segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Músicas dos Filmes de Charlot (Segundas-f. Musicais, nº12)

Charlie Chaplin, todos conhecem... mas, talvez só superficialmente. Como todos os génios, ele tinha imensas facetas. Não somente era o argumentista, realizador e ator principal dos seus filmes, como também produziu uma boa parte das músicas que acompanham a evolução das cenas no écran. Nesta pequena amostra, são do próprio Chaplin 6 das 8 composições selecionadas. 
As 2 composições que não são de Chaplin são «La Violetera», uma habanera que estava na moda cerca de 1914 (vídeo 2), e a popular «Dança Húngara nº5» de Brahms (vídeo 6). 

Chaplin escreveu muitas outras músicas para seus filmes; eu apenas quis dar uma amostra de como ele utilizou o seu talento de compositor para pôr em relevo as cenas, cómicas ou românticas, nos seus filmes.
Chaplin, em sua carreira bastante longa, soube manter uma qualidade e originalidade das obras, absolutamente ímpares. Não conheço toda a obra de Chaplin, alguns filmes do princípio são difíceis de encontrar. Mas, o que conheço, deixa-me maravilhado: As câmaras de filmar e outros meios técnicos eram bastante primitivos, se comparados com os de hoje. Porém, com a sua arte, conseguia obter efeitos cénicos de uma comicidade total.

1/
Célebre tema de Limelight: Música original do filme.
 Muitas pessoas conhecem este trecho romântico, mas nem todas sabem que é o tema musical  de Limelight /Luzes da Ribalta*.



"La Violetera" (City Lights): Chaplin aproveitou a habanera célebre (de José Padilla), para uma cena comovente com a vendedora de flores cega, no filme City Lights

3/
https://www.youtube.com/watch?v=o9NfXIXzgnA
(City Lights/ Boxing Match. A cena de boxe é de um cómico absolutamente irresistível )

4/
https://www.youtube.com/watch?v=6n9ESFJTnHs
(Tempos Modernos, Cena na Fábrica)

5/


( Tempos Modernos - a Dança e a Canção Absurda)
(O Grande Ditador: No Barbeiro - Dança Húngara)


7/
(A Corrida ao Ouro: A valsa dos Sapatos)

8/
       (
Condessa de Hong Kong: This Is My Song)
- Versão instrumental:
- Versão vocal (The Seekers):

...............

Os vídeos acima foram agrupados numa PLAYLIST, clique em MUSIC FROM CHAPLIN MOVIES

(*) O filme Limelight, Luzes da Ribalta, contém uma cena com Buster Keaton, de humor surrealista, inesquecível: Já foi reproduzida esta cena no nº1 da série "Segundas-f. Musicais".

domingo, 11 de agosto de 2024

OPUS VOL. III 21: AGUARELA


O pincel desloca-se suavemente sobre o papel branco

Este absorve a tinta fixando espirais de cinzento

Recolhe mais tinta no tinteiro; aplica curtos traços

Nos intervalos brancos do papel; surge uma figura

Uma paisagem, um céu que se destacam do fundo

Como se sempre lá estivessem, mas invisíveis

Esta arte de pintar é toda em subtileza

A mais ambiciosa, na modéstia dos meios usados

Não admira que vejam nela meditação profunda.



Os esfumados que nos dão a espessura, os vazios

Que se enchem de luz, as linhas apenas sugeridas,

Os relevos de corpos gráceis ou pesados

As humanas formigas que descem a colina

Encosta abaixo, até aos telhados de colmo


Arte pensada, imaginada, antes de executada

Toda ela tensão entre o interior e o exterior

Poesia realista e onírica que mais aprecio

Mas que nunca alcançarei!

ORIGEM DA VIDA E DESÍGNIO INTELIGENTE

 



