visto que as pessoas deixaram, numa percentagem crescente, de dispor de um excedente para poderem consumir, além do indispensável, esse acréscimo de consumo foi feito à custa de crédito. Este é efectivamente uma punção sobre o futuro. 
A mínima crise, com seu corolário de aumento dos despedimentos, dos aumentos de preços, de instabilidade nas vidas, precipita as pessoas na pobreza, quando deixam de conseguir pagar as prestações do carro, da casa, dos electrodomésticos, dos estudos universitários, etc.
A solução não está ao virar da esquina, mas tem de ser a duma estrutura muito mais descentralizada, em que redes, não controladas por gigantes, seja na produção, na distribuição ou nos serviços, terão de assegurar o funcionamento mínimo da economia e da sociedade em geral. 
Um tal modelo cooperativo não implica a «morte súbita» do capitalismo enquanto tal, mas que as pessoas descolem de uma dupla ilusão, castradora: 
(1) A de que podem esperar ter um modo de vida decente como assalariadas duma grande empresa, onde patronato ou classe empresarial, dirige e as restantes limitam-se a fazer o que lhes mandam. 
(2) A ilusão de que o Estado é uma espécie de «pai» ou de«mãe» severo/a mas, ainda assim, protector/a, que ouve e atende as pessoas em caso de necessidade, de problemas ... 
As pessoas que estão agora a entrar na vida activa vão descobrir, por elas próprias, que construir um negócio, uma empresa, serem capazes de gerar dinheiro pelos produtos ou serviços que elas próprias desenvolvem é real alternativa à vida de escravidão assalariada, ainda por cima, quando esta se reveste de grande precariedade. Apenas algumas terão coragem de se organizar em sociedades cooperativas, ou de outro tipo, imbuídas de uma visão completamente diferente do espírito empresarial corrente. Sendo de prever que elas irão ter dificuldades colocadas pelos concorrentes capitalistas tradicionais, penso que - no final - têm real possibilidade de triunfar, pois dispõem de maior flexibilidade. 

O pressuposto do que afirmo é de que o agravamento simultâneo da crise económica e da crise ecológica, vão ser os factores decisivos da transformação social. 
As situações sociais e económicas vão ser completamente transformadas pela amplidão, profundidade e duração desta crise. 
Ela poderá ser uma crise de marasmo, de degradação progressiva das condições gerais de funcionamento da sociedade. Não prevejo algo como uma crise revolucionária, embora esta não esteja completamente fora dos possíveis. 

As condições sociais vão ser tão rudes, que apenas pessoas capazes de trabalhar num espírito de entre-ajuda - e não no espírito capitalista «normal» do enriquecimento pessoal - conseguirão subsistir. Ao emergirem desse período de grandes provações, as sociedades irão auto-produzir algo novo.

Com que se poderá parecer tal nova sociedade? Não sou adepto de profecias ou futurologia, mas tenho desejos, esperanças de que as presentes e futuras gerações encontrem o seu caminho. Para que a espécie humana tenha futuro, julgo que as seguintes condições devem verificar-se: a  nova sociedade será mais localizada e menos baseada em mega-monopólios, com uma multiplicidade de regimes de propriedade, onde não haverá predomínio de formas estatais, embora o Estado continue a existir.  


terça-feira, 20 de novembro de 2018

NÓS, OS PEQUENOS DEUSES (nº3)

[continuação dos artigos nº1nº2, neste blogue] 

A construção de um consenso é fundamental para fazer funcionar a sociedade capitalista; esta possui muitas articulações da economia com o Estado. 
Seria por demais ingénuo supor que existe o Estado, por um lado, com um certo número de funções eletivas e onde as vontades dos cidadãos - supostamente - se traduzem numa determinada política e, por outro, empresas, o mundo da economia, onde empresários e gestores decidem e os empregados executam. 

Na realidade, a imagem, que as pessoas têm da organização política e económica do país e do mundo, é distorcida. Mas, isso é intencional, é resultante da ocultação e deformação constantes. 
É esta ausência de lucidez da generalidade dos cidadãos, justamente, que cria um consenso mínimo e possibilita esta governação (pseudo) democrática. 
A razão desta estratégia é muito fácil de compreender: As classes dominantes, em todo o mundo, sabem que é mais fácil manter uma fachada de democracia, do que exercer sua ditadura sem máscara. 
Porém, fruto das condições da crise que se generaliza, a narrativa do poder está constantemente a entrar em contradição com a sua prática. Tal constitui sinal claro de que o Estado de «democracia liberal» tem os seus dias contados.

