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domingo, 8 de dezembro de 2024

UMA LEITURA DA «ARTE DA GUERRA» DE SUN TZU


Esta leitura tem o mérito de não reduzir o texto clássico (do IVº Século AC) em um manual de conduzir as batalhas ou a estratégia bélica, em geral.

No contexto do pensamento de SUN TZU, o que importa é o resultado; é fazer com que as circunstâncias - sejam elas quais forem - sejam aproveitadas, da melhor maneira.
O general que comanda o exército deve poupar ao máximo as suas tropas, não deve encetar combate senão quando indispensável, deve conhecer ao pormenor o terreno, saber o máximo sobre o inimigo e sobre seu próprio campo. Estes ou outros conselhos são afinal sabedoria de experiência feita. Por isso, não surpreende que outros teóricos da guerra, como Tucidides, Clausewitz e Maquiavel também os enunciem.

Mas, a filosofia do Taoismo penetra profundamente o texto de Sun Tzu, sendo este somente realmente inteligível, para quem possua leituras e compreensão aprofundadas das filosofias, religiões e civilizações do Extremo Oriente.
Afinal, é mais um texto filosófico, uma filosofia da ação. Deixa de lado considerações morais. É «técnico», portanto amoral num certo sentido. Deixa inteiramente em aberto a questão das causas, motivações e princípios éticos ou religiosos subjacentes.

Em suma, adapta-se a quaisquer tempos e circunstâncias, inclusive, em campos afastados da Arte Militar, em si mesma: Pode ser visto como um manual de condução dos assuntos de Estado /da política, de negócios, de relações sociais e pessoais, etc. Tornou-se moda, no Ocidente. Tem sido aproveitado por «gurus de Public Relations», politólogos, psicólogos, etc.
Mas, parece-me que - quase todos eles - distorcem a doutrina de Sun Tzu, talvez de modo não intencional, ao «adaptá-la» à mentalidade ocidental. Seria mais sensato vê-lo enquanto texto filosófico de estratégia no contexto supracitado; o do estudo aprofundado de correntes religiosas e filosóficas do Extremo Oriente, nomeadamente, do Confucionismo, Taoismo e Budismo.

                              

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

O GLOBALISMO É SEMPRE OPRESSOR.


Para se combater um inimigo, é preciso saber-se como é que ele raciocina. Conhecer o inimigo por dentro, é condição para poder derrotá-lo. Ora, muitas vezes, os globalistas revelam os seus pensamentos, as suas conceções do mundo e as suas estratégias.
É o caso do site do Fórum Económico Mundial, onde se afirma claramente o seguinte: «A paisagem geopolítica está a sofrer uma profunda transformação, dando origem a uma ordem mundial que é, não só multipolar, como multiconcetual.»
Esta ideia de uma transformação profunda é central na tese do «Grande Reset», defendida por Klaus Schwab e os multimilionários globalistas.
Há uma narrativa, que reza assim: 
- O Ocidente decadente procura impedir o agrupamento dos países, colonizados no passado, em torno de potências em ascensão, a China e a Rússia, capazes de colocar em xeque o domínio das potências (essencialmente da Europa e América do Norte), que foram responsáveis por longos séculos de colonialismo e a partir das quais se desenvolveu o capitalismo ocidental.
Esta narrativa, por muito sedutora que seja, omite alguns aspetos essenciais, nomeadamente: As nações outrora colonizadas,  são governadas por frações da burguesia autóctone, que se guindaram ao poder, para logo venderem todas as riquezas e privilégios que os tais capitalistas dos ex-impérios coloniais ou neocoloniais, poderiam desejar.
Além disso, os grandes motores da multipolaridade, a Rússia e a China, não hesitam em adotar políticas tipicamente capitalistas, como seja (entre outras), a agressiva penetração e domínio dos mercados de países inteiros, se isso for no sentido de reforçar o seu poderio.
Não existe na História qualquer exemplo de imperialismo «benévolo», nem aliás de capitalismo «defensor dos direitos humanos», pois estas máscaras caem, assim que os interesses das superpotências e das oligarquias que beneficiam delas, estejam em risco.
Estamos realmente numa situação semelhante à das últimas décadas do séc. XIX até ao eclodir da Iª Guerra Mundial, num aspeto: Novas potências sobem em competência industrial e militar, para disputar os mercados e também as alavancas políticas globais,  às potências até então dominantes, possuidoras de impérios coloniais.
Nos finais do século XIX, as potências ascendentes eram a Alemanha imperial, os Estados Unidos e o Japão imperial; as potências imperiais/coloniais ameaçadas eram a Espanha, a França, o Reino Unido, o império Otomano e a Rússia czarista.
Não se repete nunca a História, não veremos, de novo, a ascensão de potências imperiais típicas. O domínio unipolar dos EUA foi transitório e apenas possível por um conjunto de circunstâncias, que não voltarão a realizar-se com as mesmas formas e moldes, para originar uma situação idêntica.
Mas a História por vezes «rima», ou seja, podemos ver um conjunto de grandes e médias potências que, de forma bélica ou diplomática, acabam por engendrar uma nova configuração de esferas de poder, abrangendo zonas do Globo que elas consideram interessantes.


