sábado, 8 de julho de 2023

SCOTT RITTER DÁ ENTREVISTA ESCLARECEDORA

NB: Desde os primeiros tempos deste blog que tenho publicado sobre a Ucrânia e o renovo da guerra-fria no continente europeu. Convido os leitores a pesquisar neste blog, usando palavras-chave relevantes como «Ucrânia», «Rússia», «OTAN» etc.


Scott Ritter: Cobardia dos líderes do Ocidente, em especial dos EUA, ao  sacrificarem o povo da Ucrânia na guerra contra a Rússia, não arriscando intervir abertamente com suas tropas. 
Scott Ritter fala sobre a forma como a Operação Militar Especial ocorreu e o papel dos países da OTAN na rutura do acordo já negociado com o governo Zelensky nas conversações (Turquia, em Março 2022).
Scott Ritter dá vários esclarecimentos  sobre...
- O papel do agrupamento Wagner na resistência das repúblicas do Donbass e depois na Operação Militar Especial. 
- O jogo de Prigozhin a partir do momento em que já não podia ter, oficialmente, o agrupamento Wagner nas repúblicas de Donetsk e Lugansk, que integraram a Federação da Rússia, pois a lei russa proíbe que sejam usadas tropas mercenárias no seu solo. Estava previsto estes mercenário serem recrutados como voluntários pelo exército russo e inseridos em unidades regulares.
- Descreve o esquema corrupto de gestão e de recrutamento dos mercenários de Wagner por Prigozhin.
Scott Ritter relembra que ele tinha previsto que este Verão de 23 seria de revolução na Europa
- Explica as razões pelas quais as sanções europeias e americanas contra a Rússia foram um fiasco.
                                                 
                                                                       ....



 Veja também uma avaliação da situação por B. de «Moon of Alabama»

sexta-feira, 7 de julho de 2023

O IMPÉRIO DAS LUZES - RENÉ MAGRITTE

 







Existem 17 versões desta paisagem, « O Império das Luzes», do pintor surrealista René Magritte. Nutro uma grande admiração por este pintor, pela sua originalidade que sobressai até mesmo em relação ao vanguardismo noutros surrealistas seus contemporâneos.


As suas telas questionam, colocam o espectador perante um jogo inteiramente mental, por vezes, desencadeando um estranhamento, quase à maneira de Fernando Pessoa*: O estranhamento do quotidiano, da paisagem quotidiana, dos gestos, das palavras.
Esta obra, que eu tive muito tempo pendurada sob forma de «poster» no meu quarto, apela ao nosso sentido visual, como é evidente, mas para além disso, dá-nos uma sensação vaga de inquietude, de insólito pois - num primeiro momento de análise - encontraremos apenas elementos «banais». A casa é banal, como o são as luzes e o reflexo destas sobre o lago, a claridade de um céu com nuvens dispersas, um céu de fim-de-tarde de Verão... Tudo isto é banal.

Menos banal, porém, é o lusco-fusco da cena, ao nível da casa e das árvores, confrontado com o céu azul. Esta justaposição causa uma sensação de insólito inexplicável, não obstante a nossa experiência de paisagens indicar-nos como sendo possível que a cena próxima do solo seja crepuscular, enquanto o céu ainda é iluminado por raios solares, podendo apresentar-se com cor azul clara. Sua luminosidade é acentuada pela presença de nuvens alvas, como farrapos de algodão.

A visualização da paisagem - ela própria - é subjetiva, independentemente do realismo e materialidade banal, «burguesa» do eventual modelo. Pensa-se que o artista utilizou como modelo uma casa realmente existente nos subúrbios de Bruxelas. Este facto, assim como o estatuto ímpar dentro da obra do artista, que não fez outra série de telas sobre um mesmo motivo, além desta, abrem as portas à nossa curiosidade.

Magritte é discursivo, mas ao nível do próprio trabalho de pintor. Ele não diz por que razão fez isto ou aquilo, nem o que estava a pensar quando decidiu representar determinada cena. Ele deixa que os seus quadros «falem» por eles próprios, que mostrem a evidência de uma meditação interior, de um olhar que interroga o real, sem qualquer laivo de «ingenuidade», mas sem concessões a psicologismos ou intelectualismos, como o fizeram outros (surrealistas ou não; contemporâneos ou não).

Em Magritte, o intelecto do observador é provocado a «ler» o quadro, a uma aventura de reflexão mental pura, em rutura com a espessa camada de convencionalismo reinante na sociedade e que interiorizámos sem crítica.


