terça-feira, 29 de julho de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: «O grau zero» [OBRAS DE MANUEL BANET]
quinta-feira, 17 de julho de 2025
CARTILHA ELEITORAL [OBRAS DE MANUEL BANET]
terça-feira, 8 de julho de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: «O Barco Encalhado» [OBRAS DE MANUEL BANET](*)
Perguntei ao piloto do meu navio se tivera notícia dalgum naufrágio, nos tempos mais recentes.
Ao que ele me respondeu: "Não, Senhor. Este deve ter encalhado há bastante tempo."
O casco de madeira apodrecida, negra, era colonizado por lapas e mexilhões; carangejos pequenos corriam à superfície.
A carcaça em decomposição ainda exibia, no centro, um fragmento de mastro; como um braço erguido para o céu .
A vida borbulhava nos seus destroços, como num cadáver de cetáceo morto que dera à costa.
Este, lentamente, é descarnado pelas brigadas de criaturas oceânicas até nada mais restar senão o esqueleto.
A visão daquele esquife imóvel no meio de rochedos bravios, lentamente devorado pelo exército voraz dos mares...
Fez-me pensar...
A cena apareceu-me como perfeita analogia das construções intelectuais que navegam na sociedade, como navios nos oceanos.
As construções defeituosas não vogam até muito longe. As correntes arrastam-nas, metem água e acabam por naufragar!
Depois, seus destroços presos nos rochedos, sob as furiosas vagas, ficam desconjuntados, irreconhecíveis.
Por fim, o que resta do navio, desfaz-se; só alguns pedaços a boiar, ou nem isso. O que sobra, vai para as profundezas.
Ninguém advinha que ali se ergueu um orgulhoso navio. Da praia ao horizonte, o mar permanece tão vazio como no começo do Mundo.
sexta-feira, 27 de junho de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: Guerras Sem Fim [OBRAS DE MANUEL BANET]
Gostava de voar para um país distante,
Muito mais distante, que a tecnologia atual
Nos pode transportar. Aí, pisaria o solo
e abraçaria as gentes; mas não teria ilusões:
Este país seria como os outros, apenas
Poupado aos horrores deste século moderno.
Não será algo assim que muitos de nós procuramos
Atingir? - O paraíso terreal ou refúgio
Contra a fealdade, a cobardia e crueldade
Dos nossos contemporâneos?
Estamos à procura do que não existe,
De uma utopia no sentido estricto
Não estamos porém errados, na essência:
É o nosso coração humano que nos diz
Outros procuram aconchego dentro da tribo
Dentro da família, do grupo a que pertencem
Não os critico pelo desejo de auto-preservação
Embora seja irrisório, neste Mundo em guerra
A guerra não poupa as simples gentes
Fustiga todos, todos nós somos sem-abrigo
Só os sanguinários poderosos têm meios;
Eles sabem-no e usam-se disso!
quinta-feira, 5 de junho de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: Às Palavras Renunciei [OBRAS DE MANUEL BANET]
Gostava de construir novas palavras,
Delas fazer um vocabulário
Só meu, para meus leitores
Que pudesse partilhar
Como num dicionário
Mas sem o estafado sentido
Só me acodem palavras gastas
Daquelas que são ecoadas
Em inúmeras canções
De amor ou desesperança
Lançadas ao desbarato
Enfim, palavras chãs
Se ao menos pudesse
Com elas construir
Algo novo, inaudito
Seria o triunfo do som
Sobre a gramática fria
A síntese genial
Então, como bandeira
Envolveria teu corpo
De cores, sons e sentidos
Na imperfeita obra
Que o poema desvela
E toda a nudez revela
Pois renunciei ser
O mago dos versos
A Lua não me aquece
Prefiro o forte abraço
Do vento oceânico
No meu corpo tenso
Colhi todos os perfumes,
Cores e sabores da vida
Como jardim de mistérios
Serei mais qu' uma ave
Improvisando seu canto
Em harmonia perfeita?
Somos frutos tardios
De jardins tranquilos
Nem mais, nem menos
Nenhuma pretensão
Tivemos de profetizar
A luz que se esvai
-----------
Murtal, 05 de Junho 2025
segunda-feira, 26 de maio de 2025
NO CREPÚSCULO SANGRENTO + POEMA DE FERNANDO PESSOA
NO CREPÚSCULO SANGRENTO
sexta-feira, 23 de maio de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: O Mundo [OBRAS DE MANUEL BANET]
O mundo está fora de mim, no sentido trivial
Mas também se pode dizer que ele penetra
Em todos os poros da minha pele,
Pelo ar que respiro, pela comida que ingiro
Pela água e pelo vinho,
Pelas letras, os sons e os cheiros
Ele penetra por todos os canais
Dos sentidos.
