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terça-feira, 24 de outubro de 2023

[CRÓNICA(Nº19) DA IIIª GUERRA MUNDIAL] A GUERRA VISTA POR OUTRO ÂNGULO

                    Foto: Intenso bombardeamento de Gaza City pela aviação israelita

CONTRASTE ENTRE DINÂMICAS DE DESENVOLVIMENTO E DE GUERRA 

 Na semana passada, o  Fórum das Novas Rotas da Seda em Pequim incluiu - para a integração Euroasiática - investimentos totalizando cerca de 100 biliões de dólares em projetos para novas infraestruturas e para desenvolvimento.

Há dois dias, o presidente Biden apresentou ao Congresso um projeto, votado por unanimidade, consistindo em ajuda militar totalizando mais de cem biliões de dólares, cerca de 60 biliões para  Ucrânia (para comprar mais armas), e para Israel uns 40 biliões (sobretudo para compra de força aérea e mísseis ).

As motivações das águias e falcões imperiais são transparentes, como aponta Pepe Escobar, no seu mais recente artigo.


PARECE-ME FATAL QUE ESTA GUERRA SE GENERALIZE A VÁRIOS VIZINHOS DE ISRAEL. 

Pois a questão central que se coloca é que nenhum muçulmano, seja qual for a sua tendência política, religiosa ou sua nação pode ver tranquilamente a aniquilação de um povo irmão (muçulmano) indefeso em Gaza, sem ficar tremendamente indignado e desejoso de vingança. Os que governam os países árabes da região podem não ser muito ardentes defensores da causa palestiniana, mas se não se mostrarem em sintonia com as massas, podem ter, internamente, que enfrentar uma rebelião. O presidente Erdogan da Turquia está ciente disso, ele sabe que o povo não esqueceu a afronta feita em 2008, com o assassinato de civis turcos, num barco destinado a entregar ajuda humanitária  a Gaza, brutalmente atacado pela marinha guarda-costeira israelita. A marinha de guerra turca está posicionada perto de Israel, ao largo de Chipre.

Seja qual for o desenrolar desta guerra assimétrica Israel-Palestina, o certo é que o campo pró-palestiniano está reforçado como nunca,  inclusive, as simpatias pelo Hamas cresceram muito. Este movimento está a conseguir efetuar  a reunificação de toda a resistência palestiniana.


PROPAGANDA DE GUERRA DO OCIDENTE 

A propaganda do Ocidente, tanto as narrativas do governo dos EUA e de governos seus vassalos, como as duma media prostituída aos poderosos, não deixa que a real complexidade da situação político-militar seja perceptível pelo público, em geral. É preciso ir á procura ativa de fontes não alinhadas com o «globalistão», para se perceber quais as cartas possuídas pelos diversos intervenientes. As mentiras repetidas das autoridades de Israel deveriam fazer com que os jornalistas ocidentais olhassem com sentido crítico as suas histórias. Mas, pelo contrário, transcrevem acriticamente essas mentiras, nunca as confrontando com factos do terreno. Esta atitude da media é semelhante às sucessivas «notícias», segundo as quais as forças ucranianas estavam prestes a causar tremenda derrota no exército russo. Isto foi dito e redito, tantas vezes e de forma obviamente enganosa. O resultado, quando a realidade veio deitar por terra tais narrativas, foi que muitas pessoas acordaram para a natureza da media de massas.


JOGO PERIGOSO DO OCIDENTE

O jogo do «Ocidente coletivo» além de nojento - porque não se importa que as forças armadas de Israel anunciem e cometam um genocídio perante o olhar do Mundo inteiro - tem uma vertente de irresponsabilidade inquietante, pois assopra nas brasas quentes da destruição de Gaza, parecendo que o seu objetivo é o de causar uma guerra regional, com possibilidade de evoluir rapidamente para uma guerra generalizada. Pensam que assim, poderão obter a dominância total e definitiva do Ocidente sobre o resto do Mundo!  

