segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A CIÊNCIA DO VINHO; O ABANDONO DA AGRICULTURA

CIÊNCIA DO VINHO, ENOLOGIA 

O vinho é um sumo de uva fermentado. 
A fermentação realiza-se graças a leveduras que transformam os açúcares presentes na uva em álcool e dióxido de carbono. 
As leveduras não são visíveis à vista desarmada, são micro-organismos. Estão naturalmente presentes na adega, na vinha, na superfície da uva e, geralmente, em todos os lugares onde exista o cultivo da vinha. 
Foram estas, as leveduras ditas «indígenas» ou naturais, durante muito tempo utilizadas para produzir o vinho. As leveduras «indígenas» estão a regressar à produção vinícola - nomeadamente - nos vinhos ditos naturais. 

A ciência do vinho é multissecular em Portugal. 
As nossas vinhas e as castas de origem portuguesa são cuidadosamente  inventariadas, catalogadas e experimentadas, em institutos públicos e nas grandes empresas do sector. 
A genética molecular, as técnicas de recombinação, clonagem e de transformação de leveduras, têm encontrado ultimamente numerosas aplicações no domínio da vinificação. 
Para se fazer vinho digno desse nome, são tão importantes as condições climáticas, do solo, das variedades de vinha, como os micróbios que fazem parte dum ecossistema. 
Além destes factores, evidentemente, há toda uma série de saberes, de técnicas de cultivo da vinha, do processamento do vinho, transmitidos de pais para filhos, mas que também se podem ensinar e aprender, como parte integrante da cultura científica e técnica.

Do ponto de vista económico, o sector vinícola em Portugal tem três tipos distintos de empresas;  as quintas familiares, onde se produz vinho para o auto-consumo e pouco mais; as pequenas e médias empresas, que têm frequentemente uma cooperativa vinícola a apoiá-las, onde se recolhem as uvas, se fermentam, se engarrafam e comercializam e por fim, as grandes empresas exportadoras, organizadas para a conquista dos mercados internacionais. 
Estas grandes empresas estão «verticalizadas» ou seja possuem os terrenos, as vinhas, as adegas, os circuitos de comercialização. Tiveram origem, muitas vezes, em capitais estrangeiros, como na produção de vinho do Porto, na região do Douro. 
Estas três tipificações mostram que há possibilidade de uma economia se diversificar e crescer a partir do sector agrícola e obter um rendimento apreciável, não apenas um auto-sustento. 
A exploração familiar que faz vinho, além de outras produções, porém, não é de desprezar. Muitas famílias do Norte da Europa vieram para Portugal fazer este tipo de agricultura, usando seus conhecimentos técnicos e científicos para construir explorações viáveis e ecológicas. As explorações pequenas e médias para o mercado «bio» têm também futuro no nosso país. 
O sector agrícola em Portugal tem futuro, obviamente, se as condições ambientais excepcionais  forem preservadas. 
  
ABANDONO DA AGRICULTURA

A vocação natural e histórica de Portugal é agrícola.  
Porém, o país é um importador de alimentos; as exportações são muito mais baixas do que as importações, ano após ano, quer em termos de dinheiro, quer em volume de produtos. A produção agrícola e as pescas nacionais não chegam a cobrir 50% das necessidades do mercado interno.

Portugal é um país de clima atlântico sob influência  mediterrânica. Possui os melhores solos para a vinha (solos xistosos) em várias zonas do território. Mesmo noutras zonas, a vinha pode ser cultivada, pois existem castas e técnicas adequadas a essas condições.

Em geral, o que a agricultura de Portugal precisa mais é de água. 


                     Paisagem da Beira, perto de Monsanto                    
                     
A água disponível, na maior parte do território continental, é suficiente para as diversas necessidades humanas, incluindo a agricultura, mas está irregularmente distribuída. Por outras palavras, uma irrigação apropriada é necessária para corrigir esta irregularidade. 
Igualmente, as precipitações também estão irregularmente distribuídas no tempo; embora se possa usar, nalguns casos, uma «rega de emergência» para salvar culturas, numa altura de seca excepcional, o mais adequado será fazer-se a criteriosa selecção das espécies, variedades e cultivares, mais apropriados aos factores climatéricos. Tem também aqui lugar uma genética agrícola, respeitando e tirando partido das características do ecossistema. 
Mas a escassez e/ou irregularidade das precipitações ao longo do ano, faz com que a água seja o factor limitante. 

