A apresentar mensagens correspondentes à consulta Grécia ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta Grécia ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens

domingo, 2 de julho de 2023

O PAGANISMO CRISTIANIZADO

 

    Foto: Menhir «cristianizado», de Saint Uzec (Bretanha)

A evolução das religiões instituídas afasta-as muito da sabedoria e ensinamentos dos profetas e seus primeiros seguidores. No caso do cristianismo, a religião de origem era a mesma que a do povo judeu, pelo que as pessoas que seguiram o Cristo inicialmente, consideravam-se dentro do Judaísmo. Mas, já em São Paulo, se nota um  afastamento em relação a certas práticas do judaísmo ortodoxo. 

Os dias santos, feriados, festas religiosas, foram colar-se às práticas de paganismo do Império romano. Sem essa colagem, não teria sido possível a  religião cristã tornar-se «religião de Estado». Estas festas eram celebradas por todos, desde tempos imemoriais. Se o pretexto era homenagear - nesses festivais - certas divindades, o seu espírito não era apenas de devoção a esses deuses ou heróis míticos: Era um pouco como o Natal de hoje, uma festa pagã, a pretexto da data (mítica) do nascimento de Jesus Cristo. 

Nas sociedades agrárias, os dias, semanas e meses estavam associados a tarefas agrícolas, comuns em toda a área mediterrânea. As épocas das colheitas, ou das sementeiras,  etc. estavam associadas às espécies cultivadas e ao ciclo anual das estações. Estes ritos, dedicados aos deuses agrários, implicavam sacrifícios de animais e/ou de produções vegetais, em honra do/da deus/a, supostamente responsável pela fertilidade, pela abundância das colheitas, etc. 

Também, desde tempos imemoriais, se assinalavam certos momentos* da trajetória do Sol: O solstício de Inverno (23 de Dezembro; festa do Natal) e o de Verão (23 de Junho, festa de S. João Batista). Os equinócios: O equinócio  da Primavera, coincidindo com a Páscoa, festa pagã da fecundidade e o equinócio do Outono, em Setembro, após a colheita dos cereais, coincidente com a vindima, a colheita da maçã e doutros frutos. 

Havia rituais associados à Deusa da Terra e da Agricultura, ou Ceres, a deusa que era responsável pela fertilidade agrícola. Nalguns povos, instaurou-se o Thanksgiving, ou seja, o dia em que se agradece a Deus pelas colheitas, em continuidade com festas pagãs com o mesmo fim.

O «Dia dos Mortos» (30 de Outubro) e o de «Todos os Santos» (1º de Novembro), foram instaurados com o objetivo de apagar a memória do Halloween, o  ritual celta de culto dos mortos.

Os camponeses e artesãos medievais não tinham direito a um mês de férias. Além disso, tinham muito pouca mobilidade: Quanto muito, podiam visitar parentes numa aldeia próxima, à distância de uma jornada a pé. Porém, tinham muitos dias feriados: As festas do santo patrono da vila ou cidade, além dos feriados tradicionais, celebrados em toda a cristandade: Natal e São Silvestre, Carnaval e Quaresma, Semana Santa e Páscoa, Corpo de Deus.

É um erro considerar-se que os «pagãos» (ou seja, todos os povos que celebravam religiões politeístas) eram forçosamente «bárbaros», primitivos, etc. Esta visão deturpa a profunda ligação das religiões politeístas, que eram as da Grécia e Roma antigas, com as mais elevadas realizações da antiguidade, todas as artes, as ciências mais avançadas, engenharia, arte de navegar, etc. e sobretudo a sofisticação da filosofia, com várias escolas que o Renascimento europeu (a partir do séc. XV) redescobriu e tentou emular.

A popularidade das festas pagãs, devia-se em parte a uma devoção genuína aos deuses e deusas que eram objeto de culto e celebração nestas festas. Mas, em grande parte também, elas estavam intrinsecamente ligadas aos ciclos naturais. Os povos, desde tempos imemoriais, tinham observado os fenómenos periódicos dos astros, da Terra, do Sol e da Lua; as estações do ano, os ciclos de reprodução de plantas e animais; etc...  Naturalmente, atribuíam os movimentos e transformações a forças divinas, cósmicas, que os deuses personificavam. Cada divindade presidia a um certo número de fenómenos da Natureza. Estas mesmas divindades também eram invocadas em circunstâncias particulares da vida dos indivíduos, do nascimento até à morte.

Ao fim e ao cabo, a nossa cultura está impregnada de símbolos e mesmo de crenças que vêm das religiões politeístas. Essa mesma herança está disfarçada pela cristianização de muitas festas pagãs, pela transformação de locais sagrados das religiões pagãs em santuários e locais de adoração de santos cristãos. A própria existência dos santos, embora na religião dos teólogos, aqueles sejam apenas «homens e mulheres notáveis, que constituem exemplos de vida e de fé para os cristãos», são vistos pelo povo cristão como se fossem (quase) deuses, aos quais se pede algo, que recebem dos devotos presentes (sacrifícios, num certo sentido, mesmo que não sejam animais sacrificiais), os devotos sentem-se obrigados em «cumprir as promessas feitas», enfim, uma quantidade de indícios de que a forma como os «santos-deuses» são ressentidos é muito semelhante à dos deuses do paganismo. Que outro significado terão as santas e os santos cristãos, serem os patronos de profissões, de atividades, ou os que devem ser invocados para determinadas doenças ou outros males ? 

O protestantismo - nas suas diversas tendências - insurgiu-se contra esses cultos «divinos» dados a santos e santas cristãos, pelas tradições populares. Mas não conseguiu eliminar por completo essa adoração dos santos, mesmo nas zonas mais profundamente influenciadas pelo protestantismo (ex: Estados do Centro e do Norte da Europa, assim como os EUA e Canadá). 

O catolicismo, predominante no Sul Europeu, na América Latina, e noutras paragens, tem abordado estas questões de uma forma ambígua: Na religião dos teólogos católicos, o conceito de «santo» é bastante semelhante aos dos protestantes. Mas, em relação ao povo católico há, não só uma tolerância em relação a crenças populares de origem pagã, como também existe um discreto ou ostensivo encorajamento de práticas de devoção, que são diretamente inspiradas do paganismo. Com efeito, as Nossas Senhoras disto ou daquilo, têm virtudes milagrosas «comprovadas» pelas lendas que estão ligadas a elas e aos seus locais específicos de devoção. Como disse acima, o modo como é feita a invocação de um santo é o equivalente a dar-lhes um estatuto de divindade, com o poder de «interferir» junto de Deus, para olhar pelo devoto e de realizar a cura ou alívio neste ou naquele aspeto da vida (saúde, dinheiro, ligações conjugais ou amorosas, etc...). Penso que a mentalidade dos que rezam, nestes termos, ao santo de sua devoção é idêntica - no essencial - ao que uma pessoa da antiguidade greco-romana faria, em relação ao deus sob a proteção do qual se colocava.