A emergência recente de tendências ditas «populistas», sobretudo na Europa, parece-me um último recurso para reconstruir o tal consenso, fundamental para a conservação do Estado e do sistema capitalista. 
As pessoas estão numa situação de ignorância na prática, sobre os mecanismos da política. Embora seja vista como algo de exterior, apercebem-se dos efeitos graves que ela exerce sobre suas vidas. 
Então, imaginam que haverá alguém que os compreende, que será seu porta-voz e que não estará corrompido: uma parte da população adere, entusiasta, a tais movimentos e personagens, mais do que às ideologias ou programas políticos, na esperança ingénua de que sejam pessoas íntegras, incorruptíveis. Os partidos e líderes populistas ascenderão então ao poder.

Mas, chegará um dia em que estas forças populistas, confrontadas com o exercício do poder, terão de atender às pressões do grande capital e  do «Estado profundo» (corpos não eleitos: funcionários, polícias, militares, tribunais), com capacidade de bloqueio, quando não mesmo, de derrube do governo. 
Sujeitos a esta chantagem, os políticos populistas terão de reagir, de uma ou doutra maneira. Mas, em geral, não adotarão medidas extremas para reprimir violentamente a oposição no interior da máquina estatal. 
Vão preferir compor com elas; isso significa que certas medidas prometidas não serão tomadas, que haverá uma redefinição discreta de objetivos, tentando salvar a face com explicações sobre a conjuntura económica, etc.
Dececionados com o desempenho daqueles que ingenuamente tomaram como seus salvadores, as pessoas não equacionarão o facto de que a crise é sistémica e global, pelo que não haverá um qualquer retorno à «democracia pura» e ao «capitalismo puro» que, aliás, nunca existiram. 

Com o agravamento da crise económica, com o desespero da classe média pauperizada e a rutura completa do contrato social, que permitia manter os economicamente mais fragilizados fora das situações extremas de pobreza, criam-se condições para uma mudança radical. 
Porém, esta mudança pode bem ser em direção a um totalitarismo. Poderá ser um totalitarismo, com características próprias, mas igual - na essência - aos outros totalitarismos, historicamente conhecidos. 

Não apenas é realista este cenário, como está a acontecer diante dos nossos olhos: Basta ver a deriva autoritária de vários regimes, ditos de democracia liberal. Ocorre, não em países periféricos, mas em praticamente todo o chamado «Ocidente» (América do Norte, Europa, Japão, Austrália...). 
Somos testemunhos, em muitos países, de um deslizar para um «fascismo cinzento», ou seja, um autoritarismo sem clara e definida viragem do discurso ideológico, guardando aparências de governo e instituições formais, mas onde o verdadeiro poder está nas mãos da oligarquia que controla tudo: meios de produção,  média subserviente, aparelho de Estado, partidos políticos.

Penso que muitas pessoas estão completamente desprevenidas e, portanto, incapazes de se defenderem.  Para isso contribui a viragem das forças de esquerda, parlamentares ou não-parlamentares, para posições reformistas e de cogestão do capitalismo e do Estado. Nesta deriva, desde os anos oitenta do século passado, elas evoluíram de reivindicações de classe e de lutas com o objetivo explícito da mudança em direção ao socialismo, para reivindicações hedonistas, identitárias e que não colocam sequer a hipótese de mudança geral da sociedade, seja ela pacífica ou não.

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

UMA CRÓNICA REPUGNANTE

Hesitei longo tempo em escrever esta crónica, porque os factos à qual esta se refere são simplesmente repugnantes. 
Toda a gente em Portugal comenta a notícia da sentença do Tribunal da Relação do Porto, que considera aceitável violência (exercida com sadismo, ainda por cima) pelo marido, devido a se tratar de uma mulher adúltera. 
Foi preciso uma afirmação do Presidente da República, de que «todos os magistrados são obrigados, obviamente, a cumprir a Constituição da República» para que o Conselho Superior da Magistratura instaurasse um inquérito disciplinar. 
Ora, acontece que o juiz que redigiu a sentença infame tinha antecedentes em desculpar a violência contra mulheres e mesmo em «justificar» violência contra criança de quatro anos.

Estes factos, quando saltam dos tribunais para as primeiras páginas dos jornais e para a discussão pública, são chocantes porque as pessoas têm uma noção intuitiva da justiça que está exatamente no polo oposto do comportamento destes juízes. Aliás, não é assim tão raro - em Portugal - vir a público uma notícia de uma sentença completamente disparatada e com fundamentos absurdos, como foi este recente caso, que despoletou a onda de indignação em todo o país. 

Infelizmente, as pessoas estão completamente equivocadas em relação à chamada «justiça». Ela é efetivamente uma justiça de classe e os seus guardiões de toga estão ao serviço do Estado, não ao serviço dos cidadãos. São privilegiados - pelo próprio estatuto e pelo Estado - que se veem numa situação de impunidade. 