A nova ordem mundial, ou como a queiram chamar, não é um «comunismo», nem é uma ordem de nações respeitosas umas das outras, capazes de interagir, comercialmente e noutros domínios, através da estratégia «win-win» tão cara à direção do PC Chinês.
Tudo o que uns e outros desenvolvem como retórica, é apenas retórica, destinada a encobrir (dos ingénuos) a verdadeira natureza das suas jogadas de poder.
Dizer que a humanidade ficará mais resguardada numa «ordem multipolar», em relação à «unipolar», é uma grande ilusão, uma miragem que nos querem fazer engolir.
É fácil de engolir, tanto mais que detestamos e tememos o imperialismo decadente dos EUA. Este, ainda possui o maior arsenal de armas nucleares, a maior rede de bases espalhadas pelo globo, a maior economia (embora financeirizada) e o controlo de instituições multilaterais e regionais, o que lhes permite impor a sua «rules based order».
Mas, não desejo ver, no futuro, uma interminável sequência de guerras localizadas, seguidas de conferências para estabelecer novos equilíbrios instáveis. Nestas guerras, pequenas ou grandes, os sacrificados são sempre as classes despossuídas. Estas financiam diretamente essas matanças com o dinheiro dos seus impostos e com o sangue dos soldados (seus filhos e parentes).
Não creio porém que a humanidade em geral - e em particular, as pessoas aparentemente mais instruídas em cada nação - tenha a lucidez para compreender o que se está a passar. Esta compreensão é necessária para se conectarem e agirem, com vista a bloquearem os poderosos, porque estes têm como objetivo conservar ou alargar o seu próprio poder. Aos que herdaram o poder, ou que o tomaram pela força, como dizia Maquiavel, é mais vantajoso dominar os povos pela astúcia, pelo engano (demagogia) e sempre que necessário, através de violência e de crueldade.
Os «príncipes» do presente, não são diferentes - no essencial- dos príncipes do Renascimento, que Maquiavel serviu e observou. Todas as lutas pelo poder político, pela conservação hegemónica do poder, acabam por «obrigar», mesmo os mais idealistas, a cometer crimes para conquista ou manutenção do poder. O conhecimento da História dos séculos passados confirma-o.
Não está na natureza intrínseca do ser humano, ser «bom» ou «mau»; são as circunstâncias que o fazem «bom» ou «mau». Um mundo onde a força predomina sobre o mútuo acordo, onde a ganância é erigida em lei, onde a justiça é um apêndice da máquina de oprimir, um mundo assim não pode originar sociedades pacíficas, onde o melhor de cada um possa vir ao de cima, onde as pessoas estejam realmente livres e seguras, pois os seus direitos são respeitados. As pessoas deveriam  autoeducar-se para compreender o mundo real onde vivem e sairem da «Matrix». Só assim conseguirão encetar a construir, no seu entorno,  relações recíprocas e sem imposições, ou seja, um mundo verdadeiramente humano.
Estou convencido de que a natureza humana não é imutável; que as pessoas são determinadas pelas relações reais em que se encontram mergulhadas. As sociedades e os indivíduos, têm a faculdade de aprendizagem, não apenas das técnicas, como dos comportamentos e respetivos valores implícitos.
Se a natureza humana fosse imutável, não teria sido possível a evolução histórica, com todas as suas contradições e até com catástrofes (naturais ou causadas pelos humanos) e a saída das mesmas, graças à criatividade humana.

sábado, 10 de julho de 2021

MERCENÁRIOS E CONTRATANTES

                               Bartolomeo Colleoni, o famoso Condottiere do Séc. XV


A guerra está mais ou menos completamente privatizada. O motivo real dessa privatização é que as guerras do Império não têm nenhum atrativo para os nacionais US, mesmo os das classes baixas, que foram durante decénios atraídos por salários elevados e pela possibilidade de frequentarem o ensino superior (privado e muito caro, nos EUA), depois de cumprirem o contrato como soldados, graças a bolsas especiais. 

