terça-feira, 25 de junho de 2019

OBSERVATÓRIO DAS GUERRAS E MILITARISMO:«A U.E. na estratégia nuclear do Pentágono»




A Arte da Guerra                                                                    Manlio Dinucci

 Os Ministros da Defesa da NATO (de Itália, Elisabetta Trenta, M5S, de Portugal, João Gomes Cravinho) foram convocados para reunir em Bruxelas, em 26 e 27 de Junho,  a fim de aprovar as novas medidas de “dissuasão” contra a Rússia, acusada, sem qualquer prova, de ter violado o Tratado INF.

Fundamentalmente, irão alinhar-se com os Estados Unidos que, retirando-se definitivamente do Tratado, em 2 de Agosto, preparam-se para instalar na Europa, mísseis nucleares de alcance intermédio (entre 500 e 5.500 km) com base no solo, semelhantes aos da década dos anos 80 (os Pershing II e mísseis de cruzeiro) que foram eliminados (juntamente com os SS-20 soviéticos) pelo Tratado assinado em 1987 pelos Presidentes Gorbachev e Reagan. 



As principais potências europeias, cada vez mais divididas dentro da UE, reúnem-se na NATO sob o comando USA para apoiar os seus interesses estratégicos comuns.
A mesma União Europeia – da qual 21 dos 27 membros fazem parte da NATO (assim como faz parte a Grã-Bretanha, de saída da UE) – rejeitou nas Nações Unidas, a proposta russa de manter o Tratado INF. Sobre uma questão de tal importância, a opinião pública europeia é deixada, deliberadamente,  no escuro pelos governos e pelos principais meios de comunicação mediática. Assim, não se avisa sobre o perigo crescente que paira sobre nós: aumenta a possibilidade que, um dia, se venha a usar armas nucleares.

Confirma-o, o último documento estratégico das Forças Armadas dos EUA, “Nuclear Operations” (11 de Junho), redigido sob a direcção do Presidente do Estado Maior reunido. Dado que “as forças nucleares fornecem aos EUA a capacidade de atingir os seus objectivos nacionais”, o documento salienta que as mesmas devem ser “diversificadas, flexíveis e adaptáveis” a “uma ampla gama de adversários, ameaças e contextos”.
Enquanto a Rússia adverte que mesmo o uso de uma única arma nuclear de baixa potência desencadearia uma reacção em cadeia que poderia levar a um conflito nuclear em grande escala, a doutrina dos EUA está-se orientando com base num conceito perigoso de “flexibilidade”. Alvos (esclarece o mesmo documento) realmente escolhidos pelas agências de inteligência/serviços secretos, que avaliam a vulnerabilidade a um ataque nuclear,  prevendo também os efeitos da chuva radioactiva.
O uso de armas nucleares – sublinha o documento – “pode criar as condições para resultados decisivos: especificamente, o uso de uma arma nuclear mudará fundamentalmente o quadro de uma batalha criando as circunstâncias que permitem aos comandantes prevalecer no conflito”. As armas nucleares também permitem aos EUA “salvaguardar os seus aliados e parceiros” que, confiando neles, “renunciam à posse das suas próprias armas nucleares, contribuindo para os propósitos de não-proliferação dos EUA”.
No entanto, o documento deixa claro que “os EUA e alguns aliados selecionados da NATO mantêm aviões de capacidade dupla capazes de transportar armas nucleares ou convencionais”. Admite, assim, que quatro países europeus não nucleares – Itália, Alemanha, Bélgica, Holanda – e a Turquia, violando o Tratado de Não-Proliferação, não só hospedam armas nucleares americanas (as bombas B-61 que, a partir de 2020, serão substituídas pelas B61-12, mais mortíferas ), mas estão preparados para usá-las num ataque nuclear sob comando do Pentágono.  Tudo isto é omitido pelos governos e parlamentos, televisões e jornais, com o silêncio cúmplice da grande maioria dos políticos e jornalistas, que, pelo contrário, nos repetem, quotidianamente, como é importante para nós, italianos e europeus, a “segurança”. Garantem-na os  Estados Unidos,  instalando na Europa, outras armas nucleares.


il manifesto, 25 de Junho de 2019

sábado, 22 de junho de 2019

UMA LISTA DE JAZZ VOCAL

Clicar no link abaixo:

https://www.youtube.com/playlist?list=PLUv1WgIwP9IMMYD0dCGIG1c0A_JQ45HZh


Uma lista em permanente actualização!

