quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

SCOTT RITTER EXPLICA MUITO CLARO O PROCESSO DA GUERRA RÚSSIA-UCRÂNIA


 Scott Ritter é um militar americano, que fez parte de delegações destinadas a inspecionar o cumprimento de tratados de desarmamento nuclear bilaterais entre os Americanos e os Soviéticos. Ele  também é conhecido por ter trabalhado no âmbito da ONU em relação ao Iraque. Estamos perante um competentíssimo especialista e alguém que é verdadeiro, doa a quem doer. Os que querem aprender, aprendam; «Uma guerra é sempre um ato de agressão» mas, no caso da invasão russa da Ucrânia, é mentira que tenha sido um ato de agressão «não provocado»: foi claramente provocado pela OTAN.

É uma entrevista boa, porque o entrevistador (penso que seja holandês) coloca questões difíceis, às quais Scott Ritter responde, pondo os pontos nos ii . 

Censores, Incompetentes & Corruptos

 É assim -censores, incompetentes & corruptos - que Gonçalo Lira caracteriza as sociedades ocidentais e sobretudo as suas classes dirigentes. Ele efetua o paralelo com a União Soviética dos últimos tempos antes do seu colapso. Vale a pena ouvir este homem corajoso que vive em Karkov! Como tem um acesso muito limitado à Internet, talvez ele escolha exemplos significativos, que ilustram melhor o seu pensamento. 

As suas intervenções, curtas, têm grande densidade, embora sejam ditas num tom ligeiro, de "piada".


https://www.youtube.com/watch?v=Lc3ntJx_AjM


Só que ele é muito mais sábio e culto do que milhões de "youtubers" que procuram obter a nossa atenção!

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

O PANO DE FUNDO NÃO REFERIDO DE JEFFREY EPSTEIN*

 https://www.armstrongeconomics.com/wp-content/uploads/2022/12/FBI-Epstein.mp4?_=1

(Veja as imagens incluídas neste link acima. Atenção, são chocantes!)

Jeffrey Epstein era um playboy que tinha como sua sócia Ghislaine Maxwell  (filha do famoso Maxwell dos media britânicos e espião da Mossad). Tinha muito dinheiro disponível (de agências de espionagem, como a MOSSAD, ou CIA). Estava protegido por «boas» relações, incluindo o Bill Gates, o Bill Clinton, o Príncipe Andrew... e muitos mais. 
Ele, durante dezenas de anos, pôs a render, literalmente, as escapadelas sexuais de centenas de homens políticos e celebridades (masculinas). Utilizava mulheres jovens super atraentes em armadilhas sexuais. Os políticos ou homens de negócios, eram filmados em «atividade», com câmaras ocultas nas mansões de Epstein. Depois, chantageava-os com ameaça de divulgação das imagens.
 Não é novo; isto foi tentado com JF Kennedy e tem sido usado em muitos outros casos, mesmo em casos de investigação e de julgamento em tribunais. Não são boatos, é a realidade.
Claro que estas atividades de Epstein e da sua sócia Maxwell eram criminosas, não apenas pela chantagem, como também pela utilização de mulheres jovens, algumas violentadas e, muitas delas, menores. 
Mas, do sistema que usa estes métodos, não se fala. Também não se fala dos métodos utilizados pelas polícias e serviços secretos dos diversos Estados. Hipocrisias...


*NOTA: Este título refere-se à maneira como a media corporativa trata o assunto. Felizmente existem alguns escritores e jornalistas que estão apostados em que cheguem ao conhecimento do mais largo público todas as intrigas às quais estão associados J. Epstein e G. Maxwell. 
Se tiver oportunidade, leia a obra em dois volumes de Whitney Webb: 

«One Nation Under Blackmail: The Sordid Union Between Intelligence and Organized Crime That Gave Rise to Jeffrey Epstein»



ENTREVISTA COM O PROF. MICHAEL HUDSON (PARTE II)

(continuação da PARTE I do artigo)

(6.) Tenho lido muitos relatórios sobre o contexto das sanções contra a Rússia. Parece que as sanções fazem cada vez mais estragos, porque eles não conseguem produzir todos os produtos - em especial - os tecnológicos, sozinhos. Por outro lado, a Rússia tem agora negócios e compradores mais estáveis, com a China e a Índia.
Qual o efeito real das sanções, segundo a sua análise?

