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segunda-feira, 23 de maio de 2022

MITOLOGIAS (V) : COSMOGONIAS, OS MITOS DAS ORIGENS


 
Praticamente todas as culturas presentes ou passadas possuem suas narrativas da Génese, da Origem do Universo, da Origem da Humanidade.

 Embora estas narrativas sejam completamente diferentes na aparência, se pegarmos em descrições oriundas de povos não industrializados, na África ou América do Sul e Central, por exemplo, verificamos que todas essas descrições se enquadram num conjunto que - explicitamente - se coloca como explicação do que atualmente existe, da existência do homem e da mulher, dos animais, do Sol, da Lua, etc.

 Os mitos de origem na Grécia antiga não são exceção, no fundo. Eles se conformam com uma visão do caos (primordial), a partir do qual nascem os primeiros deuses, claramente personificações de forças naturais, visto que «comandam» essas forças. 

A mitologia greco-romana distingue claramente o tempo das origens do tempo presente. Não existe uma continuidade, mas antes uma série de etapas descontínuas, pelas quais passaram o Universo e o Mundo. Nestas fases, embora o presente seja necessariamente herdeiro delas, não está sujeito às mesmas forças ou a manifestações esbatidas, somente, como que a testemunhar do tal passado remoto. Por exemplo, sendo os titãs responsáveis pela forma como foi moldado Mundo, a geologia, as montanhas, os mares, etc., o seu trabalho está basicamente completado e o que se observa - agora - é o resultado dele.

Note-se que as cosmogonias orientais, como a Hindu, a Budista, a Taoista, etc. são completamente diferentes, visto que partem doutro princípio organizador. Nelas, o tempo não é linear, mas circular. A existência de ciclos, leva a que seja possível observar «n» vezes os mesmos processos naturais, os mesmos fenómenos. Terá sido isso que levou povos e filósofos dessas culturas a postular que o tempo é cíclico. Segundo algumas correntes orientais, o tempo seria ilusão, ou mera aparência; o tempo existiria só na nossa mente.   

Legenda da Figura 1: Representação de Omphalos, a origem do mundo, num templo grego

A mitologia grega - da qual se vão inspirar as tradições europeias - postula uma origem absoluta do Universo, a partir do «ovo primordial». A rutura do equilíbrio teria desencadeado o caos, que se foi transformando em ordem, em resultado do trabalho dos titãs, deuses primordiais e progenitores dos deuses do Olimpo. 

O tempo é unidirecional e aberto, na mitologia grega, a qual foi inspiração de todas as narrativas do Ocidente, em relação à origem do Mundo.

Por contraste, o tempo é cíclico em bom número de cosmogonias asiáticas; tal distinção leva a que sua cosmovisão seja totalmente diferente da ocidental. 


                                 
Legenda da figura 2: A imagem do Ouroboros, ou serpente que morde a sua própria cauda, é um símbolo do tempo cíclico. Foi adotada no Ocidente por influência provável de filosofias orientais.

Talvez seja isso o que distingue mais a filosofia Oriental (Chinesa, Japonesa, Indiana, etc.) da Ocidental (Greco-romana, Judaica, Cristã, Islâmica). 
As consequências não se limitam à filosofia, pois podemos encontrar reflexo disso na economia, na administração pública, na política, na estratégia e nas ciências sociais, desde a História, à Sociologia, à Antropologia. 
Por debaixo da aparente uniformidade de discursos, existe uma estrutura profunda totalmente dissemelhante. Não se deve considerar que uma é a forma «correta» e a outra «errada» de conceber as origens e as transformações. 
A riqueza e diversidade na abordagem dos fenómenos naturais e sociais é um aspeto positivo que possibilita a fecundação recíproca das culturas e civilizações.