JONATHAN COOK - ISRAEL ESTEVE SEMPRE NO CAMINHO DA ANEXAÇÃO

ESQUEÇAM O ACORDO DO SÉCULO DE TRUMP; ISRAEL ESTEVE SEMPRE NO CAMINHO DA ANEXAÇÃO



 Quando os primeiros-ministros de Israel estão em dificuldades, enfrentando eleições difíceis ou um escândalo de corrupção, a tentação tem sido - tipicamente - de desencadear uma operação militar para fortalecer a sua posição junto do eleitorado. Nos anos recentes, Gaza tem sido o alvo preferido.
Benjamin Netanyahu confronta-se com ambas as dificuldades ao mesmo tempo: a segunda volta das eleições em Setembro, que ele terá dificuldade em vencer; e um procurador-geral que se espera irá processá-lo com acusações de corrupção, imediatamente depois destas.
Netanyahu está numa posição de aperto particularmente grave, mesmo segundo os padrões de um sistema político israelita, usualmente caótico e faccioso. Após uma década no poder, o seu charme eleitoral pode estar a desfazer-se. Já se notam sinais de descontentamento entre os seus aliados da extrema-direita.
Dadas as circunstâncias de aperto, alguns observadores receiam que ele se lembre de tirar um tipo diferente de coelho da cartola.
Nas duas eleições passadas, Netanyahu cavalgou para o triunfo depois de ter produzido declarações dramáticas nos últimos minutos de campanha. Em 2015, agitou o papão do quinto dos cidadãos de Israel, que são palestinianos, garantindo que eles iriam usar os seus direitos democráticos de voto, avisando que "eles viriam votar em massa".
Em Abril passado, declarou a sua intenção de anexar largas áreas da ocupada Margem Ocidental, em violação da lei internacional, no decurso do próximo período parlamentar.
Amos Harel, um analista de assuntos militares e jornalista veterano no Haaretz, observou - na semana passada -que Netanyahu pode decidir que as palavras já não chegam para vencer. Será necessário entrar em acção, sob forma de um anúncio, na véspera da votação de Setembro, de que a extensão da anexação da Margem Ocidental atingirá os dois terços.
Não consta que Washington se irá colocar como obstáculo deste acto.
Pouco tempo antes da eleição de Abril, a administração Trump ofereceu a  Netanyahu um bónus na campanha ao reconhecer a anexação ilegal de Israel nos Montes Golan, território tomado por Israel à Síria em 1967.
Já neste mês, o embaixador dos EUA em Israel, David Friedman, um dos arquitectos do longamente incubado plano de paz de Trump, o «acordo do século», veio oferecer um apoio precoce para as eleições.
Em entrevista, argumentou que Israel "estava do lado de Deus" - ao contrário, assim estava implícito, dos palestinianos. Argumentou, além disso, que Israel tinha o «direito de reter» muito da Margem Ocidental. 
Ambas as posições sugerem que a administração Trump não irá colocar objecções a movimentações israelitas no sentido da anexação, especialmente se isso garante que o seu candidato preferido regressará ao poder.
Independentemente do que Friedman sugeriu, não é Deus que interveio em favor de Israel.  As mãos que têm cuidadosamente preparado o terreno em muitas décadas para a anexação da Margem Ocidental são todas muito humanas.
Os governantes de Israel têm estado a preparar este momento há mais de meio século, desde que a Margem Ocidental, Jerusalém Leste e Gaza, foram tomadas no ano de 1967.
Este facto é sublinhado por um mapa interactivo dos territórios ocupados. Esta importante fonte de informação é um projecto conjunto do grupo B'Tselem israelita de direitos humanos e da equipa londrina «Forensic Architecture», que utiliza nova tecnologia para visualizar e mapear a violência política e a destruição ambiental. 
Sob o título Conquer and Divide [Conquista e Divide], revela no pormenor como Israel tem “dilacerado o espaço palestiniano, dividindo a população palestiniana em dúzias de enclaves desconectados e destruindo a sua estrutura social, cultural e económica.”
O mapa prova, para além de qualquer dúvida, que a colonização da Margem Ocidental por Israel nunca foi acidental defensiva ou relutante. Foi friamente calculada e planeada com um fim em vista - e o momento para atingir este fim está a aproximar-se rapidamente.

