domingo, 10 de setembro de 2023

QUEM SÃO OS RESPONSÁVEIS? QUEM ORDENA O SACRIFÍCIO INÚTIL DE INÚMERAS VIDAS?


 

PS1: No seguinte artigo, Caitlin Johnstone dá conta de recente entrevista de Blinken, em que este admite que os mísseis de longo alcance fornecidos pelos EUA a Kiev, poderão atingir alvos bem dentro da Rússia. Caitlin argumenta que a questão é grave, pois a escalada nos armamentos aumenta a probabilidade de confronto nuclear: 

PS2: A hipocrisia do Tio Sam terá outro efeito nas pessoas, que não seja revulsivo ???



SANÇÕES AMERICANAS, GUERRA ECONÓMICA E POR PROCURAÇÃO CONTRA A RÚSSIA E CHINA

 As sanções americanas e ocidentais contra os gigantes euro-asiáticos foram um fracasso, que hoje até as entidades oficiais e os media corporativos, reconhecem. Mas, a extensão do fracasso tem sido tão grande, que se pode dizer, em relação a várias instâncias, que tiveram um efeito boomerang. Ou seja, os países sancionados, boicotados, tornaram-se mais fortes, mais resilientes, mais capazes de desenvolvimento autónomo. Quanto aos países europeus, tornaram-se mais dependentes dos EUA, tanto na energia, como no armamento, fazendo com que a política europeia se tenha transformado de um jogo de vassalos (os chefes de estado e de governo, em relação aos EUA) para uma posição de servidão (= impossibilidade de escapar à subordinação). É este o único resultado «positivo» para o Império Yankee. 

Visione-se estes dois documentários abaixo, falados em francês. São muito completos e rigorosos nos dados e permitem ver - por contraste - como a media corporativa ocidental tem  ocultado ao público, minimizado, distorcido esses factos para manter a narrativa favorável aos governos belicistas da OTAN.






sexta-feira, 8 de setembro de 2023

JEFFREY SACHS - A liderança dos EUA está cometendo o maior erro que se possa conceber


 https://www.youtube.com/watch?v=MKMxMUG4cKA

A barragem de censura e de propaganda faz com que a media corporativa não se «atreva» ou não «goste» de publicar testemunhos independentes e corajosos, como o de Jeffrey Sachs.

Oiça com atenção este homem, professor universitário nos EUA, muito conhecido e respeitado e que tem mais de trinta anos de experiência, enquanto conselheiro económico dos governos soviético, russo e ucraniano, desde o início dos anos 90. 

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

O FACTO [Obra de Maximiano Gonçalves]


Eu falo aqui do Facto.

O Facto fala por si mesmo,

Nenhum artifício de palavra o desmente,

Nenhuma autoridade o esconde ou ofende.

Vem da Natureza,

E eu, ser vivo consciente,

De um local que ouço chamar Terra,

Fico feliz de o perceber,

O Facto integrador da Realidade que me rodeia

E do movente Cosmos que o Homem pensa

E lentamente vai encontrando,

Percebendo que dele veio.

Também sei do Facto que é acto inicial

Do homem que inventa do tronco o pau,

O instrumento que o prolonga

E por ele vai matar e construir.


O Facto, já se escreveu,

Fala por si mesmo e é teimoso.

O Facto sempre me pergunta

Se sei da sua origem

E das suas razões de ser.

Por existir, não pergunta se é necessário.

Mas, depois de aparecido,

Interpela-me se sei da sua razão


E quer que dele se saiba.

Do Facto se ergue a Ciência

E se imagina a Arte.

O Facto não esteve à espera,

Simplesmente apareceu

Na devida altura de aparecer,

O Facto quer que o pensem

E por ele avancemos.

Não é por o desconheceres

Que se cala ou desvanece.

Olha bem o Facto,

Ele indica o que aí vem.

O Facto traz consigo as suas razões

E se te parece que as guarda

É por te querer interrogador,

Trabalhador da verdade, buscador.

Pergunta-lhe por elas,

O Facto pede a tua inquietude

Até chegares ao acontecimento

E lhe entenderes a virtude.

O Facto é indestrutível,

Complexo mas compreensível,

O Facto explica a Vida,

A da Terra que ainda aprendemos

E dos Mundos que começamos a ver

E, sem os ver, calculamos,

No Espaço cujo fim nem sabemos.


Disseram de ti, Facto

(e do Número, que é Facto, também)

Que és teimoso.

Sei porquê e todos

- e são tantos - os mais sábios que eu:

Mas, sendo literariamente interessante

Dizer que és teimoso o certo é dizer

Que queres encontrar a Verdade

E, assim, és invencível e determinante.