De facto, a guerra deixou de ter qualquer relação com a defesa do território, pelo menos, nos países dominantes do hemisfério ocidental. Nota-se que, as missões em África (Líbia, Chade, Mali), no Médio Oriente (Iémen, Síria) ou na Ásia Central (Afeganistão), apenas constituem as versões mais recentes de aventuras neocoloniais, mesmo quando debaixo da capa e sob os auspícios de «forças de paz» da ONU.  

Seja no país sede do Império (EUA), seja nas potências vassalas (Reino Unido, França, etc...) a privatização da guerra segue o seu percurso típico de privatização dos lucros para as empresas de mercenários, enquanto os custos são públicos, financiamentos inscritos em rubricas de «defesa» ou outras, dos orçamentos estatais. Assim, ficam satisfeitas estas empresas de mercenários - que se transformaram em autênticos potentados, com poderosos meios militares e logísticos- mas  também os deputados que podem aprovar estas despesas na ignorância dos cidadãos comuns, convenientemente dissimuladas em rubricas de «cooperação», «ajuda ao desenvolvimento», etc.

Uma extensiva pesquisa surgiu no Newsweek, sobre os segredos do exército «incógnito»  de autoria de WILLIAM M. ARKINNesta peça extensa, são dissecados os meandros do exército secreto dos EUA, que conta já com 60 mil homens, segundo o autor, sendo certo que as suas funções no terreno, deixaram há muito de ser a de meros auxiliares, fornecendo apoio logístico. São - de facto - um exército mercenário encoberto, com meios muito sofisticados, mais ou menos como comandos, mas sem ligação orgânica à estrutura militar do Estado, como é o caso daquelas forças especiais.

No caso da retirada* do Afeganistão, segundo vários relatos, não se trata realmente de retirada, mas antes da transformação da guerra: Esta, deixa de ser protagonizada maioritariamente por forças dos Estados, pelos contingentes da NATO, com elementos das forças armadas dos países da aliança, para ficar entregue a um conjunto de «contratados» (maneira eufemística de designar mercenários) que irão sustentar pontos-chave do dispositivo ocidental. Estes incluem uma série de bases dispostas na proximidade das fronteiras com o Irão, a China e Rússia. Embora o Afeganistão não tenha fronteira direta com este último país, pode seu território ser facilmente alcançado atravessando outros países da Ásia Central.  Estas bases têm funções de espionagem, de manter uma pressão permanente por exemplo, com mísseis, que poderão ser, a qualquer momento, equipados com ogivas nucleares e como ponto de apoio a guerrilhas que poderão infiltrar os territórios inimigos. Vital - também - será a proteção dos campos de ópio e fábricas secretas, que processam esta droga, para ser transportada em voos secretos, até a vários pontos do globo, onde existam bases dos EUA. Este tráfico de droga está confirmado, para além de qualquer dúvida, tendo como motivação primária fornecer dinheiro às operações secretas da CIA. 

Quando leio, hoje, que a famosa empresa «Blackwater», está em condições de substituir  os soldados que abandonam o Afeganistão, vem-me à memória Maquiavel. No tempo de Maquiavel, no fim do século XV, princípios de século XVI, muitos potentados e príncipes italianos tinham como coluna vertebral de seus exércitos, mercenários, cujo chefe ou «condottiere», era um senhor da guerra que oferecia os seus préstimos a troco de pagamento em espécies sonantes. Os exércitos das grandes potências, na Europa dos séculos XVI até ao Séc. XIX e posteriormente, recrutavam mercenários, em regimentos completos, desde o coronel, até aos soldados rasos e oriundos de um só país, como os regimentos Suíços, Irlandeses, etc. 

Ao longo do século XX e até agora (século XXI), existem algumas forças «de certa forma mercenárias», como a Legião Estrangeira (em França e na Espanha), os Gurkas (Nepaleses ao serviço dos britânicos) ou ainda os Guardas Suíços do Vaticano. Porém, estes regimentos não são considerados formalmente como mercenários. 