MH: As sanções dos EUA acabaram por ser um inesperado presente dos Céus para a Rússia. Na agricultura, por exemplo, as sanções proibindo as exportações de laticínios da Lituânia e dos outros países bálticos, provocou o florescimento da indústria de laticínios russa. Agora, a Rússia é o maior exportador de cereais, graças às sanções ocidentais, que têm um efeito muito semelhante às tarifas protetoras e às quotas de importação que os EUA usaram nos anos 1930, para modernizar o sector agrícola.

Se o Presidente Biden fosse secretamente um agente russo, ele dificilmente poderia ter ajudado mais a Rússia. A Rússia precisava de isolamento económico, mas estava demasiado comprometida com a política neoliberal, contrária ao protecionismo, para o fazer de sua própria vontade. Assim, os EUA fizeram-no por ela.
As sanções forçam os países a ser mais autossuficientes, pelo menos, nos produtos básicos, tais como os setores alimentar e da energia. Esta autossuficiência é a melhor proteção contra a desestabilização económica dos EUA, que - deste modo - conseguem forçar uma mudança de regime e aceitar a submissão.
Um efeito é que a Rússia vai precisar de comprar muito menos à Europa, mesmo depois de ter terminado o conflito na Ucrânia. Portanto, será necessário menos exportação de matérias-primas da Rússia para a Europa. Pode trabalhá-las ela própria. O coração industrial da Europa pode acabar por ir parar mais à Rússia e seus aliados asiáticos, do que aos EUA.
Isto é o resultado irónico da Nova Cortina de Ferro da OTAN.


(7.) Como descreveria a China, a Rússia e a Índia: Vê nelas capitalismo industrial ou socialismo?

MH: RIC sempre foi o coração dos BRICS, agora muito alargados pela inclusão do Irão e de vários países da Ásia Central, por onde passam as vias das Novas Rotas da Seda. O objetivo é que os países da Eurásia não estejam dependentes da Europa ou da América do Norte.

O ex-Secretário da Defesa Donald Rumsfeld referiu-se várias vezes à “Velha Europa”, como sendo uma zona a definhar, próxima da morte. Não se inteirou dos planos europeus de há um século atrás, de evoluir para uma economia crescentemente socializada, que sustente níveis de vida crescente e crescente produtividade do trabalho, da ciência e da indústria. A Europa, não só rejeitou o marxismo, como a própria base da análise marxista, ou seja, os economistas clássicos Adam Smith, John Stuart Mill e seus contemporâneos. Este, foi o caminho seguido na Eurásia, enquanto o liberalismo antigovernamental das escolas Austríaca e de Chicago destruíram a economia dos países da OTAN por dentro.

Visto que o foco da liderança industrial e tecnológica se está a deslocar para o leste, o investimento europeu e o trabalho vão, provavelmente, seguir o mesmo rumo.
Os países euroasiáticos continuarão a visitar a Europa como turistas, tal como os americanos, que gostam de visitar a Inglaterra, como se fosse um parque temático da nobreza pós feudal, com guardas do palácio real e outras distantes tradições do tempo dos cavaleiros e dragões. Os países europeus serão mais parecidos com a Jamaica e o Caribe, com o setor da hospitalidade tornando-se um dos principais vetores de crescimento, com empregados franceses ou alemães, vestidos com roupa "hollywoodesca". Os museus irão ser um negócio florescente, à imagem da Europa, que se transforma, ela própria, num tipo de museu da sociedade pós industrial .

(8.) Recentemente, houve o colapso e bancarrota da plataforma de cripto-moedas, FXT. A gestão desta companhia parece ser altamente criminosa. Como avalia isto?


MH: O crime é aquilo que fez o setor cripto crescer no passado recente. Os investidores compravam cripto-divisas porque são um veículo para as fortunas obtidas com o tráfico de drogas, de armas, de outra criminalidade e da evasão fiscal. Estes são os grandes setores de crescimento, na era pós industrial, nas economias ocidentais.

