segunda-feira, 2 de novembro de 2020

OS CONFINAMENTOS (LOCKDOWN) ESCONDEM UMA POLÍTICA DE TOMADA DE PODER DOS ULTRA-RICOS

 O impedimento do debate científico, mormente em assuntos de grande relevância social, deveria ser um sinal de aviso de que uma nova vaga de intolerância e de censura se está a levantar nos países que têm sido os arautos da «democracia liberal», EUA, Canadá, Reino Unido, Austrália, Europa e alguns outros. Sunetra Gupta é epidemiologista, Professora de Oxford: denuncia a campanha de intimidação e difamação contra cientistas que questionam a racionalidade dos confinamentos.


Porém, não apenas tem sido censurada a opinião dos mais eminentes cientistas das áreas relacionadas com virologia, epidemiologia, biologia molecular, medicina preventiva, como têm sido postas em prática restrições aos movimentos e direitos dos cidadãos, que não têm qualquer racionalidade e apenas têm como resultado a criação de desespero, de raiva, de muitos casos de mortalidade e do agravamento de doenças crónicas, em resultado do lockdown...

Para qualquer espírito lúcido, a pergunta que se impõe é: 

«A quem isto beneficia?»

A resposta não é linear, mas tem de ir buscar elementos sobre a economia e o modo de agir dos muito ricos (os multimilionários) como Bill Gates e a sua fundação. A oligarquia globalista, reunida no Fórum Económico Mundial de Davos, está naturalmente a favor destas medidas de confinamento, pois vão entroncar com as suas visões do futuro.

E quais são elas? 

- uma «economia verde» que de verde, propriamente só tem o nome, pois se trata de uma desindustrialização (ainda maior) dos países que foram os protagonistas da revolução industrial, há dois séculos atrás,  com consequente regressão dos padrões de bem-estar e de qualidade de vida das multidões. Ainda por cima, eles não dizem, mas compreende-se, que hipocritamente aceitam como tácito que o Terceiro Mundo irá fazer as tarefas insalubres e poluentes, que o mundo dito rico já não quer fazer.

- uma política sanitária com laivos de totalitarismo, pois as pessoas são forçadas a vacinar-se com uma vacina largamente experimental, cujos perigos e contra-indicações são pura e simplesmente ignorados, assim como a instituição de um «certificado imunológico», sem o qual não se poderá viajar, obter determinados serviços, candidatar-se a emprego, inscrever-se na universidade, etc, etc.

- uma concentração total nos principais ramos de actividade económica; o mercado ficará dominado por pouquíssimas empresas, acentuando a desertificação do pequeno comércio e indústria, nos países ditos afluentes. Na realidade, deixarão de sê-lo, visto que se irão transformar em servos cativos de gigantes (Amazon, Google, Walmart, etc...)

- um globalismo exacerbado, que se traduz em ditar as políticas aos Estados, desde instâncias como a ONU e suas agências (OMS, FAO, etc...), cooptadas pelos grandes interesses. No caso da OMS, é conhecida a dependência desta instituição, em relação às «ajudas» dos grandes empórios farmacêuticos e fundações como a de Bill Gates. Mas, algo muito semelhante se passa com  as outras instâncias internacionais, reflectindo os interesses dos muito poderosos, a OMC, o FMI, o Banco Mundial, o BIS de Basileia, etc.

- esta situação global explica a razão por que a media, ela própria controlada pelos mesmos interesses, faz campanha ininterrupta de medo, de pânico, de desenvolvimento duma psicose colectiva nas populações. Este estado de paradoxal uniformidade numa media supostamente «plural», incita as pessoas a retraírem qualquer expressão de curiosidade, de simpatia para pontos de vista diferentes. É um mecanismo bem conhecido em psicologia, quando uma mole de gente aparenta adoptar um certo ponto de vista, as pessoas que não o possuem sentem-se coagidas a ficar silenciosas, a não expressar sequer dúvidas em público, com medo de serem ostracizadas e, nalguns casos, perseguidas e reprimidas.

Estamos perante um quadro de fusão dos governos de uma parte do mundo com as grandes corporações (com maior capitalização do que o PIB da Suíça!), para produzir uma espécie de «governança mundial», que tem sido proposta, sob vários nomes, em documentos oficiais da ONU (Agenda 2021) do FMI e de outros. 