Pinheiros no campo, quadro a óleo de E. H. Gandon

O abandono dos campos, principalmente na Beira interior e no Alentejo, ao longo de meio século, fez com que se criasse e alargasse a mancha de «deserto verde» ou «floresta de produção», baseada no eucalipto, cujo único escoamento é a produção de pasta de papel. 
Um motor deste fenómeno foi o facto de que, só assim, podiam obter das terras um rendimento pecuniário os proprietários absentistas, perante a quase ausência do trabalho assalariado.  Desde a década de 1960 até hoje, os trabalhadores agrícolas têm emigrado massivamente para as cidades do litoral ou para países europeus com necessidade de mão-de-obra. A emigração rural, o abandono da agricultura, propiciou ainda mais o alargamento do «deserto verde», que impediu na prática a  manutenção das comunidades, obrigando a um maior êxodo, num ciclo vicioso...

Quando penso nisto, fico muito triste, porque é um lento e frio assassinato de um país, de uma cultura, de um povo, de um saber agrícola (que deixou de estar...) enraizado na memória.

As pessoas jovens que estão sem emprego ou com um emprego de má qualidade (mal pago, precário) podiam formar cooperativas e reconverter-se à agricultura. 

Penso que um país com boa sustentabilidade alimentar terá um melhor viver e guardará capacidade para se desenvolver nos restantes sectores. Pelo contrário, a indústria, nesta fase de transição energética, só poderá ter futuro, se não for baseada no petróleo.
A aposta «fácil» mas não sustentável (aqui, em Portugal) é o turismo, que se desenvolve no curto prazo. Deixa determinados sectores inflacionados, tais como o imobiliário e restauração, mas sem reprodução do capital e dos saberes. Pode o turismo ser uma alavanca, mas apenas se este sector for integrado com o sector agrícola e das pescas, numa visão de longo prazo. 

Gostaria de saber a tua opinião sobre este assunto.
 Escreve para manuelbap2@gmail.com
Obrigado!
Manuel Banet 





domingo, 17 de dezembro de 2017

NORMALIDADE OU SABEDORIA?

Na continuação do artigo «NINGUÉM É NORMAL...», apresento-te agora reflexões no prolongamento do mesmo. 

Se não há verdadeiramente ninguém «normal», quer num sentido quer noutro, então que consequências tirar deste facto?

- Primeiro, todo o raciocínio sobre assuntos de sociedade, de economia, de política que se baseie na normalidade, na referência à norma, deve ser repudiado. 
Além de falso do ponto de vista científico e filosófico, está associado às formas mais autoritárias de governação e de manipulação. 
Procura impor a normalidade ou a norma, para melhor exercer controlo sobre as pessoas, as «massas» como eles dizem.

- Segundo, se tal sistema de pensamento está muito difundido, como  podemos constatar facilmente nos media, quer no discurso político, quer noutros manipuladores da opinião, será ineficaz combatê-lo apenas contrapondo argumentos. 
Porque o discurso do poder reforça continuamente o preconceito da «normalidade» nas pessoas, que o aceitam sem espírito crítico, formando-se e mantendo-se assim um ciclo vicioso.  
Discursos alternativos apenas, por muito sábios ou sensatos que sejam, não podem ter grande alcance! 

- Terceiro, o «discurso da prática» e não a «prática de discurso» (ou oratória) é que conta: cada pessoa, grupo, colectivo,  ou sociedade, que tenham uma prática autónoma, constroem a mesma de acordo com as suas necessidades, os seus interesses, as suas visões do mundo e da sociedade. 
Ao contrário de se partir de um «a priori» ideológico, seja ele qual for, parte-se da situação dada, daquilo que é, das pessoas tais como são, com as suas vivências, as suas necessidades, os seus desejos, as suas aspirações, as suas capacidades. 

- Quarto, «Fazer uma revolução» no sentido de tomada de poder para impor a nossa visão das coisas, mesmo que fosse a visão acima delineada, é a negação - na teoria e na prática - da autonomia.
Isso seria a negação da vivência em que os vários elementos da comunidade cooperam uns com os outros, numa abertura permanente e numa forte consciência que lhes advém de um «algoritmo interno», «ouvindo a parte melhor de si próprios e tomando exemplo dos melhores de entre eles».

