segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

ENTREVISTA COM MANUEL BANET, ELE PRÓPRIO



O QUE TE LEVOU A FAZER O BLOGUE «MANUEL BANET, ELE PRÓPRIO»?
Eu tinha estado muito mal, durante anos a fio. Precisava de me pôr «de pé» e tive ideia de escrever exactamente aquilo que me apetecia. Não por capricho, mas por uma necessidade de me situar a mim próprio, em relação às minhas convicções, aos meus gostos, às minhas vivências… Ao fazer algo potencialmente visível pelo público, tinha de ser mais exigente comigo próprio, do que se fosse meramente «confissões a um diário».

VEJO QUE TE INTERESSAS POR MÚLTIPLOS ASPECTOS DA CULTURA, DA SOCIEDADE, EMBORA TENHAS ALGUNS TEMAS DOMINANTES…
Sim; assim como sou, assim escrevo: tenho interesses variados, como sempre tive, às vezes reencontro velhas «teimosias», velhos «jeitos», mas tento não estar exclusivamente centrado na minha pessoa, nos meus pensamentos. 
Penso sempre se aquilo que estou a escrever ou a mostrar tem o mínimo de interesse para os outros. Senão, mais vale não publicar…

COMO ENCARAS O MUNDO DA POLÍTICA E DA ECONOMIA, HOJE EM DIA?
Tenho a visão de alguém que passou por muitos episódios, que observou muitas coisas, tentando reflectir sobre aquilo que se passava à sua volta. 
A minha intervenção hoje é mais distante, mas não é indiferente. Tenho horror ao estilo panfletário: tento fazer com que a minha posição, seja ela qual for, seja bem clara para os leitores. 
A política no sentido nobre de preocupação com os assuntos da sociedade em geral sim, é do meu interesse. A pequena intriga, o ódio vesgo e partidário, a mesquinhez, a difamação… tudo isso não cabe nos meus parâmetros. Não estou interessado em escrever assim. 
Tenho muita preocupação pelo facto de que as jovens gerações sofrem, sem o saberem, de uma constante lavagem ao cérebro, que as torna – mesmo inteligentes – incapazes de compreender o mundo. Eu tento dar um contexto a certos fenómenos, a certos factos. Espero contribuir com algo de positivo em relação aos outros. Em relação ao meu percurso pessoal, é importante também, pois ajuda a me situar e a ver as coisas em perspectiva.


O QUE SIGNIFICA PARA TI LIBERDADE?

Pergunta realmente difícil! Não considero que se possa ter uma ideia unívoca, que caiba dentro duma definição de dicionário. 
Acho que a liberdade humana é a capacidade potencial de cada pessoa em criar. 
Agora, no concreto, há muitas pessoas a quem lhes são negadas tais possibilidades, de uma variedade muito grande de maneiras. 
Em relação ao exterior, às forças externas ao indivíduo em sociedade, há uma liberdade «negativa», ou seja: a liberdade de não ter fome, de não ser preso por exprimir os seus pensamentos, etc. Esta liberdade «negativa», que poderíamos considerar também «as garantias do cidadão» está em perigo, hoje em dia, porque se confundiu durante demasiado tempo isso com a «defesa de privilégios».  
Mas o que me preocupa actualmente é o indiferentismo, que atinge tantas pessoas, ou por incultura, ou por cobardia, ou por egoísmo, ou tudo isso junto. Desta maneira, a liberdade ou as liberdades correm perigo, porque estas só são verdadeiras se e quando exercidas pela cidadania. 
Uma liberdade «letra morta», encerrada nos textos das leis, mas que não se exerce na vivência social, está mesmo morta, é um cadáver!