Se os políticos no poder, nos países ocidentais, fossem sujeitos à crítica livre e esclarecida, não poderiam manter-se no poder. Por isso, a matança dum povo tem de ser recoberta de um manto de mentiras!


PS1: Mecanismo de propaganda de guerra e de lavagem ao cérebro:

A media corporativa, unanimemente, toma posição a favor de Israel. Basta ler os títulos, em que sistematicamente classifica o conflito como «Guerra Israel -Hamas». Este é seu modo hipócrita de colocar a situação, escondendo a vontade (e os atos) de genocídio anti- árabe, por parte dos sionistas, desde antes de 1948. 

Habilmente, deslocam o problema, como se fosse a questão do «Hamas, organização terrorista» que estivesse em causa, quando é o próprio Estado, Governo e Forças Armadas de Israel que (coletivamente) cometem atos terroristas, criminosos e estão a exterminar civis inocentes na Faixa de Gaza. 

PS2: Uma lição esclarecedora do Coronel US Douglas Macgregor: 

https://www.youtube.com/watch?v=00frv5blaXM


PS3: Leia como um jornal dito «de esquerda» faz censura despudorada sobre a questão Palestiniana

https://www.globalresearch.ca/surge-suppression-how-guardian-applies-censorship/5837810


domingo, 2 de julho de 2023

O PAGANISMO CRISTIANIZADO

 

    Foto: Menhir «cristianizado», de Saint Uzec (Bretanha)

A evolução das religiões instituídas afasta-as muito da sabedoria e ensinamentos dos profetas e seus primeiros seguidores. No caso do cristianismo, a religião de origem era a mesma que a do povo judeu, pelo que as pessoas que seguiram o Cristo inicialmente, consideravam-se dentro do Judaísmo. Mas, já em São Paulo, se nota um  afastamento em relação a certas práticas do judaísmo ortodoxo. 

Os dias santos, feriados, festas religiosas, foram colar-se às práticas de paganismo do Império romano. Sem essa colagem, não teria sido possível a  religião cristã tornar-se «religião de Estado». Estas festas eram celebradas por todos, desde tempos imemoriais. Se o pretexto era homenagear - nesses festivais - certas divindades, o seu espírito não era apenas de devoção a esses deuses ou heróis míticos: Era um pouco como o Natal de hoje, uma festa pagã, a pretexto da data (mítica) do nascimento de Jesus Cristo. 

Nas sociedades agrárias, os dias, semanas e meses estavam associados a tarefas agrícolas, comuns em toda a área mediterrânea. As épocas das colheitas, ou das sementeiras,  etc. estavam associadas às espécies cultivadas e ao ciclo anual das estações. Estes ritos, dedicados aos deuses agrários, implicavam sacrifícios de animais e/ou de produções vegetais, em honra do/da deus/a, supostamente responsável pela fertilidade, pela abundância das colheitas, etc. 

Também, desde tempos imemoriais, se assinalavam certos momentos* da trajetória do Sol: O solstício de Inverno (23 de Dezembro; festa do Natal) e o de Verão (23 de Junho, festa de S. João Batista). Os equinócios: O equinócio  da Primavera, coincidindo com a Páscoa, festa pagã da fecundidade e o equinócio do Outono, em Setembro, após a colheita dos cereais, coincidente com a vindima, a colheita da maçã e doutros frutos. 

Havia rituais associados à Deusa da Terra e da Agricultura, ou Ceres, a deusa que era responsável pela fertilidade agrícola. Nalguns povos, instaurou-se o Thanksgiving, ou seja, o dia em que se agradece a Deus pelas colheitas, em continuidade com festas pagãs com o mesmo fim.

O «Dia dos Mortos» (30 de Outubro) e o de «Todos os Santos» (1º de Novembro), foram instaurados com o objetivo de apagar a memória do Halloween, o  ritual celta de culto dos mortos.

