quinta-feira, 16 de março de 2017

FROBERGER «TOMBEAU...» POR SOPHIE YATES


                                   

Johann Jacob Froberger foi um compositor, organista e cravista, originário do sul da Alemanha (Stuttgard), muito famoso no seu tempo - século XVII - tendo exercido o seu talento na corte de Viena, assim como na da Duquesa Sibila de Wurtemberg, a qual guardou os manuscritos de seu músico após sua morte. 
Pode dizer-se que Froberger foi um músico cosmopolita, tendo visitado não apenas regiões de língua alemã, mas também Roma e Paris. 
Nesta cidade, Froberger relacionou-se com os grandes mestres do cravo da escola francesa, assim como dos alaúdistas. Nota-se que o estilo de Froberger influenciou músicos como Louis Couperin. 
A peça aqui seleccionada foi composta como uma reflexão filosófica sobre a transitoriedade da vida «memento mori». 
Compôs também um célebre «tombeau» em honra do alaudista  seu amigo Monsieur de Blanrocher, que morreu nos seus braços. 
Outros compositores franceses seus contemporâneos também compuseram «Tombeaux», em memória do mesmo músico.
A música de cravo de Froberger e de outros seus contemporâneos integra o estilo de execução comum no alaúde, o «style brisé». 
Pode dizer-se que as suas composições para cravo são um cume da música escrita para este instrumento. Ele obtém uma grande variedade expressiva graças às diversas figurações, idiossincrasias próprias do instrumento, nas suas composições. 
Nota-se na sua obra um gosto pronunciado pela música descritiva. Sabemos que a literatura das décadas seguintes para cravo, nomeadamente, está cheia de peças descritivas. 
Froberger, sendo um precursor do estilo cravístico dos finais do século XVII e primeira metade do XVIII,  é também um músico de primeira grandeza pela originalidade e perfeição das suas composições para cravo.


quarta-feira, 15 de março de 2017

ELEIÇÕES FRANCESAS: FICARÃO OS MUROS?

Depois das peripécias mais ou menos grotescas da candidatura de Fillon, acossado por uma parte da elite, que queria que ele cedesse o lugar ao candidato mais bem posicionado para perpetuar o sistema (Macron), criaram-se as condições para uma «tempestade perfeita», que irá colocar no poder Marine Le Pen. 

Digo isto, sem qualquer dúvida, pois, mesmo que ela não consiga derrotar o seu opositor na segunda volta das presidenciais, terá o regime completamente debaixo do seu polegar.
Com efeito, depois das presidenciais há as legislativas e as municipais. 
Não é normal que uma força política - neste caso, o FN - tenha um quarto ou um terço do eleitorado e depois, ao nível dos órgãos de representação, não se observem quaisquer representantes ou tenham assento numa proporção muito menor. 
Assim, o regime fica refém desta força política, pois Marine e o FN estarão sempre em condições de posar como excluídos, como vítimas, como discriminados. 
Podem portanto (continuar a) chantagear as restantes forças políticas, as quais se apressam a ceder às sucessivas chantagens, aplicando o programa do FN, mas em nome do «espírito da República».
É nesta fantochada que anda o regime francês, há pelo menos dez anos. Qualquer pessoa com bom senso hesitaria a designar isso como regime democrático. 
Com efeito, tem sido o hábil manobrismo de pessoas que partilham o poder há décadas e o seu absoluto desprezo pelos humildes que tem empurrado os destituídos, os «sem-voz», para os braços da extrema-direita. 
Os operários, os trabalhadores modestos, deixaram de se reconhecer nos tradicionais partidos operários, socialista e comunista. 
O mesmo fenómeno - com as necessárias adaptações - se verificou na eleição de Donald Trump. 
Uma fatia importante do eleitorado escolhe o candidato percebido como vindo de fora do sistema (que, de facto, não será), mais por raiva contra os senhores no poder, do que por adesão real ao programa e ideário desse candidato(a). 

A democracia em França foi sendo socavada em sucessivos momentos, após a vaga de fundo imediatamente a seguir à libertação, após a II Guerra Mundial. 
Nessa altura, tratava-se de a burguesia ceder, em quase tudo, a uma classe operária aguerrida e triunfante, para conservar o essencial. 
Agora, trata-se de salvaguardar os privilégios de uma nova feudalidade que se instalou no poder durante os longos anos da Vª República, através de um «delfim do regime» (Macron).