A anexação não é um projecto direitista que se tivesse apoderado das intenções benignas da geração fundadora de Israel. Ela esteve nos planos da ocupação desde os princípios, em 1967, quando o dito centro-esquerda - agora apresentado como defensor da paz, em alternativa a Netanyahu – era governo.
O mapa mostra como os planificadores militares de Israel criaram uma rede  complexa de pretextos para tomar as terras dos palestinianos: hoje, as zonas militares fechadas cobrem um terço do território da Margem Ocidental; exercícios de tiro afectam a vida de 38 comunidades palestinianas; as reservas naturais ocupam 6 por cento do território; cerca de um quarto foi proclamado terras do «Estado de Israel»; cerca de 250 colonatos foram instalados; dúzias de barreiras de controlo limitam os movimentos severamente; e centenas de quilómetros de muros e de vedações foram já construídos.
Estas tomadas de território entre-cruzadas foram insensivelmente retirando território, ao estabelecerem os muros de prisões estreitamente vigiadas para os palestinianos no seu próprio território.

Duas imagens de satélite da NASA, tiradas à região com um intervalo de 30 anos - de 1987 e de 2017 - revelam como os colonatos israelitas e as infraestruturas de transporte foram gradualmente desfigurando a paisagem da Margem Ocidental, removendo a vegetação natural e substituindo-a por betão. 
As tomadas das terras não eram simplesmente acerca de adquirir território. Eram uma arma, ao mesmo tempo que aumentavam as medidas draconianas de restrição dos movimentos, para forçar a população palestiniana autóctone a submeter-se, a reconhecer a derrota, a abandonar a esperança.

No seguimento imediato da ocupação do território da Margem Ocidental, Moshe Dayan,  o ministro da defesa, herói do momento de Israel e um dos arquitectos do projecto dos colonatos, observou que os palestinianos deveriam ter que «viver como cães e quem queira partir, pode partir - e veremos aonde este processo vai levar».
Embora Israel tenha concentrado os palestinianos em 165 áreas desconectadas por toda a Margem Ocidental, os seus actos conseguiram efectivamente obter o selo de aprovação da comunidade internacional em 1995. Os acordos de Oslo consolidaram o controlo absoluto de Israel sobre 62 por cento da Margem Ocidental, incluindo  as terras principais agrícolas dos palestinianos e recursos hídricos, o que tinha sido classificado como Área C.
As ocupações são supostas serem temporárias - e os acordos de Oslo prometiam isso mesmo. Gradualmente, os palestinianos seriam autorizados a retomar o seu território, para construir um Estado. Mas, Israel assegurou-se que as ocupações e os roubos de terras sancionadas por Oslo iriam continuar. 

O novo mapa revela mais do que os métodos usados por Israel para dominar a Margem Ocidental. As décadas de tomadas de terras mostram um trajecto, um propósito cuja finalidade ainda não foi completada.
 - Se Netanyahu anexar parcialmente a Margem Ocidental - Área C - este será apenas outro passo nos esforços persistentes de Israel em tornar a vida da população palestiniana miserável e acossá-la a sair.  É uma guerra de desgaste - que os israelitas, desde há muito tempo, vêm compreendendo como «uma anexação rastejante», levada a cabo discretamente, para evitar a condenação da comunidade internacional. 
Os israelitas querem, em última instância, que os palestinianos se vão embora completamente, amontoados em Estados árabes vizinhos, tais como o Egipto e a Jordânia. Esse próximo capítulo está prestes a desenrolar-se em pleno, se Trump tiver oportunidade de desvendar o seu «acordo do século».