COMO ENCARAS O FUTURO DAS NOSSAS SOCIEDADES?
As sociedades souberam ao longo de milénios encontrar saídas para situações dilemáticas. A nossa época é uma de transição, em que muitas pessoas ficam desorientadas, onde não se tem qualquer certeza. Mas estas épocas são, normalmente, as mais promissoras em soluções.
O que me preocupa mais é a possibilidade dessas mil e uma experiências serem anuladas subitamente por uma catástrofe, como uma guerra nuclear, ou a perda da habitabilidade do planeta pelo excesso de poluição, pela destruição dos habitats, pelo esgotamento de recursos, água potável e outros… 
Como biólogo, encaro com imensa preocupação que as questões ambientais, muitas vezes, não se traduzem senão por discursos, destinados a captar o voto dos cidadãos, enquanto se tornam cada vez mais urgentes verdadeiras intervenções de protecção e recuperação dos nossos habitats.

QUE ASPECTOS DA BIOLOGIA TE TÊM INTERESSADO MAIS, NOS TEMPOS MAIS RECENTES?
Nos tempos mais recentes, frequentei alguns cursos online sobre epigenética, sobre paleoantropologia e sobre pensamento crítico. Estes cursos de elevado nível e com real conteúdo foram para mim ocasião de aprofundar coisas que nunca pude aprender, pelo menos de maneira sistemática, quer no meu estudo inicial, quer durante a minha vida profissional. 
Em particular, no caso dos cursos sobre a evolução humana, ensinaram-me imenso (e refrescaram-me conhecimentos também) sobre a bela e frágil aventura humana e como é tão preciosa. 
Estou certo que se houvesse uma compreensão mais aprofundada deste assunto, não apenas haveria maior cuidado em resguardar os vestígios do passado remoto, como se teria uma perspectiva da profundidade histórica da nossa própria espécie e das que nos antecederam. Logo, acredito que o conhecimento da evolução humana ajude a abater mitos e dar força a um humanismo integral, que tenha orgulho e humildade daquilo que somos enquanto espécie, em toda a sua diversidade.
  

EM TERMOS DE POESIA, QUE INFLUÊNCIAS TE MARCARAM AO LONGO DA TUA VIDA?
A poesia sempre me acompanhou desde muito pequeno, pelo que - para mim - é impossível dar um conjunto concreto de influências. Mas, na minha adolescência, lia com entusiasmo tudo o que me caía debaixo dos olhos. Tinha especial interesse pelos surrealistas e pelos autores maneiristas do século XVI e XVII. Hoje, ao ler poemas meus, vejo claramente que sofri essas influências estilísticas: é como se fossem vários Manuel Banet a escrever, umas vezes num estilo, outras noutro…

AS TUAS PREFERÊNCIAS MUSICAIS SÃO O BARROCO E O JAZZ CLÁSSICO, EMBORA OUTROS TIPOS DE MÚSICA TAMBÉM ESTEJAM PRESENTES: O QUE TE ATRAÍ MAIS NESTES ESTILOS?
Sim, aparentemente, o barroco e o jazz são géneros musicais muito distantes. Mas tanto um como outro, devem ser interpretados com enorme liberdade e também adequação, bom gosto. É isso que os liga subjectivamente, no meu espírito… não gosto de modelos demasiado rígidos.  Mas, a minha preferência por estes estilos, não anula a capacidade de apreciar outros estilos de música.

PREOCUPAM-TE AS REACÇÕES QUE POSSAS SUSCITAR NO LEITOR, QUANDO PUBLICAS ALGO NO BLOG?
Sim; preocupa-me, pois se trata afinal duma amostra daquilo que eu sou: não posso esquecer que estou a revelar algo de mim próprio, através dos meus escritos, sejam eles ensaios políticos, filosóficos, poesia, crítica de música, etc…
Por outro lado, não condiciono a decisão de incluir isto ou aquilo ao que suponho seriam as reacções de um dado público. Primeiro, porque não ando «à caça» de nenhum público (!) e, depois, porque não se pode «agradar a gregos e troianos»: quem não aprecia o que eu escrevo, simplesmente não vai ler… é um blog aberto, sem vinculação a nenhuma agenda particular. Agora, o que ocorre com frequência, é receber reacções aos meus escritos da parte de pessoas amigas.