Muitos devem ver-se a si próprios como fora do alcance de qualquer medida disciplinar, mesmo quando pisam e distorcem de forma grotesca a letra e o espírito da lei. Muitos, não apenas aqueles juízes do Tribunal da Relação do Porto, pensam que podem decretar sentenças segundo o seu parecer subjetivo e distorcer - até à caricatura - os fundamentos legais, sobre os quais essas mesmas sentenças teoricamente deveriam repousar.

Sem dúvida, o ordenamento do Estado tem a ver com esta situação de virtual impunidade dos juízes: a prática tem-lhes mostrado que poucas vezes algo acontece em termos disciplinares, seja qual for a sentença proferida, seja qual for o fundamento invocado para a mesma. 
Pressupõe-se que um juiz deve ser respeitoso da Constituição e das Leis, mas a sua posição é praticamente inamovível ou é preciso um escândalo de enormes proporções, como este, da «sentença da mulher adúltera», para que algo sério lhes aconteça, em termos disciplinares.

A um nível diferente, também os polícias são salvaguardados de sérias consequências dos seus atos, mesmo quando estes envolvem clara violação dos direitos das pessoas, um desrespeito óbvio pela lei e atos de brutalidade. Tanto no caso dos magistrados como dos polícias, há alguns elementos que interpretam de forma «demasiado lata» a impunidade que - de facto- lhes é facultada pelo Estado - dito- de «Direito», com suas leis e práticas disciplinares. 

Que eles têm a proteção do aparelho e dos agentes do Estado, pode ser comprovado por nunca serem postos em causa quando ocorre a repressão brutal e totalmente injustificada de manifestações, que eles consideram «contrária à ordem pública», mesmo manifestações legalmente convocadas, onde não exista qualquer ato agressivo de manifestantes. 
Nestas ocasiões, quanto muito, pode surgir alguma indignação pública por «actos desproporcionados» por parte dos polícias ou sentenças «demasiado severas» por parte de juízes. 

Mas não se equaciona nunca que estes são levados a cabo pelos mesmos que os das sentenças aberrantes ou dos atos brutais nas esquadras. Se não são os mesmos, pertencem todos ao mesmo caldo de cultura dos tribunais e das esquadras. 

Se um indivíduo de origem africana é agredido no interior de uma esquadra ou se uma mulher, que sofreu agressão física pelo seu marido com um bastão cheio de pregos, é sujeita a uma sentença totalmente absurda, a indignação do público, muito justificadamente, sobe ao rubro. 

Porém, após o anúncio de um inquérito, parece que tudo volta à normalidade, tudo entra «na ordem». As punições disciplinares são decretadas e aplicadas muito tempo depois e com a maior das indulgências, por norma, ou não fossem eles também, os que as decretam,  guardiãos do sistema.

Não nos iludamos: a justiça é de classe e defensora do Estado acima de tudo. As corporações, supostamente especializadas em defender a legalidade, têm de defender o Estado, acima de tudo! 
... e as pessoas? - Bem, estas, deve-se dar a impressão de que o Estado «se preocupa» com elas.

Uma justiça de verdade só poderá ser baseada num poder real do povo; não me admira nada que numa sociedade divida em classes e onde o poder do dinheiro «soa» cada vez mais alto, a justiça seja o lamentável espectáculo que se vê.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

«O ESTADO... ESTÁ FORA DE PRAZO»

O Estado é uma complexa e tentacular organização que se instalou e consolidou paulatinamente, há uns 6000 anos. 
Sofreu as mais diversas formas e reformas, mas - na sua essência - continua a ser baseado no monopólio da força e coerção, sobre um povo ou vários povos, além de que tem o monopólio de «sacar tributo» ou seja de decretar impostos, sendo criminalizados todos aqueles que violenta ou pacificamente põem seriamente em causa este domínio hegemónico. 


O livro de Gregory Sams é muito original e a entrevista acima reproduzida dá conta disso. O entrevistador não poupa questões difíceis, faz o papel de advogado do diabo, todo o tempo... o que torna a entrevista viva e intelectualmente provocante.
Muitos autores de um vasto espectro têm criticado a construção autoritária do Estado, sem por isso pretenderem a abolição de toda a forma de autoridade, simplesmente vendo esta como emanação de baixo para cima, ou seja, das comunidades. Estas estão muito mais em medida de exercer uma certa coerção no seio da própria comunidade do que uma autoridade exterior, judicial ou policial. O autor também privilegia a justiça de tipo reparativo sobre a justiça punitiva, que prevalece ainda hoje.
Ele não se considera anarquista: porém, muitos anarquistas evolucionistas, por oposição às tendências revolucionárias, têm tido ideias semelhantes a Gregory. 
São pessoas pragmáticas, que preferem avançar para objectivos de maior justiça, liberdade e igualdade, a fomentar um cataclismo, que provavelmente iria desencadear a construção de um poder tão ou mais ditatorial e opressivo do que o que foi derrubado.