Comentário: Dentro das formulações evolucionistas, são dados exemplos como o da convergência entre os olhos dos cefalópodes e os dos vertebrados, que chegaram ambos por vias distintas e independentes a uma sofisticação elevada dos seus respetivos órgãos da visão. Os «finalistas» dizem que não fazem sentido em si mesmas as pequenas modificações que terão ocorrido em estruturas como os olhos destas duas ordens de seres vivos: Só fazem sentido em função  de um plano geral pré-estabelecido.
Os evolucionistas «darwinistas» fazem notar que pequenas modificações podem ter um significado em termos da aptidão (fitness) dos indivíduos; que uma zona fotossensível, inicialmente apenas capaz de distinguir entre luz e escuridão, pode ter beneficiado de aperfeiçoamentos como a existência de uma lente, ou de um sistema muscular permitindo orientar a visão. 
Os biólogos moleculares põem em destaque as propriedades catalíticas e autocatalíticas das estruturas secundárias formadas em vários tipos de ARNs. Por outro lado, as zonas de dupla cadeia - presentes em ARN mensageiros e de transferência - podem servir como zonas de codificação, visto serem mais estáveis que as de cadeia simples. 
Estou de acordo que a reconstituição das etapas da evolução pré-biótica não podem ser simuladas. Porque as condições iniciais do meio no qual estas moléculas evoluíram são praticamente desconhecidas; podemos fazer conjeturas sobre essas condições, apenas. 
Mas, isso não significa que o «texto» significativo de um gene tivesse de ser construído de uma vez, como por efeito «mágico». Além disso, as considerações sobre sistemas contendo mensagens com sentido e sua produção deliberada por entidade inteligente, não passam duma abordagem (nem sequer analógica) «mítica», do processo. 
Um dos autores entrevistados (Stephen Meyer) põe em causa que se exclua a hipótese do «desígnio inteligente» de forma apriorística. Mas, na verdade, o tal desígnio inteligente teria um modo de proceder bem retorcido: Ele, tendo a noção do que pretendia obter, entreteve-se, durante biliões de anos, a fabricar formas abortadas, becos sem saída, cujos frutos não chegaram até nós, quer sob forma de seres vivos, ou dos seus descendentes. 
Creio que o «desígnio inteligente» não explica nada, embora possa satisfazer o intelecto de certas pessoas. 
O outro entrevistado (James Tour) aponta a impossibilidade de se reconstituir um ser vivo a partir dos seus componentes químicos: Mesmo que se dispusesse de todos os componentes isolados em frascos, na sua forma pura. Ora, os componentes da vida não coalescem a partir de peças isoladas como «um puzzle» ou «uma construção de Lego», mas constroem-se a si próprios. 
Os cientistas entrevistados possuem um extenso conhecimento das pesquisas experimentais levadas a cabo no século passado, para aclarar as etapas pré-bióticas.  Estou de acordo com eles, quando dizem que os processos foram pouco adequados para modelizar as tais etapas. Mas acho que, mesmo assim, valeu a pena realizar tais experimentos. 
Vejo essa utilidade - por analogia - com a síntese química da ureia por Liebig, no séc. XIX: Essa descoberta invalidou a tese da irredutibilidade do orgânico ao químico, segundo o paradigma vitalista então muito em voga. 
Note-se que as experiências em meados do século passado, de Miller, Urey, e outros, vieram mostrar que não é impossível serem geradas moléculas simples como os aminoácidos (blocos constituintes das proteínas) em condições abióticas parecidas com o que se pensava ter existido na Terra primitiva. Além disso, não provaram coisa nenhuma.
As críticas dos dois cientistas às metodologias predominantes nos estudos sobre abiogénese  é -mesmo assim - muito interessante, na medida em que contradizem os consensos preguiçosos da (má) vulgarização científica, incluindo no ensino secundário e universitário. 
Só isso, já é um grande mérito desta conversa!

PS1: Conferência por Jack Szostak. Enumera alguns avanços em química pré-biótica de ARNs :

quinta-feira, 8 de agosto de 2024

O BITCOIN NÃO É SUBSTITUTO PARA O OURO


Retirei o gráfico nº1 de um artigo de Alasdair Macleod «Fool's gold and gold». Nele, é analisado o último crash bolsista, induzido pela súbita subida da taxa de juro das obrigações soberanas japonesas, que anteriormente se encontravam virtualmente ao nível zero. Esta mudança fez com que o «carry-trade» Yen-Dólar deixasse de ser rentável. Este processo durou décadas, sendo protagonizado por bancos e especuladores financeiros, que pediam emprestado em yens (a bancos japoneses ou a outros que os tivessem), para depois os trocarem por dólares e os investirem, obtendo uma confortável margem de lucro. Este processo implicava que o empréstimo de Yen fosse quase gratuito (como tinha sido durante décadas devido a juros quase nulos das obrigações do Tesouro japonesas). Isto permitia embaratecer, de forma considerável, operações recorrendo ao crédito.