- Quinto, eu respeito a autonomia dos outros, meus iguais em direitos, mas sempre diferentes uns dos outros. 
O que se chama a «Regra de Ouro» (the Golden Rule) é apenas a síntese - em várias religiões e civilizações - do tal algoritmo interno acima referido. 
Aceito e sou aceite pelos outros tal como sou, sempre reconhecendo e aceitando minhas próprias fraquezas e imperfeições e aceitando reciprocamente, nos outros, as suas. 

- Sexto, não pode haver progresso, transformação real e benéfica, senão com a abordagem, a crítica, seguida da mudança na prática, dessas mesmas fraquezas e imperfeições (individuais e colectivas). 

- Sétimo, uma religião ou doutrina moral ou ideologia que proclamasse o contrário, ou seja, reprimir, esconder, disfarçar, ignorar... estaria condenada ao fracasso.
A ideia, a impulsão primeira dos movimentos - religiosos ou não - que tiveram sucesso foi abraçada, intuitivamente, por muitas pessoas. Se um determinado movimento espiritual teve sucesso, foi  porque - num primeiro tempo, pelo menos - pareceu reforçar o tal «algoritmo interno».

- Oitavo, o «algoritmo interno», que permite ao indivíduo existir, mover-se, movimentar-se dentro da sociedade, foi desviado e utilizado abusivamente. 
Em demasiadas ocasiões, esse abuso tem como resultado a perda de referências, a desorientação, sobretudo na juventude, a qual é sempre mais maleável e portanto manipulável, por líderes carismáticos devido a uma usurpação do papel de modelo a emular (o chefe, a vedeta, a estrela, o herói, o ídolo etc...)    

- Nono, nenhum indivíduo ou conjunto de indivíduos é irrecuperável para a autonomia verdadeira, pois os líderes carismáticos, sejam políticos ou não, apenas semeiam a ilusão e as pessoas recolhem decepções. 

- Décimo, parecem «fracas», as pessoas que cuidam realmente de si próprias e dos outros, mas são elas que acabam por moldar e impulsionar decisivamente as comunidades, são «as sementes e o solo» da continuidade das sociedades e da natureza.


sábado, 16 de dezembro de 2017

CADERNOS SELVAGENS, DEZEMBRO 2017 / SESSÃO DE APRESENTAÇÃO

Na Sexta-feira 22/12/2017, das 18:30 às 20:30, FÁBRICA DE ALTERNATIVAS de Algés, haverá uma sessão de apresentação dos CADERNOS SELVAGENS. Na mesma ocasião também será apresentada a exposição de pintura de Isabel Gomes da Silva. 

Faz agora um ano que decidimos colocar os Cadernos nas «mãos» da Fábrica e que saiu o primeiro número em novos moldes

Por isso, convido - para a sessão acima assinalada, na «FA's» de Algés - todas as pessoas que têm interesse em literatura, em arte, em crítica, em economia, em política, em psicologia, etc, etc... resumindo: pessoas com curiosidade e com vontade de debater amigavelmente, com os outros, os seus pontos de vista!

Manuel Banet


                            

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

OBRAS DE MANUEL BANET: «NO PAÍS DOS SONHOS»




                              rainbow


https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/p/no-pais-dos-sonhos-poemas-musicais.html
                                             

[NO PAÍS DOS SONHOS] SCHUBERT «ARPEGGIONE SONATA»


Uma rapsódia de melodias, umas inquietas outras serenas, trotando na sua cabeça. 
Não se podia levantar da marquise onde estava deitado, o corpo hirto, os braços ao longo do tronco, todo coberto por um pano de linho branco. 
Ouvia vozes que conferenciavam, a poucos metros, mas não distinguia as palavras, nem sabia identificar seus autores.
As palavras não tinham sentido, quaisquer que fossem; não fazia sentido, senão a melodia sublime que emanava do âmago. 
Como que chamando a sua alma para o alto, declinando todo o carinho que pode possuir uma voz de mãe, de abraço terno e caloroso, mas sem nostalgia... desse "eu", que deixava para trás; ele seria em breve cinza; já nada restaria da entidade corpórea senão a concha, vazia do espírito que a habitara.
Não havia regresso à vida, nem havia morte; a alma estava a ser transportada para uma nova dimensão. 
A serenidade que ressentia, não era penosa ou pesada. 
A analogia musical surgia como a única possível. Cada nota musical era como que uma descoberta eterna,  revelação, desvelar de antigo segredo. 
Vibração, onda, frequência... todo o Universo, afinal, se abria e acolhia este Ser, o verdadeiro Ser transcendente.


quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

NINGUÉM É NORMAL ... pensem nisto

Será verdade? Será uma brincadeira?
Ou será algo mais profundo?
O que é normalidade? O que significa «normal»?
Já escavaram o conceito de normal?
Já viram que é um conceito da matemática e estatística?
Não são os termos «doente», ou «patológico», os contrários de «normal»!