domingo, 26 de fevereiro de 2017

SOBRE O NIILISMO, O FUNDAMENTALISMO E A NECESSIDADE DE ACREDITAR

 Nas minhas andanças e experiências, tive oportunidade de conviver com algumas pessoas, ateias ou crentes, que tinham uma grande segurança e firmeza. Porém, nuns e noutros casos, pareceu-me que essas pessoas se fechavam dentro dum sistema, de uma visão global, de uma ideologia.
Uso a palavra «ideologia» no sentido mais lato, não no de «ideário político», mas mais no sentido filosófico de uma narrativa construída, destinada a explicar tudo, a vida, o universo, a natureza.
Assim, mesmo em pessoas que se designam de ateias, vejo que se sobrepõe à racionalidade pura, uma necessidade ou desejo de crer, de acreditar. Eu chamaria estas pessoas de «crentes», sem qualquer desprezo ou menosprezo pelos seus pensamentos ou sentimentos.
Contrariamente, as pessoas que se deixam enrodilhar nas vaidades das modas, incluindo obviamente, as modas intelectuais, são as que têm diminuta firmeza nas suas crenças. Em geral, não as confrontaram com outras narrativas, ou porque não tiveram essa oportunidade, ou porque preferiram evitar esse confronto.
Na realidade, se algo caracteriza o grupo dos «crentes», e nos permite distingui-lo do segundo, os «seguidores das modas», é o grau de profundidade da consciência.
As pessoas mais sujeitas a modas, a seguirem a corrente, facilmente ficam decepcionadas com alguma ideologia, religiosa ou não, porque estavam falsamente convencidas de que podiam «comprar», a felicidade, a iluminação, a beatitude, etc. com a sua «adesão» exterior.
Face às realidades da vida, cedo vêem que as coisas não se apresentam como imaginavam. O resultado é caírem numa passividade em relação ao domínio social, refugiando-se no egoísmo, no hedonismo, no consumismo, posturas encorajadas pela própria sociedade.
Quanto às pessoas «crentes», estas podem também ser confrontadas com decepções nas suas respectivas convicções, religiosas ou não. As pessoas com maior pendor crítico tenderão a reformular, a requintar as suas convicções.
Mas muitas pessoas caem num «extremismo» conceptual, traduzindo-se quer em niilismo, quer em fundamentalismo. Por outras palavras, ou repudiam todo e qualquer sistema teórico, ideologia, convicção (niilismo) ou, pelo contrário, atribuem à sociedade - ao «mundo» - os males todos, vendo nela o «pecado» da não-aceitação plena da sua verdade (fundamentalismo).
Sem tentar absolutizar, creio que isto é uma chave importante para se compreender porque razão os adolescentes de hoje, como outros de outras épocas históricas, têm - com frequência - uma grande apetência pelas versões ideológicas ou religiosas ditas «mais radicais», mais «fundamentalistas», ou que se traduzem em práticas violentas e totalitárias.  
Na adolescência e juventude, muitas pessoas mostram uma grande necessidade de acreditar: por isso, as suas posições são absolutas ou, pelo menos, manifestam-se deste modo.  
Na plenitude da idade adulta, o confronto com as realidades da vida transforma as pessoas que não desistiram de se interrogar – as pessoas dotadas de consciência- o que se traduz pela evolução dos seus pensamentos e crenças, que ganham em subtileza, em consistência, por comparação com as posições adoptadas na adolescência.
Porém, a adolescência é uma época de grande insegurança do «eu», em que este já não se sente essencialmente protegido pelo aconchego familiar, maternal, mas ainda não sabe agir e posicionar-se no mundo dos adultos. 
A sociedade mercantilizada tem como alvo principal os jovens. A indústria do entretenimento explora as necessidades de afirmação, de oposição em relação aos parentes, por vezes confundida com rebeldia. Jogando com a psicologia dos jovens, a publicidade acentua os sentimentos de frustração, para lhes apresentar o consumo como panaceia: consumir música, roupas, bebidas alcoólicas, drogas, motos, etc…Consumir é «viver»! O vazio deste consumismo não deixa de se tornar patente, mais cedo ou mais tarde. É aí que muitos optam pela tal viragem «radical», pela sua entrega a uma causa, seja ela de âmbito secular ou religioso.
Neste caso, o que predomina é a enorme necessidade de acreditar, de ter fé em algo, de fugir ao vazio de uma sociedade que apresenta como único modelo o consumismo. As versões mais totalitárias das religiões, ou das ideologias políticas, têm aí a sua base de recrutamento.
Julgo que as condições para o crescimento do niilismo e do fundamentalismo residem mais na sociedade do que nos indivíduos. Verifica-se que os jovens que aderem a organizações terroristas são pessoas idealistas, transviadas e manipuladas. Pois a procura de ideal, a entrega a uma causa elevada, deveria ser factor para elevação desses jovens e não de serem utilizados como «peões», em violências terroristas.
O factor primário reside na ausência de referências, de valores, que se notam nos seus microambientes de estrutura familiar, comunitária, de trabalho; na malha social, em geral.
A sociedade atomizada, onde a norma é essencialmente hedónica e egoísta, onde predomina o darwinismo social mais primário como ideologia, não pode esperar ter outros «filhos e filhas».