Uma primeira versão deste artigo apareceu inicialmente no jornal «National», de Abu Dhabi.
Jonathan Cook ganhou o prémio Martha Gellhorn Special de jornalismo. Os seus livros incluem "Israel e o Choque das  Civilizações: Iraque, Irão e o Plano para Refazer o Médio Oriente” (Pluto Press) e “Palestina em desaparecimento: experiências de Israel com o Desespero Humano” (Zed Books). O seu sítio Internet é www.jonathan-cook.net.

sexta-feira, 21 de junho de 2019

A GUERRA DE QUARENTA ANOS ENTRE OS EUA E O IRÃO


Infelizmente, as pessoas do Ocidente são mantidas num estado de ilusão, que se parece com a hipnose. São constantemente colocadas perante as narrativas dos grandes poderes, em particular dos meios oficiais dos EUA, para «justificação» de suas políticas. Porém, não apenas no aspecto da diplomacia, como no aspecto humanitário, elas são completamente indefensáveis.

                       

Para tal, basta ler o excelente artigo de David Stockman, que, melhor que eu, poderá esclarecer o que têm sido estes 40 anos de relações tempestuosas, entre as diversas administrações dos EUA e o governo dos Ayatollahs. 

O artigo é uma oportuna, rigorosa e detalhada argumentação, em como os EUA não estão a ser ameaçados pelo Irão, mas precisamente o contrário. 
O título em português seria: «A América em último lugar - qual o real significado da deplorável agressão de Trump contra o Irão»:


Peço desculpa por não o traduzir, mas este artigo é longo e, por outro lado, penso que vale a pena lê-lo no original. 

David Stockman 2011.jpg


Stockman é um antigo membro da equipa de Reagan. Ele é sobejamente conhecido e apreciado pela clareza e frontalidade do seu espírito crítico, que não poupa as políticas levadas a cabo nestes últimos anos, incluindo as da responsabilidade dos republicanos, «família política» à qual pertence, ou da qual é originário.
  

quinta-feira, 20 de junho de 2019

DESFAVORÁVEL PARA A ECONOMIA / FAVORÁVEL PARA O OURO

                              


Numa situação política e estratégica internacional de grande tensão, com os preços do petróleo a dispararem, com a  guerra comercial aberta dos EUA com a China a atingir o comércio internacional e não apenas as trocas bilaterais, com a aposta cada vez mais clara dos bancos centrais em comprar ouro e despejar o dólar o mais depressa possível, e com a Reserva Federal (Banco Central dos EUA) a dar sinais claros de inversão para breve da sua política de subida das taxas de juro... todos estes  factores fazem com que a subida do ouro seja muito acelerada e esteja a atingir um novo máximo.

A noção clara de que a situação da dívida, mesmo nos países afluentes, está num ponto crítico e de que - a todo o momento - se pode desencadear um «crack» nas acções e nas obrigações, sem outro possível refúgio senão os metais preciosos, é agora lugar comum nos meios financeiros. A crise económica continuou pós 2008, até hoje, apenas disfarçada por medidas cosméticas, mas estas estão a desfazer-se claramente. 
Porém, as pessoas comuns são mantidas no escuro por uma média vendida aos poderes, pois só assim é que conseguem evitar, por enquanto, corridas aos bancos para levantamento dos depósitos. A confiança do público é mantida através da ilusão sobre o estado verdadeiro da economia.
Os poderes - estatais e outros - estão a jogar na ilusão de que possuem o controlo da situação, quando a verdade é que ninguém a pode controlar. 
O melhor que se pode fazer, ao nível individual, é seguir a estratégia dos bancos centrais; estes compram ouro em quantidades significativas. São toneladas de ouro que são adicionadas mensalmente aos cofres de bancos centrais, em quase todo o mundo. Este sector do mercado é responsável pela subida espectacular: em Setembro de 2018 o ouro estava a cerca de 33 euros/grama. Agora (Junho de 2019), está praticamente a 40, em dez meses subiu 21%.


