Uma peça que eu me habituei a relacionar com o destino e ... com a força de enfrentá-lo, também!
(gravação ao vivo, obra integral)
Sabemos que Kubrick aproveitou o tema do Andante con moto, em sequência inesquecível do filme «Barry Lyndon», mas a obra merece ser apreciada na íntegra.
Esta transcrição pianística de Liszt, sobre um Lied muito célebre de Schubert, deve ser escutada no contexto literário que enforma a peça. Sobretudo, deve-se ler a versão original, com os versos do «Fausto» de Goethe, uma passagem em que Margarida (Gretchen) está na roda de fiar (Spinnrade).
Uma das peças mais maravilhosas do reportório romântico. Schubert está muito pouco interpretado, actualmente. Acho que é totalmente injusto.
É verdade que esta peça, em particular, exige uma execução de grande limpidez e rigor. Repare-se que o andamento, embora rápido, não é como duma «corrida de velocidade». A justeza do tempo é fundamental para traduzir a ideia do compositor.
A interpretação de G. Solokov é exemplar nestes aspectos. Mas, além disso, junta-lhe a criatividade própria de um grande mestre: transforma cada frase em algo sublime.
O impromptu é uma forma que pretende simular o improviso ou que é derivada do improviso.
O que me fascina neste tipo de música é a sua adequação ao piano.
Schubert também escreveu peças notáveis, designadas por «impromptu».
Porém, sendo Chopin o mais notável compositor para piano de todos os tempos, segundo o meu gosto subjectivo, é com imenso prazer que eu oiço esta composição.
Uma
rapsódia de melodias, umas inquietas outras serenas, trotando na sua cabeça. Não se podia levantar da marquise onde estava deitado, o corpo hirto, os braços
ao longo do tronco, todo coberto por um pano de linho branco.
Ouvia
vozes que conferenciavam, a poucos metros, mas não distinguia as palavras, nem
sabia identificar seus autores.
As
palavras não tinham sentido, quaisquer que fossem; não fazia sentido, senão a
melodia sublime que emanava do âmago. Como que chamando a sua
alma para o alto, declinando todo o carinho que pode possuir uma voz de
mãe, de abraço terno e caloroso, mas sem nostalgia... desse "eu", que
deixava para trás; ele seria em breve cinza; já nada restaria da entidade
corpórea senão a concha, vazia do espírito que a habitara.
Não
havia regresso à vida, nem havia morte; a alma estava a ser transportada para
uma nova dimensão.
A
serenidade que ressentia, não era penosa ou pesada. A analogia musical
surgia como a única possível. Cada nota musical era como que uma descoberta eterna, revelação, desvelar de antigo segredo.
Vibração,
onda, frequência... todo o Universo, afinal, se abria e acolhia este Ser, o
verdadeiro Ser transcendente.
[O impromptu, como o nome o indica é, na
origem, um improviso. Estes improvisos transcritos de Schubert têm o dom de,
magicamente, nos restituir a atmosfera dos serões vienenses.
Não sei se este é o impromptu que melhor
faz vibrar a corda sensível dos outros. Mas, certamente no que toca á minha
pessoa, quando o oiço, é impossível não começar a sonhar acordado:]
-Sonho
que estou sentado à lareira de uma casa burguesa, está uma primavera fria -
neva lá fora. Uma jovem está ao piano, de costas para mim, com um xaile de lã
axadrezada e executa com nonchalance este impromptu.
O professor, um jovem com uma casaca
escura e gravata branca, de pé no lado esquerdo da executante, ligeiramente
inclinado, segue a interpretação lendo a partitura, uma mão pronta, ao canto da
mesma, para virar a página.