Embora teoricamente o Deus de cristãos, judeus e muçulmanos seja único, a verdade é que os povos onde estas religiões nasceram, tiveram religiões politeístas, que antecederam as «reformas» monoteístas. Os cristãos não puderam «erradicar» o politeísmo, senão «disfarçando-o» em adoração aos santos. Podem-se considerar os «exércitos» de santos católicos como um elaborado panteão, com especialidades médicas ou outras, cuidadosamente distribuídas, de tal modo que o devoto tenha - em qualquer circunstância - sempre um santo apropriado para invocar. 

Não vejo, portanto, diferença em qualquer aspeto essencial com as religiões politeístas existentes, ou passadas; também nestas, as divindades asseguram uma fração «dos trabalhos divinos», tendo que colaborar com a Entidade suprema, o Deus principal das religiões na Grécia e na Roma antigas (Zeus e Júpiter) ou o seu análogo noutras culturas. A Virgem Maria e outros Santos, são considerados interceptores junto de Deus, sendo este conceito do papel dos santos, em si mesmo, uma clara negação da omnisciência do Deus Supremo e mesmo da sua omnipotência.

Porém, aquilo que caracteriza a religião nascida há cerca de 2000 anos atrás, principalmente antes do período dos concílios, quando se começou a codificar o cristianismo, não tem muito que ver com a religião praticada depois pelos cristãos, pelo clero e pelas mais elevadas autoridades eclesiásticas. Muitas pessoas sinceras e totalmente inocentes foram parar às fogueiras da Inquisição, ou sacrificadas de múltiplas maneiras cruéis, apenas por colocarem questões sobre a adoração dos Santos. 

Talvez a maior traição dos que se dizem fiéis de Cristo, seja a sua intolerância sectária, que fez com que praticassem crimes, com a boa consciência de que os faziam «pela glória Divina». Este passado de intolerância sectária, ainda presente nalguns, é a maior negação da mensagem de Cristo. 

Não digo que não haja sectarismo noutras religiões, no passado e no presente. Mas, o que choca particularmente,  é que no caso dos Evangelhos de Cristo, a sua mensagem de Libertação espiritual profunda, tenha sido desvirtuada e o seja ainda agora, em tantos sítios e por tantas entidades eclesiásticas. Sem o seu papel pernicioso, o povo seria provavelmente menos fanático, haveria mais consideração pela Palavra e pelo Espírito da mensagem de Jesus.  

O meu esforço para encontrar uma via pessoal para viver em harmonia com os Ensinamentos de Cristo, tem recebido muito pouco apoio institucional. Penso que seja também o caso de muitos cristãos pelo mundo fora. 

O problema não decorre do texto das Escrituras Sagradas, mas, da perversidade daqueles que as interpretam a seu bel prazer, para conquistar e  consolidar o poder, nas igrejas e nas sociedades.  Chegam a negar - na prática - a «Boa Nova», que dizem seguir e propagar. Felizmente, conheço um certo número de teólogos e de filósofos cristãos, que esclarecem os aspetos de Libertação, Espiritualidade e Compromisso com os outros. Também existem algumas pessoas na minha vida pessoal, que são (ou foram) reais apoios para minha vivência cristã.

-------------

*)Ver a influência pagã no calendário cristão:

https://wol.jw.org/pt/wol/d/r5/lp-t/1966206


quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

A CRISE DAS RELIGIÕES E O SEU SIGNIFICADO

 Este século,  ainda tão jovem, já está bem cheio de acontecimentos - mas não de quaisquer!

 - Acontecimentos suficientemente graves e irreversíveis para mudarem para sempre a(s) civilização/ões, que estamos acostumados a associar a determinadas zonas geográficas e a determinadas tradições: A História, a Arte, a Literatura e a Religião, são - entre outras - identificadoras de determinado complexo cultural ou civilização. 

Embora saibamos que todas as civilizações são mortais, tal como os humanos, não sabemos que género de morte espera cada uma delas. Será uma morte por colapso catastrófico? Será um definhar progressivo, até ser englobada por outra, ascendente? Serão outras modalidades, demasiadas para enumerar aqui?

As religiões não podem ser estranhas à construção civilizacional pois, em qualquer civilização, mesmo nas que se proclamam oficialmente «ateias», acaba por haver fenómenos de tipo religioso. 

Inversamente, em civilizações que se identificam, a si próprias, como cristãs, nota-se a dissolução progressiva dos laços da população com o elemento cristão. 

Isto traduz-se - por exemplo - numa paganização do Natal, a época do ano em que tradicionalmente os cristãos de todas as confissões saudavam a vinda do Salvador. O mesmo, em relação à paganização da Páscoa, transformada em ocasião para dar ovos e coelhos de chocolate às crianças.

Esta paganização não se faz, no mundo cristão, sob forma de um qualquer ressuscitar das religiões pagãs que antecederam o aparecimento do Cristianismo nesses territórios. Faz-se com o abandono de tradições e, sobretudo, de assistência ao(s) culto(s).  Muitos são aqueles que dizem professar o cristianismo e, no entanto, não observam quase nenhuma tradição, não vão à missa (ou culto) dominical, apenas frequentam igrejas, quando se trata de um casamento, batizado ou enterro. 

O estádio último desta descristianização, verifiquei-o há poucos anos, na belíssima capital da República Checa. As igrejas do centro de Praga (magníficos monumentos barrocos, na sua maioria) estavam transformadas em locais de concertos (de música clássica em geral, mas não de música clássica sacra) e isto não era temporário. Tinham sido permanentemente transformadas em «salas de concerto históricas», pela muito pragmática razão de que o número de pessoas, na vizinhança, dispostas a frequentar essas igrejas era tão diminuto, que elas deixaram de ter sustentabilidade económica e, sobretudo, de centros vivos de cristianismo. 

O principal «culpado» aqui, não é o Estado, diretamente - pelo menos - mas o processo de «gentrificação» dos centros históricos, que também afeta - de modo insidioso, mas brutal - Lisboa e muitas outras capitais da Europa. 

Assim, o turismo, fonte preciosa de divisas e estimulador de atividade económica está a contribuir para matar os centros culturais. Isto passa-se em países como França, Espanha, Itália, Grécia e outros, muito turísticos. Todos sofrem de uma gentrificação dos locais mais emblemáticos. Estes centros mais investidos pelo turismo, são locais com maior significado monumental e histórico, os centros civilizacionais desses países. 

A «verdadeira religião é o dinheiro», mas esta frase banal, não deixa de soar como grave sentença de morte, de civilizações que se construíram em torno de determinada espiritualidade. 

Pode-se argumentar que a espiritualidade se mantém em indivíduos que não são religiosos. É verdade: No entanto, ao nível de um todo civilizacional, de uma sociedade inteira, isso nunca aconteceu. Basta ver-se o renovo do  cristianismo ortodoxo, que já antes da queda da URSS, tinha um aumento sensível de adesão. É portanto, uma regra empírica, constatar-se que onde esmorece a tradição religiosa, com cultos e clero, também a religião «popular» recua.  Verifica-se o inverso, quando há um renovo da(s) Igreja(s), este acompanha, em paralelo, a evolução da sociedade.

Tudo o que sei sobre as civilizações do passado, é que uma civilização em ascenso vai propulsionar, senão criar mesmo, um determinado movimento religioso. Por outro lado, a espiritualidade não desaparece quando, por motivos políticos e ideológicos (como no Estalinismo ou na Revolução Cultural Maoista), se combatem ativamente a difusão ou, mesmo, a existência de religiões. 