                           

Quando as coisas na economia real vão mal, o ouro e os outros metais preciosos sobem espectacularmente: é sinal de que os investidores (sobretudo, os grandes) estão descrentes da economia real e se refugiam nos metais preciosos, como salvaguarda num contexto de crise. 
Muitas pessoas comuns são apanhadas de surpresa e ficam arruinadas: muitas, estão a comprar casa, ou outros bens, a crédito. Ficam com uma sobrecarga de dívida no pior momento, no pressuposto - errado - de que tudo irá correr normalmente.

Vejam no link seguinte:

quarta-feira, 19 de junho de 2019

TRABALHOS DOS NEANDERTAIS NA GRUTA DE BRUNIQUEL


                                           

                                 Neanderthals & Art: Interview with Dr. Wragg Sykes

O estado a ciência permite descobrir quando as estalagmites foram retiradas e dispostas pelos Homens de Neandertal. Não existem vestígios orgânicos, à parte de um fragmento de osso de urso das cavernas, calcinado, que deu a datação carbono de cerca de 47 mil anos. Mas, os resultados das datações de estalagmites deram o resultado de 175 mil anos! É sensacional e muda completamente a perspectiva sobre o paleolítico e o Homem de Neandertal mais antigo.

Um templo, com vários centros de fogueiras, que se podem reconstituir, mostram que estes homens tinham grande controlo do fogo, nesta época de glaciação.

João Zilhão mostrou que existem provas de capacidade simbólica no Homem de Neandertal a partir de conchas perfuradas e com pigmentos de ocre.

Não se vai construir uma estrutura que implica a remoção de 2,3 toneladas de estalagmites a 300 metros de profundidade, senão com objectivos rituais. Portanto, estamos perante uma prova  evidente de espiritualidade no Homem de Neandertal de há 180 mil anos.
Estamos bem longe da imagem estereotipada de uma espécie (Homo neanderthalensis) «inferior» à dos homens anatomicamente modernos (o Homo sapiens).

terça-feira, 18 de junho de 2019

SANÇÕES DOS EUA: SABOTAGEM ECONÓMICA MORTÍFERA, ILEGAL E INEFICAZ


Enquanto o mistério de quem é responsável pela sabotagem dos dois petroleiros no golfo de Omã permanece por resolver, tem sido bem claro que a administração Trump levou a cabo a sabotagem das encomendas de petróleo iranianas desde 2 de Maio, quando anunciou a sua intenção de causar uma redução das exportações de petróleo do Irão até zero, negando ao regime a sua principal fonte de rendimento.” A medida estava destinada à China, Índia, Japão, Coreia do Sul e Turquia, países que compram petróleo iraniano e agora têm de enfrentar ameaças dos EUA se continuarem a fazê-lo. Pode não ter sido uma força militar dos EUA a danificar os navios transportando petróleo iraniano, mas as suas acções têm o mesmo efeito e deveriam ser consideradas acções de terrorismo económico. A administração Trump também está a realizar um roubo massivo ao apoderar-se de 7 biliões de dólares da venda de petróleo da Venezuela impedindo o governo Maduro de acesso ao seu próprio dinheiro. De acordo com John Bolton, as sanções sobre a Venezuela têm efeito sobre um valor de 11 biliões de dólares de exportações de petróleo em 2019. A administração Trump também ameaça as companhias de navegação que transportam o petróleo venezuelano. Duas companhias, uma baseada na Libéria e outra na Grécia, foram já atingidas com multas por transportar petróleo venezuelano para Cuba. Não abriu buracos nos navios mas trata-se igualmente de sabotagem. Quer no Irão, Venezuela, Cuba ou Coreia do Norte ou ainda numa das 20 nações debaixo das sanções dos EUA, a administração Trump tem usado o seu peso económico para tentar impor mudança de regime ou mudanças importantes de políticas, em todo o globo.