Os camponeses e artesãos medievais não tinham direito a um mês de férias. Além disso, tinham muito pouca mobilidade: Quanto muito, podiam visitar parentes numa aldeia próxima, à distância de uma jornada a pé. Porém, tinham muitos dias feriados: As festas do santo patrono da vila ou cidade, além dos feriados tradicionais, celebrados em toda a cristandade: Natal e São Silvestre, Carnaval e Quaresma, Semana Santa e Páscoa, Corpo de Deus.

É um erro considerar-se que os «pagãos» (ou seja, todos os povos que celebravam religiões politeístas) eram forçosamente «bárbaros», primitivos, etc. Esta visão deturpa a profunda ligação das religiões politeístas, que eram as da Grécia e Roma antigas, com as mais elevadas realizações da antiguidade, todas as artes, as ciências mais avançadas, engenharia, arte de navegar, etc. e sobretudo a sofisticação da filosofia, com várias escolas que o Renascimento europeu (a partir do séc. XV) redescobriu e tentou emular.

A popularidade das festas pagãs, devia-se em parte a uma devoção genuína aos deuses e deusas que eram objeto de culto e celebração nestas festas. Mas, em grande parte também, elas estavam intrinsecamente ligadas aos ciclos naturais. Os povos, desde tempos imemoriais, tinham observado os fenómenos periódicos dos astros, da Terra, do Sol e da Lua; as estações do ano, os ciclos de reprodução de plantas e animais; etc...  Naturalmente, atribuíam os movimentos e transformações a forças divinas, cósmicas, que os deuses personificavam. Cada divindade presidia a um certo número de fenómenos da Natureza. Estas mesmas divindades também eram invocadas em circunstâncias particulares da vida dos indivíduos, do nascimento até à morte.

Ao fim e ao cabo, a nossa cultura está impregnada de símbolos e mesmo de crenças que vêm das religiões politeístas. Essa mesma herança está disfarçada pela cristianização de muitas festas pagãs, pela transformação de locais sagrados das religiões pagãs em santuários e locais de adoração de santos cristãos. A própria existência dos santos, embora na religião dos teólogos, aqueles sejam apenas «homens e mulheres notáveis, que constituem exemplos de vida e de fé para os cristãos», são vistos pelo povo cristão como se fossem (quase) deuses, aos quais se pede algo, que recebem dos devotos presentes (sacrifícios, num certo sentido, mesmo que não sejam animais sacrificiais), os devotos sentem-se obrigados em «cumprir as promessas feitas», enfim, uma quantidade de indícios de que a forma como os «santos-deuses» são ressentidos é muito semelhante à dos deuses do paganismo. Que outro significado terão as santas e os santos cristãos, serem os patronos de profissões, de atividades, ou os que devem ser invocados para determinadas doenças ou outros males ? 

O protestantismo - nas suas diversas tendências - insurgiu-se contra esses cultos «divinos» dados a santos e santas cristãos, pelas tradições populares. Mas não conseguiu eliminar por completo essa adoração dos santos, mesmo nas zonas mais profundamente influenciadas pelo protestantismo (ex: Estados do Centro e do Norte da Europa, assim como os EUA e Canadá). 

O catolicismo, predominante no Sul Europeu, na América Latina, e noutras paragens, tem abordado estas questões de uma forma ambígua: Na religião dos teólogos católicos, o conceito de «santo» é bastante semelhante aos dos protestantes. Mas, em relação ao povo católico há, não só uma tolerância em relação a crenças populares de origem pagã, como também existe um discreto ou ostensivo encorajamento de práticas de devoção, que são diretamente inspiradas do paganismo. Com efeito, as Nossas Senhoras disto ou daquilo, têm virtudes milagrosas «comprovadas» pelas lendas que estão ligadas a elas e aos seus locais específicos de devoção. Como disse acima, o modo como é feita a invocação de um santo é o equivalente a dar-lhes um estatuto de divindade, com o poder de «interferir» junto de Deus, para olhar pelo devoto e de realizar a cura ou alívio neste ou naquele aspeto da vida (saúde, dinheiro, ligações conjugais ou amorosas, etc...). Penso que a mentalidade dos que rezam, nestes termos, ao santo de sua devoção é idêntica - no essencial - ao que uma pessoa da antiguidade greco-romana faria, em relação ao deus sob a proteção do qual se colocava.