O Facto desfaz a falsidade.

E ao encontrar-te, Facto,

Ensina-me as tuas razões

Para chegar à Paz.


Maximiano Gonçalves

quarta-feira, 6 de setembro de 2023

O QUE É O ROMANTISMO?

Aqui, não vos irei falar sobre a infinidade de sentidos que é dada à expressão ou a forma como o público, em geral, avalia qualquer obra como sendo «romântica» ou não. Isso terá pouco interesse, se não se compreender previamente a existência de um movimento dentro da História, que é simultaneamente estético, político e filosófico.

É esse movimento romântico que me interessa: o que  foi assim designado por críticos contemporâneos ou posteriores, ao movimento sobre o qual escreveram.

Muito haveria a escrever sobre as componentes que o caracterizam - a estética, a política e a filosofia. Estão entrançadas de tal modo que, ao distingui-las, devemos ter em mente que isso se deve antes a conveniência na exposição, pois se misturarmos os aspetos, acabamos por não clarificar nada sobre as várias facetas do movimento.

A definição de romantismo poderia dá-la  sintetizando definições de dicionários; mas estou convicto que essas definições «congelam» ideias, causam a sua cristalização, tanto na mente de quem escreve como de que lê.

É inegável a ligação do romantismo com algumas ideias que «andavam no ar», nos finais do século XVIII: A ideologia liberal, na sua formulação primeira, a da Declaração de Independência dos Estados Unidos. A filosofia dialética de Hegel, a filosofia da Natureza de Goethe e de muitos mais. Nota-se a emancipação da Escolástica medieval. Embora o ser humano ainda seja colocado no centro da Criação, não é um «pedaço de argila moldado por Deus», antes o construtor de si próprio, da sua própria vida, do seu devir. Num tempo em que as estruturas do passado se desmoronam, a realeza absoluta, a Igreja da Inquisição, a família patriarcal, começo de emancipação da mulher (somente na aristocracia e na burguesia), tendência a acabar o regime de monopólio e privilégio das companhias de comércio, protegidas pelo poder real, levando à entrada de vários atores no mercado. Tudo isso, tinha relação com um dos pilares da nova visão do Homem enquanto indivíduo, um ser dotado de inteligência, sensibilidade e senso moral: ele não podia já ser tratado como mera criança, obrigado a aceitar como as únicas ideias «legítimas», as que lhe impunham os padres, os reis e os nobres. A descoberta doutros mundos, para além do Velho Mundo, da Europa, Ásia e África, implicava relativizar ou por francamente em causa «certezas» ensinadas e reproduzidas em austeros tratados, nas Universidades europeias. O saber deixou de estar limitado à elite universitária e eclesiástica, com a nova dimensão do saber técnico, o saber-fazer. Pense-se nos saberes associados à navegação: a geografia, a cartografia, as técnicas de construção de navios, a descoberta e descrição de novas espécies vegetais e animais, nos continentes explorados pelos europeus. Nos dois séculos anteriores ao século XIX, houve um constante alargar dos horizontes. Foi, propriamente, o início da revolução científica e técnica. Esta revolução não foi política, ou não teve como motivação substituir a ordem política vigente. Os reis e os poderosos encorajavam as expedições longínquas, acolhendo os novos dados científicos que delas resultavam, com a mesma abertura com que acolhiam novas trocas comerciais.

Foi assim nascendo a ideia do ser humano enquanto indivíduo. Não que dantes não existisse uma tal noção. Mas, de uma forma ou doutra, ela esteve subordinada ao coletivo: o povo, a pátria, a pertença ao reino, à zona geográfica, à profissão (as corporações de ofícios). O homem do século XVIII/XIX ainda continua conectado a essas realidades, que moldam o seu destino. Mas, aquilo que muda, é a ênfase: o essencial, já não é a proveniência do indivíduo, a sua classe de origem ou a sua pertença a tal ou tal reino.

Na música, no teatro, na pintura e escultura, as sociedades aceitam o cosmopolitismo dos artistas e até o encorajam. Por exemplo, a corte do rei D. João V de Portugal, que beneficiou das muitas riquezas das colónias, em particular do Brasil, estava repleta de estrangeiros, músicos, artistas plásticos, cientistas, etc. na sua maioria, italianos.

A ênfase tornou-se mais política, a partir da Revolução Francesa. O cidadão, era aquele individuo que aderia ao projeto revolucionário. Assim, houve deputados polacos, irlandeses e alemães à Convenção da França revolucionária. Eram homens que se tinham identificado com a causa revolucionária; eram legitimamente membros deste corpo representativo. Note-se que, mais tarde, esta noção política de cidadania foi instrumentalizada por Napoleão: Em todas as suas campanhas militares utilizou estrangeiros (regimentos de irlandeses, de polacos, de suíços, de alemães), completamente subordinados ao poder imperial. 