Curiosamente, Mussolini definia o fascismo (1) como «a fusão do Estado e das Corporações». O que se está a presenciar, ao nível internacional, é a deriva das chamadas «democracias ocidentais» para um modelo semelhante. 

Além do aspecto económico e estrutural, um Estado totalitário tem que exercer uma repressão sobre qualquer sector não conforme da população. Aquilo a que se assiste hoje, na Austrália, no Reino Unido, na Alemanha, na Espanha, etc. é a negação do direito de manifestação, de expressão do pensamento, quando este assume formas ordeiras e não violentas, mas contra os objectivos do totalitarismo sanitário instaurado. 

Os «confinamentos» não são mais do que «estados de sítio» mitigados, disfarçados. Eles são ensaiados com o pretexto do Covid. Mas, na realidade, são instaurados porque o «Great Reset» começa a ser implementado. Ele pode definir-se como a maior tomada de poder sobre as nossas vidas, a nossa capacidade de sobrevivência económica, sobre as nossas liberdades e direitos.

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  (1)... «The fascist conception of the State is all-embracing; outside of it no human or spiritual values can exist, much less have value. Thus understood, fascism… interprets, develops, and potentiates the whole life of a people.» Pode-se consultar o artigo inteiro em: https://www.cs.mcgill.ca/~rwest/wikispeedia/wpcd/wp/f/Fascism.htm

domingo, 1 de novembro de 2020

O PESADELO DOS VÍDEOS YOUTUBE PARA CRIANÇAS - JAMES BRIDLEY


 Um mundo de vídeos aditivos para crianças muito pequeninas.

Uma cultura onde algoritmos estão a produzir constantemente.

Existem estranhos cartoons que causam pavor (intencionalmente) nas crianças.

James  Bridley fala-nos de muitas coisas inacreditáveis que fazem parte do nosso quotidiano.

«Desigualdade de poder leva inevitavelmente à violência»

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

RAMEAU - PRIMEIRO LIVRO DE PEÇAS PARA CRAVO (1706) Suite em Lá menor


                                                 

Rameau foi celebrado como o mais destacado músico francês da época barroca. O talento e criatividade de Rameau permitiram que ele se erguesse até um lugar proeminente no gosto do público, quer fosse na corte, quer em meios muito mais modestos.

Sobressaem a delicadeza e adequação das suas composições para o cravo, como a Primeira Suite. Ele fez imprimir estas peças, reunidas em livro, para se tornar conhecido, quando veio de sua cidade natal (Dijon) para a capital, decidido a conquistar o seu público. 

Ele construiu um reportório único de ópera e de ópera-ballet. Muitos consideram-no o verdadeiro fundador da tradição de ópera francesa, apesar dos antecedentes de Lully e de outros. 

A sua polémica com Jean-Jacques Rousseau, filósofo das Luzes e defensor da ópera italiana, foi célebre na altura... já quase ninguém, hoje em dia, compreende sua razão de ser. É que Rameau foi também um teórico da música e procurou fazer música prática coerente com os princípios, defendidos na qualidade de teórico. Por exemplo, uma peça - L'Enharmonique - é uma aplicação muito directa dos seus conceitos teóricos.

A suite em Lá menor, na verdade, não é nada rebuscada, não é difícil de «entrar no ouvido». Eu gosto de me banhar neste universo sonoro, enquanto estudo ou quando ocupo as mãos com uma tarefa de precisão. Mas, ela é muito mais do que «música de ambiente», reconheço que esta música tem uma qualidade excepcional. Não tem «efeitos especiais» para cravo, que exibem recolhas posteriores de Rameau, com peças descritivas, as mais executadas em disco ou em concerto.