Mortíferas

As sanções dos EUA contra o Irão são particularmente brutais. Embora tenham falhado totalmente obter as mudanças de regime desejadas pelos EUA, têm causado tensões crescentes com parceiros comerciais dos EUA pelo mundo fora e têm causado um sofrimento terrível ao povo comum no Irão. Embora os alimentos e os medicamentos estejam tecnicamente isentos das sanções, as sanções dos EUA contra os bancos iranianos  como o Parsian Bank, o maior banco não estatal do Irão, tornam quase impossível processar pagamentos para bens importados e isso inclui alimentos e medicamentos. A escassez resultante em medicamentos é responsável por ter causado milhares de mortes no Irão e as vítimas são normalmente pessoas comuns, não os Aiatolas nem os ministros do governo. A media corporativa nos EUA tem sido cúmplice com a pretensão de que as sanções dos EUA são um meio não violento para criar pressão sobre os governos visados com vista a forçá-los a uma determinada mudança de regime democrática. As notícias dos EUA raramente mencionam o seu impacto mortífero sobre as pessoas comuns, antes culpando as crises económicas resultantes apenas nos governos que estão sendo sancionados. O impacto mortífero das sanções é evidente na Venezuela, em que as sanções económicas severas atingiram a economia que já se ressentia da baixa dos preços do petróleo, da sabotagem pela oposição, pela corrupção e pelas más políticas governamentais. Um relatório conjunto anual por três universidades venezuelanas em 2018 mostrou que as sanções dos EUA eram em grande parte responsáveis por pelo menos umas 40 mil mortes adicionais nesse ano. A Associação Venezuelana Farmacêutica noticiou que havia uma carência de 85% dos medicamentos essenciais em 2018. Na ausência de sanções dos EUA, a retoma do nível global dos preços do petróleo em 2018 teria trazido pelo menos uma ligeira subida a economia na Venezuela e mais adequadas importações de comida e de medicamentos. Em vez disso, as sanções financeiras dos EUA impediram a Venezuela de rolar as suas dívidas e privaram a indústria petrolífera de dinheiro fresco para compra de peças, para reparações e para novos investimentos, causando ainda mais dramática quebra na produção de petróleo, relativamente a outros anos em que havia baixos preços de petróleo e depressão económica. A indústria petrolífera fornece 95% das receitas externas da Venezuela, portanto, ao se estrangular a sua indústria de petróleo e cortando a Venezuela do crédito internacional, as sanções previsível e intencionalmente capturaram a população venezuelana numa espiral descendente mortal. Um estudo por Jeffrey Sachs e Mark Weisbrot para o Centro de Investigação de Economia e Política intitulado “Sanctions as Collective Punishment: the Case of Venezuela,” [Sanções como Punição Colectiva; o Caso da Venezuela] relataram que o efeito combinado das sanções de 2017 e de 2019, têm a consequência de um impressionante declínio de 37,4% no PIB real da Venezuela em 2019, no seguimento de um declínio de 16,7% em 2018 e somando-se a uma quebra para lá de 60% nos preços do petróleo em 2012 e em 2016.
Na Coreia do Norte, muitas décadas de sanções, junto com extensos períodos de secas, deixaram milhões desta nação com 25 milhões de habitantes sofrendo de malnutrição e empobrecidos. As zonas rurais em particular, carecem de medicamentos e de água potável. As sanções ainda mais severas impostas em 2018 impediram a maior parte das exportações do país, diminuindo a capacidade do governo conseguir pagar as importações de comida para aliviar a escassez.