René Magritte é um bom antídoto à sociedade do instante, do convencional, da pulsão hedónica, à sociedade «de massas» que está no exterior e interior de nós próprios, que penetra nas circunvoluções cerebrais de todos nós, sem nos darmos conta.


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*Fernando Pessoa (1888-1935) poeta e filósofo modernista português que dedicou muitas páginas de prosa e muitos poemas à análise de estados de estranhamento perante o real.

quinta-feira, 6 de julho de 2023

A BANDA QUE CARACTERIZA O SOM DOS ANOS 60: THE ROLLING STONES

 





Podia alinhar umas cinquenta faixas dos Stones dos anos 60. Canções, pelas quais merecem ser lembrados como o grupo de rock mais selvagem e mais cool dos anos 60. Eles continuaram e nem sempre estiveram à altura da banda que tinham sido, no passado. De qualquer maneira, estas minhas 4 escolhas são apenas a expressão do meu gosto pessoal. 

Muitos de nós, adolescentes dessa época, nos fartámos de dançar ao som dos Stones. Sei que os da minha geração gostam de regressar ao ambiente sonoro desse tempo!

PRIGOZHIN E A SECUNDARIZAÇÃO DA EUROPA por Alastair Crooke

   Prigozhin gosta de se exibir de camuflado embora nunca tenha sido militar!


O artigo abaixo, de Alastair Crooke vale a pena ser lido na íntegra:

 https://strategic-culture.org/news/2023/07/03/prigozhin-and-the-diminishment-of-europe/

Traduzi algumas frases em português, abaixo, para dar aos leitores uma ideia do seu conteúdo. Porém, tem muito mais reflexões interessantes:

A Europa, em resumo, colocou-se a si própria como vassala – uma vassala voluntária e submissa. Quando a UE seguiu os EUA e adotou as sanções contra a Rússia, os líderes da UE anteciparam um rápido colapso financeiro da Rússia. Estavam enganados. Quando a UE - sem cuidar dos seus interesses próprios - negou a si mesma a compra de combustíveis russos, calcularam que a Rússia não conseguiria aguentar-se economicamente - na ausência do mercado da UE - e que iria capitular rapidamente. Estavam enganados. Quando a OTAN lançou a guerra sobre a Rússia (via Ucrânia), a UE esperava a rápida derrota das forças russas e das milícias do Don. Estavam enganados. Quando Prigozhin desencadeou a sua 'insurreição', os líderes da UE esperaram ansiosos que se seguisse uma imediata guerra civil. De novo, estavam enganados.

Agora, a UE encontra-se arramada a sanções, sem fim à vista, contra a Rússia (e com sanções contra a China a seguir); um subsídio eterno a Kiev; um eterno ciclo da militarismo da OTAN; e uma economia em vias de desindustrialização, elevados custos energéticos e dificuldades de abastecimento. 

terça-feira, 4 de julho de 2023

O FIM DO EXORBITANTE PRIVILÉGIO



04/07/2023

O regime presidido por Joe Biden não tem muito que ver com a imagem idealizada dos EUA, que hoje comemora mais um «4 de Julho», dia da Independência da antiga colónia, em relação à coroa britânica. 

Não há dúvida que estamos num virar de página da História, para os EUA e para o chamado mundo Ocidental.

Os escândalos amontoam-se, a corrupção generaliza-se, as leis são ditadas ao sabor dos grandes conglomerados de interesses agrupados em lobbies.  

Ao nível internacional há uma fuga dos mais fiéis aliados, virando-se para países  como a Rússia, a China e outros que dispõem de potencial militar e capacidade económica para dissuadir  qualquer presidente dos EUA (ou antes, os que mexem os cordelinhos em seu nome), de outra guerra, direta ou por procuração.

Os instrumentos habituais de relacionamento dos países uns com os outros, são: o comércio, a diplomacia e as relações multilaterais. Os horizontes destes três campos vão-se estreitando, de ano para ano, em relação aos EUA e seu governo. 

Estes, e muitos outros aspetos, indicam que se está no final de um ciclo. Ele surge com toda a clareza com o fim do dólar enquanto moeda de reserva universal e principal moeda das transações internacionais, comerciais e financeiras.

Porém, estes fatores não se podem analisar isoladamente. Tem igualmente de se evocar  em todo o «Ocidente» e em particular, nos EUA,  a retração do domínio da liberdade de expressão, do direito de se ter opinião própria, mesmo que esta negue a do governo, mesmo que esteja em contradição com a opinião da maioria. 