O prelúdio desta Suite é uma peça muito especial e típica da tradição dos cravistas e alaúdistas franceses. Ela não tem barras de compasso a separar as notas, é um prelúdio «non-mesuré». A duração das notas não é precisa. Isto significa que o executante tem uma latitude maior para interpretar a peça. O prelúdio derivou da improvisação inicial que os cravistas e alaúdistas executavam, no início de um recital, quer para verificar a afinação do instrumento, quer para colocar o auditório perante o contexto sonoro apropriado à audição da Suite. Muitas peças das Suites possuem nomes de danças; pois são, de facto, danças estilizadas. Por isso, o compasso, o andamento, o tamanho das frases e secções, as repetições, as modulações, etc. não eram «livres», eram características impostas pela natureza da dança estilizada: uma Sarabande, um Menuet e todas as outras danças tinham de obedecer a regras precisas. 

Nalguns casos, uma Suite não era mais do que a recompilação de peças no mesmo tom. Isto observa-se, apesar de haver, nalguns compositores, uma certa sistematização, uma procura de unificação através de temas semelhantes, mas estes traços não são generalizáveis. Temos indicações seguras de que - nessa época - a Suite era vista como um agrupamento conveniente, não de execução integral obrigatória: O executante podia adoptar uma ordem diferente da que estava escrita, podia encurtar ou aumentar o número de peças.



quarta-feira, 28 de outubro de 2020

terça-feira, 27 de outubro de 2020

«O COLOSSO» de Francisco de Goya

             «O Colosso» de Francisco de Goya 


Recordo-me ter visitado o museu do Prado com meus pais, quando muito jovem e ter ficado deveras impressionado com esta figura do colosso que se ergue, terrível, por entre as montanhas, espantando pessoas e gado, que pareciam estar reunidos nalguma feira. Na parte inferior da tela, homens, cavalos, mulas, bois e burros, movem-se, em pânico, derrubando tudo e todos à sua passagem. 
A força deste quadro, interpela-nos hoje em dia, já passados mais de 200 anos. 

No artigo da Wikipedia sobre este quadro, são feitas considerações e conjecturas sobre quem simbolizaria este gigante; qual seria o significado deste quadro; que relação teria com as invasões napoleónicas, pois terá sido pintado durante o período 1808-1812. 
Para mim, este quadro sempre teve relação com forças telúricas simbolizadas pelo colosso; como a erupção de um vulcão, de um terramoto, algo completamente insuspeitado, que se ergue das profundezas da terra, destruindo tudo e todos. 
A força cega da natureza selvagem que é acordada do seu sono letárgico pela incúria dos vivos, poderá também ser simbolizada por esta pintura. 
Das profundezas da terra emerge o inaudito, o monstro raivoso e destruidor. Surge, horrendo e nu, perante uma humanidade totalmente indefesa. 
Ele é o monstro do nosso medo profundo, da nossa fragilidade, que povoa as profundezas do nosso ser. Nós queremos ignorá-lo, mas isso é impossível. 
Os humanos desta cena, assim como os animais, são tomados pelo pavor que os faz correr desordenadamente. 

Creio que é adequado, no nosso tempo, meditar sobre este quadro. Embora saibamos o contexto em que foi pintado, que teria uma leitura precisa e evidente pelos contemporâneos de Goya. Acontece que o tempo torna hermético o significado de muitas obras de arte. 
Não apenas os significados simbólicos se sobrepõem, também a experiência humana corrente das pessoas que contemplam determinada obra, é decisiva para a forma -subjectiva - como a lêem.
Vale a pena meditar sobre o efeito de espanto, de horror, do pesadelo que emerge deste quadro. Ele tem algo de moderno, de impossível de reduzir a um contexto histórico particular. Ou seja, o quadro evoca, ressoa, dentro das nossas mentes. 
Conheço poucas obras, além desta, capazes de - com tanta força - evocar o medo, o pânico e a irrupção do impossível, do sobrenatural no quotidiano. 

A arte pode ser um sinal de alerta, um despertar das mentes adormecidas. Sobretudo, se não tiver como intuito veicular uma ideia precisa, mas antes traduzir o indizível, o inconcebível, por meio de traços e pinceladas. 
A ideia subjectiva que se forma no espectador da obra, é o fruto das vivências do mesmo. Ele fará uma dada leitura, a leitura que se lhe impõe pelos seus sentimentos.