Na realidade, os mercenários atuais têm um vínculo exclusivo a uma empresa, a qual os recruta, os equipa e os coloca no terreno, a troco de pagamento pela potência estatal. Esta, pode assim desencravar-se de uma situação difícil, ou em que não obteria o aval dos cidadãos e/ou dos parlamentos, para levar a cabo os seus desígnios. Os cenários de conflito protagonizados por mercenários, recentemente, foram os da Rep. Dem. do Congo e doutros países de África. 

A privatização da guerra não é um progresso, sob nenhum ângulo. Em relação às tropas regulares, os mercenários estão menos obrigados pelas leis da guerra. Isto significa que não terão a proteção de serem considerados como «forças combatentes», na eventualidade de serem capturados. Serão considerados criminosos de direito comum. Como sabem que não beneficiarão, em caso de captura, da proteção ou pagamento de resgate pela potência para a qual combatem, talvez isto os incite a ter comportamentos criminosos, em especial, em relação a civis.

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*Veja como Pepe Escobar analisa o complexo jogo diplomático sob auspícios da SCO e envolvendo os Taliban e governo afegão. 

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

O PODER É POR NATUREZA TOTALITÁRIO



Sim, sem dúvida. Embora muitos ainda não o tenham compreendido. Será por isso que muitas pessoas estão em estado de choque prolongado, com tudo o que tem acontecido - pessoal e socialmente- neste ano danado de 2020. 
Não perceberam que o que importa, aos que detêm o poder, não é ter um pedaço, uma concessão temporária, não é obterem o teu consentimento, nem a tua participação, mais ou menos esclarecida... 
Não; para os que detêm o poder, é o poder na sua totalidade que conta. 

Isso mesmo já tinha claramente enunciado, no início do século XVI, Maquiavel, o qual, infelizmente, foi mal compreendido como sendo o «conselheiro de príncipes», para estes fazerem as suas poucas-vergonhas e oprimirem os cidadãos.                  
De facto, Maquiavel não era «maquiavélico»: era um republicano, que amava a sua república florentina, o mais livre e humanista que um espírito podia ser na sua época. Escrevendo o «Príncipe», quis desmontar os esquemas do poder, de maneira não demasiado explícita, de forma a não arriscar a forca... mas, ainda assim, quando os ventos viraram, foi cruelmente torturado.


Não gosto de yes-men, ou de yes-women; são pessoas com índole para «marchar a passo de ganso», seguindo seus chefes, sejam eles Hitlers ou Estalines, ou outros... 
Têm a adoração do chefe, gostam de se submeter, de se humilhar, de se mostrar humildes e agradecidos.
Serão -psicologicamente- como cães, pois nem sequer têm uma humanidade plena, a estatura inteira de homens e mulheres. São produtos de castração mental, da supressão do germe de liberdade, que existe em todos nós, em potência. São produtos do medo, do medo de ser, de pensar, de viver sem um polícia a ditar-lhes o comportamento dentro cabeça...


Leiam CJ Hopkins, é um autor dos EUA, auto-exilado em Berlim. Ele, recentemente, publicou um belíssimo artigo, «Ano Zero». Tenho respeito e admiração por pessoas como ele, intelectuais que incomodam o poder, que não se importam com o que pensem deles, que fazem o que tem de ser feito. Sempre que seja preciso, desmascaram a tendência totalitária dos que estão no poder e dos seus sequazes.


Não irei escrever neste blog, em termos de reflexões pessoais sobre os assuntos que tenho aqui abordado, até ao virar do ano. 
Sei que é arbitrário fazer esta distinção de datas, mas esta pausa é apenas o reconhecimento de que necessito concentrar energias e reflexão, para enfrentar os desafios que se aproximam. 
No plano pessoal, é igualmente um interregno para melhor «afiar a minha pena», porque nunca estou totalmente satisfeito com o que produzo!

Até breve, ao Ano da Graça de 2021!