Com efeito, os ataques à liberdade de expressão e difusão do pensamento acabam por ter um efeito duplo: São, por um lado, a demonstração óbvia da falsidade de que são uma democracia, perdendo o seu regime apoio interno e - sobretudo - ao nível internacional. Por outro lado, fazem com que muitos indivíduos em altos cargos, públicos ou privados, tenham uma visão distorcida da realidade. Isto está na origem da multiplicação de decisões equivocadas ou francamente estúpidas, em diversos assuntos de importância fundamental para o regime..  

O fim do privilégio exorbitante, expressão primeiro usada pelo ex-presidente francês Giscard D'Estaing para caracterizar o estatuto de moeda de reserva do dólar dos EUA, parece não inquietar a classe política corrupta e pouco preocupada em disfarçar a sua corrupção. Ela parece só estar preocupada em exercer o poder para encher os bolsos, com dinheiro público, ou com doações (luvas) privadas ou de empresas. Quanto ao dinheiro público, ele é distribuído de acordo com os grandes interesses e sem qualquer controlo, beneficiando as grandes corporações da indústria farmacêutica ao armamento e às «novas tecnologias».

Mas não podem realmente impedir o facto de um novo sistema monetário internacional estar a ser construído, entre vários parceiros, com a garantia de que nenhum destes se aproveitará de uma posição de destaque ou dominância nas trocas comerciais ou com os seus trunfos estratégicos, para impor às outras nações um «diktat». 

Foi exatamente o que os EUA decidiram fazer com o dólar, a partir do momento em que julgaram que detinham a primazia, de que só eles tinham os meios e a «legitimidade» para impor ao resto do mundo a «rules made order» (ou seja; a ordem deles, feita com as regras ditadas por eles). 

É um caso típico de húbris, que lhes está a sair caro, pois os seus competidores e mesmo seus aliados compreenderam o perigo da instrumentalização do dólar: A brutal guerra económica contra a Rússia, em Fevereiro / Março de 2022, já estava a ser preparada de longa data. Se a Rússia não tivesse tomado, por sua vez e com grande antecedência, medidas para minimizar os ataques desenfreados das sanções, punitivas para toda a sua economia, estas teriam feito muito mais estragos à economia e ao povo da Rússia. Muitos acordaram e perceberam que os EUA eram capazes de fazer o mesmo com qualquer país que - em dado momento - não se conformasse com o seu domínio hegemónico. Foi assim que, os que governam os EUA, eles próprios enterraram o dólar. Conseguiram fazer com que o dólar deixasse de ser a divisa que todos gostavam de ter, para ser aquela da qual todos se querem ver livres, o mais depressa possível.

Está-se perante um notável exemplo de autoderrota duma grande potência. Isto é um caso de húbris, por terem avaliado erradamente o seu poderio, por acreditarem na sua própria propaganda. Isto diz-nos muito igualmente, sobre as «elites» do poder nos EUA.   

O RENOVO DA FILOSOFIA NATURAL

 

         Figura: simbolismo tranquilo de paisagem holandesa, séc. XVII 

Eu sinto que é necessário eclodir um novo ramo da grande árvore naturalista. Um ramo que pode florescer em meio das estruturas falsamente «inteligentes» e que nos cercam e mesmo nos invadem por todos os lados. 

Já não chega, com efeito, a resistência natural dos seres vivos e mesmo dos humanos, enquanto organismos. Na realidade, o que de positivo se poderia extrair de «progressos científicos e técnicos» neste novo milénio, foi desviado, quando não mesmo anulado, ou subvertido, pela civilização da ganância, do hedonismo e do individualismo exacerbado. Estas três características são apenas diferentes facetas dum fenómeno global de desorientação, decadência e desequilíbrio nas nossas  sociedades tecnologizadas, a saber:  

A ganância é o desejo de enriquecer e acumular riqueza por cima de quaisquer considerações éticas ou morais. Note-se que não considero o desejo de enriquecer, em si mesmo, como um mal. Mas, se as pessoas fossem formadas dentro de padrões de equidade e justiça (o que não acontece, antes pelo contrário) iriam naturalmente considerar que o facto de serem ricas, ou de terem enriquecido, se deve em grande parte, a estarem numa sociedade que lhes  proporcionou as coisas básicas, a própria organização social, sem o que os seus esforços teriam sido fúteis. A maior riqueza implica maior responsabilidade social, implica ter-se em conta a adequação do que se faz com o dinheiro e com  o poder daí decorrente. Isto seria a lógica de indivíduos que foram educados para internalizar certos valores. Pelo contrário, pessoas que não têm uma escala interna de valores acabam fatalmente por pensar que são ricas «porque o mereceram», etc.