Embora teoricamente o Deus de cristãos, judeus e muçulmanos seja único, a verdade é que os povos onde estas religiões nasceram, tiveram religiões politeístas, que antecederam as «reformas» monoteístas. Os cristãos não puderam «erradicar» o politeísmo, senão «disfarçando-o» em adoração aos santos. Podem-se considerar os «exércitos» de santos católicos como um elaborado panteão, com especialidades médicas ou outras, cuidadosamente distribuídas, de tal modo que o devoto tenha - em qualquer circunstância - sempre um santo apropriado para invocar. 

Não vejo, portanto, diferença em qualquer aspeto essencial com as religiões politeístas existentes, ou passadas; também nestas, as divindades asseguram uma fração «dos trabalhos divinos», tendo que colaborar com a Entidade suprema, o Deus principal das religiões na Grécia e na Roma antigas (Zeus e Júpiter) ou o seu análogo noutras culturas. A Virgem Maria e outros Santos, são considerados interceptores junto de Deus, sendo este conceito do papel dos santos, em si mesmo, uma clara negação da omnisciência do Deus Supremo e mesmo da sua omnipotência.

Porém, aquilo que caracteriza a religião nascida há cerca de 2000 anos atrás, principalmente antes do período dos concílios, quando se começou a codificar o cristianismo, não tem muito que ver com a religião praticada depois pelos cristãos, pelo clero e pelas mais elevadas autoridades eclesiásticas. Muitas pessoas sinceras e totalmente inocentes foram parar às fogueiras da Inquisição, ou sacrificadas de múltiplas maneiras cruéis, apenas por colocarem questões sobre a adoração dos Santos. 

Talvez a maior traição dos que se dizem fiéis de Cristo, seja a sua intolerância sectária, que fez com que praticassem crimes, com a boa consciência de que os faziam «pela glória Divina». Este passado de intolerância sectária, ainda presente nalguns, é a maior negação da mensagem de Cristo. 

Não digo que não haja sectarismo noutras religiões, no passado e no presente. Mas, o que choca particularmente,  é que no caso dos Evangelhos de Cristo, a sua mensagem de Libertação espiritual profunda, tenha sido desvirtuada e o seja ainda agora, em tantos sítios e por tantas entidades eclesiásticas. Sem o seu papel pernicioso, o povo seria provavelmente menos fanático, haveria mais consideração pela Palavra e pelo Espírito da mensagem de Jesus.  

O meu esforço para encontrar uma via pessoal para viver em harmonia com os Ensinamentos de Cristo, tem recebido muito pouco apoio institucional. Penso que seja também o caso de muitos cristãos pelo mundo fora. 

O problema não decorre do texto das Escrituras Sagradas, mas, da perversidade daqueles que as interpretam a seu bel prazer, para conquistar e  consolidar o poder, nas igrejas e nas sociedades.  Chegam a negar - na prática - a «Boa Nova», que dizem seguir e propagar. Felizmente, conheço um certo número de teólogos e de filósofos cristãos, que esclarecem os aspetos de Libertação, Espiritualidade e Compromisso com os outros. Também existem algumas pessoas na minha vida pessoal, que são (ou foram) reais apoios para minha vivência cristã.

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*)Ver a influência pagã no calendário cristão:

https://wol.jw.org/pt/wol/d/r5/lp-t/1966206