Neste quadro, o que mais me impressionou quando criança, o que fez com que ficasse gravado na minha memória, talvez fosse o frémito, a ruptura, o espanto. Não é a parte racional da mente que se utiliza para apreciar a Arte, mas antes a parte emocional.

domingo, 25 de outubro de 2020

A ESTRANHA PROPRIEDADE DE NÃO NOS COMPREENDERMOS

                     

Quando olho através da janela e vejo o céu, plantas, uma cerca... estou a ver algo real. Mas as palavras que escrevi, agora mesmo, não descrevem sequer o real. Não poderia esse real ser descrito por uma filmagem pois, o que uma filmagem mostra, é uma paisagem sob determinado ângulo (escolhido pelo indivíduo que está filmando) e as imagens captadas estão «congeladas» num dado momento do tempo. O filme não capta as transformações que ocorrem ao longo de meses, nem tão pouco pode captar o micro detalhe do que se passa no interior das estruturas, do solo, das plantas, etc... O problema que tenho  -  todos temos afinal - é que o real está para além do trivial. Temos aqui uma situação paradoxal. Não queremos especular, queremos nos limitar ao que «vemos», ao sensível. Mas, sabemos que existe - na realidade - muito, para além do que nos é oferecido conhecer através dos sentidos. Porém, logo que começamos a pensar em processos atómicos ou cósmicos, nas escalas do espaço e do tempo, começamos a especular, entramos no domínio da especulação.  

Há uma distância irredutível do homem à realidade do mundo, mas também à sua realidade interior, afinal a base do seu ser, da sua personalidade. Não nos é suportável a introspecção, senão por breves momentos, a introspecção permanente é caminho certo para a loucura, já é um sinal de loucura. A subjectividade existe, porém: estamos sempre a reelaborar o nosso passado, somos seres dotados de um cérebro extremamente sofisticado, completamente diferente, nos princípios lógicos e no modo operacional, dos computadores da nossa tecnologia. O cérebro é um órgão, é um componente do corpo, nós «raciocinamos» com o corpo todo, não apenas com o cérebro. O cérebro tem a  propriedade única de integração das diversas partes do organismo, permitindo a homeostasia, esse maravilhoso poder de manter um determinado estado interior.

Tal como a homeostasia de funções «orgânicas», como o intervalo de flutuação dos níveis de glucose no sangue, ou de hormonas, a homeostasia das funções emotivas e cognitivas é realizada através de operações no cérebro. Isso traduz-se pela activação ou inibição de certa categoria de circuitos neuronais, etc., mas também pela própria modificação estrutural, visto que estamos sempre a fabricar dentrites e mesmo neurónios, numa arquitectura extremamente complexa e bem organizada. 

A nossa fala espelha de um modo grosseiro a complexidade do mundo. É característico do mais simplista e equivocado pensamento, confundir a «etiqueta», o nome dado às coisas,  com as coisas. Mas, todos nós - insensivelmente - fazemos isso, e com grande frequência, porque o nosso cérebro gosta de atalhos, gosta de poupar energia; evita gastar energia num grande número de operações. 

Talvez o problema da nossa abordagem ao real, esteja relacionado com a hiper sofisticação dos nossos modos de viver e de pensar. Talvez sejamos construídos basicamente com uma estrutura igual ou equivalente à dos primeiros homens modernos, mas o nosso cérebro e o nosso ser de sapiens contemporâneos está confrontado, talvez desde o nascimento - certamente, desde os primeiros anos de vida - com os desafios da complexidade. Falo de complexidade social, relacional, sociológica, cultural... Nós conseguimos, graças à nossa «incompletude» (a propriedade da «neotenia»), nos adaptar ao mundo tal como ele é, evoluir e transformar múltiplos aspectos (físicos, emocionais e intelectuais) do nosso comportamento. Mas, o homem, durante perto de 300 mil anos (e só considerando o homem anatomicamente moderno), viveu num mundo completamente diferente, onde as interacções sociais significativas eram muito poucas, mas - talvez - mais intensas. As questões de sobrevivência eram sempre prementes (não havia um excedente acumulado pelo agrupamento humano). Certamente, os comportamentos e os cérebros destes nossos antecessores estavam totalmente mobilizados para atender às tarefas relacionadas com a sobrevivência.  