Na escala individual, o hedonismo campeia, como forma predominante de comportamento, nas sociedades mais afluentes, mas também nas outras, com uma adoração de quem é rico, tem sucesso, tem fama, tem exposição mediática, etc. 

Este tipo de mediatização da vida pessoal chega ao ponto de uma «mise en scène» da própria vida pessoal e familiar, para se enquadrar dentro do imaginário da multidão adoradora do ídolo.  A media de «massas» é a principal promotora desta despudorada exposição da vida particular das «estrelas» (sejam de cinema, de desporto, de política, de empresários, dos membros de casas reais, etc.). Mas, não seria possível ela fazer este «trabalho de coscuvilhice», se as pessoas, que são o objeto dessa curiosidade, não se prestassem de bom grado ao jogo, não «abrissem as portas», por um lado; por outro,  este jornalismo vai ao encontro do desejo do público, ávido de intriga, de «ver pelo buraco da fechadura», ávido de conhecer as venturas e desventuras dos ricos e poderosos, de as comentar longamente, imaginando-se membro ou, pelo menos, frequentador dessa «elite».

O individualismo exacerbado é dado como «modelo» de comportamento. A ideologia de massas vai buscar todos os casos de «sucesso», que são invariavelmente descritos como a «gesta heroica» de um indivíduo, forçando o destino e finalmente recebendo o justo triunfo e recompensa pela sua persistência etc. Este discurso é um panegírico muito comum nos empresários. Têm todos eles uma característica; a de que «saíram do nada». Mas, também serve o propósito de mitificar a carreira de académicos, de médicos, de políticos, de artistas, etc. Portanto, nesta ideologia, o sucesso é tudo e assim tem-se as maiores nulidades promovidas a modelos de comportamento, de bom gosto e de virtudes!

Seria fácil atribuir isto tudo ao capitalismo, só que tal não decorre automaticamente do capitalismo, ou doutro tipo de organização económica e política da sociedade. Decorre do abandono da ligação do homem, dos homens organizados em sociedade, com a Natureza. 

Com efeito, este divórcio deu-se bastante cedo, na história da humanidade. Mas, embora a tecnologia inventada e desenvolvida, tenha sido sofisticada em vários domínios, desde a mais alta antiguidade, a vida em sociedade era ainda regida pelos ciclos naturais: As pessoas comiam o que a natureza lhes dava, na estação em que ela lhes dava; a agricultura era uma imitação da biologia e da ecologia; não a radical artificialidade, pondo as plantas e os animais em condições antinaturais, como hoje em dia, praticamente em todas as sociedade humanas (desenvolvidas, ou «em desenvolvimento»). 

Hoje tornou-se evidente, a humanidade está a ser acorrentada pelas invenções ou gadgets que alguns inventaram. Os que fabricam estes objetos tecnológicos dirão que eles trazem conforto, prazer, saber, velocidade, etc. Eles querem vender o máximo de produtos... nunca irão desvendar os aspetos negativos; porém, o público desejoso de consumir estes objetos, «esquece-se» de verificar minimamente se as promessas publicitadas, são reais ou apenas uma forma de publicitar o produto, «vendendo sonho».

A humanidade já não está em ligação com o mundo natural, na sua imensa maioria, pois uma maioria dos humanos habita em grandes cidades; outros, habitarão em centros urbanos mais pequenos, mas podem - numa proporção variável - estar tão «mentalmente urbanizados» como os primeiros. Sobretudo, a vida urbana com sua escravidão assalariada, a agressão à saúde e ao equilíbrio humano,  o gigantismo e  fealdade predominante do espaço urbano, etc. é ainda tida como local de vida «ideal», sobretudo pelos habitantes das áreas menos urbanizadas, ou rurais, que restam. Todos - ou quase - anseiam ir para a grande cidade, vista apenas pelas oportunidades, nunca vista através do prisma da exploração desenfreada e da vida antinatural.

Existe algum desejo de subtração a este ambiente urbano e à artificialidade do seu modo de vida mas, em muitos casos, este desejo permanece não realizado; noutros, as tentativas para viver em espaços rurais falham, porque as pessoas foram para lá com visões românticas do que é viver no campo, como agricultores. 

Em qualquer dos casos acima, trata-se duma pequena minoria. Enquanto a imensa maioria das pessoas urbanizadas anseia «estar no campo», mas em férias, apenas. Trazem para o espaço rural o modo de vida urbano («as casas de férias»), fazendo curtas estadias periódicas, numa transumância sazonal das famílias, sobretudo em estâncias de férias na costa, zonas  hipertrofiadas no Verão. São vilas e aldeias inicialmente rurais ou de pescadores, agora apenas vivendo de e para o turismo. 