Ilegal 

Uma das características mais destacadas das sanções dos EUA é seu alcance extraterritorial Os EUA castiga os negócios de terceiras partes com penalidades por «violar» as sanções americanas. Quando os EUA abandonaram unilateralmente o acordo nuclear e impuseram sanções, o Departamento do Tesouro vangloriou-se de que, apenas num dia, a 5 de Novembro de 2018 sancionou mais de 700 indivíduos, entidades, companhias aéreas e marítimas fazendo negócios com o Irão. No que respeita à Venezuela  foi noticiado pela Reuters que, em Março de 2019 o Departamento de Estado deu “instruções a empresas e refinarias ao nível mundial para cortar os fornecimentos de petróleo venezuelano ou serem elas próprias a sofrer sanções, mesmo no caso das compras efectuadas não serem proibidas pela lista publicada de sanções dos EUA.” Uma empresa de petróleo queixou-se à Reuters, “Este é o modo de operar dos EUA nos dias de hoje e depois telefonam-nos para dizer que também existem regras que eles também querem que nós observemos.” Os membros do governo dos EUA dizem que as sanções irão ser benéficas para os povos da Venezuela e do Irão, ao empurrá-los a insurgirem-se e a derrubar os seus governos. Visto que o recurso à força militar, os golpes e operações encobertas para derrubar governos estrangeiros têm sido comprovadamente  catastróficas no Afeganistão, no Iraque, no Haiti, na Somália, nas Honduras, na Líbia, na Síria, na Ucrânia e no Iémene, a ideia de usar a posição dominante dos EUA e o dólar nos mercados financeiros internacionais como forma de «soft power» e assim conseguir mudanças de regimes, pode ser uma tentação de políticos dos EUA como forma mais fácil de coerção e mais fácil de convencer um público doméstico cansado de guerras e aliados hesitantes. Mas mudar do «choque e medo» do bombardeio aéreo e da ocupação militar para os silenciosos meios causadores de mortes por doenças curáveis, por desnutrição e por pobreza extrema está longe de ser uma opção humanitária e não é mais legítima do que o uso da força militar à luz do direito internacional. Denis Halliday era um auxiliar do Secretário Geral da ONU, que serviu como coordenador humanitário no Iraque e demitiu-se da ONU, em protesto pelas sanções brutais contra o Iraque em 1998. “Sanções pontuais, quando impostas pelo Conselho de Segurança, ou por um Estado, sobre um país soberano são uma forma de guerra, um instrumento grosseiro que inevitavelmente pune cidadãos inocentes” segundo Denis Halliday. “Mas, se estas são deliberadamente alargadas, sendo o seu resultado mortífero conhecido, neste caso as sanções podem ser consideradas genocídio." Quando a embaixadora dos EUA Madeleine Albright disse, no programa da CBS ‘Sixty Minutes’ em 1996, que a morte de 500.000 crianças iraquianas para tentar derrubar Saddam Hussein «se justificava» a continuação das sanções da ONU, contra o Iraque, estas estavam de acordo com a definição de genocídio. 
Nos dias de hoje, dois Relatores Especiais da ONU, nomeados pelo Conselho da ONU dos Direitos Humanos, entidades sérias e independentes, avaliam o impacto das sanções dos EUA sobre a Venezuela e as suas conclusões gerais aplicam-se igualmente ao caso do Irão. Alfred De Zayas visitou a Venezuela pouco depois dos EUA terem imposto sanções financeiras em 2017 e redigiu um relatório extenso sobre o que viu aí. Detectou impactos significativos devido à dependência de longo prazo da Venezuela em relação às exportações de petróleo, à fraca eficácia governativa e à corrupção, mas também condenou fortemente os EUA pelas suas sanções e «guerra económica». «As sanções económicas e os bloqueios, nos dias de hoje, são comparáveis com os cercos de cidades na idade-média» escreveu De Zayas «As sanções do século vinte e um, tentam por de joelhos não apenas uma cidade, mas países inteiros» O relatório de De Zayas recomendava que o Tribunal Penal Internacional deveria investigar as sanções dos EUA contra a Venezuela, como um crime contra a humanidade. 
Um segundo Relator Especial da ONU, Idriss Jazairy, produziu uma declaração vinculativa em resposta ao golpe falhado de Janeiro, apoiado pelos EUA, na Venezuela. Condenou a «coerção» por poderes externos como uma «violação das normas do direito internacional». «Sanções que podem levar à fome em massa e a carências de meios médicos não são a resposta à crise na Venezuela,” disse Jazairy, “…provocar uma crise económica e humanitária … não é um ponto de partida para solução pacífica de disputas.” As sanções também violam o Artigo 19 da Carta dos Estados Americanos, a qual é explícita na proibição de intervenções “seja por que motivo for, nos assuntos internos ou externos de qualquer outro Estado.”  Acrescenta que “proíbe não só a intervenção armada mas também qualquer outra forma de interferência ou ameaça tentada contra o Estado ou contra os seus elementos políticos, económicos e culturais.” O Artigo 20 da Carta da OEA é igualmente pertinente: “Nenhum Estado pode usar ou encorajar o uso de medidas coercivas de carácter económico ou político em ordem a forçar a vontade soberana de outro Estado e obter assim quaisquer tipo de vantagens” Nos termos da lei dos EUA, tanto as sanções de 2017 como 2019 contra a Venezuela são baseados em declarações presidenciais não substanciadas de que a situação na Venezuela criou uma «emergência nacional» nos Estados Unidos. Se os tribunais federais dos EUA não tivessem tanto medo de chamar à responsabilidade o ramo executivo em matérias de política externa, tal poderia ser desafiado e posto em causa, muito provavelmente, com ainda mais rapidez do que caso semelhante, o caso da «emergência nacional» na fronteira do México, pelo menos neste caso, estava geograficamente conectado ao território dos EUA.