Há uma necessidade profunda, que pode ultrapassar a explícita adesão a determinado credo religioso. Penso que a humanidade não pode viver com uma visão estreita, «materialista» da vida, da Natureza e do próprio ser humano.  O materialismo de hoje, acantona-se numa forma estreita de propaganda antirreligiosa. Não me parece que haja uma oposição entre a espiritualidade de hoje e a aceitação e mesmo a procura ativa de saber científico. Acho mesmo que esta contradição é um subproduto de ideologias do século XIX (sobretudo, do cientismo e do ateísmo «militante»). 

É verdade que as religiões, na sua vertente exterior, perante a sociedade concreta, não foram capazes, muitas vezes, de fazer atualizações que se impunham. Imagine-se alguém do clero, formado/a na perspetiva de que, aceitar a ideia de Evolução biológica e do Homem, era uma heresia intransponível e um passo para a mais total negação de Deus, ou seja, para o ateísmo. Este doutrinamento atravessou várias gerações. Portanto, não se pode ter a ilusão de que as formas de pensar morrem quando desaparecem os criadores ou primeiros cultores de determinada corrente.

Para ilustrar isso, basta-me evocar a estranha - para mim - forma de abordar a sociedade e todos os fenómenos através de um prisma marxista. O marxismo é um exemplo importante e típico de uma religião sem Deus. Mas tudo nele aponta para o fenómeno religioso, como forma de ver o Mundo e o Universo, como se fossem apenas inteligíveis através da «ciência marxista» (que, afinal, é apenas «cientismo»).

Seria muito estranho que, caso a «ciência do marxismo» fosse verdadeira, o mundo científico atual estivesse totalmente divorciado da filosofia / ideologia do marxismo: Note-se que não é uma teoria esotérica, muitos terão tido contacto com ela; muitos cientistas terão mesmo estado convencidos, durante uma etapa de suas vidas, de que se tratava de uma forma de pensar adequada à ciência. Mas, nada disto é verdadeiro, para a imensa maioria dos cientistas de hoje. 

Ao fazerem ciência, não invocam « S. Marx ou S. Engels, ou S. Lenine», da mesma forma que não invocam os Santos cristãos, nem os Deuses pagãos. Têm, como pessoas cultas, conhecimento de correntes filosóficas e de religiões. Mas, na sua imensa maioria, nem escrevem sobre a relação da ciência que praticam, com a espiritualidade.  

Noutras partes do globo, eventualmente, os fenómenos serão divergentes. Eu tenho de me limitar ao que conheço melhor. Não acredito que as diversas civilizações se tenham fundido numa só, ou que esta fusão esteja em curso. Tenho observado mesmo que diversas civilizações afirmam cada vez mais as suas idiossincrasias, para fazer face ao globalismo, largamente promovido por ocidentais. 

Embora não seja uma ideologia cristã, o globalismo da nossa época, enquanto veículo de dominação ideológica, é propagado por pessoas, algumas das quais se afirmam como «cristãs» (não é senão uma capa, para elas, a meu ver).

Estou convicto de que as ideias profundas que os homens podem produzir hoje, estão radicadas na essência da humanidade, daí que não seja difícil encontrar ensinamentos de sabedoria, de espiritualidade e sensibilidade estética, em civilizações passadas, hoje consideradas «mortas». Porém, sua existência foi um passo, uma etapa, para o que a humanidade é, hoje. 

Os aspetos espirituais, têm a sua evolução própria, de certa forma, análoga com a evolução biológica. Os traços da evolução biológica não pararam nos alvores da espécie humana, pois a evolução continua aos vários níveis (genético, anatómico, fisiológico, comportamental) nos humanos do século XXI. 

A cultura e a religião, a pertença a um dado universo mental, a uma forma de compreender o Todo Universal, nada disso pode congelar, tudo se vai transformando. As formas de religião também evoluem; cabe aos contemporâneos atuar no sentido de não «deitar fora o bebé, com a água do banho», isto é, não se deixarem iludir com formas transitórias do fenómeno religioso, como se estas fossem a essência e razão de ser das religiões. 

Sou tão incapaz de descrever as formas que as religiões irão adotar no futuro, como de antever como as sociedades serão organizadas. A minha aposta, porém, é que continuarão a existir valores e que podemos procurá-los em civilizações passadas. Não posso saber quais serão selecionados, da profusão de filosofias, de formas e conteúdos, de mitos, de relatos, etc.. Mas possuo a certeza íntima de que as civilizações futuras irão guardar alguns valores, adaptando-os à sua época. 

                       Foto de ruínas do Convento do Carmo, Lisboa

domingo, 27 de novembro de 2022

DÍVIDA PÚBLICA DE PORTUGAL, ALGUNS DADOS ESTATÍSTICOS

 

Dívida Pública Portuguesa
Crescimento em espiral desde há 20 anos 
Valor da dívida pública em 27/11/2022:
                       309 171 508 215 € 


Juros da dívida, por ano 
 9 045 028 729€ 
                        por segundo 287€ 
Dívida pública por cidadão 29 802€ 
Dívida em % percentagem do PIB 154.73%
PIB de Portugal 199 809 976 417€ 
População de Portugal 10 374 289


COMENTÁRIO

A dívida pública portuguesa é monstruosa face às capacidades produtivas do país, isto é, a dívida é essencialmente incobrável. No mesmo plano, na Eurozona, estão a Grécia, a Espanha e a Itália. Não nos equivoquemos: O desenho do euro foi, desde o início, destinado a manter sob domínio alemão os países do Sul da Europa e permitiu 20 anos de superavit da economia alemã, enquanto as economias mais frágeis da Europa ou estavam em  recessão, ou mantinham o seu PIB ligeiramente positivo, devido a manipulações das estatísticas. 
Assim, agora que o Euro está «na agonia», as economias dos países mais fracos do euro vão ter de pagar a fatura, com aquilo que tiverem. Vai ser um fartote de privatização das últimas empresas públicas, isto é, sua venda ao desbarato, como modo de diminuir o enorme défice, que se foi avolumando nestes 20 e poucos anos de existência do Euro. 
Mas, a espiral descendente vai continuar, pois as pessoas vão ficar cada vez mais pobres, pelo que não poderá haver consumo suficiente para arrancar o país da estagnação económica, por mais sacrifícios que a população seja obrigada a fazer.
Os políticos e os barões da finança portuguesa sabem isto muito melhor que nós; têm mantido o rumo catastrófico da economia; são eles os beneficiários desta enorme burla (conjuntamente com seus congéneres da UE).
É para mim inacreditável que o povo continue a votar neles (os políticos em causa) e a confiar-lhes as suas parcas poupanças (os banqueiros ladrões)! 

domingo, 4 de setembro de 2022

MITOLOGIAS (XI) HISTÓRIA NATURAL DO UNICÓRNIO

Há uma certa dificuldade em compreender como é que se construiu este mito do unicórnio. Este animal magnífico foi, desde a Grécia Antiga e em narrativas posteriores, descrito como possuindo muitas virtudes e qualidades benéficas. Isto contradiz a tendência claramente dominante do «bestiário mitológico». Dos dragões aos lobisomens, quase todos possuem propriedades inquietantes, aterradoras.
O unicórnio é um animal muito belo, geralmente parecido a um nobre cavalo, de cor branca, simbolizando a pureza. É dócil perante donzelas, para junto das quais se dirige respondendo, solícito, ao seu apelo. Personificação do bem, da nobreza, da coragem, é um dos animais mais representados na heráldica. Algumas vezes, está presente no interior do próprio escudo heráldico; noutras, fora dele, segurando estandartes, como em muitos brasões. 
 
