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segunda-feira, 13 de novembro de 2023

TRADIÇÃO ESPIRITUAL E CIENTÍFICA

 Complicam tudo.

De facto, a Palavra de Cristo é muito clara;  não tem nada de misterioso ou de «escandaloso» como alguns pretendem. 

Toda a dificuldade na questão da interpretação das palavras e atos atribuídos a Jesus nos Evangelhos, tem a ver com os preconceitos da nossa época. 

Uma época materialista e racionalista não pode  compreender - porque não pode aceitar - um discurso que se situa num universo mental diferente:  Um Mundo profundamente imbuído do Espírito, onde o Espírito é a realidade última, enquanto  a matéria é uma manifestação limitada, momentânea, da energia espiritual. 

Os milagres são inversão da ordem natural das coisas, por intervenção do Espírito. Sem dúvida, no tempo de Jesus, havia falsos profetas, que tentavam iludir os incautos com truques de magia. As pessoas comuns que viram e sentiram a energia que se desprendia da presença física de Jesus, sabiam da existência desses falsos profetas, algumas até os teriam visto em ação. Portanto, de certa maneira, temos aqui uma prova de que Jesus era diferente de (falsos ou verdadeiros) profetas que o antecederam.

A arrogância das pessoas atuais consiste em pensarem que toda a sofisticação da sua maquinaria, seus gadgets eletrónicos, seus instrumentos científicos, permitiriam descobrir os truques usados (supostamente) por Jesus, nessas intervenções. Na verdade, sendo a Energia cósmica uma realidade espiritual ou não-material, não sendo formada por partículas ou ondas no Universo, a modificação instantânea de certos parâmetros físicos é tudo o que há de mais fácil para Deus. Cristo pediu o auxílio ao Deus Cósmico, que ele chamava «Pai», e Este, repetidas vezes, satisfez o pedido.   

Daqui, não decorre que a filiação de Cristo ao Pai, seja de ordem material. Obviamente, é espiritual e a intervenção do Espírito Santo na gravidez de Maria é uma imagem simples, compreendida pela humanidade da época. 

O contexto era espiritualista, não materialista. A gravidez era tida como fenómeno material, sabia-se perfeitamente que havia intervenção do sémen masculino para fecundação da mulher. Porém, a  vida era considerada «dom de Deus», ou seja, toda a criança nascia por vontade de Deus. 

Se acreditas realmente em Deus, qualquer que seja a forma como se reveste a tua visão do Divino, aceitas que os fenómenos - além das suas causas «mecanísticas» - estão sujeitos à vontade Divina. Ou, por outras palavras: Há uma espiritualidade que emana de todo e qualquer fenómeno, que ocorra, cuja «parte material» é indissociável da correspondente «parte espiritual». 

Algures nos Evangelhos, é explicado que somos todos «filhos de Deus». Então, muitos fazem o erro de atribuir a Cristo a designação exclusiva de «filho de Deus» quando, na realidade, ele refere-se a si próprio como «O Filho do Homem». 

Para mim,  a dualidade não existe, há simplesmente um Universo, em toda a sua maravilhosa complexidade, a sua extensão no tempo e no espaço, de que somos todos «filhos». A mensagem de que somos todos «irmãos», não tem justificação no sentido literal, obviamente. Nem teria, a partir de especiosos argumentos sobre ADN antigo e recorrendo à Paleoantropologia, a Ciência do Aparecimento e da Evolução do Humano. 

Mas, tem completo sentido para mim e para todos os «espirituais», que aceitam a comunhão fundamental dos seres vivos com o Universo. Não compreendo que pessoas que se consideram científicas, digam que somos feitos a partir da matéria formada nas estrelas (o que é verdadeiro, aliás)  e não se considerem em comunhão com os outros seres vivos, nomeadamente com os outros humanos (de quaisquer «raças», nações, credos, etc.).

Para mim, as coisas são simples, no seu âmago, mas hoje, demasiado difíceis ou laboriosas de explicar. Porque, qualquer civilização humana, até bem perto dos nossos dias, dava a presença do Espírito sob suas várias formas, como uma evidência, como dado adquirido. 

Porém, um nefasto extremismo materialista veio acentuar, a partir do século XVII, o «exclusivismo » da matéria, desenvolvendo um paradigma mecânico na física, que depois se estendeu a outras ciências, incluindo a fisiologia e a psicologia. 

Triunfou a falácia de que «tudo é matéria»: Isto implicava que só seriam validadas explicações que recorressem exclusivamente aos aspetos materiais. Vê-se claramente que se trata dum raciocínio circular: Dá como provado aquilo que pretende provar. Pior, tudo o que seja espiritual é decretado como uma «emanação», como um «fenómeno secundário» do cérebro humano, de relações eletroquímicas e moleculares neste. 

As consequências éticas desta postura são evidentes. Embora existam pessoas materialistas com elevada ética individual, uma civilização baseada nos princípios acima, é suscetível de cometer os piores crimes contra a Humanidade ou a Natureza. Claro que não será por isso que uma posição filosófica será mais ou menos verdadeira. Mas, a sacralidade da Vida, a religião verdadeira do Respeito pelo Cosmos, está a ser arredada, de várias maneiras, da esfera pública pelo «transumanismo», pelo «materialismo consumista», pelo «egoísmo hedónico», que tão obviamente penetram na psicologia das massas, quer através de «intelectuais», quer da media corporativa, quer da publicidade destinada a criar a dependência pelo novo e pela acumulação de objetos.

terça-feira, 18 de abril de 2023

PORQUE NÃO SOU MARXISTA

 De facto, apenas «cri» nas teorias marxistas na adolescência. Já no início da idade adulta, colocava várias objeções pertinentes, em especial, às versões leninistas do marxismo. 

Com o meu afastamento da «religião» M-L (Marxista Leninista), pude ter abertura de espírito para ler clássicos da política, da economia política e da sociologia (secundariamente, pois eu estudava biologia, a minha maior paixão).

Devo dizer que conhecia bem as obras de Marx, Engels, Lenine, um pouco de Trotsky, de Mao e de outros. Muitos autores pró-marxistas eu li; também li muitos anti-marxistas, ou críticos das obras de Marx.

Foi importante para mim ler as obras críticas da ideologia marxista-leninista, de Dominique Lecourt, um filósofo francês. Também li outros autores. A hegemonia  do marxismo e das suas tendências ou correntes, era notória na minha geração. Mas, igualmente notória, a ignorância sobre o conteúdo concreto das obras dos que se idolatrava. 

Muito do que se passou (e passa) com o marxismo, faz-me pensar que, em termos sociológicos ou antropológicos, estamos perante uma religião sem Deus. Ou pior; que endeusaram «personalidades» dessa corrente política, sem o mínimo espírito crítico, mostrando assim que nem sequer o conteúdo objetivo das obras, tinham eles lido ou percebido. 