As pirâmides de Ponzi são, por vezes, bons veículos de investimento no seu estádio de arranque, no estádio de «bombear e despejar». Era inevitável que os criminosos não usassem somente as cripto-divisas para transferências de fundos, mas realizassem eles próprios as suas divisas, «livres da regulação opressora» do governo. Os criminosos são os mais coerentes discípulos, entre os adeptos da Escola de Chicago do livre-mercado.

Qualquer um pode criar a sua própria cripto-divisa, tal como nos EUA da época do Oeste selvagem, os bancos faziam isso em meados do século 19: Imprimiam a contento as suas divisas. Quando se entrava em lojas, no início do século 20, estas ainda mantinham as listas de cotações das várias notas de banco. As notas com um desenho mais bonito, eram tendencialmente as com maior sucesso.

(9.) Tem algum conhecimento das relações de FTX com a Ucrânia, com o governo de Kyiv? Existem algumas conversas e artigos, na media alternativa sobre isto?

MH: O FMI e o Congresso pagaram largas somas ao governo da Ucrânia e seus cleptocratas entronados. Houve notícias de imprensa sobre uma grande fatia desse dinheiro que foi devolvida à FTX, que se tinha tornado o segundo maior financiador do Partido Democrático (atrás de George Soros o qual, diz-se, anda a tentar adquirir ativos ucranianos). Então um fluxo circular parece ter operado: O Congresso vota os fundos para a Ucrânia, que põe parte desse dinheiro na plataforma cripto FTX, para pagar a campanha para reeleição de políticos favoráveis ao regime ucraniano.


(10.) Há uns meses houve artigos na imprensa dos EUA sobre os planos da FED: Estão a planificar estabelecer o dólar digital, a Divisa Digital de Banco Central (sigla em inglês: CBDC). Na Europa também, a Sra. Lagarde e o ministro alemão para as finanças, Lindner, falaram sobre a introdução do Euro digital.
Aqui, na Alemanha, alguns especialistas críticos têm avisado que isto apenas irá permitir uma total vigilância sobre a população e clientes. O que pensa sobre as divisas digitais?

MH: Não é o meu departamento. Todas as operações bancárias são eletrónicas, portanto, o que significa «digital»? Para os libertários, isto significaria não haver vigilância governamental, mas, se estiver nas mãos do governo, este manterá registo de tudo o que alguém gasta.

(11.) Qual a sua opinião sobre as presentes subidas ou descidas do Dólar US, do Euro, da Libra britânica, do ouro e da prata?

MH: O dólar vai continuar a ser procurado, devido ao facto de ter colocado a Eurozona na sua dependência. A libra britânica tem poucas possibilidades de sustentação, há escassos motivos para que estrangeiros queiram investir nela. O euro é a divisa «júnior», um satélite do dólar.

Sem dólares ou outras divisas nas suas reservas monetárias, os governos vão continuar a aumentar a proporção de reservas em ouro nos bancos centrais, porque o ouro não tem dívida associada a ele. Portanto, o governo dos EUA simplesmente roubou o ouro russo. Analogamente, os países da Eurozona fizeram o mesmo em relação às contas em divisas do Banco Central da Rússia. Não se pode confiar que países da Eurozona não sigam as ordens dos EUA, de tomarem as divisas de um Banco Central estrangeiro, portanto, tais depósitos serão evitados.

Como a taxa de câmbio do euro desce em relação ao dólar, o investimento estrangeiro irá diminuir porque os investidores não vão querer investir (1) num mercado em retração e (2) em companhias com sede na Eurozona, pagas em euros, que vale cada vez menos em dólares, ou noutras moedas sólidas.
É óbvio que o ouro do banco central deve ser guardado no próprio país, para não ser roubado, como foi o ouro da Venezuela. Foi o que fez o Bank of England (banco central do Reino-Unido), que tomou esse ouro e entregou-o a um direitista e fantoche ao serviço dos EUA. A Alemanha faria bem em acelerar o repatriamento do seu ouro, guardado nos EUA em cofres da «U.S. Federal Reserve Bank» de Nova Iorque.

(12.) Qual é a sua análise presente das crises financeira e energética no Mundo?

MH: Não tanto uma verdadeira crise como um «crash» em câmara lenta. O aumento dos preços beneficiou as exportações dos EUA: petróleo, alimentos e tecnologias informáticas (IT) monopolistas. Com o custo de vida a aumentar mais depressa para os consumidores, do que os aumentos de salários, haverá então um apertar do cinto para a maioria das famílias. A classe média irá descobrir que realmente é - ao fim e ao cabo - uma classe assalariada e irá mergulhar mais fundo na dívida, em especial, se tentar proteger-se tomando uma hipoteca para comprar sua casa.