                                 
As propriedades do único corno do animal também eram maravilhosas: as taças dos reis e doutros personagens poderosos eram - às vezes - em chifre do unicórnio, considerado um antidoto eficaz contra venenos e infeções. Na «lógica por analogia», um fragmento do animal que simboliza a pureza, seria ele próprio, remédio ou preventivo eficaz contra substâncias impuras.

                    

Mas, se o unicórnio é animal lendário, a sua marca distintiva, o "chifre" (na realidade, um dente), não é um objeto imaginário: Seu detentor, o narval, é uma espécie de baleia do Oceano Ártico. Nos machos, um dos dentes cresce desta maneira. Após a morte dos mamíferos marinhos, é natural que algumas presas (dentes muito modificados) se destaquem do esqueleto e vão dar às costas geladas que rodeiam o Oceano Ártico desde o extremo Norte da Rússia e Norte da Escandinávia, à Gronelândia e Leste do Canadá.

                       

Para quem os recolhesse, tal poderia significar - senão o enriquecimento - pelo menos, um rendimento considerável. Depois, uma longa cadeia de intermediários encarregava-se de fazer chegar os espécimes raríssimos - com o seu preço decuplicado, pelo menos - a palácios reais e mansões de ricos comerciantes.
Os dentes de narval são representados em pinturas e frescos por artistas medievais, do renascimento e posteriores enquanto chifres de unicórnio. Algumas vezes, são montados em pedestais, como raridades preciosas.

O século XIX, apesar do seu cientismo e sua racionalidade, não esqueceu completamente o gentil unicórnio:
                              
O professor Charles Lutwidge Dodgson, mais conhecido pelo seu pseudónimo Lewis Carroll, escreveu, em «Alice no País das Maravilhas», um diálogo entre um Unicórnio e Alice (1).
Carroll, professor de lógica matemática, inventa um diálogo pleno de humor. Estabelece a equivalência perfeita entre a «realidade de Alice» (personagem ficcional) e a «realidade do Unicórnio» (outro personagem ficcional). Esta equivalência é afirmada através de um truque, ou falácia: «se tu me reconheces como real, então eu também te reconheço» ou seja, mútuo reconhecimento como «critério de verdade», entre personagens ficcionais.
Neste diálogo, CC. L. Dodgson/ Lewis Carroll desfaz humoristicamente aquele género de falácia.


No século XXI, deu-se um novo sentido ao termo unicórnio, mas no vocabulário dos «traders».
Na gíria da finança, uma empresa «unicórnio» é aquela que rapidamente atinge um valor considerável em bolsa, com elevados lucros, sobretudo para os que primeiro nela apostaram. Infelizmente, o mais frequente, é que empresas «unicórnio» sejam uma autêntica fraude. Verificou-se a entrada em bolsa de empresas destituídas de receitas (2), antecedendo tanto a crise das «dot.com» do ano 2000, como o grande crash de 2008. 


Hoje, classificar uma dada empresa como «unicórnio», pode ter conotação irónica, designando empresas lançadas com muita publicidade, mas sem substância, que atraem os investidores ávidos de lucros fáceis. As cotações destas empresas, inicialmente sobem muito depressa e logo também depressa descem, podendo mesmo ser varridas, num instante.
------------------------------------------------
1) DIÁLOGO : ALICE E O UNICÓRNIO (de «Alice no País das Maravilhas»):

 ‘What—is—this?’ he said at last.

‘This is a child!’ Haigha replied eagerly, coming in front of Alice to introduce her, and spreading out both his hands towards her in an Anglo-Saxon attitude. ‘We only found it to-day. It's as large as life, and twice as natural!’

‘I always thought they were fabulous monsters!’ said the Unicorn. ‘Is it alive?’

‘It can talk,’ said Haigha, solemnly.

The Unicorn looked dreamily at Alice, and said ‘Talk, child.’

Alice could not help her lips curling up into a smile as she began: ‘Do you know, I always thought Unicorns were fabulous monsters, too! I never saw one alive before!’

‘Well, now that we have seen each other,’ said the Unicorn, ‘if you'll believe in me, I'll believe in you. Is that a bargain?’

‘Yes, if you like,’ said Alice.


--------------------------------


(2) Ou não produziam realmente qualquer produto ou serviço, ou - caso produzissem - eram cronicamente deficitárias. Apesar disso, puderam ser inscritas nas bolsas de ações!


########################################################


ARTIGOS ANTERIORES DA SÉRIE MITOLOGIAS:



sábado, 16 de julho de 2022

MITOLOGIAS (VIII) MIDAS E A ECONOMIA FINANCEIRIZADA

 


Tenho estado a ler Michael Hudson. Já tinha tido contacto com este autor, desde há alguns anos, através artigos lidos na Internet, bastante esclarecedores e originais*, do ilustre professor de economia. Mas, ler um livro «em papel» é realmente outra coisa. Sobretudo, quando esse livro nos traz tanto conhecimento verdadeiro sobre economia, desfazendo os mitos que enformam a nossa época. 

E que tem isso a ver com a lenda do Rei Midas, que recebera de Dionísio (Deus da embriaguez, do amor sensual e dos excessos...) o dom de transformar em ouro, tudo aquilo em que tocasse? O ouro, nessa altura, era sinónimo de riqueza, a mais óbvia forma de riqueza, a forma de entesouramento preferida por reis e grandes comerciantes.  

Na realidade, o que nos diz o mito, tem a ver com riqueza acumulada que não corresponde a nenhum contributo prévio do seu possuidor. Um proprietário de terrenos aluga esses terrenos a agricultores; estes pagam uma renda. Um proprietário de dinheiro, moedas de ouro e de prata, empresta a juros, aumentando assim seu património, sem que tenha  contribuído com algo, do seu próprio esforço, para o aumento da riqueza geral. 

Michael Hudson sublinha que a riqueza adquirida por alguém sem que esta tivesse, de uma ou outra forma, contribuído para o acréscimo de riqueza ou bem-estar geral, os chamados «rentistas»,  era uma preocupação central das doutrinas económicas clássicas, desde Adam Smith, David Ricardo, J.S. Mill, Marx e outros. Até ao final do século XIX, muitos estavam a favor do capitalismo industrialista, contra um capitalismo rentista. Este não era senão uma herança do feudalismo, que as revoluções burguesas derrubaram, nos finais do séc. XVIII e ao longo do século XIX. Pois, se houve revolução política com o advento do Estado burguês, ao nível económico subsistiam muitos resquícios de feudalismo, como a classe dos terra-tenentes, tão relevantes na Itália do Sul, na Espanha e em Portugal, nomeadamente. O seu domínio estendia-se sobre aldeias inteiras com seus habitantes, situadas no meio de  quilómetros quadrados de terra pertença do senhor feudal, do latifundiário. 