Com a cessação brusca e não anunciada de tal «carry trade», muitas apostas ficaram a descoberto, nomeadamente nos «casinos bolsistas». Os que se encontraram de repente a descoberto, tiveram de cobrir seus déficits com a venda de ações tecnológicas e de bitcoins.

Verifica-se portanto que o bitcoin, tal como noutras ocasiões, se comporta do mesmo modo que o índice NASDAQ.


E quanto ao ouro? na figura nº2, abaixo, verifica-se que o ouro (preço expresso em euros) sobe no mesmo período de forma mais regular que o NASDAQ. Os recentes movimentos foram de descida, porém muito mais suaves que do NASDAQ e do BITCOIN. 



É evidente que perante um crash tão grande, como o que ocorreu a partir do início de Agosto deste ano, o ouro teria de baixar um pouco, pois também terá servido para cobrir perdas nos mercados bolsistas. Porém, perdeu numa proporção muito modesta. 

Na tabela seguinte, verifica-se que houve uma pequena descida, correspondente ao crash da semana passada, mas seguiu-se uma rápida recuperação, nesta semana (dados colhidos a 08/08/2024):

 

cotação do ouro em dólares USgold_performance_chart
                     

De novo, pela enésima vez, o ouro consegue conservar o seu valor perante as mais diversas divisas, apesar das bolsas mundiais terem sofrido um recuo acentuado no valor de muitas ações, perdendo algumas delas todos os ganhos obtidos desde o início do ano de 2024. 

Eis porque o bitcoin nunca poderá ser equiparado ao ouro (dizem que é «como ouro», que é «o ouro do século XXI», etc): 

O bitcoin comporta-se como uma ação tecnológica cotada no NASDAQ. O bitcoin ACOMPANHA as descidas das bolsas. O ouro, por contraste, não está correlacionado com ações (a não ser com ações de minas de ouro, claro!); tem muita estabilidade; tem procura em todo o Mundo; no médio e longo prazo é o ativo monetário mais estável, batendo divisas, obrigações, índices bolsistas e outras aplicações financeiras. Alguém que conheça um pouco do mercado do ouro, sabe que ele constitui o melhor refúgio, permitindo a conservação do valor, especialmente em tempos tão conturbados como os de hoje.

terça-feira, 6 de agosto de 2024

QUANDO MORRE UM ANCIÃO OU ANCIÃ, É COMO SE ARDESSE UMA BIBLIOTECA

  Todos ouvimos falar da biblioteca de Alexandria e do seu incêndio, que teria sido provocado (acidentalmente) pelos soldados de Júlio César  em guerra com o Rei Ptolomeu do Egipto. Este incêndio teria transformado em fumo e cinza uma boa parte do saber da antiguidade, encerrado nos seus livros. Não sei se isto é rigorosamente assim; mas o que sei é que - mesmo na antiguidade - havia cópias de tratados de História ou Geometria, de livros de poesia, de peças teatrais, etc. Não eram muitas, essas cópias, eram raras, pois tinham de ser feitas à mão, em pergaminho ou em papiro...

Já no caso da sabedoria e conhecimentos acumulados pelos anciãos, não é muito fácil manter a continuidade. Nas sociedades que não conheciam a escrita, os saberes eram baseados no ato de decorar. Podem assim os poemas épicos ter sido reproduzidos de geração em geração, caso da Ilíada e Odisseia, mas também as lendas de muitos povos, desde as sagas nórdicas, aos ciclos de narrativas em povos subsaarianos. 

Mas, este processo é bastante difícil de se manter e a degeneração do conteúdo ocorre ao fim de um certo número de gerações. Se a transmissão oral ocorreu, em muitas gerações e em diferentes partes do mundo, é porque os povos - ainda sem escrita, ou com incipiente alfabetização - tinham a consciência da importância das narrativas da origem da família, do clã, da tribo, da nação e da humanidade. Estas narrativas, por mais mitificadas que fossem, eram tomadas como base para as pessoas se identificarem com uma dada etnia, uma dada nação. 

O simbólico reinava, no discurso, como no quotidiano, pois os homens nessa época viam em tudo um símbolo, viam entidades divinas nas mais variadas manifestações da Natureza. 