A alternativa, para a grande burguesia, será de recompor as alianças num quadro de retração nacionalista, xenófobo e intolerante, no caso de um triunfo imediato de Marine Le Pen obrigar a isso. 

Penso que a salvaguarda do status quo é o «plano A» da oligarquia e que a opção Le Pen será o «plano B». 
Mas, em qualquer dos casos, serão eles a gerir o resultado, será sempre a oligarquia a triunfar, não tenhamos dúvidas. 

Está quase completo o trabalho de esvaziar de conteúdo democrático a República, no «país dos direitos humanos»... ficarão os muros?
- Os muros ficarão, obviamente, para dar a ilusão de que a democracia continua... 

terça-feira, 14 de março de 2017

SESSÃO DE MOVIMENTO SOLUÇÕES PARA A PAZ (11-03-2017)

A sessão, organizada pelos activistas do Movimento «Soluções para a Paz» nas instalações da «Fábrica de Alternativas» de Algés, no Sábado 11 de Março, contou com a presença de um público pouco numeroso, mas interessado.

Os dados coligidos pelo nosso companheiro João Pestana, que apresentou os temas para discussão, mostram como as guerras têm sido uma constante, em vários pontos do globo, desde o fim da II Guerra Mundial, até hoje. O número de mortes, feridos e deslocados é difícil de avaliar, pois as estatísticas oficiais ou não existem ou ocultam essa realidade. Depois, passou em revista alguns dados sobre o comércio de armamento, ao nível mundial, utilizando dados do SPIRI, que indicam os maiores vendedores e compradores.

Abordou-se em seguida o papel da NATO e a carga que representa no orçamento de cada país, mesmo em tempo de «paz». Referiu-se a exigência de aumentar as despesas militares em todos os países desta aliança militar, para que cada um tenha nível de despesa igual ou superior a 2% do seu PIB.

Um documento do Estado-Maior das Forças Armadas portuguesas, mostra as missões que estas cumpriram no ano passado. Além de missões de utilidade pública, como seja transporte de feridos e vigilância das praias, o grosso das missões foi em diversos teatros de guerra, sob bandeira da NATO, na maioria dos casos, desempenhando um papel subordinado, pois os contingentes portugueses são em geral da ordem das dezenas ou menos, portanto subordinados a comandos de outras nacionalidades, dentro da estrutura dessas missões.

Comparando os dados relativos a 2015 e 2016 para o orçamento da Defesa em Portugal, chegou-se à conclusão que ele se manteve aproximadamente constante (1,2 – 1,3 % do PIB), embora haja discrepâncias de cerca de 300 milhões de euros entre o que foi gasto e o orçamentado, não se sabendo como foi preenchido o «buraco».
Parecendo pouco, menos dos 2% reclamados pelo secretário-geral da NATO, no entanto, é 5 vezes o montante para a cultura. Também é superior ao atribuído à investigação, ao ensino superior, etc.

Falou-se do «Dia de Defesa Nacional» e das penas extraordinariamente duras para quem falte sem justificação a essas encenações de propaganda das FAs, da guerra e de lavagem da imagem da NATO junto da juventude. Foi ainda referido que não existe nenhuma informação  realmente acessível aos jovens sobre a existência do estatuto de «objector de consciência».

Relativamente ainda à objeção de consciência, reconheceu-se uma generalizada confusão entre a prestação de serviço militar obrigatório e não obrigatório, mas havendo sempre a possibilidade do governo decidir reinstalar o serviço militar obrigatório. Outra ambiguidade é a de prestação «com armas», «sem tocar em armas» e «civil». Hoje em dia, muitos servem na estrutura militar, sem armamento pessoal, mas contribuem com sua prestação para a máquina de guerra.

Durante a discussão, falou-se muito do papel da NATO em manter certos regimes, falsamente instalada nesses países a pretexto de «terrorismo». 

Falou-se do caso do Afeganistão, entre outros, onde tem estado presente um pequeno contingente das forças portuguesas.