Ineficaz

Existe ainda mais uma razão importante para poupar as pessoas do Irão, Venezuela e outros países seleccionados a este impacto mortífero e ilegal das sanções económicas dos EUA: não funcionam.
Há vinte anos, enquanto as sanções económicas retiravam 48% do PIB do Iraque durante 5 anos e os estudos sérios documentavam o seu efeito genocida, tais sanções não removeram Saddam Hussein do poder. Dois Assistentes dos Secretário Geral da ONU, Denis Halliday e Hans Von Sponeck, demitiram-se em protesto, das suas posições altamente colocadas na ONU, para não terem de por em prática estas sanções mortíferas. Em 1997, Robert Pape, então professor no Colégio de Dartmouth, tentou resolver as questões mais básicas no que respeita ao uso de sanções económicas para conseguir mudanças políticas noutros países, tendo para tal coligido e analisado dados históricos de 115 casos em que tal fora tentado, entre 1914 e 1990. O seu estudo intitulado “Why Economic Sanctions Do Not Work,”[Porque é que as Sanções Económicas Não Funcionam] concluiu que as sanções só tinham sido bem sucedidas em 5 de 115 casos. Pape colocou também uma questão importante e desafiadora: “Se as sanções económicas são raramente eficazes, porque é que os Estados continuam a usá-las?” Ele sugeriu três possíveis respostas: “Os responsáveis políticos que impõem as sanções sobrestimam sistematicamente a sua eficácia como meio coercivo.” “Os líderes que estão inclinados, em último recurso, a usar a força armada esperam que as sanções prévias tenham o efeito de aumentar a credibilidade das ameaças militares subsequentes.” “A imposição de sanções confere aos líderes vantagens domésticas maiores quer do que negar os apelos a sanções, quer do que o recurso à força.” Pensamos que a resposta possa ser uma combinação de todas as opções anteriores. Mas estamos convictos firmemente que nenhuma combinação das razões acima ou outro raciocínio possam jamais justificar o custo humano genocida das sanções económicas no Iraque, na Coreia do Norte, no Irão, na Venezuela ou em qualquer outro lugar. 
Enquanto o mundo condena os recentes ataques contra os petroleiros e tenta identificar os responsáveis, as condenações globais deveriam também incidir sobre a nação responsável pela guerra económica mortífera, ilegal e ineficaz, que está no cerne desta crise: Os Estados Unidos da América.

Medea Benjamin é uma activista política dos EUA, co-fundadora do Code Pink https://www.codepink.org