domingo, 27 de janeiro de 2019

[OBRAS DE MANUEL BANET] COMPOSIÇÃO


Fazer poesia com as mãos
Moldar estátuas de fumo branco
Entoar as horas pelos valados
De noite escalar as dunas
De dia ouvir zumbidos no lugar

Assim irei rente ao rio 
Canoa sem mastro e sem remos
Serei aquela ave de falcoaria
Ou aquela raposa assustada
Clandestina senha do juncal

Mais não saberei que meus dias
Minhas errantes caminhadas
Aquelas visões de poente

E me extinguirei sem dor
Sem assumir dívida ou herança
Apenas assoprado como vento
Da alma entregue ao universo

(Murtal, Parede, 23 de Janeiro, 2019)

sábado, 26 de janeiro de 2019

VENEZUELA: FABRICAÇÃO DO «INEVITÁVEL» GOLPE...


Começaram por fazer um boicote a todos os meios de subsistência da Venezuela. Lembram-se da «campanha do papel higiénico»? O boicote económico implicava que apenas se conseguiam coisas essenciais à custa de dólares e estes obtidos no mercado negro, a um valor múltiplas vezes superior ao câmbio legal. Foi assim que começaram a desencadear o ciclo infernal da hiperinflação. 
A Venezuela estava bem exposta a esse tipo de sabotagem, na medida em que - devido à bonança do petróleo - as pessoas recebiam ajudas do governo para praticamente tudo, o qual governo se abastecia de dólares no mercado petrolífero, distribuindo esses dólares aos comerciantes que os usavam na importação de bens de consumo. A partir de determinado momento, os comerciantes começaram a guardar os dólares, muitos deles, com certeza, fora do país, em vez de os trocar por mercadorias. Organizou-se a escassez, que levou à inflação e depois à hiperinflação.

A CIA esteve desde sempre associada na Venezuela com todo o tipo de contestação, desde a mais «política», à mais terrorista, à sabotagem económica, que culminou com uma série de sanções cada vez mais abrangentes, do governo dos EUA contra o Estado Venezuelano.
A guerra económica era apenas uma etapa para o golpe, para a substituição de Maduro por um Juan Guaido fiel e submisso aos seus patrões dos EUA: com 35 anos, preside ao parlamento, membro da oposição, não tem direito constitucional de tomar o cargo de presidente, visto que Maduro ganhou as eleições presidenciais, de forma totalmente legal, como foi decretado pelos juízes, que avaliaram (e descartaram) as queixas sobre o referido processo eleitoral.  
A utilização de países da América Latina (e do Canadá) como apoiantes do golpe, mostra claramente quais estão ao serviço do imperialismo, por sinal os que já tinham sido largamente favorecidos pelo «maná» vindo de Washington. 
Logo que se trata de subverter um processo democrático que escapa ao seu controlo, estes fantásticos «democratas» esquecem logo certos factos, relegados a «pormenores sem relevância» como, nomeadamente, de que uma grande maioria do povo venezuelano votou em eleições consideradas livres e legítimas e elegeu Nicolas Maduro.

É lamentável ver a falta de coragem de uma certa esquerda, sendo que as personagens que nos EUA realmente colocam as coisas em termos factuais são Paul Craig Roberts e Ron Paul.



Caitlin Johnstone trouxe ao nosso conhecimento o acto corajoso de Medea Benjamin, que realmente diz as coisas que os presidentes da Organização dos Estados Americanos não gostaram de ouvir, mas totalmente certas:


Fazer um golpe de Estado, não é solução, além de que é criminoso; é o caminho mais certo para desencadear uma guerra civil, uma tragédia. 
Apoiar um golpe de Estado é uma cobardia; quem sofre as consequências é o povo desse país, não os presidentes que nas suas poltronas lançam uns contra os outros e promovem o caos.


sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

ALAIN SOUCHON - FOULE SENTIMENTALE + LA VIE NE VAUT RIEN




A canção «foule sentimentale» fez um enorme sucesso em 1993, mas este cantor autor tem muitas outras composições de grande qualidade. 
Por exemplo, «la vie ne vaut rien», que tem os ingredientes necessários para ser um sucesso.