Eu não recuso este fluxo constante
De sensações.
Porém, ficar cativo,
É outra coisa; estar cativo das coisas materiais
Ou até das ideias, das que se originam
Nas agitações fúteis, sempre procurando
O novo; como se, perante a novidade,
Devêssemos baixar a cabeça, curvar a espinha!
Se quiseres argumentar que eu «estou fora do mundo»
Tens razão, num certo sentido:
No sentido antigo e caído em desuso
da palavra «mundo»...
Como «mundano» ou «mundanidade»...
Se não sou deste mundo, estou contente
Estou mais aconchegado no mundo
Da infância, das recordações
Dos momentos felizes, da pesquisa
Científica e intelectual,
Do prazer de conversar com iguais...
Sim, não é com naturalidade, nem com desembaraço
Que «falo» através de telefones móveis, ou de teclados
Digitando palavras, como agora...
Sou realmente antiquado e não tenho complexos!
Sou capaz de compreender os mais jovens,
Mas duvido que a recíproca seja verdadeira.
Estou fora do mundo e ele está fora de mim.
Sim, do mundo fútil, coisificado e destruidor
Do que há de mais humano na humanidade,
Estou fora!
Por muito que vos custe, pensai de outro modo;
Já será um princípio de emancipação.
Não pretendo que pensem como eu;
Mas pensem!
Com alma, espírito e todo o ser,
Libertos da prisão doirada da tecnologia
Que ambiciona encerrar nossas mentes.
terça-feira, 20 de maio de 2025
ESCOLHAS POÉTICAS: Fortuna [OBRAS DE MANUEL BANET]
FORTUNA
Poderia pôr a teus pés, Deusa gloriosa,
Cestas de fruta e flores odoríferas
Das mais exóticas espécies
Que seja possível alcançar.
E poderia declamar a teu ouvido
Versos em rimas obscuras, ofegantes
Sem outra lógica que a do sonhar
Mas tudo em vão seria, Fortuna
Tens ouvidos e cabeça de bronze
Teu gesto amplo ficou para sempre
Parado, na suspensa promessa...
Para lá da Tua casa, velejo em mar
Denso e fluido, no ocaso demente
Enfunando as velas em tributo
À sombra que traça o Sol.
Fortuna seja nome de barco
Destino humano sempre igual.
sábado, 17 de maio de 2025
PERANTE OS TEMPOS DE ESTUPIDEZ [OBRAS DE MANUEL BANET]
Em vez de prefácio
Desesperadamente procuro o sentido; não procuro por pensar que o irei encontrar, mas por impulso irracional, no que existe de humano, no âmago do meu ser.
Não sei se isto é defeito ou virtude, sinceramente. Mas, de facto, talvez seja defeito, pois sofro e nada ganho, nem meu sofrimento a outros aproveita.
Gostava de ser como a árvore ou como o rio que se estende sem perguntar para onde corre, sem se importar com as pedras nas margens.
Mas não sou árvore, nem rio, nem pedra. Gostava de ser animal e sentir. E meu saber ser instinto, e minha vida ser instantes sucessivos.
Mas também não sou o animal, simples produto da Natureza, nela imerso e dela participante. Sou homem, por isso sofro, pois vejo a degradação da espécie e o sofrimento de muitos, sob a opressão sádica e violenta de alguns.
Mas como posso fazer face a esta monstruosidade? - Deus não tem plano nenhum para a nossa espécie, nem para todas as outras. Esta é a conclusão a que cheguei, por agora.
Confortável ou não, esta conclusão parece-me o princípio de racionalidade neste tempo de violência, de desprezo pelas leis dos homens e da Natureza, do triunfo da morte, a par da estupidez e da vaidade...
segunda-feira, 3 de março de 2025
AMÁLIA RODRIGUES : «Maria Lisboa»
terça-feira, 11 de fevereiro de 2025
Obras Vol. I, II & III: «Todas as Manhãs do Mundo» [OBRAS DE MANUEL BANET]
Não estava completo o livro «Opus Vol.I, II & III» ; não tinha posfácio. Vou escrevê-lo na contracapa ...
sábado, 1 de fevereiro de 2025
domingo, 29 de dezembro de 2024
OPUS. VOL. III, 33: SOBRE A ARTE POÉTICA
[P.S. , AS PALAVRAS POÉTICAS E SUA INTERPRETAÇÃO]
POESIA E JOGO
Na continuidade da pesquisa sobre aquilo que faz com que algo seja considerado poesia ou não, há uma característica que não é demais enfatizar: O efeito do inesperado.