Estar dentro da norma (estatística, subentende-se) tem um significado matemático; a este sentido, adicionam ou sobrepõem o significado moral e jurídico de «norma», de lei, de coisa que as pessoas devem fazer ou evitar, para cumprirem a lei.
Mas nem um, nem outro dos sentidos, se coaduna com a complexidade do indivíduo, pois são...
- ou uma deliberada simplificação do ser, reduzindo toda a sua existência a um único parâmetro (para depois o medirem!),
- ou a imposição de lei não consentida, mas decretada do alto do poder, cuja não observância pode ter consequências bem pesadas. Podem ir até ... uma condenação à morte, ou a «morte cívica», numa prisão ou numa instituição para alienados.

Somos infinitamente complexos; é impossível qualquer «medição» da normalidade estatística, em relação ao que é a nossa personalidade, o nosso comportamento. Ambos são demasiado complexos para serem definidos e determinados por meia-dúzia de parâmetros.
Quanto à norma como lei, somos livres de cumpri-la ou não (conceito de livre-arbítrio): Temos consciência, logo podemos decidir que vamos cumprir determinadas normas sociais; ou, pelo contrário, a nossa consciência pode levar-nos a infringir certas normas, porque as consideramos não compatíveis com a nossa ética.

Em nenhum caso, faz sentido dizer-se que somos, ou não somos, «normais». O conceito, qualquer que seja a conotação dada, não é apropriado ao que nos define enquanto seres humanos.

«Normalizados» é porém o que os totalitarismos (soft ou hard) pretendem fazer de nós, humanos!

CONSEQUÊNCIAS DAS «NOSSAS» POLÍTICAS

                              An aerial shot of a long line of people standing on ground that looks like desert.

                                      Refugiados na Líbia, à porta de centro de detenção

As pessoas das chamadas «democracias ocidentais» gostam de ser vistas - e de se verem a si próprias - como defensoras dos Direitos Humanos. 
Porém, as políticas bárbaras e criminosas da guerra dita humanitária são a principal causa das violações destes mesmos direitos. É isto que nos é omitido sistematicamente nos media.

- Mas estes media mostram-nos, sem dúvida, os horrores, noticiam o tráfico de escravos, na Líbia, por exemplo, etc. poderia alguém objectar. 
- Escandalizam-se os opinadores nos jornais e TVs de todo o continente. Eles «denunciam» toda a espécie de violações dos direitos humanos mais básicos. Por sinal, os piores casos aparecem sobretudo e sistematicamente (mas isso não dizem eles) nos teatros de operações onde estejam imiscuídos ocidentais e civilizados militares e mercenários. 

Porque procedem assim? 
- Primeiro, porque não é possível, no mundo de hoje impedir que as coisas se tornem conhecidas, por muito controlo que haja nos media ocidentais. 
- Segundo, porque é mais fácil para o poder globalista manter-se ao comando, se conseguir controlar a «narrativa». 
Assim, pode nos manipular, usando os nossos sentimentos mais nobres, a nossa compaixão; mas também o medo atávico do outro, que está na origem da xenofobia e do racismo. 

Que fique bem claro para todas as pessoas que se consideram humanistas, respeitadoras e defensoras dos direitos humanos:

-Passivamente ou ativamente, a cidadania dos diversos países tem estado a consentir com as guerras neo-coloniais e imperialistas, levadas a cabo pelo «Ocidente» sob a batuta dos EUA e NATO. 
- Os governos não seriam - por si sós - capazes de tal feito. Têm de ter a conivência, anuência, até mesmo a adesão «consciente» de muitos cidadãos, civis ou militares. 
-Para tal consentimento da cidadania, há uma máquina poderosa dos media, ao serviço dos poderes globalistas. O nosso subconsciente é usado, manipulado, sob pretexto de nos «informar».