Não compreendo por que razão a canção francesa tem tão pouca estima do público de Portugal, tanto mais que um número considerável de pessoas, jovens e menos jovens, viveram em França (como emigrantes ou descendentes) e depois voltaram para Portugal. 



                                




LA VIE NE VAUT RIEN

Il a tourné sa vie dans tous les sens
Pour savoir si ça avait un sens L'existence Il a demandé leur avis à des tas de gens ravis, ravis De donner leur avis sur la vie Il a traversé les vapeurs des derviches tourneurs Des haschich fumeurs et il a dit La vie ne vaut rien, rien, la vie ne vaut rien Mais moi quand je tiens, tiens, Mais moi quand je tiens, Là dans mes deux mains éblouies, Les deux jolis petits seins de mon amie, Là je dis rien, rien, rien, rien ne vaut la vie, Il a vu l'espace qui passe Entre la jet set les fastes, les palaces Et puis les techniciens de surface, D'autres espèrent dans les clochers, les monastères Voir le vieux sergent pépère mais ce n'est que Richard Gère, Il est entré comme un insecte sur site Internet Voir les gens des sectes et il a dit La vie ne vaut rien, rien, la vie ne vaut rien Mais moi quand je tiens, tiens, Mais moi quand je tiens, Là dans mes deux mains éblouies, Les deux jolis petits seins de mon amie, Là je dis rien, rien, rien, rien ne vaut la vie Il a vu manque d'amour, manque d'argent Comme la vie c'est détergeant Et comme ça nettoie les gens, Il a joué "Jeux interdits" pour des amis endormis, La nostalgie, et il a dit La vie ne vaut rien, rien, la vie ne vaut rien Mais moi quand je tiens, tiens, Mais moi quand je tiens, Là dans mes deux mains éblouies, Les deux jolis petits seins de mon amie, Là je dis rien, rien, rien, rien ne vaut la vie. Rien, rien, rien, rien ne vaut la vie Rien, rien, rien, rien ne vaut la vie Rien, rien, rien, rien ne vaut la vie.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

BIG BROTHER QUER O TEU ADN

                             
https://www.zerohedge.com/news/2019-01-23/uncle-sam-wants-your-dna-fbis-diabolical-plan-create-nation-suspects

Segundo nova lei em vigor nos EUA (ver ligação a artigo, acima), a polícia pode recolher ADN de meros suspeitos e estes dados ficarem arquivados numa base de dados de ADN. 

Os kits portáteis de análise do ADN cabem numa mala com o tamanho de um computador portátil, sendo possível obter os dados de ADN, a partir de uma amostra, num tempo reduzido.

Porém, a recolha e tratamento destes dados não estão isentos de erros, havendo sempre a possibilidade de um perfil de ADN - supostamente de um criminoso procurado pela justiça - ser afinal de uma pessoa inocente. 

Pior ainda é a certeza de que tal base de dados possa ser pirateada, pois as informações podem valer muito dinheiro, quer para vender a diversas entidades, quer para exercer chantagem sobre determinadas pessoas. 

A ligação de uma tal base de dados sobre ADN dos indivíduos às bases que analisam perfis de utilizadores de Internet e de redes sociais, poderá significar o controlo totalitário das pessoas e da sociedade em geral, por governos. 
Estes não precisarão de prestar contas a ninguém sobre aquilo que fazem realmente com estes dados, usando o pretexto de que estão somente a perseguir e a vigiar criminosos...ou suspeitos de crimes.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

GLOBALISTAS REUNIDOS EM DAVOS...

CARAS JOVENS E SIMPÁTICAS PARA NOS VENDER UMA 
«GLOBALIZAÇÃO ALTERNATIVA, VERDE, SUSTENTÁVEL...»