Hoje em dia, compreendo quais as razões psicológicas (mas não lógicas) do fascínio e adesão a tais teorias. É que elas abarcavam um todo: O «materialismo dialético» era uma explicação última e uma fórmula simples que permitia reivindicar o estatuto de cientificidade para uma teoria de dialética hegeliana, com pedaços de materialismo mecanicista

O século XIX, foi aquele em que se criou um culto da ciência. As pessoas acreditavam na «Ciência», acreditavam no papel libertador do ateísmo científico e  do mecanicismo. Foi este, o cocktail ideológico em que banharam as elites burguesas e os revolucionários, quase todos, oriundos da mesma burguesia ascendente ou triunfante.

Na verdade, tive o privilégio de estudar a fundo as ciências físicas e naturais. Não apenas a biologia, mas igualmente a física (em especial a termodinâmica), a química (também ao nível experimental), a ciência dos sistemas, etc.  A matematização dos modelos não me intimida; eu tive oportunidade de estudar muitos assuntos, que recorriam a modelos matematizados, da Biologia Populacional, à Teoria do Caos, aos Fractais...

Para mim, é evidente que o que se pensa ser a cientificidade da economia, em  especial, das teorias neokeynesianas e monetaristas,  deve-se ao uso de instrumentos matemáticos (por exemplo, os gráficos) mas sem assumirem ou explicitarem as enormes simplificações (o reducionismo) associadas. O não-iniciado fica impressionado com tanta matematização, do mesmo modo que fica impressionado com a matematização dos modelos da física, da química e mesmo da biologia. 

Mas, a quantificação e o tratamento dos dados em termos estatísticos ou usando outras metodologias é útil, sobretudo, para expor uma teoria. Estou a referir-me, obviamente, aos ramos do saber que não sejam diretamente «matemática», incluindo a «física matemática». Faz parte da estratégia de exposição nas ciências naturais, apresentar curvas e gráficos, em conferências ou em publicações científicas. Mas, na maior parte dos casos, as matemáticas têm uma função auxiliar.  

Em biologia, também se utiliza muito as matemáticas. Porém, o substrato último da biologia é experimental e continuará a sê-lo. Mais importante que a matemática, é a metodologia propriamente experimental utilizada, cujos dados podem ser traduzidos sob forma matemática, ou não. Os conteúdos das descobertas ou observações, podem ser descritos de diversas maneiras. Um excelente artigo na área de ciências biológicas pode nem sequer apresentar os resultados sob forma de dados estatísticos.

Esta longa digressão serve para nos precavermos da insistência de certos propagandistas, seja qual for a sua ideologia, em «citar» a Ciência, dizendo que  estão «baseados» na Ciência, ou algo deste género. É confrangedor ver como esta evidente aldrabice funciona: Pois a Ciência não tem nada que ver com seus pronunciamentos políticos; aliás, a «ciência nunca prova nada» (G. Bateson). O pior é que eles são seguidos por muitas pessoas, fascinadas com as aparências. Mas isto não é novo; já no século XIX, usavam o mesmo «disfarce», para melhor levar o auditório a aderir às suas teorias políticas.  

De facto, os verdadeiros cientistas, sobretudo os da ciência experimental, quer estejam no laboratório, ou em «atividade de campo», não têm hoje - nem jamais tiveram - grande interesse pelo marxismo; isso deveria surpreender os que aderem ainda à ideia de que o marxismo «se baseia na ciência», ou mesmo «que é uma teoria científica». 

Marx era um filósofo, Engels, filho dum industrial e Lenine, de família de professores primários. Eles tinham a ideologia «silenciosa» do cientismo da época;  imbuíram as suas políticas de «teorias ad oc», que «justificavam cientificamente» suas teses propriamente políticas. Eles conseguiram arrastar consigo uma parte da intelectualidade da época, pois o discurso deles parecia científico e isso impressionava muitos. Ainda hoje, alguns se deixam impressionar. Se lerem, por exemplo, a obra «Materialismo e Empiriocriticismo », compreenderão que se trata de uma obra panfletária de Lenine, que discorre sobre questões fundamentais da natureza da matéria, segundo as teorias em debate na época . Mas, Lenine não percebeu realmente o debate entre várias correntes da física, nem estava à altura de poder discutir os méritos e fraquezas de cada uma. É um exemplo interessante, pois mostra como questões científicas, foram abusivamente enquadradas na moldura ideológica do «materialismo dialético». Lenine atribuiu adjetivos de «progressista» ou de «reacionária», a tal ou tal teoria e aos cientistas a estas associados.

O mesmo processo, mas em mais trágico, pois muitos cientistas foram mortos ou deportados, passou-se com o decretar da genética como ciência «burguesa», por Estaline e seu protegido Lysenko. Foi importante, para a minha formação, ler a obra sobre Lysenkismo de Dominique Lecourt. É daquelas «lições» que nunca se esquecem. E se nos esquecermos, há líderes e sociedades que voltam a cair nos mesmos erros. O lysenkismo foi nos anos 30 do século XX na União Soviética do estalinismo triunfante. Infelizmente, viu-se um ressurgir recente daquele comportamento no mundo contemporâneo: A histeria «covidiana», desencadeada pelo poder, a campanha de violência difamatória contra as pessoas com espírito crítico, a «caça às bruxas», etc. 

No que toca à teoria política, propriamente dita, é um facto que não existe libertação ou emancipação, se a sociedade estiver sujeita a um governo totalitário, que se considera incumbido duma tarefa «messiânica». Um poder que fala em nome da classe operária, do proletariado, não se importando, porém, de o esmagar da maneira mais rude, de lhe retirar todos os meios legais de contestação. Uma pessoa medianamente instruída e que tenha convicções socialistas/comunistas irá naturalmente divergir da teoria política marxista leninista, perante a observação da «práxis» dos mesmos, quando alcançam o poder. 

Eu estive muito interessado nos primeiros socialistas que eram, quase todos, da vertente «não-autoritária»: William Godwin , Gracchus Babeuf, Charles Fourier, Pierre-Joseph Proudhon, e muitos outros, vilipendiados por Marx e marxistas de hoje, que continuam a repetir as difamações de ignorantes, contra esses pioneiros. Na verdade, o que os primeiros socialistas não-autoritários «descobriram», foi retomado e aperfeiçoado por várias gerações de socialistas libertários ou anarquistas, pioneiros em associações não baseadas no lucro e na desigualdade, que estiveram largamente envolvidos na criação e desenvolvimento dos sindicatos, que fundaram muitas cooperativas, etc. A difamação foi pôr-lhes um rótulo («socialistas utópicos») que não lhes corresponde, que os ridiculariza: Marx era costumeiro disso, em dar etiquetas falsas,  em relação a pessoas  que ele detestava. 

O século XXI tem demasiados desafios próprios, para as pessoas ficarem tomadas pela «paixão pelas coisas mortas». Eu quero com isso dizer que o passado, a história, não são para ignorar, mas também não se devem mitificar. Não se ignorem as realizações, as teorias e as reflexões dos séculos anteriores, mas deve pôr-se tudo isso num contexto apropriado. 