No Afeganistão, a cultura de papoila para ópio, principal negócio dos senhores da guerra, tinha sido quase extinta no regime dos Taliban. Quando a «coligação internacional» invadiu o Afeganistão no Outono de 2011, trouxe os senhores da guerra, que reinstauraram o cultivo da papoila. Hoje, 80% da heroína vendida nas ruas do mundo inteiro é proveniente do Afeganistão; era rara a heroína dessa proveniência, nos anos imediatamente anteriores à invasão do Afeganistão pela NATO e associados.
Segundo vários autores, o negócio de tráfico de ópio é controlado pela CIA, que pode livremente distribuir grandes quantidades a partir de bases militares da NATO, na Turquia, na Alemanha e no Kosovo. O dinheiro que obtém vai servir para operações «negras» ou ocultas, aquelas que oficialmente «não existem» e portanto não suscetíveis de inquirição ou controlo pelo Congresso dos EUA.

Pediu-se uma maior participação no nosso Movimento, sabendo que o grau de ausência de informação - sobretudo da juventude - torna a tarefa dos militaristas mais fácil, conjugada com muita desinformação por parte da media corporativa.

O discurso do poder é invariavelmente  de que a  presença de tropas portuguesas tem uma justificação «humanitária», ou de que os nossos soldados estão em tal ou tal país a «combater o terrorismo» (Afeganistão, Mali, República Centro Africana, etc…). Estas afirmações - repetidas vezes sem conta e nunca contestadas ou sequer problematizadas - criam um falso consenso (falso, porque baseado na ignorância) na cidadania.

Consideramos necessário e possível criar-se um observatório sobre o papel das forças armadas portuguesas em Portugal e no mundo, como forma de documentar, de debater e estudar as questões de estratégia, não de um ponto de vista meramente militar, mas também de cidadania.




[NO PAÍS DOS SONHOS] «Rodrigo Martinez» (Anon. circa 1490)


Estava semi-adormecido, à longa mesa corrida da taberna. 
Nisto, aparece uma barulhenta e alegre tropa fandanga, tangendo vários instrumentos, com roupas de fantasia. Esta tropa aclamava o Rei Momo, enquanto entoava a folia célebre «Rodrigo Martinez». 

Logo se dispuseram em roda, com duas figuras no centro. Estas dançavam com trejeitos cómicos e eróticos. Os passos eram duma «baixa dança», mas  as suas poses grotescas faziam rir a assistência, enquanto os músicos executavam variações sobre a simples melodia, introduzindo sucessivas figurações. 
No centro, o par (um homem e um travestido) mudava suas maneiras a cada nova quadra, adoptando sucessivas mímicas, cruas sátiras de aristocratas, poetas, cortezãs ...

Contagiado, fui para junto da roda, batendo o pé ritmicamente e cantando os estribilhos brejeiros. Só depois desta alegre folia, a tropa carnavalesca começou a beber. Nada do que se passou a seguir me ficou na memória, porque o espírito de Bacco se apossou de meu cérebro.

Acordei no dia seguinte, deitado no soalho da taberna, com dor de cabeça e língua pastosa, típicas da ressaca, mas bem disposto; regressei a casa. 

segunda-feira, 13 de março de 2017

[NO PAÍS DOS SONHOS] Lamento de Dido (H. Purcell)


Vogava num universo enfumado, onde se evaporavam os rostos dos companheiros da véspera, como se os fantasmas se confundissem com os vivos, dando a estes uma consistência fantasmagórica, enquanto aqueles se faziam passar por viventes.
Em cima de uma mesa comprida, apenas iluminada por um candelabro, jazia um corpo. Estava ainda revestido da aparência do que fora, uma jovem e alegre criatura. 
No escuro, ouviam-se murmúrios de preces, entrecortados de suspiros e silêncios. 
Lá fora, o sol de Junho resplandecia e as aves cantavam, em contraste insólito com a cena de desolação que se apresentava no interior.
O espectáculo deste palácio do renascimento parecia-me real. 
Sentia-me oprimido e só desejava sair, mas não sabia como. Foi um pequeno pagem que me indicou, com um gesto tímido, um cortinado, recobrindo uma porta. Avancei para lá, levantei o cortinado e abri a porta. 
Foi então que abri os olhos, vendo a realidade do meu quarto, banhado em luz natural. 
Suspirei e fiquei deitado, a tentar relembrar-me dos pormenores do que acabara de sonhar.

domingo, 12 de março de 2017

HISTERIA, EM VEZ DE RAZÃO


Vem este título a propósito do mantra «Vêm aí os russos», dum establishment inseguro, acossado, desmascarado por sucessivas revelações de whistleblowers.