Um poema pode ser muito bem construído, harmonioso, etc, mas não estimular a atenção do auditor/leitor. Essa coisa que falta, chama-se imprevisto, aleatório, surpresa... Uma quebra no discurso, assim como nos acontecimentos descritos. O imprevisto é fundamental, tanto em poesia como em música. E a poesia é, no fundo, uma forma de música.
Outra circunstância esclarecedora em relação à importância do acaso em poesia, é o mecanismo do riso. Certas histórias são engraçadas, desencadeiam o riso: Reconhecemos-lhes qualidade humorística, enquanto outras, não. Aquilo que torna uma história humorística, é possuir elementos completamente imprevisíveis, mas da ordem do verosímil. Temos aqui uma componente poética frequente em narrativas em prosa, o conto ou o romance.
Afinal, nem o conteúdo, nem a forma, nos permitem concluir da qualidade poética duma produção. O "tour de force" poético, consiste na formulação, em apenas um verso ou estrofe, de algo complexo ou subtil, que precisaria de mil palavras para ser descrito analiticamente. Neste último caso, haveria perda total do encanto poético.
É por isso que, embora seja possível traduzir automaticamente através de algoritmos, uns pedaços de prosa, tal é impossível com poesia verdadeira: Nesta forma mais elevada de literatura, quase nao sera possivel uma tradução. Só por analogia ou semelhança, mas não literalmente, poderá a obra-prima poética ser traduzida. Mesmo que a tarefa seja levada a cabo por alguém com profundo conhecimento de ambas as línguas; a língua original e a da tradução.
Empiricamente, podemos confrontar uma tradução realizada por «robot», com a de um humano, tradutor qualificado: Se o texto poético traduzido for «pesadão», sem as subtilezas do texto original, podemos apostar que é produto de um algorítmo; se não colar exatamente ao texto original, mas transmitir a atmosfera poética deste, então terá «mão humana». Uma boa tradução é também um ato de criação literária.
POESIA E INTERPRETAÇÃO
Há que diferenciar entre interpretação e adaptação:
- É uma diferença muito evidente em música: Pode haver fidelidade à obra musical, com a sua execução noutros instrumentos, que não aqueles para os quais o compositor ideou a partitura. No domínio musical, fala-se então duma adaptação.
A interpretação de uma peça musical, refere-se a algo muito diferente: Será a forma de traduzir em discurso musical o que está na partitura; a interpretação pode servir bem a ideia do compositor, ou pode afastar-se, ao ponto de deturpar a peça em causa. Por isso, ao estudar-se música antiga, é indispensável conhecermos as convenções interpretativas, as regras implícitas de uma dada época.
Na poesia declamada, deve procurar-se a inteligibilidade imediata do texto. Nos textos antigos, é lícita a atualização de certos termos, assim como da fonética. O poema tem de ser inteligível. Deve dar-se prioridade à articulação da palavra, em relação aos efeitos expressivos. Nos textos cantados, porém, esta prioridade pode não existir, em certos casos: Por exemplo, em cantos litúrgicos com textos em latim, as palavras podem ser incompreensíveis, devido às complexidades da polifonia. Nas óperas, a compreensão imediata das palavras não é essencial, pois supõe-se que o público conheça o enredo e que vai ao espectáculo mais pelo seu lado musical, do que pelo teatral.
sexta-feira, 20 de dezembro de 2024
OPUS VOL. III. 32: MEDITAÇÕES FILOSÓFICAS
Podes ignorar a questão, admitir que não nos diz respeito. Ficamos a olhar o rio escoar-se suave ou agitado. Muitos ignoram a complexidade dos ecossistemas, que não sejam o seu.
Por que se preocuparia um bovino com o que há na profundeza do rio? Só lhe interessam os pontos onde pode beber ou os vaus, para chegar à outra margem, onde se encontram ervas frescas.
A CRIAÇÃO É DESVIO CRIATIVO, MAS A SOCIEDADE PRECISA DE ESTABILIDADE. ISSO NÃO É O MESMO QUE RIGIDEZ, ESTA É O ATRIBUTO DOS CADÁVERES.
PORÉM, A RUPTURA CRIATIVA ARRISCA TORNAR-SE NUMA DERIVA CAÓTICA. ENTÃO, É NECESSÁRIO UM HOMEM AO LEME.