A intolerância e o fanatismo, em pessoas que se dizem socialistas é exatamente tão contraditória, como em pessoas que se afirmam cristãs. Aliás, o cristianismo é uma das fontes e das inspirações do socialismo - comunismo - anarquismo: desde a Reforma no século XVI, passando pelos movimentos sociais dos séculos XIX e XX, até aos movimentos de hoje. 

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

A CRISE DAS RELIGIÕES E O SEU SIGNIFICADO

 Este século,  ainda tão jovem, já está bem cheio de acontecimentos - mas não de quaisquer!

 - Acontecimentos suficientemente graves e irreversíveis para mudarem para sempre a(s) civilização/ões, que estamos acostumados a associar a determinadas zonas geográficas e a determinadas tradições: A História, a Arte, a Literatura e a Religião, são - entre outras - identificadoras de determinado complexo cultural ou civilização. 

Embora saibamos que todas as civilizações são mortais, tal como os humanos, não sabemos que género de morte espera cada uma delas. Será uma morte por colapso catastrófico? Será um definhar progressivo, até ser englobada por outra, ascendente? Serão outras modalidades, demasiadas para enumerar aqui?

As religiões não podem ser estranhas à construção civilizacional pois, em qualquer civilização, mesmo nas que se proclamam oficialmente «ateias», acaba por haver fenómenos de tipo religioso. 

Inversamente, em civilizações que se identificam, a si próprias, como cristãs, nota-se a dissolução progressiva dos laços da população com o elemento cristão. 

Isto traduz-se - por exemplo - numa paganização do Natal, a época do ano em que tradicionalmente os cristãos de todas as confissões saudavam a vinda do Salvador. O mesmo, em relação à paganização da Páscoa, transformada em ocasião para dar ovos e coelhos de chocolate às crianças.

Esta paganização não se faz, no mundo cristão, sob forma de um qualquer ressuscitar das religiões pagãs que antecederam o aparecimento do Cristianismo nesses territórios. Faz-se com o abandono de tradições e, sobretudo, de assistência ao(s) culto(s).  Muitos são aqueles que dizem professar o cristianismo e, no entanto, não observam quase nenhuma tradição, não vão à missa (ou culto) dominical, apenas frequentam igrejas, quando se trata de um casamento, batizado ou enterro. 

O estádio último desta descristianização, verifiquei-o há poucos anos, na belíssima capital da República Checa. As igrejas do centro de Praga (magníficos monumentos barrocos, na sua maioria) estavam transformadas em locais de concertos (de música clássica em geral, mas não de música clássica sacra) e isto não era temporário. Tinham sido permanentemente transformadas em «salas de concerto históricas», pela muito pragmática razão de que o número de pessoas, na vizinhança, dispostas a frequentar essas igrejas era tão diminuto, que elas deixaram de ter sustentabilidade económica e, sobretudo, de centros vivos de cristianismo. 

O principal «culpado» aqui, não é o Estado, diretamente - pelo menos - mas o processo de «gentrificação» dos centros históricos, que também afeta - de modo insidioso, mas brutal - Lisboa e muitas outras capitais da Europa. 

Assim, o turismo, fonte preciosa de divisas e estimulador de atividade económica está a contribuir para matar os centros culturais. Isto passa-se em países como França, Espanha, Itália, Grécia e outros, muito turísticos. Todos sofrem de uma gentrificação dos locais mais emblemáticos. Estes centros mais investidos pelo turismo, são locais com maior significado monumental e histórico, os centros civilizacionais desses países. 

A «verdadeira religião é o dinheiro», mas esta frase banal, não deixa de soar como grave sentença de morte, de civilizações que se construíram em torno de determinada espiritualidade. 

Pode-se argumentar que a espiritualidade se mantém em indivíduos que não são religiosos. É verdade: No entanto, ao nível de um todo civilizacional, de uma sociedade inteira, isso nunca aconteceu. Basta ver-se o renovo do  cristianismo ortodoxo, que já antes da queda da URSS, tinha um aumento sensível de adesão. É portanto, uma regra empírica, constatar-se que onde esmorece a tradição religiosa, com cultos e clero, também a religião «popular» recua.  Verifica-se o inverso, quando há um renovo da(s) Igreja(s), este acompanha, em paralelo, a evolução da sociedade.

Tudo o que sei sobre as civilizações do passado, é que uma civilização em ascenso vai propulsionar, senão criar mesmo, um determinado movimento religioso. Por outro lado, a espiritualidade não desaparece quando, por motivos políticos e ideológicos (como no Estalinismo ou na Revolução Cultural Maoista), se combatem ativamente a difusão ou, mesmo, a existência de religiões. 

Há uma necessidade profunda, que pode ultrapassar a explícita adesão a determinado credo religioso. Penso que a humanidade não pode viver com uma visão estreita, «materialista» da vida, da Natureza e do próprio ser humano.  O materialismo de hoje, acantona-se numa forma estreita de propaganda antirreligiosa. Não me parece que haja uma oposição entre a espiritualidade de hoje e a aceitação e mesmo a procura ativa de saber científico. Acho mesmo que esta contradição é um subproduto de ideologias do século XIX (sobretudo, do cientismo e do ateísmo «militante»). 

É verdade que as religiões, na sua vertente exterior, perante a sociedade concreta, não foram capazes, muitas vezes, de fazer atualizações que se impunham. Imagine-se alguém do clero, formado/a na perspetiva de que, aceitar a ideia de Evolução biológica e do Homem, era uma heresia intransponível e um passo para a mais total negação de Deus, ou seja, para o ateísmo. Este doutrinamento atravessou várias gerações. Portanto, não se pode ter a ilusão de que as formas de pensar morrem quando desaparecem os criadores ou primeiros cultores de determinada corrente.

Para ilustrar isso, basta-me evocar a estranha - para mim - forma de abordar a sociedade e todos os fenómenos através de um prisma marxista. O marxismo é um exemplo importante e típico de uma religião sem Deus. Mas tudo nele aponta para o fenómeno religioso, como forma de ver o Mundo e o Universo, como se fossem apenas inteligíveis através da «ciência marxista» (que, afinal, é apenas «cientismo»).

Seria muito estranho que, caso a «ciência do marxismo» fosse verdadeira, o mundo científico atual estivesse totalmente divorciado da filosofia / ideologia do marxismo: Note-se que não é uma teoria esotérica, muitos terão tido contacto com ela; muitos cientistas terão mesmo estado convencidos, durante uma etapa de suas vidas, de que se tratava de uma forma de pensar adequada à ciência. Mas, nada disto é verdadeiro, para a imensa maioria dos cientistas de hoje. 

Ao fazerem ciência, não invocam « S. Marx ou S. Engels, ou S. Lenine», da mesma forma que não invocam os Santos cristãos, nem os Deuses pagãos. Têm, como pessoas cultas, conhecimento de correntes filosóficas e de religiões. Mas, na sua imensa maioria, nem escrevem sobre a relação da ciência que praticam, com a espiritualidade.  