A lei do lucro e do poder é uma lei de morte, que se opõe à lei do amor e da vida. Esta ideologia difusa, que dita os comportamentos de uns e de outros, é a produtora do terrorismo; precisa do terrorismo como pseudo-justificação das suas derivas autoritárias, securitárias. 
Desmascarar a origem do terrorismo como instrumento de todas as derivas autoritárias, quer sejam oriundas dos Estados ou de grupos autoritários que disputam a hegemonia aos Estados, parece-me ser o principal e fundamental ponto de partida da luta pacifista, não-autoritária.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

ESTADO, CAPITALISMO, MONOPÓLIO, GLOBALIZAÇÃO

Debaixo deste título deixo vários pontos de reflexão, que pretendem ir pra além de «uma definição de dicionário» dos acima-mencionados termos.
O Estado tem como elemento fundamental a coacção. 
Mesmo quando não tem aspectos odiosos, a coacção existe e é aceite de forma generalizada. Que essa aceitação seja de bom grado ou mau grado, pouco importa. O facto é que a imensa maioria tem em atenção as leis produzidas pelo Estado: por exemplo, dificilmente alguém consegue deixar de pagar impostos, colectados em exclusivo pelo Estado, através das Finanças, do Fisco. 
Não se deve confundir o Estado com os elementos que ocupam lugares-chave do mesmo. Como em todo o aparelho, as pessoas que o comandam são importantes, mas não são indispensáveis. 
Outro atributo muito citado é o da exclusividade da força armada; não existe no conceito de Estado moderno lugar para forças militares ou militarizadas privadas ou que pertençam a uma qualquer facção particular. Porém, o Estado recorre cada vez mais a serviços de policiamento, de prisões, mesmo a forças combatentes (mercenários) privadas. 
O Estado tem o papel de cunhar moeda, sendo isso citado como atributo de sua soberania. Porém, a partir do Euro, muitos Estados renunciaram a ter a faculdade de o fazerem, para confiar o papel de banco central a uma entidade supra-nacional, o BCE. 
De facto, o Estado, apenas é um instrumento eficaz de coação porque as pessoas têm a sua vida dependente do mesmo; quer se trate de emprego público (frequentemente o Estado é o maior «patrão» numa sociedade), quer se trate de emprego privado, as relações de trabalho são reguladas por leis e acordos laborais. O que se designa por sector da economia «privada», não é mais do que a oportunidade dada pelo Estado, que alguns aproveitam: as oportunidades de «mercado» do capitalismo e tudo o resto, só são possíveis com inúmeros apoios estatais, directos e indirectos, desde a legislação, tribunais, organização burocrática, forças armadas, ensino, às infraestruturas de toda a espécie...

O capitalismo é frequentemente definido como modo de produção, mas esta definição deverá contemplar a historicidade deste. Pois nem sempre houve capitalismo, no passado remoto, e -provavelmente - será substituído por outro modo de produção no futuro. 
A característica mais relevante do capitalismo não é a exploração, pois essa ocorreu também em sistemas feudais ou esclavagistas; é sim, o facto de que a organização da produção é relegada para o domínio individual. Isto é, não se trata de um sistema onde as decisões sobre investimento ou produção estejam centralizadas. 
No capitalismo é reconhecido que será, em última instância, o interesse do capitalista (a maior parte das vezes associado a outros) a decidir e não o Estado ou outra entidade. Esse interesse em produzir algo ou fornecer tal ou tal serviço é determinado pela existência de uma necessidade da sociedade, uma necessidade que se traduz numa procura, num mercado. 
A coisificação do próprio trabalho e do  trabalhador, transformado em mercadoria, é a consequência desta disposição do sistema produtivo, não de uma perversidade intrínseca dos capitalistas
A existência de capitalismo não se acomoda bem com a permanente intervenção do Estado no mercado. 
Isto verifica-se, com uma grande acuidade, por exemplo, com a manipulação por entidades estatais ou para-estatais (bancos centrais) do «custo do dinheiro», ao fazerem baixar artificialmente a taxa de juro das obrigações soberanas. Arrastam assim toda a economia para um jogo perigoso, em que múltiplos actores fazem apostas arriscadas, tomam posições apenas porque os juros estão muito baixos. Com isso, tornam inviáveis os investimentos com menos rentabilidade imediata, dão um sinal ilusório de investimento produtivo, criam ilusões de rentabilidade em empresas e sectores que não são e acaba por ter um efeito destruidor de capital e da poupança. 

