VAI O PEIXE NA CORRENTEZA, ASSIM EVITA GASTO EXCESSIVO DE ENERGIA.
ALIÁS, OUTROS SEGUEM O MESMO CAMINHO.
FORMAM IMENSOS CARDUMES SEM PÁTRIA. SEU TERRITÓRIO É A CORRENTEZA. POUCOS SÃO OS TRANSGRESSORES DA CORRENTEZA.
ELES ARRISCAM MUITO, MAS QUANDO ATINGEM DETERMINADO TAMANHO, CONSEGUEM DEFENDER-SE MELHOR DOS OUTROS PREDADORES.
MAS, TODOS OS PEIXES, PEQUENOS OU GRAÚDOS, SÃO CONSUMIDORES.
Podes ignorar a questão, admitir que não nos diz respeito. Ficamos a olhar o rio escoar-se suave ou agitado. Muitos ignoram a complexidade dos ecossistemas, que não sejam o seu.
Por que se preocuparia um bovino com o que há na profundeza do rio? Só lhe interessam os pontos onde pode beber ou os vaus, para chegar à outra margem, onde se encontram ervas frescas.
A CRIAÇÃO É DESVIO CRIATIVO, MAS A SOCIEDADE PRECISA DE ESTABILIDADE. ISSO NÃO É O MESMO QUE RIGIDEZ, ESTA É O ATRIBUTO DOS CADÁVERES.
PORÉM, A RUPTURA CRIATIVA ARRISCA TORNAR-SE NUMA DERIVA CAÓTICA. ENTÃO, É NECESSÁRIO UM HOMEM AO LEME.
Muita gente conhece a canção de Serge Gainsbourg e Jane Birkin «Je t'aime, moi non plus». Tornou-se um enorme êxito comercial e propagou para uma fama ainda maior este par já bastante famoso. Porém, eu não considero que esta canção seja grande coisa, nem do ponto de vista musical, nem do ponto de vista da letra «erótica». O facto de uma letra falar explicitamente de sexo, de ato sexual, não a torna automaticamente merecedora de entrar na categoria de erotismo.
Compare-se com o bolero de Consuelo Velasquez «Besame»(1): Não há dúvida que é uma canção de amor com forte componente erótica (ela explicita somente beijos e abraços)...
Com efeito, os surrealistas consideravam que era ingrediente fundamental da poesia erótica(2), esse erotismo estar recoberto dum véu, de haver ambiguidade, incerteza, duplicidade de sentido, que tornam o poema, ou peça musical, muito mais interessantes.
O auditor é confrontado com uma sensação análoga à que tem, quando os traços dum rosto são sugeridos, por detrás de um véu.
O contrário ocorre hoje, em particular nas praias, com o rosto e com o corpo todo, não deixando qualquer espaço para a imaginação.
Para os surrealistas, a Arte erótica era sugestão, provocação encoberta, o «dizer sem dizer»(3). Note-se que esta definição não era inspirada por uma moral puritana, antes pelo contrário. Eles, surrealistas, faziam na sua vida uma experimentação permanente, o desregramento sexual era "regra", não havia para eles tabus de qualquer espécie.
Porém, hoje em dia, se dissermos "erótico", provavelmente as pessoas irão pensar em sexo explícito, em obscenidades, em pornografia. Mas, estas características estão afinal nos antípodas do verdadeiro erotismo.
(2) André Breton: « La beauté convulsive sera érotique-voilée, explosante-fixe, magique-circonstancielle ou ne sera pas »
(3) Aliás, é notável o número de artistas plásticas femininas surrealistas; estas mulheres-artistas desenvolveram sua própria abordagem do erotismo.
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A canção seguinte, «In the mood for love(4)», sugere que ela está nesse estado quando está na presença do seu amado. Mas, quererá isso dizer que «está pronta para fazer amor»? Note-se que não é o que ela diz, realmente. O efeito sugestivo advém da música, lânguida e sensual, que reforça o caráter erótico da canção.
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(4) traduziria por «estou numa onda de amor» ou algo deste género.
No poema «Pensionnaires», de Verlaine magistralmente posto em música por Léo Ferré, a situação é explícita e tem um pormenor tal, que se compreende quais as atividades a que se entregavam as duas irmãs. Se há um aspeto explícito de atos sexuais, por outro lado, há o contraste (musicalmente sublinhado) da criança no berço, muito contente e entretida, enquanto as duas amigas se entregam a rituais fogosos.
Escolhi-o, porque é, a meu ver, uma obra-prima poética e porque na arte não existem fronteiras estanques, nem regras absolutas: Apesar do aspeto explícito, parece-me algo só ligeiramente transgressivo. A arte do poeta e do músico, conseguem fazer-nos aceitar a letra como sendo erótica, não como pornografia.
Poema de Paul VERLAINE /Música e Canto de Léo Férré:
Este poema foi composto na prisão, juntamente com outros poemas eróticos. Veja abaixo a ilustração feita por Jean Berque, que também ilustrou outros poemas do livro «Amies», publicado em vida do autor sob pseudónimo:
Françoise Hardy, que faleceu recentemente aos 80 anos, deixou-nos algumas das canções mais belas em língua francesa. Ela tinha um modo de cantar extremamente sensual. Além disso, era excelente compositora e letrista. Ninguém fica indiferente à sua beleza e à sua voz. Oiçam (letra em baixo):
A canção «Moi vouloir Toi» (letra e música de Françoise Hardy/ Louis Chedid), celebra o amor físico entre um homem e uma mulher, enquanto o melhor antídoto para descolar das chatices do mundo. Mas como não é explícita, cai dentro da minha definição de erotismo.