O artigo de Gregory Clark no «Japan Times» coloca as coisas no seu devido pé, relatando as suas experiências de diplomata, em ambos os lados da então «Cortina de Ferro».

Parece-me que as pessoas com inteligência e sensatez, em qualquer parte do mundo chamado «Ocidental» ou seja, sob a órbita dos USA, estão a ser submersas por uma onda de «opinadores» que apenas opinam mas não demonstram, apresentam opiniões como se fossem factos, reforçam medos e rancores ancestrais, enfim são instrumentos de propaganda. Mas como lutar contra isso? Será possível fazer programas nas escolas para que as crianças e adolescentes não se deixem seduzir pelas diversas propagandas? Será possível, mas só num tipo de ensino cooperativo, não pilotado por qualquer poder central. A mesma questão se coloca em relação a meios de comunicação de massa: será possível que as redacções tenham uma ética de responsabilidade e não amplifiquem os boatos e os desmascarem, mesmo quando são oriundos do poder?
A onda de histeria tem sido insuflada por ONGs e grupos militantes discretamente subsidiados por pessoas como George Soros,  os Rothchild, os Rockfeller, os quais tentam fazer avançar a sua agenda de uma Ordem Nova Mundial (NWO New World Order). Vendo que seus planos estão a ser postos em causa, pelo que chamam de «populismo», apressam-se a demonizá-lo por todos os meios. Porém, com isso estão tecendo a corda que os irá enforcar a todos.

Os analistas e jornalistas com um mínimo de sensatez e bom senso, nos mais diversos pontos do globo são menos do que os que se entusiasmam e pretendem entusiasmar o público com a hipérbole, o catastrofismo, a retórica oca. No universo das «notícias», a maior parte das mesmas é apenas lixo informativo, servido para saciar o público sempre ávido de «uma olhadela através do buraco da fechadura». É assim que vejo a imprensa de escândalos, de boatos envolvendo celebridades… 
Este lixo informativo é eficaz, como mostra a indiferença com que foram recebidas as revelações de Wikileaks, sobre as actividades ilegais da CIA («Vault 7»): não têm um efeito imediato de indignação e repúdio, junto da opinião pública.  

Estas revelações mostram até que ponto todas as pessoas, em todo o mundo, incluindo dentro dos EUA, estão a ser alvo de espionagem permanente e têm fragilidades embutidas no seu hardware e software que tornam os seus computadores, iphones, televisores,  em instrumentos de vigilância contra eles próprios. 
Igualmente, demonstra a enorme manipulação da informação por uma parte do «Estado Profundo». Agora, fica claro que foi a partir de dentro do próprio aparelho de segurança dos EUA que foi fabricada a suposta piratagem das eleições americanas «pelos russos». 
Ninguém conhecedor das informações tornadas públicas pode ter dúvidas quanto à enorme ampliação do «Estado de vigilância global» que atingiu o seu paroxismo durante a presidência Obama.

Mas a ignorância, o preconceito, o enviesamento são persistentes; tanto mais persistentes quanto as pessoas são «levadas ao curral» pelo medo. 
Este medo é constantemente insuflado e mantido, sempre que necessário, com ataques de falsa bandeira, montando operações supostamente atribuídas a «terroristas», mas - na realidade- originadas e insufladas por serviços secretos, por polícias, por instrumentos ao serviço do poder.




sexta-feira, 10 de março de 2017

PORTUGAL E SUA ORGANIZAÇÃO MILITAR


Como contribuição pessoal, deixo PISTAS para reflexão, que irei apresentar na jornada de 11 de Março de2017, na Fábrica de Alternativas.

