A realidade «judaica do Antigo Testamento» do povo judeu de Israel atual é tão fictícia como a dos germânicos serem «arianos» e terem sido declarados como «a raça superior» pelo regime de hitleriano. Na verdade, são os palestinianos muito mais próximos geneticamente do povo judeu de há dois mil anos,. Isso não lhes confere um estatuto especial, mas apenas mostra o grotesco e a monstruosidade de basear uma política em dados étnicos ou «rácicos». Toda a política baseada em elementos raciais é uma clara negação dos Direitos Humanos, inscritos na Carta da ONU e em inúmeros documentos oficiais de todos os países (incluindo Israel).

terça-feira, 20 de novembro de 2018

NÓS, OS PEQUENOS DEUSES (nº3)

[continuação dos artigos nº1nº2, neste blogue] 

A construção de um consenso é fundamental para fazer funcionar a sociedade capitalista; esta possui muitas articulações da economia com o Estado. 
Seria por demais ingénuo supor que existe o Estado, por um lado, com um certo número de funções eletivas e onde as vontades dos cidadãos - supostamente - se traduzem numa determinada política e, por outro, empresas, o mundo da economia, onde empresários e gestores decidem e os empregados executam. 

Na realidade, a imagem, que as pessoas têm da organização política e económica do país e do mundo, é distorcida. Mas, isso é intencional, é resultante da ocultação e deformação constantes. 
É esta ausência de lucidez da generalidade dos cidadãos, justamente, que cria um consenso mínimo e possibilita esta governação (pseudo) democrática. 
A razão desta estratégia é muito fácil de compreender: As classes dominantes, em todo o mundo, sabem que é mais fácil manter uma fachada de democracia, do que exercer sua ditadura sem máscara. 
Porém, fruto das condições da crise que se generaliza, a narrativa do poder está constantemente a entrar em contradição com a sua prática. Tal constitui sinal claro de que o Estado de «democracia liberal» tem os seus dias contados.

A emergência recente de tendências ditas «populistas», sobretudo na Europa, parece-me um último recurso para reconstruir o tal consenso, fundamental para a conservação do Estado e do sistema capitalista. 
As pessoas estão numa situação de ignorância na prática, sobre os mecanismos da política. Embora seja vista como algo de exterior, apercebem-se dos efeitos graves que ela exerce sobre suas vidas. 
Então, imaginam que haverá alguém que os compreende, que será seu porta-voz e que não estará corrompido: uma parte da população adere, entusiasta, a tais movimentos e personagens, mais do que às ideologias ou programas políticos, na esperança ingénua de que sejam pessoas íntegras, incorruptíveis. Os partidos e líderes populistas ascenderão então ao poder.

Mas, chegará um dia em que estas forças populistas, confrontadas com o exercício do poder, terão de atender às pressões do grande capital e  do «Estado profundo» (corpos não eleitos: funcionários, polícias, militares, tribunais), com capacidade de bloqueio, quando não mesmo, de derrube do governo. 
Sujeitos a esta chantagem, os políticos populistas terão de reagir, de uma ou doutra maneira. Mas, em geral, não adotarão medidas extremas para reprimir violentamente a oposição no interior da máquina estatal. 
Vão preferir compor com elas; isso significa que certas medidas prometidas não serão tomadas, que haverá uma redefinição discreta de objetivos, tentando salvar a face com explicações sobre a conjuntura económica, etc.
Dececionados com o desempenho daqueles que ingenuamente tomaram como seus salvadores, as pessoas não equacionarão o facto de que a crise é sistémica e global, pelo que não haverá um qualquer retorno à «democracia pura» e ao «capitalismo puro» que, aliás, nunca existiram. 

Com o agravamento da crise económica, com o desespero da classe média pauperizada e a rutura completa do contrato social, que permitia manter os economicamente mais fragilizados fora das situações extremas de pobreza, criam-se condições para uma mudança radical. 
Porém, esta mudança pode bem ser em direção a um totalitarismo. Poderá ser um totalitarismo, com características próprias, mas igual - na essência - aos outros totalitarismos, historicamente conhecidos. 

Não apenas é realista este cenário, como está a acontecer diante dos nossos olhos: Basta ver a deriva autoritária de vários regimes, ditos de democracia liberal. Ocorre, não em países periféricos, mas em praticamente todo o chamado «Ocidente» (América do Norte, Europa, Japão, Austrália...). 
Somos testemunhos, em muitos países, de um deslizar para um «fascismo cinzento», ou seja, um autoritarismo sem clara e definida viragem do discurso ideológico, guardando aparências de governo e instituições formais, mas onde o verdadeiro poder está nas mãos da oligarquia que controla tudo: meios de produção,  média subserviente, aparelho de Estado, partidos políticos.

Penso que muitas pessoas estão completamente desprevenidas e, portanto, incapazes de se defenderem.  Para isso contribui a viragem das forças de esquerda, parlamentares ou não-parlamentares, para posições reformistas e de cogestão do capitalismo e do Estado. Nesta deriva, desde os anos oitenta do século passado, elas evoluíram de reivindicações de classe e de lutas com o objetivo explícito da mudança em direção ao socialismo, para reivindicações hedonistas, identitárias e que não colocam sequer a hipótese de mudança geral da sociedade, seja ela pacífica ou não.

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