Noutras partes do globo, eventualmente, os fenómenos serão divergentes. Eu tenho de me limitar ao que conheço melhor. Não acredito que as diversas civilizações se tenham fundido numa só, ou que esta fusão esteja em curso. Tenho observado mesmo que diversas civilizações afirmam cada vez mais as suas idiossincrasias, para fazer face ao globalismo, largamente promovido por ocidentais. 

Embora não seja uma ideologia cristã, o globalismo da nossa época, enquanto veículo de dominação ideológica, é propagado por pessoas, algumas das quais se afirmam como «cristãs» (não é senão uma capa, para elas, a meu ver).

Estou convicto de que as ideias profundas que os homens podem produzir hoje, estão radicadas na essência da humanidade, daí que não seja difícil encontrar ensinamentos de sabedoria, de espiritualidade e sensibilidade estética, em civilizações passadas, hoje consideradas «mortas». Porém, sua existência foi um passo, uma etapa, para o que a humanidade é, hoje. 

Os aspetos espirituais, têm a sua evolução própria, de certa forma, análoga com a evolução biológica. Os traços da evolução biológica não pararam nos alvores da espécie humana, pois a evolução continua aos vários níveis (genético, anatómico, fisiológico, comportamental) nos humanos do século XXI. 

A cultura e a religião, a pertença a um dado universo mental, a uma forma de compreender o Todo Universal, nada disso pode congelar, tudo se vai transformando. As formas de religião também evoluem; cabe aos contemporâneos atuar no sentido de não «deitar fora o bebé, com a água do banho», isto é, não se deixarem iludir com formas transitórias do fenómeno religioso, como se estas fossem a essência e razão de ser das religiões. 

Sou tão incapaz de descrever as formas que as religiões irão adotar no futuro, como de antever como as sociedades serão organizadas. A minha aposta, porém, é que continuarão a existir valores e que podemos procurá-los em civilizações passadas. Não posso saber quais serão selecionados, da profusão de filosofias, de formas e conteúdos, de mitos, de relatos, etc.. Mas possuo a certeza íntima de que as civilizações futuras irão guardar alguns valores, adaptando-os à sua época. 

                       Foto de ruínas do Convento do Carmo, Lisboa

quinta-feira, 28 de julho de 2022

QUEM TEME A PAZ?

Portugal é um país cristão ou, pelo menos, com fortes raízes e cultura cristãs. É muito fácil criticar o cristianismo. Há quem tenha dito (Nietzsche) que é a religião dos fracos, dos escravos, mas não no sentido emancipatório, antes no sentido de justificação da desigualdade, da opressão, etc. Outros pensam que muito daquilo que se fez em nome da Cruz, ao longo da História, é tão horrível que, na sua essência, o cristianismo deve ser portador de ódio e não de amor, não se pode aceitar que «a religião do amor» nada tenha que ver com desmandos e crueldades exercidas pelos que se designam como seus fiéis seguidores. 

Enfim, a paz de espírito, a renúncia a meios violentos de afirmar uma determinada verdade, não é exclusivo do cristianismo, mas antes é vulgar nas outras grandes religiões. Por exemplo, no budismo, é muito explícita a condenação da violência, porém houve samurais budistas, houve perseguições cruéis dos convertidos ao cristianismo por budistas, houve «monges-soldados». O islamismo proíbe que as pessoas sejam convertidas à força, à religião do Alcorão.  Porém, nas épocas de expansão do Islão, a conquista militar desembocava numa conversão forçada das populações. As populações conquistadas e não-convertidas, estavam sujeitas a um imposto específico, por continuarem a exercer sua religião tradicional e sujeitas também, com frequência, a serem transformadas em escravas. 

A verdadeira paz é interior. Não é privilégio de alguma religião, ou corrente ateísta. A paz de espírito significa que nós somos guiados pela nossa própria ética. Ela pode decorrer da adesão a uma religião, ou ideologia não-religiosa. Porém, na sua essência, esta ética dedica-se a viabilizar um mundo menos mau: Um mundo onde as forças do mal não se podem servir de e manipular os sentimentos das pessoas, por forma a chegarem aos seus fins desprezíveis, que se resumem, essencialmente, ao poder. 

Assim, a distinção essencial, não é étnica, religiosa, ou outra, senão que se está a favor - ou não - da distribuição o mais ampla e o mais igualitária possível do poder. Por outras palavras, pretende-se evitar a concentração do poder - quaisquer que sejam as razões invocadas para o fazer - ou se acha que há legitimidade para impor essa (falsa) solução de concentração do poder, para se «fazer reinar» a paz. No segundo caso, está-se a mascarar (perante os outros e si próprio) o desejo de poder, de domínio sobre os outros. 

O domínio sobre si próprio, a transformação pacífica, por dentro, de pessoas realmente imbuídas de pacifismo, é difícil de realizar, na prática. Mas, em teoria é muito simples de enunciar, de uma simplicidade que uma criança de tenra idade pode perceber: «Não trates os outros do modo como não queres que te tratem a ti» ou, formulado pela positiva, «Trata os outros do modo como gostas de ser tratado».

Não acredito que existam «genes da agressividade», nem que a agressividade contra um grupo, uma nação, uma fação seja ela qual for, esteja baseada em algo profundo, instintivo. Acredito que é devido à educação e ao entorno social, que são criadas as condições da intolerância, de se considerar que existem «raças» ou etnias com méritos diferentes, ou que a «competição e a superioridade dos vencedores» sejam as legítimas causas da desigualdade.

Os que não participam diretamente numa guerra estão sujeitos,  porém, à guerra psicológica, a serem forçados, coagidos física e psicologicamente, a «se arrumarem» num ou noutro lado. Alguém pacifista - no genuíno sentido da palavra - não deseja a continuação da guerra, deseja que haja cessar-fogo, para se encetarem conversações de paz, para que os povos sejam poupados a mais mortes, destruições e desgraças. 

Porque acontece isto? Ou seja, por que razão uma boa parte das pessoas, não envolvidas nas operações militares, se sentem «justificadas» em opinar que a guerra deva continuar até um dos lados («o nosso») ter esmagado o outro? Elas sentem-se justificadas (?) a decretar a continuação da morte, ferimentos, traumas, em pessoas desconhecidas, de um e do outro lado, completamente inocentes das causas e peripécias que levaram ao estado de guerra. 

Na realidade, os poderosos são os causadores e beneficiários deste estado de supressão do que há de realmente humano no ser humano. Esta supressão tem de ser prévia ao estado de guerra, para ser possível «ativá-la» e «potenciá-la» quando este estado de guerra se inicia. Os tambores da guerra começam a troar muito antes das primeiras batalhas. 