A monopolização de sectores inteiros da economia desenvolveu-se numa escala sem precedentes no século XX. Os monopólios permitem que os preços ao consumidor sejam mais baixos, num primeiro tempo, apenas. Porém, trazem a destruição de muitas empresas, não só pequenas e médias, como também grandes, que eram a concorrência e permitiam que o consumidor pudesse escolher entre vários produtos/serviços, mantendo uma pressão para baixar os custos e preços. Na fase de domínio do mercado, os monopólios vão ditar os preços aos consumidores, aumentando o lucro em muitas ordens de grandeza. Inevitavelmente, esta monopolização da economia traz custos sociais, desemprego, mas também um abaixamento da qualidade e da diversidade. 
Na economia dominada por monopólios, o Estado é apenas um regulador da «lei» instituída pelos monopólios, é um vassalo dos grupos corporativos. Com a financiarização da economia dos países afluentes, em particular a partir das últimas duas décadas do séc. XX, o sector bancário e os grandes fundos de investimento privados (hedge funds), vão dominar a economia e o próprio Estado, na medida em que impõem as normas de acordo com os seus interesses. 

A globalização é um fenómeno correlacionado com a transformação do capitalismo, nos finais do século passado. O capitalismo deixa de estar limitado pelos factores nacionais. 
O mercado de bens e serviços passa a ser global. Igualmente, o próprio mercado dos capitais é completamente globalizado, o capital pode circular sem qualquer impedimento, sem que os próprios Estados tenham direito a regular os seus fluxos. 
Paralelamente, instaura-se um regime em que a não-existência de alternativa ao capitalismo, adquire carácter de norma. 
Exemplifico com o tratado de Lisboa da UE, que instaura a obrigatoriedade dos países signatários (e quem depois aderir à UE) manterem uma economia «de mercado», um eufemismo de capitalista. Não importa que - eventualmente- os povos queiram sair do capitalismo e mesmo que explicitem este desejo nas urnas. 
A globalização é um fenómeno exclusivo do capitalismo nos seus últimos estádios, em que a vontade popular deixou de ser - mesmo em termos meramente formais e jurídicos - o fundamento do regime.  A globalização é, na essência, um extremar de posições imperialistas, pois através de instrumentos financeiros, consegue-se subjugar países como a Grécia, Espanha, Portugal, Itália, etc, amarrando-os à dívida. 
Esta foi contraída por governos, sem o aval do povo, da mesma forma que foi feito com os regimes autoritários de países africanos, nos anos 70 e 80, com ajuda do FMI (programas de «ajustamento estrutural»). 
O resultado, num e noutro caso, é um pesado fardo de endividamento, e consequente perda de qualquer semblante de independência nacional. 
Note-se que a globalização anula a independência dos países mais fracos, naquilo que ela tem de mais básico, ou seja, deixando de haver possibilidade da população determinar, por escolha democrática entre vários partidos, qual o rumo para a sua  própria vida. Note-se que não tem nada que ver com «internacionalismo». Este termo significa o oposto no sentido profundo, não se deve confundir com globalização
É do interesse do povo e dos trabalhadores de qualquer país e de todos os países, que estes se libertem das cadeias do capital, das opressões, que impedem a sua plena afirmação, como nações oprimidas. Isto é internacionalismo.
O capital, habilidosamente, faz crer que foi a globalização que trouxe os avanços tecnológicos do presente: Porém, sabemos que foram o produto do trabalho humano, de incontáveis cientistas e técnicos, trabalhadores especializados ou não, dos mais  variados sectores. 
É falacioso o argumento de que «existe uma globalização boa». Porquê confundir este processo destrutivo com outra coisa, com o engenho humano em geral e com a natural tendência para a troca mutuamente vantajosa, na base do comércio?

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

NATAL… NÃO É AQUILO QUE PENSAS

O Natal é celebrado nos diversos recantos do mundo, não apenas nos sítios em que existe devoção cristã e prática assídua dos ritos, como em muitos outros sítios, por muitas pessoas que não estão a pensar no nascimento do Menino Jesus, ao comemorarem o Natal.
O Natal paganizou-se ao longo do século XX, perdendo o cariz estrito de festa religiosa, nos nossos países ditos cristãos, na exata medida em que eles mesmos se paganizavam.
A nova «religião» do consumismo ia progredindo, à medida que eles se tornavam países mais ou menos afluentes ou onde os elementos mais afluentes da sociedade exibiam o seu poder de compra, a sua alegria de consumir, comprando prendas, fazendo festas e cometendo excessos de comida e bebida. Não creio que estivessem conscientes de que reproduziam, embora com adaptações, a festa pagã do «Sol Invictus», que era celebrada na Roma antiga e no Império Romano: Este culto solar era universal, de uma forma ou outra era celebrado em todas as grandes religiões pagãs da antiguidade... Esta festa, em Roma, estava associada às Saturnalia, em honra do patrono da Cidade e era pretexto para excessos de toda a ordem.  
O Deus Sol, segundo os primeiros cristãos seria uma antevisão confusa do Messias. O símbolo do solstício de Inverno, propiciador de ritos em adoração ao Deus, foi assim subvertido completamente pelos teólogos para que o povo recém-cristianizado deixasse de celebrar as Saturnalia e adorasse o nascimento da Luz do Mundo, de Cristo Redentor. 
Nestas épocas, em que as pessoas comuns tinham uma vida curta e bastante dura, em que a tradição oral era poderosa, tal conversão de símbolos foi eficaz. Também o foram a cristianização de símbolos de fertilidade pagãos (os ovos, os coelhos de Páscoa), por ocasião da Páscoa. Embora, neste caso, a tradição da Páscoa judaica impôs-se naturalmente na religião recém-constituída, tendo sido associada à Paixão e Ressurreição de Cristo.