No entanto, a nossa capacidade de inovar estava presente, a transformação - progressiva ou brusca - das comunidades humanas, significou uma série de desafios inéditos, para os contemporâneos dessas transformações. A  vertente do conhecimento e exploração da realidade mais desenvolvida na nossa espécie, porque verdadeiramente importante, foi da realidade social. Os indivíduos percebem que pertencem a uma certa comunidade, que têm de lutar dentro dela para que lhes seja reconhecido um dado estatuto: a realidade social foi - desde muito cedo -  apreendida como vital, mais importante que o conhecimento do entorno natural. 

Por mais que certas teorias o neguem ou o menosprezem, o ser humano sempre foi um animal social. O tipo de relacionamento que os humanos estabelecem em sociedade evolui, mas a espécie humana, em si mesma, não é concebível sem uma estrutura social complexa. Graças à plasticidade cerebral, desde os alvores da humanidade (e mesmo das espécies que a precederam, há milhões de anos) e até hoje, podemos dedicar trabalho cerebral a resolver um problema matemático, apreciar uma obra literária, ou a construir um arranha-céus... mas, não perdemos a capacidade de nos relacionar entre indivíduos, de nos apaixonarmos, de termos conflitos pessoais, de sentirmos afecto, ternura, repúdio e aversão... O cérebro emotivo está na base do desenvolvimento do cérebro racional. Somente devido a uma espécie de soberba é que muitas pessoas, incluindo as mais inteligentes, colocam as funções racionais acima das funções de gestão das emoções. A situação, hoje, pode ser menos nítida; mas, ao longo dos últimos 500 anos, foi esta a posição dominante. 

A incapacidade do homem em se perceber a si próprio, apesar de ter usado sua inteligência para resolver tantos mistérios da natureza e desenvolvido tantas técnicas com base nestes saberes, é o que há de mais estranho. Mas, isto não se deve à escassez de obras de psicólogos, filósofos, etc... que se debruçaram sobre os diversos aspectos do problema, avançando com teorias, mais ou menos convencionais ou revolucionárias. A literatura sobre o assunto é enorme e fisicamente impossível de conhecer em pormenor. Somente podemos ter alguma ideia das teorias em voga; podemos intuir como as pessoas assimilam tais teorias; como são referidas na media, nas obras de divulgação e no ensino.

Nos últimos 150 anos, a negação da espiritualidade recebeu o beneplácito do mundo científico-académico, ao contrário das épocas anteriores. O materialismo tornou-se - de facto - a filosofia implícita nos meios científicos. A espiritualidade em si mesma, não implica maior ou mais aprofundado saber sobre a nossa subjectividade, sobre o eu emocional.  Mas, o materialismo bloqueou qualquer progresso neste domínio, insistindo em modelos completamente absurdos. Penso que se pode falar de «obstáculo epistemológico» a este propósito, sobretudo em relação ao reducionismo, associado ao materialismo. Esse modo de proceder consiste em reduzir/degradar ao nível de impulsos electro-químicos, de conexões neuronais e de influências hormonais, tudo o que esteja relacionado com o eu emocional / relacional e seu modo operativo. O modelo da «actividade racional», pelo contrário, foi o do computador, a analogia mais fraca que se possa imaginar, mas que continua, como mito nas sociedades urbanizadas (o nosso «computador interior», o cérebro). 

As neuroses, o fechamento sobre o ego, o narcisismo, o egoísmo, o hedonismo, todas estas patologias dos indivíduos são, em simultâneo, sociais. São características de uma sociedade alienada e alienante. Os indivíduos, hoje em dia, não encontram, nem as referências tradicionais (que  reforçavam as normas sociais, mas também davam segurança ao indivíduo), nem constroem novas referências, adaptadas à época. Por isso, experimenta-se um mal-estar de fim de época. Nestes tempos, tornam-se óbvios sintomas de decadência que surgiram precisamente noutros momentos, dos mais perturbados da História: O relativismo moral impera, confunde-se o dogmatismo com valores, predomina o raciocínio e acção segundo padrões identitários. Estranhamente, ou talvez não, reencontramos atitudes e ideologias muito semelhantes, noutros momentos de crise civilizacional. Nomeadamente, nos últimos tempos de Império Romano do Ocidente, na decadência dos dois super poderes ibéricos no Século XVII, na véspera da Revolução francesa de 1789, da Revolução Russa de 1917, na Europa, durante o imediato pós-guerra de 1918/1919, etc... 