MOI VOULOIR TOI
Pour décoller d'la planète
y a des plans plus ou moins nets
comme les piqûres en cachette
l'alcool et les cigarettes
y a des pilules, des tablettes,
des salades sans vinaigrette
moi je suis toujours à la fête
chez toi
pour décoller d'la planète
et s'envoler à perpète
j'ai la meilleure des recettes
moi vouloir toi
moi vouloir toi
de haut en bas
de bas en haut
sans bas ni haut
sans haut ni bas
moi vouloir toi
pour décoller d'la planète
autrement qu'en superjet
qu'en soucoupe ou en navette
en yogi ou en ascète
pour perdre carrément la tête
sans presser sur une gâchette
exclusif, je regrette
moi vouloir toi
moi vouloir toi
de haut en bas
de bas en haut
sans bas ni haut
sans haut ni bas
moi vouloir toi
moi vouloir toi
de haut en bas
de bas en haut
sans bas ni haut
sans haut ni bas
moi vouloir toi
moi vouloir toi
de haut en bas
de bas en haut
sans bas ni haut
sans haut ni bas
moi vouloir toi
Este poema foi escrito na sequência do 11 de Setembro de 2001. Publiquei-o a 29 de Setembro desse mesmo ano. Não tinha ilusão sobre a política de abutres grandes e pequenos que iria desenrolar-se daí por diante. Infelizmente, para todos nós, a minha intuição estava correta!
Manuel Banet
(Murtal, Parede, a 02 de Maio de 2024)
Fábula: O CONSELHO DOS ABUTRES
Reuniu-se o Conselho Supremo dos Abutres, Para decidir de magna questão: O Abutre-chefe, bateu as asas e disse: "Senhores; a situação é grave. Há grande falta de carniça no mercado!" Virando-se para um dos seus generais, Interrogou: "Não haverá por aí uma Guerra que se aproveite?" Ao que o general abutre respondeu: "De momento, Que se veja, não! Porém, temos planos para Remediar tão penosa situação " "Dizei-me então", retorquiu o Abutre-Chefe, "Tem de ser algo em grande,
E que nos sirva por muitos e bons anos!"
G: "Recebi informação dos nossos amigos Chacais Que um banho de sangue de carneiros está em preparação, Pelos abutres do outro lado" A-C: "Quais? Dizei-me tudo o que sabeis!" G: "Aqueles mesmos que preparámos e treinámos Durante longos anos e que agora se têm rebelado Contra o Vosso supremo comando: Vão causar um genocídio, dentro da nossa coutada, Para mostrar que já não nos temem ou respeitam!" A-C: " Dentro da nossa coutada !?"
Aí, pediu a palavra o velho Abutre, que já tinha sido Conselheiro de muitas empresas de carne-para-canhão E disse: "Pois bem, deixemos que atuem! Assim, teremos pretexto para desencadear as nossas operações!" Grande algazarra se elevou então no Conselho: Uns gritavam: "O quê? Deixar que soframos uma tal humilhação?!" Outros: "Mas se desta vez os cachorros Se puserem a ladrar que estamos feitos com o outro lado?"
A maioria estava muito excitada, ao saber Que a grande crise estava prestes a terminar: Os abutres não se importam de onde vem a carniça, É sempre bem-vinda, para satisfazer suas grandes panças. O Abutre-chefe ergueu-se então do seu trono, Voejou em torno da mesa de conferências e pousou no meio desta. Fez-se logo um silêncio sepulcral. Então disse: " Sim; este é o momento! D'agora em diante, teremos abastecimento Copioso, tanto e tanto, que ainda vai sobrar Pra satisfazer a gula dos falcões, hienas, Chacais e todos os nossos amigos:
Eles são os nossos aliados naturais! Vamos organizar o cenário da guerra,
Com sua preciosa colaboração."
O enviado dos falcões disse então: "Estamos d'alma e coração convosco! Temos nossas esquadrilhas preparadas Para atacar. Iremos vestidos de pombas, Como é nosso hábito, para que os cordeirinhos Da nossa cerca fiquem quietos e calados!"
O Embaixador das Hienas, pediu a palavra E disse: "Se Vossas Senhorias me permitem, Devido aos longos anos que tenho de Experiência com as hostes cornudas, Penso que podemos dar precioso contributo A tão nobre causa; temos esquadrões Bem treinados para semear o terror Nos rebanhos, receitas infalíveis Para os desorientar, para confundirem Nossos dizeres com apelos de cães-pastores: Assim eles serão voluntários Para irem imolar-se pela nossa causa!"
"Muito bem!" Disse o Chefe-Supremo. "Ordeno que ponham em marcha os preparativos Da grande guerra que irá, com nosso selo, Marcar o início desta nova era! "
Todos aplaudiram entusiastas, fazendo juras
D'eterna fidelidade ao Céu dos Abutres, À civilização da Carnificina, Ao modo de vida Necrófago.
A voz rouca do velho abutre fez-se Ouvir, após a gritaria ter acalmado: "Amigos: que tal escolher uma data Simbólica de início da grande campanha Ficava a calhar o 11 de Setembro: Sim: Onze do nove de setenta e três! Com certeza se recordam desta data, Para a qual eu muito contribui Discretamente preparando Aquele magnífico holocausto!"
C-A: "Está bem, velho e fiel amigo" Disse o Grande Chefe Abutre, "Acho que é uma ótima ideia!" Dito isto, encerrou solenemente o Conselho, Com piedosa oração e toda a assembleia se dispersou, Cada qual indo cumprir sua missão, Dando seguimento às ordens do Chefe Abutre.