Quem realmente tem uma profunda convicção religiosa, seja em que religião for, ou tem um sentido ético profundo, sendo ateu ou agnóstico, não pode deixar de fazer tudo para que a política militarista, belicista,  deixe de se apoderar de nós, da nossa sociedade. Temos de começar por nós mesmos, mas também com os familiares, amigos, colegas... É sempre a propósito falar-se de paz, é sempre adequado propor soluções com vista à resolução dos conflitos. É da responsabilidade de cada um fazer com que a opinião pública se transforme, que exija aos dirigentes políticos soluções pacíficas imediatas aos conflitos bélicos.

    


domingo, 5 de junho de 2022

MITOLOGIAS (VI): ASTROLOGIA

                                           


Nesta curta nota, não pretendo abordar todos os aspetos da questão. A história da astrologia confunde-se com a história das civilizações e não se pode dissociar da conceção tradicional do Universo, dada pelas diferentes religiões.
Parece-me mais adequado pensar a astrologia como parte integrante de crenças que se cristalizaram - em várias civilizações - em ciclos de mitos. Com efeito, se os mitos são narrações produzidas e reproduzidas em determinadas culturas, tendo valor exemplar (como na Grécia Antiga, por exemplo), esses mitos são também visões do Mundo, da Génese ou das Origens. Têm como função explicar os mistérios do Cosmos, da Natureza, da existência Humana.
 
Na astrologia terão operado dois níveis distintos:
- O empirismo, com a observação de estrelas e planetas, em geral, das suas trajetórias na abóbada celeste, dos ciclos, da sua periodicidade, a repetição das figuras do zodíaco, cada constelação zodiacal aparecendo sobre um dado ponto da abóbada celeste no mesmo período do ano. Este nível tem uma importância prática, sobretudo a partir do momento em que é preciso determinar o tempo de semear em função da época do ano, ou outras tarefas do ciclo agrícola anual. Ou seja, a civilização agrária, a revolução neolítica, implicam o domínio, não apenas das espécies vegetais cultivadas, ou de animais domesticados e selecionados, como também o domínio do calendário, da meteorologia e de todos os fenómenos associados. Trata-se de saberes absolutamente indispensáveis, quer para a agricultura, quer para a pastorícia. 

- A religião, no sentido etimológico, tem a função de religar o homem com o cosmos, com o sopro divino, a harmonia natural e a criação. Como tal, a ordem de baixo tem de ser análoga à ordem o alto (Tábua de Esmeralda, dos Alquimistas). Isto, tanto no caso da astrologia, como da alquimia, é do domínio das correspondências: A relação do dia e hora do nascimento, com os astros (planetas, constelações) que se encontram por cima do indivíduo, nesse momento. Esta é uma relação direta, determinista e indelével. 
               
                                                     

Aquilo que hoje se designa por astrologia é uma forma de divinação, baseada na «carta dos céus» astrológica, correspondente à configuração astral no local e data do nascimento da pessoa. Mas, este conjunto de crenças tem uma origem muito evidente: Corresponde ao universo mental do politeísmo.
A astrologia é uma prática divinatória com a qual o cristianismo teve de se acomodar desde as origens. Mas, na sua essência a religião dos Evangelhos é contrária às práticas e teorias implícitas na astrologia. Basta reparar no que se passou com muitas festas «cristãs» como a festa do Natal cristão (o festival pagão do Sol Invicto e solstício de inverno) ou a Festa de S. João Baptista (celebração dos Deuses do fogo e solstício de verão). A religião cristã institucionalizada teve de acomodar práticas pagãs milenares presentes no império romano e em todas as áreas para onde o cristianismo se expandiu.
Mas, ao nível dos arquétipos, da psicologia profunda, a crença na astrologia desempenha um papel especial. Hoje, muitas pessoas absolutamente normais, cultas e equilibradas, têm uma crença na astrologia, nos signos. A um nível profundo, elas estariam à procura duma identificação com um animal fétiche, um totem: Trata-se, afinal, da mesma necessidade que os povos ameríndios têm de estar associados ao animal-totem. Mas, neste caso, trata-se de identificação coletiva, ao nível da tribo, enquanto na religião dos signos trata-se de identificação individual. Muitas pessoas na nossa sociedade têm desejo de pertença, mas não seguem uma religião aparente, institucional. A crença nos signos não é vista como «religião», mas preenche o papel central que é desempenhado por qualquer religião: RE- ligar o humano com o cosmos.
Será a astrologia de hoje, uma forma degradada e inconsciente de culto pagão? Note-se que ela permite às pessoas «justificar» o seu fatalismo. A crença num mecanismo que determina o indivíduo desde a nascença, é um determinismo férreo. Está-se perante a negação explícita do livre arbítrio, um conceito importante na teologia e filosofia ocidentais. O determinismo pode ser reconfortante para alguns: Possibilita mecanismos psicológicos de identificação e de conciliação consigo próprio.
Nas sociedades ocidentais, hedonistas e individualistas, a religião aparentemente não existe. É o que parece, mas -afinal - não é assim: É frequente ouvir-se dizer que «não acredito em Deus, nem na vida para além da morte». Porém, ao mesmo tempo, acredita-se que a configuração astral, no momento do nascimento, foi determinar todos os aspetos da personalidade. Além disso, as conjunções de astros traçariam o percurso da vida inteira, desde as escolhas no plano amoroso, às profissionais, etc. É uma forma da pessoa não se assumir como responsável pelos seus atos: «Aquilo que sou, aquilo que fiz, é devido ao meu signo».

Em resumo, os mitos nas cabeças dos contemporâneos, não serão assim tão diferentes da mitologia dos Sumérios, Fenícios, Egípcios, Gregos, etc. Há milhares de anos atrás, estes usaram o conhecimento empírico dos movimentos dos astros, de maneira que puderam viajar em terras incógnitas, ou por mares não navegados, ou fazer previsões corretas sobre as estações do ano e fenómenos meteorológicos associados. Estes, sempre foram conhecimentos muito úteis para agricultores e pastores. Eles banhavam num universo mental politeísta. Por dentro da matriz politeísta construíram explicações para os fenómenos astronómicos observados: O retorno periódico dos astros, correlacionado com fenómenos dos mares, da vegetação, das migrações das aves, etc.
Hoje, porém, uma «mitologia astrológica» parece desempenhar um papel de religião, mas degradada ao nível de crença. A crença, para sobreviver, tem de se fechar em relação à realidade, ao saber científico. A crença aposta na transformação interior do indivíduo e não busca coerência, nem com o mundo, nem com os saberes científicos. Isso não é importante para ela; é antes um obstáculo. No entanto, hoje, para se compreender os fenómenos cósmicos, é indispensável o conhecimento científico da Astronomia e da Cosmologia, que são tão diferentes da astrologia, como a Química é da alquimia.
Porém, note-se, há quem se interesse pela astrologia numa perspetiva não-ingénua, não-ocultista, como assunto antropológico. Compreender os mitos e as crenças, não só do passado ou de povos exóticos, mas igualmente de nossas sociedades contemporâneas, faz todo o sentido. É uma chave para o universo mental individual e para as ideologias que moldam as sociedades.