Tenho estudado os séculos 11 e 12, para a minha "História da Dívida" e descobri uma história que pode ter relevância para as questões que coloca. A OTAN continua a declarar que é uma aliança defensiva. Mas a Rússia não tem qualquer desejo de invadir a Europa. O motivo é óbvio: Não existe qualquer exército capaz de invadir um país dos maiores. Mais importante ainda, a Rússia não tem sequer um motivo para destruir a Europa, enquanto sua adversária e fantoche às ordens dos EUA. A Europa já está a se autodestruir.

Recordo a batalha de Manzikert em 1071, quando o Império Bizantino perdeu contra os Turcos Seljuk (em grande parte, porque o general  do qual o imperador dependia, Andronikos Doukas, desertou e depôs o Imperador). A cruzada dos reis, um suplemento de jogo, cobre a batalha de forma extensa e declara como tendo tido lugar o diálogo seguinte, entre Arslan e Romanos:

Alp Arslan: “O farias se eu fosse trazido à tua presença como prisioneiro?”

Romanos: “Talvez eu te executasse ou te exibisse nas ruas de Constantinopla.”

Alp Arslan: “A minha punição será muito mais pesada. Eu perdoo-te e deixo-te em liberdade.”

Este é o castigo que a Europa irá receber da Eurásia. Os  líderes europeus fizeram sua escolha: serem satélites dos EUA.


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Esta tradução por MB, foi feita a partir do texto no link seguinte:

JIMMY DORE DESMASCARA A CASTA POLÍTICA DOS EUA, CORRUPTA E INCOMPETENTE


                                     https://www.youtube.com/watch?v=aZZ20LJXTeU&t=98s

O «sonho americano» é antes o «pesadelo americano» ou «para  acreditares na propaganda deles é porque estás a sonhar »...

Aumentam o orçamento para o Pentágono para o total 857 biliões de dólares, mais 55 biliões do que a proposta do Presidente.

Jimmy Dore diz ao público americano, depois de mostrar os exemplos concretos de corrupção em Washington: O vosso governo é mais corrupto que o da Rússia, mais que o da China. A casta governante dos EUA é o vosso principal inimigo.

Tanto faz serem votos de democratas ou republicanos no Senado e na Câmara dos Representantes. Deu-se o caso dos republicanos deitarem abaixo a proposta de orçamento para 2023.  Como alternativa, «impõem» um aumento de uns tantos biliões a mais*! 

* J. Dore exemplifica a situação grotesca com uma piada erótica: «Can I give you a kiss?» - «No, she rebukes him, don't do that! But what about a blow-job?»

segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

ENTREVISTA COM O PROF. MICHAEL HUDSON (PARTE I)

Da última vez que falámos foi para o magazine alemão "Four" em junho.  Agora também trabalho para a MEGA Radio, uma estação rádio de notícias para a Alemanha, a Áustria e a Suíça. Emitimos a partir de Viena e estamos localizados em Berlim, Baviera e Áustria.

Gostaria de o convidar para uma entrevista, a gravar no ZOOM, para o programa de rádio. Seria uma atualização da nossa última entrevista. Talvez tenha uma duração de 20-30 minutos.

O leitor, que veja também a nossa conversa anterior.

Aqui estão as minhas perguntas:

(1.) Fez algumas previsões na nossa entrevista para o magazine «Four» que se realizaram.

Falou sobre a crise das companhias alemãs em relação à produção de fertilizantes.  Esse assunto ocupou as primeiras páginas poucas semanas após a nossa entrevista.

Também afirmou:  “O que caracteriza o bloqueio do Nord Stream 2, é realmente a política de comprar americano." Isto tornou-se agora mais do que claro após a destruição dos gasodutos Nord Stream.

Poderia comentar sobre isso?

MH: A política exterior dos EUA tem-se concentrado, há bastante tempo, no comércio de petróleo internacional. Este, é decisivo como contributo para a balança de pagamentos dos EUA e o seu controlo dá aos dirigentes dos EUA a capacidade de impor estrangulamentos noutros países.