Hoje em dia, o rentismo, ou extração de riqueza sem ter contribuído com nada de positivo para a economia, para a subsistência, o conforto ou a melhoria da sociedade, pode dizer-se que se estendeu e diversificou como nunca: Com efeito, a economia financeirizada é isso mesmo. A glorificação desta financeirização veio acompanhada de ideologia própria: O reaganismo-theacherismo e todos os seus derivados, incluindo o chamado «socialismo de terceira via» (Tony Blair e muitos outros); sobretudo, com as teorias neoliberais em economia (Milton Friedmann, e tutti quanti...).

Se o mito de Midas não fosse mais que uma fábula moralista, não seria suficientemente estimulante, para mim. Compreendo agora a metáfora, a um nível mais profundo, graças a Michael Hudson. Com efeito, a economia de renda «transforma em ouro (em riqueza)» tudo aquilo em que toca, no sentido do rentista obter acréscimo de riqueza, devido à exploração dos que não possuem meios de escapar à extração dessa renda: Não apenas sob forma da mais-valia salarial, como pela necessidade de recorrer ao crédito, para ter acesso a casa própria (os juros hipotecários dos bancos), ou para pagar os estudos, ou para comprar um carro (muitas vezes instrumento de trabalho do trabalhador precarizado, o «empresário individual»), etc. 

Do ponto de vista do rentista há um acréscimo, ao capturar rendimento, o que - aliás - se vai traduzir por aumento correspondente no PIB dum país, mas sem que tal corresponda a um verdadeiro aumento da riqueza global. Com efeito, se alguém - o indivíduo A -desvia parte do seu rendimento, não para consumo pessoal ou para investimento produtivo, mas para pagar uma «renda», (em termos atuais...) prestações incluindo juros, a quem lhe emprestou dinheiro. Se o rendimento desviado vai para a conta de B, então não houve acréscimo de riqueza. Houve apenas uma transferência, duma conta para outra, do excedente gerado por A. Este excedente corresponde ao que A conseguiu pôr de lado, sem deixar de satisfazer as necessidades básicas próprias e da família. É evidente que, sob o capitalismo, quando a capacidade dos pobres e das classes médias diminui, devido às crises periódicas que o assolam, eles perdem os bens que estavam a adquirir a prestações (incluindo a sua casa própria), ou são espoliados de bens dados em garantia, indo essa riqueza material parar às mãos dos proprietários do capital, em geral, membros da oligarquia: No nosso tempo, a oligarquia é sobretudo a detentora do capital  financeiro e imobiliário;  na Grécia antiga, onde foi originado o mito do Rei Midas, era sobretudo a dona da terra, da propriedade agrária.

O Rei Midas transformava em ouro tudo aquilo em que tocava, mas o ouro não é vida, o ouro é estéril, aquilo que se transforma em ouro deixa de participar na economia produtiva, apenas fica entesourado. Como analogia perfeita, note-se que o entesouramento vai traduzir-se numa perda da sociedade no seu conjunto, porque esse capital não é posto ao serviço da economia. O Rei Midas armazenava-o numa torre, onde ia deliciar-se, tocando nas riquezas que eram dele e só dele. 

Hoje, como exemplos de capital não produtivo, temos «buy backs» ou auto-compra de ações de empresas cotadas em bolsa, que assim desviam potencial investimento produtivo para manterem as suas ações artificialmente altas. Temos os capitais especulativos (hedge funds, bancos de investimento) que «vivem» do saber antecipado dos movimentos e oportunidades dos mercados, normalmente, pelo insider trading, pois não possuem uma «bola de cristal»! E também, as muito importantes e generalizadas rendas de monopólio, é o caso dos preços praticados por  grandes empresas de informática e de tecnologia da informação entre outras, que conseguiram eliminar os concorrentes. Nestes casos, o preço cobrado não tem qualquer relação com o custo e produção do bem ou serviço, mas com aquilo que a empresa monopolista estima ser a capacidade aquisitiva e/ou o desejo do consumidor, condicionado pela publicidade. Tudo isto, são diversas formas de extração de «renda», ou seja, um rendimento não resultante de input real  do proprietário do capital.  

Michael Hudson, recentemente, deu uma conferência  em que fez o historial das diferenças entre civilizações da antiguidade. Nos impérios do Médio-Oriente e da Ásia, havia a noção de que ser credor dava demasiado poder e que as dívidas tinham, de tempos a tempos, de ser perdoadas (os anos de jubileu, ou de Shemitah) para que reinasse a paz social. Enquanto nos reinos e impérios do Ocidente (Grécia e Roma), a oligarquia conseguiu impor a sua lei: O credor tinha sempre o direito do seu lado. A restituição do que estava em dívida, tinha prioridade jurídica absoluta. Foi assim que os agricultores endividados ficaram espoliados das suas terras e  foram transformados em proletários, em servos ou em escravos.

Esta interpretação jurídica do direito de propriedade e da prioridade que têm os credores sobre os bens das pessoas endividadas, continuou até hoje, no Ocidente,  através do direito romano e logo do direito anglo-saxónico, atualmente imposto como a norma em grande parte das relações mercantis, económicas e financeiras internacionais. 

Este processo, onde o credor tem um poder de vida e de morte sobre o devedor (a etimologia do termo inglês para hipoteca, «mortgage», vem do francês antigo, literalmente: «fazer um juramento sob pena de morte», caso ele não seja cumprido), abafa as forças produtivas em qualquer sociedade submetida a ele. 

Muito capital é desviado para as mãos dos credores. Este capital, é (em grande parte) entesourado, não é reinvestido na economia produtiva: O resultado é o empobrecimento geral da sociedade visto que o rendimento disponível global (o capital disponível para ser investido) vai sempre diminuir.

Como tentei explicar, a lenda do Rei Midas poderá ser muito mais rica de significado, do que uma banal história moralista sobre a ganância e os males que advêm aos gananciosos.

*Por exemplo, From Junk Economics to a False View of History ,recentemente publicado, que resume algumas partes do livro The Destiny of Civilization

--------------------------------------------------------

MITOLOGIAS (VII) O GRANDE MITO DO NOSSO TEMPO

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/06/mitologias-vii-o-grande-mito-do-nosso.html


MITOLOGIAS (VI): ASTROLOGIA

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/06/mitologias-vi-astrologias.html


MITOLOGIAS (V) : COSMOGONIAS, OS MITOS DAS ORIGENS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitos-v-das-origens-as-cosmogonias.html


MITOLOGIAS (IV)TRANSFORMAÇÕES ZOOMÓRFICAS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-ivtransformacoes-zoomorficas.html


MITOLOGIAS (III) QUIMERAS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-iii-quimeras.html


MITOLOGIAS (II): PROMETEU AGRILHOADO

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-ii-prometeu-agrilhoado.html


MITOLOGIAS (I) : OS CICLOPES

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-i-os-ciclopes.html

domingo, 5 de junho de 2022

MITOLOGIAS (VI): ASTROLOGIA

                                           


Nesta curta nota, não pretendo abordar todos os aspetos da questão. A história da astrologia confunde-se com a história das civilizações e não se pode dissociar da conceção tradicional do Universo, dada pelas diferentes religiões.
Parece-me mais adequado pensar a astrologia como parte integrante de crenças que se cristalizaram - em várias civilizações - em ciclos de mitos. Com efeito, se os mitos são narrações produzidas e reproduzidas em determinadas culturas, tendo valor exemplar (como na Grécia Antiga, por exemplo), esses mitos são também visões do Mundo, da Génese ou das Origens. Têm como função explicar os mistérios do Cosmos, da Natureza, da existência Humana.
 