Davos, mais uma vez, surge como montra da alta finança e do globalismo político. Mas, desta vez, os mais importantes líderes mundiais não estarão presentes, Trump sob pretexto do «shut down», Macron por causa da revolta dos Coletes Amarelos e outros, sob os mais diversos pretextos. 
Este fórum tornou-se muito odiado pelas populações, não apenas pelos activistas alter-mundialização, como também e sobretudo pelas gentes comuns que sabem perfeitamente que eles estão reunidos , neste género de fóruns, para congeminar novos processos de manter o domínio da grande finança nos assuntos mundiais e internos de cada país. 

Sinal dos tempos, Davos, este ano surge com uma preocupação de tornar a mundialização mais «inclusiva» e mais «sustentável». Sempre o mesmo discurso tranquilizador, no fundo, mas com uma inquietação maior neste início de viragem em descida dos mercados financeiros mundiais. O problema para as elites é saber como gerir a enorme frustração da população não privilegiada, aquela que assistiu à «recuperação» dos mercados, na década pós-2008, mas que ela própria estagnou ou regrediu em poder de compra, em segurança no emprego, em qualidade dos serviços sociais e todos os parâmetros de qualidade de vida, em geral. 
Esta população não se mostra nada submissa, a avaliar pelas reacções dos Coletes Amarelos e o efeito que estão a ter em toda a Europa. Isto passa-se antes da grande crise anunciada, que hoje em dia os  próprios media corporativos já dão como real, depois de terem denegrido todos os que tivessem dado conta dos sinais precursores.

A mensagem de Davos, aos seus fiéis, é clara: 

A elite do dinheiro precisa de reorientar-se,  se quiser sobreviver na grande tempestade que se aproxima no horizonte: 
- Tem de tornar a exploração menos agressiva, menos impiedosa, mais «inclusiva». 
- A sua ganância sem limites, tem de ser mascarada de benfeitora da humanidade, com projectos de salvação do planeta, sobretudo usando a enorme trapaça das alterações climáticas, que serão a face sorridente, verde, ecológica, sustentável, do capitalismo global.

É esta a receita que eles têm cozinhado para as classes muito ricas passarem este período de grandes abalos e reestruturações da economia mundial. 

Cabe a nós, cidadãos lúcidos, desvendar os seus propósitos de controlo sobre as pessoas e as riquezas planetárias. 
Isto tem sido e continuará a ser o verdadeiro objectivo estratégico das oligarquias dos grandes negócios e da grande finança mundial, aliada a um certo número de políticos por eles comprados.

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

QUE SURPRESA! TODOS OS PARTIDOS SÃO CLIENTELARES...

Na sequência de mais um escândalo, desta vez envolvendo a autarquia de Loures dirigida por comunistas, e um genro do secretário-geral do PCP Jerónimo de Sousa, verifica-se de novo aquilo que já era evidente (pelo menos) desde que se «consolidou» a democracia parlamentar neste país, por volta de finais dos anos 70: O poder dum partido está na proporção directa da percepção que o público tenha de que possa influenciar nos assuntos de Estado e nos negócios. 
Aderem muitos, na medida em que tal ou tal partido possa ser influência decisiva para arrancar um contrato ao nível autárquico, uma autorização para edificar em zona protegida, etc, etc... Sobretudo, através dos partidos muitos esperam obter emprego na máquina do Estado, algo que também foi notório durante a primeira República e ditadura. No fundo, nunca deixou de ser um forte «motivador» para as pessoas se inscreverem em partidos (durante a ditadura, a inscrição na Legião Portuguesa ou na União Nacional, era condição para aceder a muitos cargos de funcionários, mesmo os mais ínfimos, sem quaisquer funções decisórias).
O que me espanta é a aparente inocência (digo bem, aparente) dos escrevinhadores dos media, que se «escandalizam» com tais práticas, das quais eles próprios são participantes ou, no mínimo, testemunhas quotidianamente. 
Dirão que a democracia não é perfeita, mas que é o regime que permite um máximo de participação popular nos assuntos do Estado. Permitam-me discordar. 
A democracia, tal como é entendida no presente e nos nossos países europeus, é antes um processo para arredar os cidadãos da coisa pública. Quando cidadãos desencantados se erguem e clamam por mudanças, como acontece agora em França, com a revolta dos coletes amarelos, os partidos daqui calam-se, assobiam para o lado, enquanto a media é rápida a difundir imagens de comportamentos menos correctos, omitindo a imensa maioria de situações em que os coletes amarelos se comportam com a maior responsabilidade. 
Sobretudo, os media deste país não se atrevem a explicar ao povo português quais são as verdadeiras razões da revolta!