Ora, a cultura predominante, hoje em dia, apenas valoriza o que é novo, o que é jovem. Certamente que as jovens gerações são «o futuro». Mas,  nota-se cada vez mais a ignorância e falta de bases morais sólidas, em boa parte da gente jovem. A impreparação dos jovens tem a ver com duas coisas: A excessiva autoindulgência em tudo o que toca aos saberes, não diretamente ou imediatamente «rentáveis»; a capacidade de fazerem sacrifícios, somente na perspetiva de obtenção de lugar bem remunerado, pela procura dum diploma de prestígio  (mestrados ou doutoramentos). De facto, estão a preparar-se para serem "servos" ou "escravos" um pouco melhor pagos.  Não estão a preparar-se - na enorme maioria - para serem autónomos, serem capazes de se estabelecerem por conta própria, exercendo o seus talentos em benefício da comunidade, e não de um empresário ganancioso. 

As pessoas de mais idade adquiriram - através da sua experiência de vida e porque tiveram ocasião de aperfeiçoar os seus saberes, académicos ou outros - uma visão mais ampla dos problemas, um maior recuo em relação ao momento e também estão muito menos envolvidas em quezílias políticas, em lutas para alcançar o poder. Não têm, em geral, um comportamento de concorrência em relação a pessoas jovens; muitos, apenas gostariam de os ter como amigos ou aliados.  

A falsa civilização impulsionada pelo neoliberalismo (que não é novo, nem é um liberalismo, diga-se) produziu uma sociedade egoísta, individualista, onde as pessoas estão centradas apenas em aspetos materiais. Também produz pessoas ignorantes de muito daquilo que moldou a sociedade. A História, as Artes, a  Filosofia  são geralmente consideradas matérias secundárias, apenas decorativas, servindo para pôr alguns «pozinhos» de cultura, no edifício da ignorância orgulhosa dos doutorados.

Neste contexto, paradoxalmente, embora as nossas sociedades sejam «letradas», cresce a ignorância. O analfabetismo que se observa é um «analfabetismo funcional», quase nunca se observam pessoas jovens analfabetas, «sensu stricto».

Esta ignorância serve os poderosos; pois ignorar a História é ficar condenado a repeti-la; ignorar a Filosofia é não distinguir os sofismas e não ser capaz de discorrer de modo lógico, racional sobre um assunto; quanto à Artes, a sua ignorância significa que os seus sentidos e intelecto estão ao nível do animal; não podem ter prazeres elevados, pois não conhecendo as subtilezas dessas Artes, a sua capacidade de apreciação estética é diminuta.  

Os senhores deste mundo gostam disso; têm sob seu controlo massas de pessoas não muito instruídas; só o suficiente para fazerem as tarefas que a empresa lhes ordenou. Não têm qualquer visão ampla; isso foi desencorajado na educação e no entorno social. 

Os idosos são vilificados, não se pensa neles senão como um «estorvo», uma «despesa». Para uma boa parte dos jovens,  o que os velhos têm para dizer não lhes interessa, mesmo os velhos da sua família. 

O segundo paradoxo, é que em geral os velhos são desprezados, já não se lhes reconhece a sabedoria que lhes era atribuída tradicionalmente. Não que os velhos fossem/sejam sempre pessoas de grande sabedoria ou lucidez. Porém, acontece que - em lugares de topo nas empresas ou nos Estados - encontram-se velhos, muitos têm mais de 60 anos de idade, mas estes são reverenciados, pelo poder que alcançaram. 

De facto, o «agismo», o avaliar as pessoas pela sua idade e não pelo que valem - quer sejam jovens, de meia idade, ou idosos - vai ter que acabar devido à enorme contração, em muitos países, dos nascimentos A pirâmide etária resultante é completamente  anormal: As camadas etárias jovens são demasiado estreitas e as mais velhas, dilatadas. 

Não se pode facilmente mudar um padrão cultural de consumismo desenfreado, de egoísmo, de hedonismo, que leva muitos casais a não querer ter filhos. Também é impossível (ou seria monstruoso) eutanasiar os idosos. Sendo assim, é preciso a sociedade valorizar - na sua justa medida - os velhos. Sendo eles os mais frágeis, precisam de maior proteção social. Mas, por outro lado, podem contribuir - com sua experiência e sabedoria - para a resolução de muitos problemas. 

A sociedade e os indivíduos devem aprender ou reaprender a estimar as gerações mais antigas.