Na astrologia terão operado dois níveis distintos:
- O empirismo, com a observação de estrelas e planetas, em geral, das suas trajetórias na abóbada celeste, dos ciclos, da sua periodicidade, a repetição das figuras do zodíaco, cada constelação zodiacal aparecendo sobre um dado ponto da abóbada celeste no mesmo período do ano. Este nível tem uma importância prática, sobretudo a partir do momento em que é preciso determinar o tempo de semear em função da época do ano, ou outras tarefas do ciclo agrícola anual. Ou seja, a civilização agrária, a revolução neolítica, implicam o domínio, não apenas das espécies vegetais cultivadas, ou de animais domesticados e selecionados, como também o domínio do calendário, da meteorologia e de todos os fenómenos associados. Trata-se de saberes absolutamente indispensáveis, quer para a agricultura, quer para a pastorícia. 

- A religião, no sentido etimológico, tem a função de religar o homem com o cosmos, com o sopro divino, a harmonia natural e a criação. Como tal, a ordem de baixo tem de ser análoga à ordem o alto (Tábua de Esmeralda, dos Alquimistas). Isto, tanto no caso da astrologia, como da alquimia, é do domínio das correspondências: A relação do dia e hora do nascimento, com os astros (planetas, constelações) que se encontram por cima do indivíduo, nesse momento. Esta é uma relação direta, determinista e indelével. 
               
                                                     

Aquilo que hoje se designa por astrologia é uma forma de divinação, baseada na «carta dos céus» astrológica, correspondente à configuração astral no local e data do nascimento da pessoa. Mas, este conjunto de crenças tem uma origem muito evidente: Corresponde ao universo mental do politeísmo.
A astrologia é uma prática divinatória com a qual o cristianismo teve de se acomodar desde as origens. Mas, na sua essência a religião dos Evangelhos é contrária às práticas e teorias implícitas na astrologia. Basta reparar no que se passou com muitas festas «cristãs» como a festa do Natal cristão (o festival pagão do Sol Invicto e solstício de inverno) ou a Festa de S. João Baptista (celebração dos Deuses do fogo e solstício de verão). A religião cristã institucionalizada teve de acomodar práticas pagãs milenares presentes no império romano e em todas as áreas para onde o cristianismo se expandiu.
Mas, ao nível dos arquétipos, da psicologia profunda, a crença na astrologia desempenha um papel especial. Hoje, muitas pessoas absolutamente normais, cultas e equilibradas, têm uma crença na astrologia, nos signos. A um nível profundo, elas estariam à procura duma identificação com um animal fétiche, um totem: Trata-se, afinal, da mesma necessidade que os povos ameríndios têm de estar associados ao animal-totem. Mas, neste caso, trata-se de identificação coletiva, ao nível da tribo, enquanto na religião dos signos trata-se de identificação individual. Muitas pessoas na nossa sociedade têm desejo de pertença, mas não seguem uma religião aparente, institucional. A crença nos signos não é vista como «religião», mas preenche o papel central que é desempenhado por qualquer religião: RE- ligar o humano com o cosmos.
Será a astrologia de hoje, uma forma degradada e inconsciente de culto pagão? Note-se que ela permite às pessoas «justificar» o seu fatalismo. A crença num mecanismo que determina o indivíduo desde a nascença, é um determinismo férreo. Está-se perante a negação explícita do livre arbítrio, um conceito importante na teologia e filosofia ocidentais. O determinismo pode ser reconfortante para alguns: Possibilita mecanismos psicológicos de identificação e de conciliação consigo próprio.
Nas sociedades ocidentais, hedonistas e individualistas, a religião aparentemente não existe. É o que parece, mas -afinal - não é assim: É frequente ouvir-se dizer que «não acredito em Deus, nem na vida para além da morte». Porém, ao mesmo tempo, acredita-se que a configuração astral, no momento do nascimento, foi determinar todos os aspetos da personalidade. Além disso, as conjunções de astros traçariam o percurso da vida inteira, desde as escolhas no plano amoroso, às profissionais, etc. É uma forma da pessoa não se assumir como responsável pelos seus atos: «Aquilo que sou, aquilo que fiz, é devido ao meu signo».

Em resumo, os mitos nas cabeças dos contemporâneos, não serão assim tão diferentes da mitologia dos Sumérios, Fenícios, Egípcios, Gregos, etc. Há milhares de anos atrás, estes usaram o conhecimento empírico dos movimentos dos astros, de maneira que puderam viajar em terras incógnitas, ou por mares não navegados, ou fazer previsões corretas sobre as estações do ano e fenómenos meteorológicos associados. Estes, sempre foram conhecimentos muito úteis para agricultores e pastores. Eles banhavam num universo mental politeísta. Por dentro da matriz politeísta construíram explicações para os fenómenos astronómicos observados: O retorno periódico dos astros, correlacionado com fenómenos dos mares, da vegetação, das migrações das aves, etc.
Hoje, porém, uma «mitologia astrológica» parece desempenhar um papel de religião, mas degradada ao nível de crença. A crença, para sobreviver, tem de se fechar em relação à realidade, ao saber científico. A crença aposta na transformação interior do indivíduo e não busca coerência, nem com o mundo, nem com os saberes científicos. Isso não é importante para ela; é antes um obstáculo. No entanto, hoje, para se compreender os fenómenos cósmicos, é indispensável o conhecimento científico da Astronomia e da Cosmologia, que são tão diferentes da astrologia, como a Química é da alquimia.
Porém, note-se, há quem se interesse pela astrologia numa perspetiva não-ingénua, não-ocultista, como assunto antropológico. Compreender os mitos e as crenças, não só do passado ou de povos exóticos, mas igualmente de nossas sociedades contemporâneas, faz todo o sentido. É uma chave para o universo mental individual e para as ideologias que moldam as sociedades.

MITOLOGIAS (V) : COSMOGONIAS, OS MITOS DAS ORIGENS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitos-v-das-origens-as-cosmogonias.html


MITOLOGIAS (IV)TRANSFORMAÇÕES ZOOMÓRFICAS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-ivtransformacoes-zoomorficas.html


MITOLOGIAS (III) QUIMERAS

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-iii-quimeras.html


MITOLOGIAS (II): PROMETEU AGRILHOADO

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-ii-prometeu-agrilhoado.html


MITOLOGIAS (I) : OS CICLOPES

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/05/mitologias-i-os-ciclopes.html

segunda-feira, 23 de maio de 2022

MITOLOGIAS (V) : COSMOGONIAS, OS MITOS DAS ORIGENS


 
Praticamente todas as culturas presentes ou passadas possuem suas narrativas da Génese, da Origem do Universo, da Origem da Humanidade.