O petróleo é um fornecedor chave de energia e o crescimento da produtividade e do PIB das economias principais tende a refletir o aumento de energia usada por trabalhador.  O petróleo e o gás não são apenas para serem queimados, produzindo energia, mas também são uma matéria-prima química básica para os fertilizantes e, portanto, para a produtividade agrícola, assim como para boa parte da produção dos plásticos e doutros produtos químicos. 

Por isso, os estrategas dos EUA reconhecem que cortar os países do petróleo e seus derivados irá bloquear a sua indústria e agricultura. A capacidade de impor tais sanções pode permitir que os EUA tornem os países dependentes das suas políticas como meio para não serem «excomungados» do comércio de petróleo.

Os diplomatas dos EUA têm estado a dizer à Europa, desde há muitos anos, para esta não se basear no gás e petróleo russos. O objetivo é duplo: por um lado impedem um fator decisivo para o superavit comercial da Rússia e, por outro, capturam o vasto mercado europeu para os produtores americanos de petróleo e de gás. Os EUA convenceram os dirigentes governamentais alemães a não aprovar o gasoduto Nord Stream 2 e finalmente, usaram a desculpa da guerra da OTAN com a Rússia na Ucrânia para atuarem unilateralmente e conseguirem sabotar os gasodutos 1  e 2 do Nord Stream.

(2.) Para o nosso público:  No seu novo livro “The Destiny of Civilization: Finance Capitalism, Industrial Capitalism, or Socialism”,

...postula que a economia mundial está a fraturar-se em duas partes, os EUA e a Europa, na sua parte dolarizada

...e que esta unidade neoliberal ocidental está a levar a Eurásia - e a maior parte do Sul Global - para um grupo separado. Acabou de afirmar isso numa entrevista dada em Novembro.

https://michael-hudson.com/2022/11/the-rentier-economy-is-a-free-lunch/

Poderia explicar isso para o nosso público?

MH:  A separação não é apenas geográfica, mas sobretudo reflete o conflito entre o Ocidente neoliberal e a lógica tradicional do capitalismo industrial. O Ocidente des-industralizou as suas economias ao substituir o capitalismo industrial pelo capitalismo financeiro, inicialmente na procura de conseguir manter salários baixos e depois ao tentar e estabelecer privilégios de monopólio e mercados cativos, ou ainda elementos essenciais de tecnologia, das armas (e agora de petróleo), transformando-se em economias de rentistas.

Há um século, o capitalismo industrial estava no ponto de evoluir para o socialismo, com os governos a fornecer as infraestruturas básicas (tais como sistemas de saúde, de educação, comunicações, investigação e desenvolvimento) para minimizar o custo de vida e a proporcionar os negócios. Aquilo que são hoje os EUA, a Alemanha e outras nações, construíram desse modo o seu poder industrial, o mesmo que a China e outros países euro asiáticos têm estado a fazer mais recentemente.

Mas a escolha do Ocidente de privatizar e financeirizar a sua infraestrutura básica, desmantelando o papel do governo e entregando a planificação a Wall Street, à City de Londres e a outros centros financeiros,  deixou-os com pouco para oferecer a outros países - salvo a promessa de não os bombardear ou a tratá-los como inimigos, caso eles procurem criar riqueza por suas próprias mãos, em vez de a transferirem para os investidores dos EUA e de corporações internacionais.

O resultado é que, quando a China e outros países constroem as suas economias de modo idêntico ao que os EUA fizeram, desde  o pós Guerra Civil, até à IIª Guerra Mundial, são considerados como inimigos. É como se os diplomatas dos EUA vissem que o jogo está perdido e que a sua economia se tornou tão dependente da dívida, privatizada e com elevados custos de produção, que só esperam conseguir fazer que os outros países sejam seus tributários, dependentes enquanto for possível, até que o jogo chegue ao fim.

Se os EUA conseguirem impor o neoliberalismo financeiro no mundo, então as outras nações acabarão por ter os mesmos problemas que os EUA estão a sofrer.

(3.) Agora os primeiros terminais para gás liquefeito ( LNG) dos EUA estão abertos. Como é que isto afetará o comércio e a dependência /interdependência entre a Alemanha e os EUA? 