Mas a Natureza embora esteja doente em muitos sítios é, sem dúvida, mais forte que as «civilizações», que apenas se interessam em extrair dela as matérias-primas, o rendimento, em pô-la a produzir como se duma fábrica se tratasse. A cura para os múltiplos males sociais que assolam a humanidade, não a tenho. Nem creio que alguém -seriamente - a possua. Certamente não a possuem, aqueles que se fazem arautos de filosofias ou ideologias de pacotilha, que aproveitam a moda ecologista, mas são destituídos de conhecimento científico. No fundo, são meramente políticos que se apropriam de slogans ditos «verdes», para melhor deterem as rédeas do poder (e os lucros daí decorrentes). 

Eu, antes de mais, procuro para mim próprio uma filosofia de vida: Um modo de ser e de estar, que seja compatível com as poucas verdades que eu reconheço, como sendo uma base válida para nortear o meu comportamento. Nesta medida, não proclamo que encontrei a solução para os problemas que afligem a humanidade. Tenho algum conhecimento, muito incompleto, dos modos como as sociedades funcionam, como se organizam, como produzem, com se distribuem no espaço, como se sustentam e se destroem a si próprias. Mas, de forma muito incompleta e com muitos erros, pois tenho de me basear por um lado, na experiência própria limitadíssima da sociedade, por outro de recolha de dados transmitidos por outros que - consciente ou inconscientemente - segregam sua visão do mundo (ideologia), ao descreverem os fenómenos sociais.

A filosofia natural parte do reconhecimento de que  Natureza tem um grau de complexidade e sofisticação enormes. Que encontrou soluções de adaptação a vários ambientes, com as suas características físicas próprias e com as comunidades de organismos que aí se encontram e vivem, sem «ajuda» humana de qualquer espécie. É também saber-se «ouvir» os animais e plantas, inclusive os «animais humanos» (e nós próprios), não para tirar daí «lucro» ou vantagem, mas para harmonizar o nosso comportamento, para estarmos inseridos harmoniosamente no Todo que é o Universo.

É uma religião, no sentido de re-unir o Homem com o Todo. As grandes religiões fazem isso, ou fizeram-no numa etapa da sua História, tendo sido reconhecidas como tal pelos que as fundaram, as expandiram e as seguiram. As ideologias, como reduções da «ciência» para servir de meio de alcançar o poder e de o manter, são «religiões», mas no sentido negativo de obscurecerem o relacionamento dos humanos com a Natureza e com o Divino. 

Se Deus é universal, se está em todo lado, se é omnisciente, se transcende tudo o que o espírito humano consegue conceber, então a Natureza é outra forma de designar Deus. Ela está em nós e fora de nós. Está nas estrelas e galáxias, assim como na profundeza dos oceanos e em todo e qualquer lugar que queiramos investigar. Queres respeitar a Natureza, então respeita-a como Divina, não a reduzas a objeto conveniente, ou a fonte de lucro. As relações entre os homens estão subvertidas, porque a relação dos homens com a Natureza e com Deus está subvertida. Só pode haver um progresso verdadeiro, se este progresso for para todos e isto engloba as gerações vindouras. Mas, este o falso progresso é depredador, faz-se à custa da capacidade de regeneração do ambiente e, portanto, das gerações vindouras. A orgulhosa civilização tecnológica mundializada, que nos aparece como «o progresso», não é mais do que a exacerbação do violar das leis naturais e divinas. Esta destruição é não criativa, ou seja, é uma depredação, em especial dos ecossistemas mais produtivos, em abundância e diversidade. 

Pare-se de chorar «lágrimas de crocodilo»,  a hipocrisia que consiste em afixar uma ideologia «verde» ou «ambientalista», para as pessoas se «sentirem bem com as suas consciências» e faça-se o que é necessário e possível, para se subtraírem a vós próprios, mas também ao vosso entorno (família, vizinhos, colegas...) a ideologia que mina e destrói irreversivelmente a capacidade de regeneração da vida.

Viver com consciência é, sobretudo, viver em função dum conhecimento do papel que tenho na Natureza. Quanto mais profundo for esse conhecimento, quanto melhor desempenho o papel que julgo ser o meu, melhor me sinto. Eu julgo que este sentimento é partilhado pelos humanos; senão por todos, por uma grande parte deles. É por isso que mantenho a esperança, apesar deste presente de regressão e degradação civilizacional, de que somos testemunhos.