Manuel Banet Baptista







sábado, 4 de julho de 2020

MAQUIAVEL OU O DISCURSO DO REALISMO POLÍTICO


Encontra-se, neste vídeo (falado em francês), uma descrição sóbria e lúcida da teoria política de Maquiavel, o filósofo político moderno por excelência. 
O facto dos termos «maquiavélico» ou «maquiavelismo» terem conotação claramente negativa, pelo menos no discurso corrente, mostra como a «elite» pretende ocultar a sua própria forma de agir em política. 
Se bem compreendi, a tese do autor deste vídeo seria a seguinte: 
- Se olharmos para a classe política à luz de «O Príncipe» (a obra-prima de Maquiavel), este manual será o revelador da forma como a elite pensa a «arte de governar». Então, poderemos mais facilmente descodificar as suas acções. 
Basicamente, os discursos de circunstância, ou ideológicos dos políticos, são vertidos na matriz da «República» de Platão: A tarefa do poder político consistiria em tornar a sociedade e os indivíduos mais perfeitos, mais próximos do modelo ideal de «república filosófica». 
Porém, o verdadeiro esteio teórico dos políticos - de direita ou de esquerda, liberais ou autoritários - é o realismo político de Maquiavel: Os homens são assim como são; de nada serve tentar mudá-los, deve-se antes aproveitar o conhecimento que temos deles, para os governar. A arte de governar é aquilo que dá a ilusão de que o líder vai ao encontro dos desejos do povo, quando - na realidade - apenas está a manter as condições de exercer o poder.

sábado, 1 de setembro de 2018

MAQUIAVEL ERA ITALIANO...NÃO ESQUEÇAMOS!

Num artigo intitulado «Ministro Savona: o Euro é o plano do Reichsbank alemão de 1940, a Itália devia retirar-se dele!» (1), o GEFIRA  retraça os dilemas e as escolhas da elite italiana, a que está discretamente a puxar os cordelinhos do teatro do poder,  qualquer que seja o governo de turno: de «esquerda», «direita» ou mesmo «populista». 

 É muito interessante notar a enorme divergência das contas correntes entre a Alemanha e restantes países do Euro (ver gráfico, retirado do referido artigo). 
O facto é que este sistema, embora altamente favorável para a Alemanha, não é sofrível pelos restantes países, sobretudo, os que tiveram anos de medidas de austeridade, retracção brutal do poder de compra da população e altos níveis de desemprego e de emigração.

                         

O artigo é extenso e merece ser lido na íntegra. Segundo ele, será a elite italiana que irá determinar o momento do «grande terramoto» da saída do Euro. A população apenas é ouvida e atendidas as suas aspirações, quando isto é compatível com os planos da tal elite. 

Considero que é um artigo muito informativo e bem pensado sobre a relação da Itália com a UE. Resta  tirar as consequências práticas do mesmo, pois o que é previsto para Itália, também terá repercussões importantes em Portugal. 

Neste cenário político-económico-financeiro, caminha-se, ou para o abandono puro e simples do Euro, ou para sua transformação em moeda contabilística, para cálculo do «deve e haver» com o exterior, com a lira a circular novamente no mercado interno do país.  

O artigo termina com o parágrafo seguinte (tradução minha): 
«O establishment italiano compreende que é a classe no poder, não o povo, que gere o país. Que o Euro seja abandonado  ou não, isso não é assunto do povo.  
Se e quando eles decidirem fechar o interruptor do Euro, irão fazê-lo de modo que o público aplauda. Ao fim e ao cabo, Maquiavel era italiano.»

quinta-feira, 14 de junho de 2018

A INDIFERENÇA MATA

      
Veio-me esta reflexão a propósito do artigo de Jonathan Cook, aqui, cuja leitura recomendo.
Com efeito, Jonathan tem razão ao denunciar a armadilha que muitos de nós colocamos a nós próprios, quando queremos «discutir política» em termos de «qualidades e defeitos», da personalidade, duma valoração moral dos actos dos líderes, chefes de estado e governo.