O que os poderes civis e religiosos sempre fizeram e continuam fazendo é estabelecer e perpetuar uma série de comemorações, de feriados e de rituais, que têm como efeito imediato marcar o tempo vivido, o tempo subjetivo das sociedades em geral, mas também de todos os indivíduos, seja qual for o seu credo religioso. Também num país muçulmano os feriados marcarão o calendário e os não seguidores desta religião terão de se conformar com tais ocasiões, mesmo que não partilhem esses significados simbólicos.

Nos países de capitalismo de Estado, quer na defunta URSS e satélites do Leste, quer na China e outros, houve campanhas oficiais para abolir a religião, sobretudo no período do estalinismo, mas essas campanhas não tiveram o resultado esperado: o povo permaneceu, em segredo, profundamente religioso.

Podemos ver que, em geral, a repressão da religião traz sempre um reforço da mesma, fanatismo gera fanatismo, intolerância gera intolerância, é assim que se originam as divisões no seio dos povos, que se originam conflitos com base religiosa.

No Islão, conflito entre sunitas e xiitas - sempre latente desde o grande cisma – estava adormecido e foi reavivado na sequência das invasões ocidentais do Iraque e dos outros países do Médio Oriente. Aí, os EUA e vassalos da NATO (países ditos «cristãos», com excepção da Turquia) têm tentado impor a sua «democracia» a ferro e fogo.
Embora as circunstâncias sejam diferentes, vemos que existem analogias mais do que superficiais com as guerras de religião que assolaram a Europa dos séculos XVI e XVII.
Tanto os países de religião oficial católica como protestante, tinham uma política de total intolerância e discriminação dos cidadãos do próprio país que tivessem o credo minoritário. Perseguiam e suprimiam com enorme crueldade toda a dissidência religiosa. Iniciavam guerras religiosas que devastavam grande parte dos países, comparáveis às guerras contemporâneas. As alianças entre chefes de Estado seguiam, no geral, a linha divisória Católicos/Protestantes. 
Muito do comportamento político-religioso dessa época reproduz-se agora, no mundo de hoje.

O conceito de laicidade, que o filósofo Espinoza defendeu no seu «Tratado Teológico Político», foi uma resposta inteligente da elite intelectual da época, retomada pelas sociedades e por fim pelos próprios Estados a esta vaga de intolerância destruidora do tecido social, económico e das relações internacionais.

A laicidade não significa que as diversas religiões estejam «em pé de igualdade». No sentido inicial que lhe deram Espinoza e outros filósofos políticos era antes a neutralidade estatal perante a religião: O Estado não se imiscuía nos assuntos religiosos, as leis não refletiam as escolhas pessoais dos monarcas por esta ou aquela religião.
Em caso algum, se tinha o objetivo de colocar no mesmo pé, dar igual oportunidade nos media do Estado, às diversas confissões religiosas, ou ter aulas de religião nos estabelecimentos de ensino do Estado, ministradas pelas diversas religiões.
Essa interpretação da laicidade é realmente muito falsa, pois significa realmente a perpetuação da «mão do poder estatal» nos assuntos religiosos.
Penso que é muito importante, compreender que a paz civil, a concórdia entre pessoas com credo religioso diverso ou sem religião, é um valor positivo muito importante agora, não apenas no século XVII e aqui também, na Europa, não apenas no Médio Oriente.
Especialmente, quando as fanatizações político-religiosas de diversos elementos conduzem a intensificar os ataques terroristas, dirigidos indiscriminadamente a pacíficos cidadãos.
A ideia de que se deve dar uma tribuna às diversas religiões, nos meios de comunicação públicos estatais é mortífera. Bem entendido, considero essencial para o exercício da liberdade de imprensa e de opinião, que toda e qualquer corrente religiosa tenha o direito de produzir e difundir sua propaganda, como entender. Mas que o faça com seus meios próprios, não com os meios do Estado. Não considero lícito que o Estado censure e persiga judicialmente alguém ou uma entidade, apenas por fazer ataques contra a religião A ou B. 
Defendo que é ao nível da sociedade civil, na opinião pública,  que tais comportamentos devam ser energicamente combatidos pelas pessoas esclarecidas da sociedade, cientes do risco dos elementos fanáticos tomarem a dianteira da cena e desencadearem vagas de intolerância.