MITOLOGIAS (V) : COSMOGONIAS, OS MITOS DAS ORIGENS

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MITOLOGIAS (IV)TRANSFORMAÇÕES ZOOMÓRFICAS

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MITOLOGIAS (III) QUIMERAS

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MITOLOGIAS (II): PROMETEU AGRILHOADO

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MITOLOGIAS (I) : OS CICLOPES

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domingo, 13 de fevereiro de 2022

Os Senhores do Mundo e os Povos do Mundo




With God on our Side*
(música e letra de Bob Dylan)

«With God on our side», ou «Gott mit uns», etc... Sempre a mesma cantilena. Será que vai funcionar também desta vez? Será que a propaganda maciça dos media serviçais dos poderes poderá persuadir nossos povos que a «Rússia é o nosso inimigo e é o império do Mal»???
As pessoas que estão conscientemente a soprar os ventos de discórdia e de guerra, deveriam ter medo de já não estar «na Graça de Deus», caso fossem cristãs. Porque, a maior parte dos governantes e dos que os manipulam, dizem-se «cristãos». Cristãos, que não hesitam em atacar um país fundado na base do cristianismo ortodoxo, há cerca de um milénio, onde a aventura do comunismo autoritário e oficialmente ateu, se saldou num retumbante fracasso. Nesse fracasso, teve imenso peso a espiritualidade do povo russo, que nunca esqueceu a sua relação de origem com o cristianismo. Foi a sua fé que lhe permitiu aguentar com paciência, coragem e estoicismo, os cerca de 70 anos terríveis, incluindo os da IIª Guerra Mundial e os de Estaline.
Francamente, eu estou mais perto dos cristãos ortodoxos russos, que dos cristãos ocidentais, que dizem seguir os Evangelhos e a Religião do Amor, mas que - porém - fazem tudo ao contrário dos ensinamentos de Jesus Cristo. Estes, só têm como finalidade aguentar-se no poder, porque o poder significa benesses, privilégios, opressão dos menos fortes. Onde é que isto é «cristão»?
A canção de Bob Dylan tem-me obcecado nestes últimos dias. É como música de fundo, descrevendo acertadamente a hipocrisia dos poderes «cristãos» e a ilusão de um povo. Na canção de Bob Dylan, trata-se dos EUA e do povo americano, mas - igualmente - pode ser qualquer um, do campo «Ocidental». Estes, têm sido abundantemente aspergidos com propaganda de ódio contra tudo o que seja russo*. Têm sido doutrinados, têm sofrido lavagens ao cérebro, por políticos e media de massas sem escrúpulos, constantemente.
O renovo do belicismo e da agressividade (fabricada) contra a Rússia não tem outro fim, senão manter as pessoas num complexo de medo.
Agora, que a narrativa do COVID está (quase) desacreditada, eles estão a inundar as mentes com outro «papão»!! Já não servem as narrativas utilizadas até há bem pouco tempo:
-Nem o «vírus mortífero» que já está amansado,
- Nem «o terrorismo jihadista», que agora serve na Síria para fazer a guerra em «nosso nome»,
- Nem «o comunismo», que já não assusta, como na Guerra Fria Nº1, agora é um «fantasma de anteontem».
Então, agora é o medo pânico da guerra: Enquanto eles conseguirem manter as pessoas num complexo de medo, sabem muito bem que elas não se atreverão a rebelar-se contra eles, os poderes que as oprimiram e oprimem, que lhes mentem constantemente e são culpados dos crimes mais graves.
Causar uma guerra é um crime contra a humanidade e incitar à guerra, é também um crime contra a humanidade. Porque será que este princípio acima, que é o da ONU, soa agora como «irrealista», quando deveria reunir o consenso mais amplo, entre as nações e os povos???
- A resposta é que não existe, na maioria dos dirigentes ocidentais, verdadeira compreensão do que seja a paz. Além disso, o poder hegemónico de Washington, levou a que eles se tomassem, a si próprios, pelos «Senhores do Mundo**».
A conivência com os poderes criminosos nunca foi uma atitude cristã. Os cristãos foram perseguidos inúmeras vezes no passado histórico e continuam a sê-lo no presente. A perseguição mais grave, no entanto, é o que eu chamaria de extinção por dentro do cristianismo. Fazer dele uma mera «decoração», um «ritual social», é a pior traição que se possa fazer. São cúmplices igrejas e seus chefes, de várias denominações, assim como hierarquias, que não fazem nada de positivo para dissipar os ventos da guerra e militarismo, que têm sido assoprados ultimamente.
Será que as suas palavras só se aplicam quando servem a propaganda dos seus governos, quando vêm reforçar o complexo de medo?
- Se a resposta é sim, então devemos rezar um requiem pelas mesmas igrejas e pelos seus dirigentes, pois estão mortas, em termos de fé cristã. Estão mortas, deixaram de estar na cristandade. Há pessoas individuais, dentro dessas instituições, que não perderam a coragem, que dizem as verdades, mas elas são (ainda) demasiado poucas. Demasiadas «ovelhas» estão desatentas, ou tomadas pela hipnose coletiva. Há uma janela estreita de tempo para que elas acordem, antes que os globalistas levem a cabo seus planos sinistros.
A força do povo é muito maior do que ele próprio suspeita. Vejam-se os presentes exemplos de movimentos de desobediência massiva e não violenta do povo cristão do Canadá, de França, de vários outros países ocidentais. Verifico que estes movimentos são inclusivos, são tolerantes, não-violentos. É exatamente aquilo que se espera duma luta de povos profundamente cristãos (e mesmo que alguns tenham outras religiões, ou sejam agnósticos, ou ateus). Estes povos estão fartos e já acordaram para o que as «elites» dos seus países, e a «elite» globalista, querem impor a nós todos.
É fácil nos conectarmos uns com os outros, é fácil e necessário - neste contexto - construir alianças pelos nossos interesses, no curto e longo prazo, isto constitui a verdadeira cidadania. Só assim poderemos, no longo prazo, construir a sociedade que todos desejamos. Uma tal sociedade terá as melhores relações possíveis com os outros povos. Isto é também o que estes querem.
A isso chama-se viver em paz, a Paz do Senhor: Esta Paz encontra-se no coração de cada pessoa, individualmente, quer seja cristão, ou tenha quaisquer outras posições religiosas e filosóficas. Deveria estar, em particular, no coração de alguém que se assume como cristão. Seja de que tendência for, um cristão tem de recusar a histeria belicista e, pelo contrário, espalhar o espírito de paz à sua volta, apoiando as iniciativas que reforçam a paz e o bom entendimento entre os povos, sem sectarismos, sem atitudes racistas, ou xenófobas. Todos os povos são muito semelhantes em suas aspirações mais profundas pela paz.