Na literatura, a grande revolução foi o dar-se primazia ao indivíduo, através da exposição dos sentimentos: Rousseau (Confessions), Goethe (Werther) etc. 
Na música, o cânon clássico representado por Haydn e outros músicos, foi destronado a favor do romantismo nascente, correspondente ao movimento literário «Sturm und Drang» (Tempestade e Ímpeto).  
A crítica foi muito negativa, na estreia da  3ª Sinfonia de Beethoven.  Porém, a nova estética acabou por triunfar. Os músicos românticos, após a morte de Beethoven, foram célebres: Mendelssohn, Schubert, Liszt, Chopin, Berlioz, etc. A estes, seguiu-se uma segunda e uma terceira vaga. Na época do romantismo ascendente não são produzidas peças «delico-doces», associadas pelo público à expressão música romântica. A ideia do romantismo como música «lamecha» e com falta de imaginação, tem origem na utilização de fórmulas, por pessoas sem talento, mas que se atreviam a compor.
A música e a poesia romântica vão de par com uma sensibilidade emancipatória, envolvendo as determinantes nacionais e sociais.
 
Os heróis românticos não dependiam senão do seu destino. O seu devir era moldado por suas características psicológicas; pela sua capacidade em amar, o seu sentido do dever, a sua determinação. Também existe a imagem estereotipada do herói/heroína que sucumbe ao destino trágico: Eles lutam até ao limite de suas forças. São vencidos, mas não resignados. 
Mesmo a vertente «negra» do romantismo (ver poema de Baudelaire, abaixo*),  não implica uma renúncia ao bem ou ao que há de saudável nos humanos e na sociedade. Se Baudelaire adota, nalguns poemas, uma pose «decadentista» ou mesmo «satânica», isso deve-se, sobretudo, à sua condição pessoal: ele sofre, mas não aceita esse sofrimento com resignação. A revolta é percetível, em muitos dos seus poemas.

                       Foto de Charles Baudelaire, por Nadar

*
Charles BAUDELAIRE
1821 - 1867

Épigraphe pour un livre condamné

Lecteur paisible et bucolique,
Sobre et naïf homme de bien,
Jette ce livre saturnien,
Orgiaque et mélancolique.

Si tu n'as fait ta rhétorique
Chez Satan, le rusé doyen,
Jette ! tu n'y comprendrais rien,
Ou tu me croirais hystérique.

Mais si, sans se laisser charmer,
Ton oeil sait plonger dans les gouffres,
Lis-moi, pour apprendre à m'aimer ;

Ame curieuse qui souffres
Et vas cherchant ton paradis,
Plains-moi !... sinon, je te maudis !

BAUDELAIRE POR LÉO FERRÉ

 

                                              

ALBUM COMPLETO, AQUI.


Causerie

Vous êtes un beau ciel d'automne, clair et rose!
Mais la tristesse en moi monte comme la mer,
Et laisse, en refluant, sur ma lèvre morose
Le souvenir cuisant de son limon amer.

— Ta main se glisse en vain sur mon sein qui se pâme;
Ce qu'elle cherche, amie, est un lieu saccagé
Par la griffe et la dent féroce de la femme.
Ne cherchez plus mon coeur; les bêtes l'ont mangé.

Mon coeur est un palais flétri par la cohue;
On s'y soûle, on s'y tue, on s'y prend aux cheveux!
— Un parfum nage autour de votre gorge nue!...

Ô Beauté, dur fléau des âmes, tu le veux!
Avec tes yeux de feu, brillants comme des fêtes,
Calcine ces lambeaux qu'ont épargnés les bêtes!


Conversa

Sois um belo céu de Outono, claro e róseo!
Mas a tristeza invade-me como a maré,
E deixa, ao refluir, no meu lábio dormente
A lembrança ardente do limo amargo.

— Tua mão deslisa em vão sobre meu seio tenso;
O que procuras, amiga, é um local arruinado
Pelas garras e dentes ferozes da mulher.
Não  procures 
mais o coração; as feras o devoraram.

Meu coração é um palácio invadido pela turba;
Ela se embebeda, se mata e se agarra pelos cabelos!
— Um perfume flutua em torno de vosso seio nu!...

Ó Beleza, duro flagelo das almas, tu o exiges!
Com teus olhos de fogo, luzindo como festas,
Calcina estes farrapos que sobraram das feras!

(tradução de Manuel Banet)