 Embora estas narrativas sejam completamente diferentes na aparência, se pegarmos em descrições oriundas de povos não industrializados, na África ou América do Sul e Central, por exemplo, verificamos que todas essas descrições se enquadram num conjunto que - explicitamente - se coloca como explicação do que atualmente existe, da existência do homem e da mulher, dos animais, do Sol, da Lua, etc.

 Os mitos de origem na Grécia antiga não são exceção, no fundo. Eles se conformam com uma visão do caos (primordial), a partir do qual nascem os primeiros deuses, claramente personificações de forças naturais, visto que «comandam» essas forças. 

A mitologia greco-romana distingue claramente o tempo das origens do tempo presente. Não existe uma continuidade, mas antes uma série de etapas descontínuas, pelas quais passaram o Universo e o Mundo. Nestas fases, embora o presente seja necessariamente herdeiro delas, não está sujeito às mesmas forças ou a manifestações esbatidas, somente, como que a testemunhar do tal passado remoto. Por exemplo, sendo os titãs responsáveis pela forma como foi moldado Mundo, a geologia, as montanhas, os mares, etc., o seu trabalho está basicamente completado e o que se observa - agora - é o resultado dele.

Note-se que as cosmogonias orientais, como a Hindu, a Budista, a Taoista, etc. são completamente diferentes, visto que partem doutro princípio organizador. Nelas, o tempo não é linear, mas circular. A existência de ciclos, leva a que seja possível observar «n» vezes os mesmos processos naturais, os mesmos fenómenos. Terá sido isso que levou povos e filósofos dessas culturas a postular que o tempo é cíclico. Segundo algumas correntes orientais, o tempo seria ilusão, ou mera aparência; o tempo existiria só na nossa mente.   

Legenda da Figura 1: Representação de Omphalos, a origem do mundo, num templo grego

A mitologia grega - da qual se vão inspirar as tradições europeias - postula uma origem absoluta do Universo, a partir do «ovo primordial». A rutura do equilíbrio teria desencadeado o caos, que se foi transformando em ordem, em resultado do trabalho dos titãs, deuses primordiais e progenitores dos deuses do Olimpo. 

O tempo é unidirecional e aberto, na mitologia grega, a qual foi inspiração de todas as narrativas do Ocidente, em relação à origem do Mundo.

Por contraste, o tempo é cíclico em bom número de cosmogonias asiáticas; tal distinção leva a que sua cosmovisão seja totalmente diferente da ocidental. 


                                 
Legenda da figura 2: A imagem do Ouroboros, ou serpente que morde a sua própria cauda, é um símbolo do tempo cíclico. Foi adotada no Ocidente por influência provável de filosofias orientais.

Talvez seja isso o que distingue mais a filosofia Oriental (Chinesa, Japonesa, Indiana, etc.) da Ocidental (Greco-romana, Judaica, Cristã, Islâmica). 
As consequências não se limitam à filosofia, pois podemos encontrar reflexo disso na economia, na administração pública, na política, na estratégia e nas ciências sociais, desde a História, à Sociologia, à Antropologia. 
Por debaixo da aparente uniformidade de discursos, existe uma estrutura profunda totalmente dissemelhante. Não se deve considerar que uma é a forma «correta» e a outra «errada» de conceber as origens e as transformações. 
A riqueza e diversidade na abordagem dos fenómenos naturais e sociais é um aspeto positivo que possibilita a fecundação recíproca das culturas e civilizações. 

segunda-feira, 21 de março de 2022

PREVISÕES ECONÓMICAS PARA O FUTURO PRÓXIMO

   



Com o cenário de crise internacional agravado pelo conflito militar Rússia-Ucrânia, as sanções têm sido o instrumento de guerra económica escolhido pelos ocidentais para punir a Rússia. Estas sanções têm a ver com aspetos financeiros e aspetos económico/comerciais.

VERTENTE FINANCEIRA

No aspeto financeiro, sobressaiem a expulsão de muitos bancos russos do sistema de pagamentos internacionais SWIFT, e o congelar das contas em divisas e do ouro, do banco central russo, que estavam -em parte - depositados em bancos dos países ocidentais.  

Quanto ao SWIFT, os russos estavam preparados para isso, desde há bastante tempo, tendo construído a sua alternativa interna de pagamentos interbancários, «MIR». Também muito antes desta crise, já havia em muitos bancos russos a conexão com o sistema chinês UNIONPAY que fornece serviço equivalente ao MASTERCARD e outros cartões de crédito ocidentais. Já havia muitos cidadãos russos que usavam este cartão de crédito chinês. De agora em diante, serão oferecidos sistematicamente aos clientes dos bancos russos cartões de crédito com ligação ao Unionpay. 

Graças às medidas tomadas pelo governo e pela banca, não houve nenhuma corrida aos depósitos, por parte do público. Houve até um ligeiro aumento dos depósitos. Como é que conseguiram isso? 

- Primeiro, deixou de haver possibilidade de levantamento em divisas estrangeiras, o que tinha sido possível até há bem pouco tempo. Muitos russos acumularam dólares e outras divisas ocidentais. Mas agora, devido aos controlos de capitais é difícil, senão impossível exportar divisas para fora da Rússia. 

As divisas estrangeiras são agora meio exclusivo de compra de ouro, prata, platina e palladium, que os bancos comerciais começaram agora a comercializar. Com esta decisão original, o governo russo evita fuga de divisas estrangeiras, a sua acumulação em mãos privadas e, simultaneamente está a favorecer os cidadãos. Os metais preciosos têm vindo a valorizar-se muito. 

Com todas as medidas de emergência tomadas, o rublo não sofreu o colapso que os falcões dos EUA/NATO esperavam. 

O roubo (não há outra maneira de chamar isto) ocidental das reservas do banco central russo (incluindo o ouro) que se encontravam no estrangeiro, foi algo inesperado e inédito para a Rússia. Lembro que, em períodos de grande tensão internacional, no passado, continuou a haver uma certa «imunidade diplomática» dos bancos centrais, mesmo entre países beligerantes. Esta ação criminosa poderá representar uma perda importante (30-40%) das reservas russas no estrangeiro.

 Mas, tem um efeito de longo prazo grave, pois afeta a confiança que países terceiros - países neutrais ou pró-russos, incluindo a Índia, a China, etc - poderão ter (ou deixar de ter) nas instituições bancárias do Ocidente. Os países não ocidentais registaram esta medida. Aliás, ela segue-se a «tomadas de posse» de ativos do Irão, da Venezuela, e recentemente, do Afeganistão. 

A confiança nas instituições ocidentais está definitivamente abalada. Nenhum país está ao abrigo duma tomada de ativos pelos ocidentais, se esses ativos não estiverem, estritamente, depositados nos bancos centrais respetivos. Note-se, esses ativos não são pertença de governos ou órgãos políticos: As reservas dos bancos centrais pertencem aos povos, às nações. Isto vai acelerar a desdolarização.