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(*) Excerto da letra
«I've learned to hate the Russians
All through my whole life
If another war comes
It's them we must fight
To hate them and fear them
To run and to hide
And accept it all bravely
With God on my side »

(**)
Em termos cristãos, a designação «Senhor do Mundo» é sinónimo de «Senhor dos Infernos». Não sei o que pensa o leitor sobre a existência do inferno e do mal. Mas é evidente para mim, que esta época é marcada por um total divórcio entre a Palavra dos Evangelhos e a prática dos que se dizem cristãos. Infelizmente, há demasiados cristãos de base, com sua indiferença ou ilusão, que acabam por reforçar os poderosos, através do voto, do apoio e do silêncio cúmplice perante tudo o que sabem, no foro íntimo, que está mal e que é anticristão.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

XAMÃ João Mendes: «uma carta a Jesus»

Uma carta a Jesus.
Santíssimo Sr. e Mestre Jesus de Nazaré. Com todo meu respeito invoco aqui o seu nome fazendo-me presente a vossa majestade.
Mestre, eu me chamo João Mendes e tenho 64 anos prestes a completar os 65, estou escrevendo esta carta para contar ao Senhor o que aconteceu no mundo depois da sua ressurreição e a ascensão aos céus.
Bem como já estava agendado o seu irmão Tiago e o apostolo Pedro iniciaram a sua Igreja qual estava funcionando muito bem em Jerusalém, muitos aderiam as ideias pacíficas do Mestre em comparação ao que era pregado no judaísmo actual e sua Igreja crescia em todas as direcções.
Com a derrota da Grande Revolta Judaica contra o domínio romano, no ano70, Jerusalém foi tomada pelas forças do comandante romano, Tito. Outra vez, as muralhas e o templo de Jahwe (que o rei Herodes, o Grande, ampliara e embelezara, tornando-o portentoso) foram destruídos, e o resto da cidade voltou a ficar em ruínas, sem contar com os milhares de mortos e a miséria que se espalhou nesta cidade por muitos anos.
Em 135, o imperador Adriano mandou arrasar a cidade, ao cabo da revolta judaica liderada por Simão bar Kokhba. Sobre os restos de Jerusalém, edificou-se uma cidade helênica (Élia Capitolina) e sobre o monte onde se erguera o santuário de Jahwe, erigiu-se um templo dedicado a Júpite.
Lembro-me de palavras suas dizendo.
Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados! Quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e tu não quiseste! Eis que a vossa casa vos ficará deserta. Porque eu vos digo que, desde agora, me não vereis mais, até que digais: Bendito o que vem em nome do Senhor! Mat.23:37
O termo Igreja Primitiva é utilizado para se referir à um período histórico do cristianismo e da Igreja Católica entre 30- 325 d.C. O termo Igreja Primitiva refere-se a instituição do cristianismo primitivo e suas doutrinas. Neste período a Igreja estava engajada em diversas discussões acerca dos conceitos cristãos. Inicialmente cinco cidades surgiram como importantes centros da igreja: Roma, Jerusalém, Antioquia, Alexandria e Constantinopla.
Em 330 funda Constantino uma nova cidade na Grécia e a chama de nova Roma
Tratava-se, no entanto, de uma cidade puramente cristã, dominada pela Igreja dos Santos Apóstolos que era uma nova versão da Igreja católica ou a própria.
Durante este período os cristãos por vezes eram perseguidos e por vezes perseguiam e matavam os não cristãos, Quais eles denominavam de pagãos ou hereges.
Mestre este tipo de igreja e de cristianismo não me representam em seu nome, também não reconheço nem um concílio criado por esta igreja ou por este cristianismo desde então.
Mestre nos séculos de XIII-XVI aconteceram muitas coisas que me deixaram estarrecidos. Primeiro veio o santo ofício ou Inquisição criada e dirigida pela Igreja Católica Romana. Ela era composta por tribunais que julgavam todos aqueles considerados uma ameaça às doutrinas do cristianismo (conjunto de leis) desta instituição. Todos os suspeitos eram perseguidos e julgados, e aqueles que eram condenados, cumpriam penas perpétuas ou eram torturados até a morte ou queimados vivos na fogueira em plena praça pública.
Senhor meu Jesus me sinto envergonhado e triste por este tipo e prática de cristianismo completamente inspirado pelo poder do mau:
Muitas guerras e perseguições são feita pelos cristãos na tentativa de converter as pessoas ao cristianismo até mesmo os próprios judeus sofreram perseguições.
No século XIV inicia-se as grandes descobertas com a sua cruz como símbolo na proa de cada caravela e com ela a morte e a desgraça de milhões de nativos nos novos continentes e tudo isto em seu santo nome.
Em 1517 veio finalmente a reforma da igreja com Martinho Luthero
  um monge agostiniano que pregou uma proposta de reforma nas portas da igreja de Wittenberg, debatendo a doutrina e prática de indulgências. Esta proposta é popularmente conhecida como as 95 teses, que foram pregadas na porta da Igreja do Castelo (Schlosskirche). Em 1520 a igreja se separa dando inicio a igreja Luterana da qual nasce dezenas de denominações.
O papa
Calisto III, em 1456 seguido de Sixto VI, em 1481, e Leão X, em 1514). Declaram que negros e indios não tem alma por isso tambem não sentem dores como os não negros. E desta forma segue o cristianismo maltratando as gerações com escravidão e morte.
No seculo 17 e 18 nasce grandes criticos dos systemas religiosos na Europa forçando a população da época a pençar em outros termos mais humanistas criando assim novas sociédades cristãs.
Meu querido Jesus as igrejas de hoje em dia me pertubam a mente e o coração, vejo tanta ipocrisia nelas que só a metade já me era suficiente. Vejo o templo de salomão ser outra vêz erguido e a Arca da aliança refeita, desta vêz sendo carregada por falços levitas, Vejo igrejas vendendo tijolinhos de Deus, vassouras ungidas. Fronhas bentas, cuécas e caucinhas sagradas para quem quer ter filhos e uma série de outros fetiches e amuletos que pertencem mais as práticas dos povos primitivos.
Vejo igejas incoroporando rituais de Ubanda e Candonblé em seus cultos, que êles o chaman de Reteté ou Macumba evangélica,  pessoas recebendo espiritos e incorporando transes, danças em cima de tijols e telhas quebrada além dos ritos a deusa do mar Yemajá.
Mestre, tenho que lhe confeçar do fundo do meu coração,  não reconheço estas formas de cristianismo de adoração e louvor,  portanto os renego e me envergonho de tomar a palavra cristão sobre mim.
Em frente toda essa vasta corrupção na tua igreja venho a refletir o seu encontro com a mulher samaritana junto ao poço de Jacó.
Logo depois que éla percebe que o senhor é um profeta judeu ela  lhe dirige uma profunda pergunta ; Senhor, nossos pais adoraram sobre este monte, e vos outros dizeis que em jerusalem é o lugar onde se deve adorar a Deus, e o Senhor responde, mulher, cre em mim, é chegada a hora em que vos não adorareis o pai nem neste monte nem em Jerusalem. A hora vem, e agora é, quando os verdadeiros adoradores hão de adorar o pai em espirito e verdade.
Eu entendo muito bem que isto significa que temos que adorar o pai no intimo do nosso coração com respeito, reverencia e amor. E não nos templos euforicos ou nos montes desertos.
Querido Jesus, sou menbro de uma igreja bem pequena e vejo que meus irmãos em cristo procuram ter uma vida focada em ti, mais acredito que precizamos da tua ajuda para melhorarmos ainda mais nossa conduta, tratar melhor do nosso corpo que é a morada do espirito santo de Deus, não permiteis que este mesmo corpo seja inspirado pelo poder do mal, ajuda-nos a ser simples, humilde amando o nosso Deus em primeiro lugar e ao nosso proximo atendendo suas necessidades assim como nos encinaste na pratica do amor.
A partir de agora quero que o Senhor me aceite como um simples seguidor de seus encinamentos assim como foram os seus seguidores quando o senhor aqui esteve, e não quero jamais ser chamado de cristão.
Meus respeitosos cumprimentos a vossa magestade…
João Mendes