De facto, este ângulo é o que não traz nenhum beneficio para a discussão séria sobre política, pois tem como pressuposto (implícito) que as pessoas que «avaliam» o desempenho destes dirigentes são uma espécie de «consciência do mundo»... Na realidade, a media está sempre a proceder desta maneira nas suas pseudo-análises, o que apenas reforça um determinado estereótipo, uma determinada visão das coisas, que se encaixa por sua vez no «perfil típico» do leitor/espectador deste ou daquele veículo mediático.
De facto, a única análise política madura é a que vai procurar entender o porquê deste ou daquele comportamento, acção, iniciativa, dentro de uma lógica de PODER. Porque política é sinónimo de poder e querer fazer política, é - de uma forma ou de outra - querer impor seu poder, as suas vistas, ao resto da sociedade. A lógica do poder serve-se do discurso moral, dos direitos humanos, etc., mas apenas como outra arma na panóplia das que dispõe para chegar a seus fins. Maquiavel continua - sem dúvida - um marco inultrapassável do pensamento político e da filosofia pragmática da Modernidade. Isto não significa que moralmente sejamos «maquiavélicos» no sentido pejorativo, ou seja, que não nos importemos com a «moralidade» dos meios utilizados, desde que eles sejam bons para servir os fins que nós próprios queremos alcançar! 
A política, sendo o que é, obriga ao REALISMO, ou seja, a vermos o jogo político como jogo onde determinadas forças exercem o poder, de forma ostensiva ou encapotada: são aqueles que «seguram os cordelinhos» do jogo que são os verdadeiros protagonistas; os outros são apenas figurantes, ou «idiotas úteis» manipulados para fazerem os jogos de quem verdadeiramente MANDA. 
O conjunto da media desempenha globalmente um papel de ocultador do jogo dos poderosos, mesmo quando aparenta «revelar» as suas manobras. Apenas algumas organizações totalmente à margem, como Wikileaks, ou alguns «soadores de alarme» como Edward Snowden, têm sido corajosos e têm mostrado as coisas e as evidências das responsabilidades dos líderes.
No geral, os cidadãos do século XXI estão sujeitos a um ecrã de fumo da propaganda e uma «lavagem ao cérebro», que os leva à passividade em relação aos crimes e abusos cometidos em seu nome, lá longe, num «teatro de guerra». Mas, de facto, nem podem argumentar com ignorância, pois a media, não dizendo tudo e deformando muitas coisas, dá-lhes algumas pistas. Hoje ainda é possível (durante quanto tempo?) procurar saber algo mais, para além da propaganda. 
É a indiferença que mais mata, a meu ver: ela permite que os do poder (sejam eles quais forem) possam continuar suas actividades criminosas, abertas ou encapotadas, sem qualquer  receio de serem responsabilizados criminalmente ou até, somente, de perderem as eleições, devido a terem ordenado e cometido os piores crimes.

quarta-feira, 10 de maio de 2017

OS NEOCONSERVADORES E O GLOBALISMO

                                   https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/77/Machiavelli_Principe_Cover_Page.jpg



A história dos neocons escrita por Paul Fitzgerald e Elizabeth Gould é um manancial de informações valiosas sobre o chamado Estado profundo, nos EUA. Esta história explica-nos como é que um pequeno número de trotsquistas se converteu em servidor da máquina de guerra, que foi - desde o início da Guerra Fria - a propaganda do chamado «Mundo Livre» e o importante empenhamento de todas as estruturas civis e militares do Estado americano, em sucessivas etapas, até hoje em dia. 
Não se pode compreender muitas das escolhas políticas dos últimos tempos, sem ter em conta a influência das doutrinas «neocon» sobre os decisores políticos americanos.
Os quatro artigos começam com o passado recente, nomeadamente, a quase surreal campanha anti-russa, durante a campanha presidencial que levaria à eleição de Donald Trump e a continuação obstinada da mesma, até hoje.

Talvez a demissão supresa do chefe do FBI, Comey, possa ter algo a ver com isso.
Apesar de tantos nomes que surgem associados à corrente designada por «neoconservatismo», os autores dão um papel especial a James Burnham. Pessoalmente, não sabia nada sobre esta eminência parda antes de ler este artigo. Mesmo nos EUA, talvez só um punhado de pessoas saberá identificar Burnham como um dos principais «neocons».


O pensamento político e filosófico dos neoconservadores é maquiavélico, anti-democrático, despreza totalmente valores e os direitos humanos. 
O seu objectivo é apenas o poder (neste caso, o poder do Império do capitalismo corporatista), sendo «boas» quaisquer medidas que o aumentam. 
A Europa está claramente destinada a ser vassalizada, como tem sido aliás, de acordo com o credo «neocon». 
Ao fim e ao cabo, trata-se de um pensamento totalitário, mesmo que não proponha a eliminação pura e simples de qualquer liberdade de expressão ou de organização independente. 

Este globalismo agressivo e elitista tem em conta as lições de Bernays e joga com o «soft power», ou seja, uma penetração cultural através da qual leva as pessoas a adoptarem valores e juízos de valor bem definidos, mas sem dar a impressão de estar a fazer «lavagem ao cérebro».