VERTENTE ECONÓMICA

No plano económico, o fluxo do gás russo mantém-se porque existe uma vontade política clara dos russos, de não dar pretexto a que considerem que há uma falta contratual, da parte deles. Isto vai ao ponto de - apesar do boicote e dificuldade de movimentação financeira - os russos, através de um banco americano, terem pago no passado dia 18 de Março, os juros de obrigações de Estado russas, perante a surpresa dos observadores financeiros no Ocidente. Todos pensavam que a Rússia iria fazer «default».

Gás e Combustíveis

No entanto, os contratos de fornecimento de gás e de petróleo irão caducar, alguns deles já no final de 2022. Não serão, com certeza, renovados. A quebra não é pequena, entre a Europa ocidental e a Rússia. 

Para a Europa (UE), não haverá realmente um fornecimento alternativo de gás natural. A hipótese de navios-tanques de gás liquefeito dos EUA virem abastecer a Europa pode ser excluída. É inviável, no curto prazo. Isto, porque o número de navios com estas características é muito pequeno e estão fretados para outros clientes, noutras partes do Globo. No total, o número de navios-tanque disponíveis para fornecer no imediato o mercado europeu é claramente insuficiente para as necessidades. 

Será que a Europa vai continuar a apostar num «unicórnio»? Será que julgam que as energias «renováveis» são a grande salvação? Atualmente, abastecem, uns poucos por cento das necessidades energéticas totais da Europa. Irão as energias solar e eólica sustituir (num ano? por magia?) a energia do gás natural? Dizem que as reservas atuais de gás natural não se extendem para além de Junho deste ano. Para lá disso, é a incerteza total. Poderão reabrir centrais nucleares ou centrais a carvão. Mesmo isso, não será instantâneo. Reabrir centrais a carvão, bastante poluidoras, será um recuo das políticas ditas de «descarbonização», levadas a cabo por todos os governos europeus.  Reabrir as centrais nucleares será sempre um risco, pois muitas delas estavam próximas do termo do seu «tempo de vida»... Poderá custar o governo ao chanceler Scholz na Alemanha e fazer cair governos doutros países. 

Matérias-primas industriais

Quanto a matérias-primas industriais diversas, nomeadamente os metais industriais em que a Rússia é líder, ou detém grande fatia das exportações globais, pode-se esperar um efeito ainda mais grave. Enquanto a substituição de uma fonte energética por outra, é possível, como fonte de produção de energia elétrica, já o mesmo não se passa ao nível dos metais. O Titânio, por exemplo, não pode ser substituído, nem o Níquel, nem as chamadas «terras raras». As produções industriais vão ficar muito mais caras: Os ocidentais terão de obter em sítios «exóticos» esses mesmos metais, cujo preço já disparou e ainda vai subir muito mais. 

Reorientação das exportações russas

Note-se que a China não irá ficar carente, nem de combustível russo, nem de metais, ou de outras matérias-primas. Ela terá capacidade de absorver grande parte das exportações, que agora são embargadas pelo Ocidente. A China poderá fornecer uma parte dos produtos industriais que a Rússia comprava aos países ocidentais, substituindo-se assim como um parceiro fiável e com estreitos laços de amizade. 

Cereais de exportação

O mesmo se passa em relação aos produtos agrícolas. Os russos, com os bielorussos asseguravam - antes da invasão da Ucrânia - cerca de um terço do trigo colocado no mercado mundial. A Ucrânia, que era outro país com excedente em cereais, terá de os importar, neste ano. Mas a Rússia continuará a fornecer os países não-ocidentais em trigo e outros cereais. Os europeus ocidentais, pelo contrário, não apenas não poderão comprar cereais, como não terão adubos em quantidade suficiente, pois muitos vêm da Rússia.


Situação da Europa

No Ocidente, em particular na Europa, a inflação disparou quando os bancos centrais começaram a emitir divisas (dollar, euro, pound...) sem parar, com o pretexto do COVID, mas realmente devido à incapacidade dos vários países conseguirem controlar suas dívidas soberanas (a dívida soberana da França, por exemplo, é já maior que a da Grécia). As tensões no abastecimento e as ruturas nas cadeias logísticas que se registam neste ano e no ano passado, antecederam a guerra russo-ucraniana. Agora, com o aumento do preço dos combustíveis, a escassez de matérias-primas, a dificuldade em obter materiais estratégicos, somam-se à deficiência industrial, herdada dos últimos 30 anos de deslocalizações (um «benefício» do neo-liberalismo globalista). A Europa ocidental vai pagar o preço económico mais pesado, devido ao estado de guerra total. Além de estar junto do palco da guerra localizada, com o seu cortejo de mortes, destruição e refugiados, vai ficar cortada de fontes de abastecimento em energia e matérias-primas. É possível que não consiga obter quantidade suficiente para suprir as necessidades básicas quer da população, quer da sua indústria. 

Situação previsível para os não diretamente implicados

1) Os EUA incitaram a que a NATO tomasse uma posição intransigente, para provocar a decisão russa. Lembro que Putin vinha avisando que havia «linhas vermelhas» a não ultrapassar, e isto, desde a célebre conferência sobre Segurança de Munique de 2007. Repetiu o aviso muitas vezes, desde então. Mas não foi tomado a sério. Nesta guerra, quem tem os custos principais - do lado ocidental - são justamente os Estados europeus da NATO. Os EUA têm a vantagem estratégica de criarem uma rutura profunda entre a Rússia e o ocidente europeu, o que significa, para eles EUA, manter e reforçar a situação de dependência dos seus parceiros (vassalos) da NATO.

2) Os europeus não ganham nada com a situação, pois terão que sofrer o «ricochete» das sanções, que irá dizimar, ainda mais, a sua capacidade industrial. A Europa não está preparada para ser auto-suficiente; ela abriu-se demasiado à globalização capitalista, às importações provenientes da China e doutros países asiáticos, desde os produtos de «baixa gama» (confeções, por exemplo), aos produtos sofisticados (por exemplo, computadores, smartphones).

3) Os chineses, como já tinha apontado noutros artigos, são os grandes beneficiários da situação. Primeiro, porque se tornaram vitais para a economia da Rússia. Também, consolidam sua aliança estratégica com a Rússia. Conseguem garantir os fornecimentos através de contratos de importação de energia, de matérias-primas e de produtos agrícolas. Vão reforçar as suas exportações industriais para a Rússia. O mercado russo-chinês, vai ser «oleado» por um mecanismo comum de pagamento, já existente, a nota de crédito em Yuan. Esta obrigação comercial de curto prazo, é remível em ouro, na bolsa de metais de Xangai. O sistema em vigor servirá como modelo para as relações comerciais destes dois gigantes com outros países, na Ásia Central, em África e na América Latina.

Nota: Aqui, neste texto, não referi diretamente o aspeto militar-estratégico, nem outros. Sei que estão imbricados aos aspetos comerciais, económicos e financeiros. Mas, quis manter este artigo facilmente legível. Fica para outra ocasião, a análise militar e geoestratégica. 

PS1: Decreto de Putin estabelecendo que os Estados hostis deverão a partir de agora usar rublos para pagar o petróleo e o gás que compram à Rússia. Isto é uma mudança qualitativa. Veja AQUI.

PS2: Alex Christoforu explica o alcance do decreto de Putin, obrigando países «não amigos» terão de usar rublos, para comprar as exportações russas (gás, petróleo, metais, cereais, etc)