MH: As sanções dos EUA e a destruição de Nord Stream 1 e 2 tornaram a Europa dependente dos fornecimentos dos EUA, a um custo tal para o gás LNG (cerca de seis vezes o que os americanos e asiáticos pagam), que a Alemanha e outros países perderam a sua capacidade em competir no aço, no vidro, no alumínio e noutras manufaturas. Isto cria um vazio, que as empresas com sede nos EUA vão preencher com o seu investimento a partir de outros países, ou até dos próprios EUA.

A expectativa é que as indústrias pesadas, químicas e outras da Alemanha e doutros países europeus  tenham de se mudar para os EUA para conseguir petróleo e outros componentes essenciais, que lhes dizem para não comprar na Rússia, no Irão ou noutras alternativas. Assume-se que elas - indústrias europeias - não possam localizar-se na Rússia ou Ásia, pela imposição de sanções, multas e ingerências nas políticas europeias, pelos EUA.  Existem ONGs e satélites da «National Endowment for Democracy», como tem sido o caso desde 1945. Pode-se esperar uma nova Operação Gládio para promover os políticos que desejam manter esta nova Fratura Global e reorientar a indústria europeia para os Estados Unidos.

Uma questão é se o trabalho especializado alemão irá a seguir. Isso é aquilo que acontece tipicamente em tais circunstâncias. Este tipo de redução demográfica foi experimentada pelos Estados Bálticos. É um efeito colateral às políticas neoliberais.

(4.) Qual a sua visão sobre a situação militar atual na guerra Rússia/ Ucrânia? 

MH: Dá ideia que a Rússia irá facilmente vencer em Fevereiro ou Março. O que irá provavelmente criar uma zona desmilitarizada para proteger as áreas russófonicas (provavelmente, incorporadas na Rússia) do Ocidente pró-OTAN em ordem a prevenir sabotagem e terrorismo. 

Á Europa, irão continuar a obrigá-la a boicotar a Rússia e os seus aliados, em vez de procurar obter trocas mutuamente vantajosas por comércio e investimento recíprocos.  O EUA poderão incentivar a Polónia e outros países, a lutarem até ao último polaco ou lituano, à semelhança da Ucrânia. Isto irá pressionar a Hungria. Mas, antes de mais nada, haverá insistência para a Europa gastar somas imensas para se rearmar, sobretudo com armas dos EUA.  Estes gastos irão excluir muitas das despesas sociais, para que a Europa consiga suportar o aprofundamento da depressão industrial, ou distribuir subsídios para fazer reviver a sua indústria. Portanto, será crescentemente uma economia militarizada - ao mesmo tempo que a dívida dos consumidores e das empresas industriais vai aumentando, a par da dívida do governo.

Enquanto isto ocorrer, pode a Rússia decidir que a OTAN se deve retirar para as suas fronteiras de 1991. Este será, muito previsivelmente, um ponto de conflito.

(5.) Qual é sua opinião sobre a situação financeira nesta guerra.  O G7 e os governos da UE já falam de reconstruir a Ucrânia após a guerra. O que significa isso para os capitalismos de negócios e financeiros do Ocidente?

MH: A Ucrânia dificilmente poderá ser reconstruída. Antes de mais, muita população partiu e não é provável que regresse, dada a destruição de habitações, de infraestrutura ... e de maridos. 

Segundo, a Ucrânia é principalmente propriedade dum pequeno grupo de cleptocratas - que estão disponíveis para vender essa propriedade a investidores ocidentais da agricultura e a outros abutres (penso que sabe a quem me refiro).

A Ucrânia está já atolada em dívida e tornou-se um feudo do FMI (o que significa, na prática, da OTAN). Será pedido à Europa para «contribuir» e as reservas do Banco Central Russo apreendidas podem ser gastas a contratar companhias dos EUA, que irão fazer um negócio ótimo em fingir que estão a recuperar a economia da Ucrânia - deixando o país ainda mais enterrado em dívida.

Um novo Secretário de Estado do Partido Democrata irá fazer eco a Madeleine Albright, dizendo que a morte da economia, das crianças e dos soldados da Ucrânia «mereceram totalmente a pena», enquanto custos para espalhar a democracia ao estilo dos EUA. 

(continua, veja Parte II)