[Um texto poético e histórico que o meu amigo Xamã João Mendes me endereçou há ~ 2 anos]

sexta-feira, 21 de abril de 2017

CIÊNCIA, RELIGIÃO, ESPIRITUALIDADE, ÉTICA

                                 



Este cientista tem uma abordagem de bom senso, mas de um bom senso que não vai tão longe como isso. Quando fala da impossibilidade de se solucionar o «porquê», mas apenas o «como» dos fenómenos, através da ciência, está a ser correcto.
Porém, a existência de um espírito cósmico é vista com relutância por uma série de pessoas imbuídas de cientismo, talvez mais do que de ciência propriamente dita. O facto é que o célebre teorema de Goedel implica que não possamos abarcar nunca o todo para o submeter à lei de um sub-conjunto, seja ele qual for.
A ciência é um instrumento precioso, mas não é uma chave de sabedoria.
A sabedoria tem como fundamento o «coração», a ciência tem como fundamento a «razão». Quando a razão se junta com desejo de poder, transforma-se numa mistura muito perigosa e instável, dando origem às derivas mais obscuras da história humana.
Só enunciarei algumas delas (cada uma necessitaria de uma longa explanação):

- J. Robert Openheimer, um dos pais da bomba A, suicidou-se cheio de remorsos pelo monstro que ajudou a criar. Com efeito, muitos cientistas envolvidos em torno do Manhattan project consideravam como um dever patriótico desenvolver essa bomba, até porque havia indicações da espionagem (erradas ou sobrevalorizadas como depois se verificou) de avanços significativos dos cientistas alemães nazis neste domínio, de controlarem o átomo para fabricarem a bomba atómica.

- O darwinismo foi distorcido e transformado em «argumento» para justificar duas teorias monstruosas, o racismo e arianismo dos nazis, o lyssenkismo na URSS do tempo de Estaline.

- A eugenia é uma teoria racista que foi originada por Galton (sobrinho de Darwin) e que tem feito muito mal, inspirado muitos programas nefastos, desde esterilizações em massa de vários povos, até à promoção das guerras em que uma parte da humanidade contemporânea está mergulhada.

Poderia continuar com uma infindade de factos, por todos os investigadores consensualmente aceites, nomeadamente com a utilização de saberes das ciências e técnicas, para cometer depredações ou crimes ecológicos extremamente graves para o presente e futuro da humanidade...

O meu argumento é de que a ciência é um instrumento, podendo ser empregue para o bem ou para o mal, consoante as mãos nas quais esteja.
Isto sempre foi compreendido pelos cientistas, eles próprios. Por exemplo, Leonardo da Vinci escrevia os seus textos, suas notas para estricto uso pessoal, numa escrita indecifrável (excepto para ele). Era afinal a imagem em espelho da escrita vulgar, que ele treinou, provavelmente desde muito jovem, como «canhoto» que era. Os célebres manuscritos de Da Vinci só foram reconhecidos plenamente no seu enorme significado científico e filosófico, muito recentemente, em pleno século XX!

A não conflitualidade da pesquisa científica e dos seus conceitos e teorias com a religião foi reconhecida pelo papa João Paulo II. Ele, evidentemente, procedeu ao «aggiornamento» indispensável para manter a influência do catolicismo na intelectualidade esclarecida da sua/nossa época.
Do lado do ateísmo, Michel Onfray por exemplo, afirma sem qualquer problema que - apesar de ateu - ele (e muitos outros) é culturamente cristão, o que é uma evidência, não apenas pela educação, mas também pelo facto de que praticamente todas as teorias sociais e políticas contemporâneas (republicanismo, democratismo, socialismo, comunismo, anarquismo...) serem afinal laicizações do cristianismo. Esta constatação, que poderá surpreender alguns, teria de ser desenvolvida por si só num artigo ou numa série de artigos...

Mas o mais interessante, no meu ponto de vista, é que se afastem falsos argumentos:

- Uns, imbuídos do prestígio «mágico» do cientismo, usam abusivamente o nome de «ciência».

Já ouviram, com certeza, pessoas a falar do que em geral NÃO SABEM: costumam dizer, doutoralmente: «a ciência prova que...» ora a ciência nunca provou, nem prova nada, como dizia Bateson*; as ciências físicas e naturais não são como a matemática em que, aí sim, existe prova, ainda que esteja subordinada a um conjunto de axiomas (ex.: a geometria mais corrente é euclidiana; porém não tem cabimento num contexto riemanniano).

- Outros, temerosos da ciência, combatem-na em nome duma «fé», não compreendendo que a sua fé só pode ganhar com um aprofundamento do conhecimento do Universo, ou seja, de Deus.

Segundo uma visão muito consensual em várias religiões, não se pode ter uma compreensão total, nunca, do que está para além da compreensão racional, seja qual for o estado da ciência ou do desenvolvimento tecnológico humano. Porém, se essa «fé» é temerosa da ciência enquanto método de conhecimento do real, é apenas um medo, uma ignorância. Talvez essas pessoas precisem de ter mais fé, para que ela não seja abalada pelo tipo de estudo realizado no âmbito da pesquisa científica.

Isto não significa que não se coloquem limites éticos à pesquisa científica. A procura da verdade, em si mesma, não deve ser vista como um absoluto. Praticamente todos os cientistas e filósofos, quer sejam ateus, ou possuíndo alguma forma de espiritualidade, entendem que devem existir limites éticos a essa pesquisa científica, podem é não estar de acordo no traçado das fronteiras.

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Science sometimes improves hypothesis and sometimes disproves them. But proof would be another matter and perhaps never occurs except in the realms of totally abstract tautology. We can sometimes say that if such and such abstract suppositions or postulates are given, then such and such abstract suppositions or postulates are given, then such and such must follow absolutely. But the truth about what can be perceived or arrived at by induction from perception is something else again.
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