RAZÃO Nº1: Existe um défice profundo de democracia e de respeito pela cidadania: Os países da Europa foram metidos num colete de forças chamado tratado de Lisboa, que é afinal uma constituição anti-democrática, que nem sequer tem a coragem de dizer o seu nome. A razão de se mascarar assim, sob forma de tratado, aquilo de que, de facto, é uma constituição, tem tudo a ver com a rejeição em 2005 do tratado constitucional pelo povo francês e holandês, em referendos democráticos, que foram ignorados e espezinhados pelos respectivos dirigentes.

RAZÃO Nº2: Há uma perda de capacidade económica por parte de um número crescente de famílias trabalhadoras. Em face da perda progressiva da competitividade da economia, a reacção dos poderes dos diversos países, quaisquer que sejam as colorações políticas, foi de aumentar o endividamento dos Estados. Por este motivo, está-se numa situação de crise de dívida permanente, apenas disfarçada pela artimanha do BCE de comprar a dívida (quase toda) dos países do Euro do sul europeu. Mas este mecanismo está a partir de agora, oficialmente fechado.
Para fazer face a um aumento dos juros da dívida, perante um decréscimo de actividade industrial e uma fuga de capital para paraísos fiscais (que eles não querem verdadeiramente estancar pois são beneficiários) o único recurso que resta aos Estados é subir impostos. Como os impostos directos são proporcionais ao rendimento das pessoas, eles vão sobretudo abater-se sobre os impostos indirectos, as taxas sobre o gasóleo, o IVA, etc... 

A MANIPULAÇÃO: Aquilo que se quer fazer passar por retorno a visão de extrema direita, reaccionária, classificando os que contestam de forma pejorativa como soberanistas ou ainda populistas, nada mais é do que a reacção dos povos, fartos de serem espoliados por uma elite, seja ela de «esquerda» ou de «direita», que se arroga os comandos do Estado para favorecer - de todas as maneiras - a sua própria ascensão e manutenção ao estatuto de aristocracia. Nos tempos presentes, esta aristocracia é apenas a do dinheiro, sendo essa a medida de todas as coisas, no espírito e na letra do capitalismo financeiro e especulativo.

PROPOSTAS POLITICAS E ECONÓMICAS

As propostas dos coletes amarelos de reforma constitucional, permitindo um referendo de iniciativa cidadã, nada têm de democracia directa «radical», pois se baseiam nas formas muito tradicionais de democracia directa da República Helvética, cuja população vota, pelo menos, duas ou três vezes por ano em referendos nacionais e num número maior de referendos nos cantões ou municípios. 
Por outro lado, a diminuição da carga total das taxas ou impostos indirectos, substituíveis por um agravamento dos escalões superiores (imposto sobre fortunas) e sobre os lucros das firmas, não pode agradar ao 1%. Tem esta pequeníssima minoria ditado a campanha mediática para denegrir toda e qualquer iniciativa que venha das bases e pretenda reformar os aspectos mais «indecorosos» do sistema. 

Por ganância ou miopia, a reforma é tornada impossível pelos de «cima». São eles que criam as condições de uma revolução: claramente, ao inviabilizarem qualquer reforma dentro do sistema, estão a empurrar os de baixo a se radicalizarem a cada recusa de atenderem as suas reivindicações. No momento em que as massas vêem claramente que o poder apenas tem como objectivo a contenção e não a resolução dos problemas, dá-se uma explosão social, com perda completa da confiança dos governados nos respectivos governos


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