Neste quadro, não admira que as pessoas estejam desorientadas e possam desenvolver comportamentos «anti-sociais», de uma ou outra forma. A desagregação na sociedade dá-se sempre a vários níveis, que se reforçam mutuamente. 

É como um edifício que entra em ruína. A decadência ocorre, em simultâneo, em várias estruturas: tanto na fachada, como nos alicerces; tanto na consistência do cimento, como na podridão das vigas.

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 Não preconizo «um remédio» social, nem individual. Mas gostaria de debater* estes assuntos com pessoas, quer tenham opiniões concordantes ou discordantes comigo. 

[ * Se o/a leitor/a tiver interesse em fazê-lo, pode inserir seus comentários. Pode colocá-los livremente neste blog. Apenas retirarei conteúdos manifestamente insultuosos e ofensivos.... ]


sexta-feira, 23 de outubro de 2020

O Temperamento em J. S. BACH: «DAS WOHLTEMPERIERTE CLAVIER»




«O Teclado Bem Temperado, ou Prelúdios e Fugas em todos os tons e meios-tons, tanto no que respeita à terça maior como à terça menor. Destinado a ser usado por jovens músicos ávidos de aprender e para o deleite dos que já são executantes hábeis. 
Composto por João Sebastião Bach mestre de capela do príncipe de Anhalt- Cöthen. Ano de 1722» (1)


O costume de se designar a obra-prima de J.S. Bach por «o cravo bem temperado» carece de rigor e também é redutor do sentido, pois a obra era destinada a instrumentos de tecla, não especificando o cravo - ou outro instrumento - como obrigatório ou preferido, para a sua execução. 
Com efeito, na época de Bach, o clavicórdio era um instrumento de tecla e corda muito popular, sobretudo nos lares menos abastados; era muito menos caro do que um cravo. Bach, com certeza, compôs e ensaiou inúmeras peças ao clavicórdio. 
Na introdução que Bach redigiu, a preocupação pedagógica é explícita. Bach ensinou muitos jovens, não apenas os seus filhos, mas muitos outros, incluindo príncipes, nas cortes onde trabalhou.


Pode-se abordar esta obra monumental de muitas maneiras. Uma importante questão tem a ver com o temperamento, ou seja, a subtil mudança das notas musicais em relação ao que seria a estrita relação física da frequência de vibração das cordas. 
A invenção do «temperamento igual» foi aplicada ao forte-piano, o novo instrumento de tecla popularizado, sobretudo, nos finais do século XVIII e no século XIX. Mas, na época em que Bach compôs, não se utilizava sequer o temperamento igual. Este, consiste em desviar um pouco a afinação de todas as notas, para que nenhum acorde soe agreste. 
Porém, o temperamento, na época de Bach, consistia em aplicar ajustes de afinação, para que os acordes soassem melhor numa dada peça, com uma dada tonalidade, havendo portanto que mudar a afinação ao longo do ciclo dos 24 prelúdios e fugas. 
A manutenção da mesma afinação, ao longo de várias horas de execução, é apanágio do piano, sobretudo quando este passou a ser construído com moldura de ferro e cordas metálicas, no século XIX e nos séculos seguintes. 
Por contraste, durante um recital de cravo ou de outros instrumentos de corda, é perfeitamente comum o executante gastar algum tempo, entre peças, para afinar o instrumento. 
Era e é possível fazer variar a afinação do instrumento ao longo do recital, de forma a adequar a sonoridade do instrumento às características de cada peça. Um executante com sensibilidade e ciência do seu instrumento, sabe ajustar a afinação deste, em função da tonalidade da peça. 
Note-se que - nesta época - cada tonalidade tinha um carácter próprio. A escolha do compositor em relação à tonalidade não era indiferente. Uma dada tonalidade seria a mais adequada para veicular certas ideias e sentimentos ... 
Estamos, afinal, perante um problema de interpretação musical e não meramente técnico, para executar a música da época, no «teclado bem temperado»!

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(1) Ler notas acompanhando o disco vinil, por Louis van der Paal