A não-ingerência do Estado nos assuntos religiosos tem um efeito benéfico na liberdade religiosa, em geral. Esta noção deveria ser compreendida pelos hierarcas das diversas religiões, minoritárias ou maioritárias. 
Nos países de tradição cristã, países que hoje se declaram «laicos», as hierarquias católica, ortodoxa, anglicana ou luterana estão muito imiscuídas em assuntos de Estado, embora em graus diversos, quando são maioritárias.
Argumenta-se em defesa deste estado de coisas com a tradição. Mas a tradição não pode ter maior importância do que a paz civil.

- Haverá algo pior do que uma guerra civil?

- Resposta: Não, nada pior ...a não ser uma guerra civil de religião.

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

A POLÉMICA EM TORNO DO IMI (IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS)

COM LAIVOS DE «AGIT-PROP» ESTIVAL… uma certa direita revanchista, amiga  e serventuária do grande capital lança, à laia de «balão de ensaio», uma polémica completamente idiota sobre as regras do IMI, que ela própria contribuiu – no passado – a instaurar.

Não há imposto justo, todos nós sabemos isso. É do B - A BA de toda a teoria política e social.
- O imposto sobre o rendimento penaliza quem é mais produtivo, quem se esforça mais e que tem mais mérito, por isso ganha mais.
- O imposto sobre capitais é uma punção aos lucros dos capitalistas e, de uma e de outra forma, essa classe vai compensar agravando a extração do lucro, a exploração dos trabalhadores, quer como assalariados de suas empresas, quer como consumidores de bens e serviços.
- O imposto sobre propriedade tanto taxa a propriedade adquirida com esforço e honestamente como a que resulta de toda a espécie de falcatruas. Os índices do imposto sobre imóveis não dependem da forma como foi adquirida a referida propriedade, mas sim do valor estimado da mesma.

...E poderia continuar a desfolhar a ladainha de como são injustos os impostos. Mas, em vez de nos lamentarmos, ponhamos como base de raciocínio, que os impostos são um mal necessário.

É um mal necessário, enquanto houver Estado de «democracia liberal» ou seja, num regime capitalista «temperado» por alguma dose de «Estado social». A justiça não deve ser vista então como absoluta, mas sim em termos relativos.
O Estado precisa de ir buscar quase todos os recursos para o seu funcionamento à sociedade (quase, porque há um património do próprio Estado, donde pode obter rendimento direto, mas em termos globais é uma parte muito reduzida.)
O problema DE FUNDO é então saber se é lícito manter propriedade não produtiva, de forma intencional e indefinidamente. É esta a situação que impera no nosso país. Isto manteve-se por uma visão absolutista do direito de propriedade (direito que não ponho em causa, neste artigo).
Em parte alguma onde existe direito à propriedade, este é um direito absoluto. Uma propriedade pode até estar a ser utilizada em prejuízo da comunidade, da sociedade… Os Estados mais conservadores, mais amigos do capital, têm legislação que prevê a expropriação de propriedade, por motivos de interesse público…
O direito à propriedade é um direito como outro qualquer e tem os seus limites. O mau uso do que é a propriedade, seja qual for essa propriedade, tem de ser penalizado, nalguns casos até deveria ser criminalizado, por exemplo, quando se verificam atentados notórios ao ambiente, à conservação das espécies protegidas, etc. Possuir propriedade produtiva sem produzir deveria ser considerado crime.
- Quem argumenta que não produz porque a despesa seria maior que o benefício, coloque a dita cuja propriedade para venda no mercado.
- Quem diz que ninguém a compra, é porque está a pedir mais do que o mercado quer aceitar.

É curioso que os pró-capitalistas só aceitam e esgrimem o argumento das «leis do mercado» quando essa argumentação os favorece!  Se são tão favoráveis ao «mercado», por que motivo protegem aqueles que – de forma clara – estão a «emperrar» o mercado,  a impedir que o mercado «livre» funcione e se encontre o preço certo?
Seria uma coisa ótima que esta estúpida polémica estival sobre o IMI desembocasse, numa outra polémica muito mais interessante e que tentasse esclarecer o seguinte: 
1- quais os critérios para a coleta de imposto? 
2- como se explica que - neste país- quem mais paga é quem menos tem e quem detém maior capital - sob as diversas formas, imobiliário, fundiário, industrial, capitais, etc. - não paga quase nada, comparativamente?