SEREMOS OS TIMONEIROS DA BARCA DO NOSSO SER.
quinta-feira, 12 de dezembro de 2024
OPUS. VOL. III. 31: AS PALAVRAS SÃO NOSSAS AMIGAS
As palavras são nossas amigas
Mas, como nossas amigas também
Podem levar-te ao engano
Não por maldade, nem perversidade,
Mas porque a complexidade
É tal que nós cremos numa coisa
E, afinal, não era nada disso
Igualmente, as máquinas são nossas
Amigas, foram feitas e concebidas
Por mãos e cérebros humanos
Para nos ajudar nas mais diversas
Atividades: resultaram
De muito esforço e inteligência.
Desprezar as máquinas é
Não compreender o que são
Desprezar a cultura, a arte, a ciência
São atitudes equivocadas
Elas baseiam-se numa visãoMágica; a de que as coisas
Têm vontade própria
Que têm intenção
Que são animadas
As crianças pequenas
Podem pensar assim.
Mas os adultos, como é
Possível?
Eu creio que o auto-engano
Leva as pessoas a crer
Naquilo que lhes dá
Mais conforto intelectual
Ou emocional
Aquilo que lhes diminui
O sofrimento
- Mas Saber
É ser modesto, humilde
Porque saber é como
Uma faísca que ilumina
Brevemente a escuridão.
12 de Dezembro de 2024
quarta-feira, 27 de novembro de 2024
OPUS VOL. III, Nº30: DESTINO ERRANTE
deste imóvel viajante de viagens estelares
Arrastando ilusões entre fantasmas irónicos
destroço de barca encalhada em praia remota
Cego contando contos à criança sábia
em dias iguais confundindo os passos
Ou voando com as aves migratórias
sobre horizontes em brasa de ocaso
Cumprindo a promessa de peregrino
de ir por bosques, rios e mares, sempre
pela senda sem parar, até ao seu destino
Coração e alma nus, na ficção do real.
sexta-feira, 8 de novembro de 2024
OPUS VOL.III Nº29: DESALMADA
Caminha pela rua, bamboleia-se
Ao ritmo da música dos auscultadores
Imagina-se a deslizar numa onda,
Surfando sobre a música, quase voando
Voando pelos ares irradiando energia
Não vê nada além do sonho
O sonho sem os limites do mundo
Tudo o que tem de fazer
É mover o corpo, esse avatar
Obedecendo ao ritmo
Que se desprende incessante
Obsessivo, hipnótico
E, muito mais que isso,
Um espesso vidro, inquebrável
Vive no simulacro do corpo
Mas habitado pelo som
Em todas as moléculas
Vibra e ondeia no espaço
No interior/exterior
Da sua fantasia
Evolui em espirais
Pelo espaço-tempo
Ao ponto muito elevado
De onde observa a rua
Com a sua banalidade
E as pessoas cansadas
Ou vagarosas, distraídas
Ou pensativas, raivosas
Ou sorridentes, enfim
Se elas soubessem
Se elas acordassem
Se elas escapassem
Coitadas...
Só que nunca o fazem!
Um vulto no passeio
Avança com passos
Cadenciados gestos
Nos dedos e nas mãos
Trejeitos na boca
Oscilando a cabeça
Possuído pela música
Indiferente ao resto
sábado, 26 de outubro de 2024
OPUS VOL. III nº 28: IMPENITENTE
Há um cadafalso que te espera
Impenitente verdadeiro
Fugidio relapso
Insensato herege
Amante da vida 'té à morte
"Ela que entre" dizes, sorrindo
"E nos teus braços se extinga
O fraco pulsar do coração".
Murtal, Parede
Outubro, 2024
OPUS. VOL. III nº27: REGISTO
Vivi em parte incerta, em tempo remoto
Dos humanos desprezado, confidente dos bichos
Sua língua falei; foi também a minha
Desenhei quantas nuvens se desdobram no céu
Fui escrivão de sonhos, as palavras eu comi
E o vento, d'erva fresca temperado, eu bebi
Debaixo de terra permaneço; aqui fico
Tranquilo espero a eternidade.
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
OPUS VOL. III. Nº26: METAFÍSICO
Ah, pudesse eu mais que em sonho abraçar-te
Se estivesses comigo agora, sentindo teu respirar
Ser ou não ser, não importa mais qu'este sofrer
O destino frio desta matemática ausência
Por que persigo o impossível com a aplicação
Dos loucos ou dos heróis, não posso desculpar-me.
A sombra que somente eu vejo não me esconde
É um sudário que recobre levemente o cadáver
Mas no espaço de infinitas dimensões, quem sabe?
Talvez nos encontremos, um átomo, um instante
Na impulsão de sonhar que nos propulsiona
Talvez nos encontremos em uma vida paralela
Á beira mar, com suave brisa e serena plenitude
Unida alma fluirá, bailando no céu de estrelas