Podemos analisar qual o regime saído do 25 de Abril, o golpe militar e de Estado duma oficialidade - «os capitães de Abril» - entalada entre uma guerra colonial eternizada e uma pertença a um «Ocidente», também do ponto de vista geoestratégico, mas sobretudo do ponto de vista da luta total anticomunista, sendo esse, aliás, o pretexto para a continuação, durante mais de uma década, de uma guerra colonial repartida entre três teatros de guerra separados por milhares de quilómetros entre si e de outros milhares à metrópole colonial.
Além dessa abordagem histórica de como surgiu e evoluiu o regime saído do «25 de Abril» de 74, deveríamos ter presente o momento crítico da implosão da URSS e do sistema do pacto de Varsóvia. A partir de determinada altura, modificaram-se os dados estratégicos fundamentais, no início da década de 90 do século XX em diante.
A compreensão profunda da nossa história recente (portuguesa, europeia e mundial) deveria levar-nos a repensar a nossa manutenção dentro da NATO. 
Do meu ponto de vista, esta manutenção dentro da NATO deveu-se ao complexo neocolonial (conforme analisei no ensaio «Portugal, País Neocolonial» de 2009). Devido a todas as ambiguidades do novo regime saído do 25 de Abril, os atores civis e militares assumiram como política (ou submeteram-se politicamente) a permanência na estrutura da NATO.  
Ora, nem uma História da guerra colonial, nem do regime pós 25 de Abril são objecto de estudo sério e independente pelos jovens. Estes não têm consciência de que muitos problemas na sociedade de hoje, a vários níveis, necessitam dessa tal leitura - verdadeiramente séria e independente - para se tornarem inteligíveis e portanto serem abordados de forma adulta e responsável.
Se um país neocolonial, como o nosso, tem Forças Armadas isso não se traduz por elas estarem ao serviço do povo e com função de defesa deste e do território nacional. Meramente fazem o papel de forças mercenárias, ao serviço de um poder imperial (embora institucionalmente sejam militares de carreira). Estão sob a chefia directa do superpoder imperial que controla o «hemisfério Ocidental» desde o final da IIª Guerra Mundial e que ficou como único superpoder mundial após o colapso do Pacto de Varsóvia.
O imaginário de uma nacionalidade está ligado às forças militares porque no passado tiveram um papel decisivo, ao unificar as várias classes em torno de um projecto político. Em Portugal, isso aconteceu repetidas vezes desde a reconquista no início da formação do Reino; na  luta pela independência em relação a Castela com o Mestre de Avis, etc., etc.  
Actualmente, no âmbito do regime de democracia representativa, o papel da força militar, consignado na Constituição da República e na Lei de Defesa Nacional, não é tido como problemático. Haverá um consenso aparente das forças políticas no hemiciclo. Mas este «consenso» é antes um pacto de regime e um pacto de silêncio. Se alguém falaciosamente disser que esse silêncio é o reflexo dum consenso ao nível da opinião pública nacional, respondemos: então é um consenso fabricado pelo silêncio da média corporativa, que se dedica a talhar «a regra e esquadro» a opinião, reduzida às forças políticas com assento no Parlamento. Porém, uma questão que é sistematicamente evitada, quer em programas eleitorais, quer no discurso político entre eleições é - justamente- qual o papel das Forças Armadas.

dois debates por fazer, pelo menos:

-Justifica-se a existência de forças armadas?

-Admitindo que exista opinião maioritária a favor da sua existência, que funções lhes competem e qual o seu desempenho?

Infelizmente, como há um silêncio transpartidário e mediático, nem uma nem outra das questões surgem no debate público. Isto porque todos os partidos, por razões diversas, NÃO QUEREM que esta questão seja levantada. Quando uma questão é sistematicamente evitada, estamos perante um complexo (social), um não-dito, um tabu. Porém, este não-dito tem consequências muito graves para o País.

Não se equaciona (faço uma listagem não exaustiva):

- A mobilização de soldados para teatros de guerra que não têm que ver com a defesa do nosso território e das nossas gentes
- Mesmo que sejam voluntários/as, quem assume a responsabilidade se morrerem ou ficarem gravemente feridos por uma causa que é essencialmente estranha aos interesses de Portugal e do povo português
- Os efectivos, os armamentos, os meios logísticos, portugueses são colocados ao serviço da NATO, da UE, da ONU, como país vassalo de um poder global e exterior ao nosso controlo e interesse nacional.
- O esbanjar de meios económicos e financeiros dum aparelho, inútil no melhor dos casos e prejudicial na maior parte das vezes, não apenas por não cumprir a missão que, constitucionalmente, deveria ser a sua, mas porque ao serviço de (super) potência estrangeira.
- As recentes modificações estruturais e operacionais vão no sentido de atribuir às FA um papel de policiamento interno, de militarização do espaço público, sob pretexto de terrorismo que serve para «justificar» tudo…
- Tal como se apresentam as Forças Armadas no presente, são uma casta privilegiada e que sustenta os privilegiados; um trunfo da elite do poder que se apoia em última instância na hierarquia militar para fazer reinar «a ordem» em caso de insurreição.