sexta-feira, 12 de abril de 2024

O CANÁRIO NA MINA DE CARVÃO*

                                                 O CANÁRIO NA MINA DE CARVÃO*



               Gráfico retirado do site https://www.goldmoney.com/research

Nas últimas semanas, tanto o ouro como a prata, têm subido de forma parabólica, sem cessar. Esta subida é correlacionável com uma situação muito anómala do mercado. Em particular, os acontecimentos geopolíticos indicam aos investidores (apenas 0.5% dos investidores têm ouro nos seus portefólios!) que estamos a passar pelo período mais conturbado, não só do século XXI, como das nossas vidas.

A instabilidade geopolítica foi potenciada por dois acontecimentos:

- O ataque terrorista contra um concerto na periferia de Moscovo, que fez 144 mortos e grande número de feridos, cuja responsabilidade o governo russo atribui aos serviços ucranianos, inspirados por Washington e Londres. Em consequência deste ataque, houve um potenciar e alargar de ações ofensivas russas em toda a Ucrânia.

O segundo evento é o ataque às instalações consulares iranianas, pelos israelitas. Este ataque causou sete mortos diretos, dos quais um general iraniano. 

Ao atacar representações diplomáticas, que são salvaguardadas pela convenção de Viena, estejam onde estiverem e sejam de que país for, o governo de Israel indicou que não hesitaria em transgredir todas as regras e convenções internacionais, como aliás o tem feito abundantemente no genocídio que leva a cabo em Gaza, desde o 7 de Outubro passado. 

Todo o mundo está a aguardar quando e como será a resposta iraniana a este crime. As representações diplomáticas são consideradas território do país; portanto, o ataque de Damasco pelos israelitas é uma agressão ao território do Irão. É uma agressão brutal, sem dúvida, motivada pelo desespero de terem de retirar de Gaza onde -apesar da chacina causada na população civil - não conseguiram erradicar o Hamas (o seu objetivo declarado).  

As pessoas mais bem informadas, assim como grandes empórios financeiros e os bancos centrais, já há muito tempo que começaram a acumular ouro (e prata) para enfrentar a enorme crise económico-financeira-monetária que está agora a começar a desenrolar-se, mas que desde 2008 era visível, aquando do quase-colapso do sistema global do capitalismo e das catadupas de dinheiro oferecido aos grandes bancos sistémicos e aos grandes fundos de investimento. 

Como de costume, os últimos a despertar são os pequenos, convencidos de que estão a  fazer fortuna na bolsa quando, na verdade, o valor nominal das ações deixou de ter significado, face à perda acelerada de valor (em termos reais de poder aquisitivo) das principais divisas nas quais essas ações estão cotadas. 

-------------

* No passado, os mineiros costumavam levar, para dentro das minas, canários engaiolados; se estes morressem, então isso devia-se a concentração elevada de metano, pois os canários eram mais sensíveis.  Então, havia que evacuar a mina, antes que ocorresse uma explosão. Ficou a expressão para designar o sinal que antecede a catástrofe em termos financeiros.

quinta-feira, 11 de abril de 2024

OPUS. VOL. III 11. PALAVRAS OBSCURAS



 Serão palavras obscuras,

As que eu tenho para te mostrar:


Amei a luz e o calor

Não vi o cortejo

De invejosos atrás de mim

Ofereci meu coração

E afeto, mas a quem

Não sabia dar de volta


Agora estou às voltas

Com o meu passado

Arrependimento?

Só de ter sido ingénuo

Pois amor não é pecado!


Neste mundo onde vivemos

Hipocrisia, cobiça e outros

Sentimentos venenosos

Involucraram-se

Nas massas cerebrais

Dos contemporâneos


Ao ponto de não saberem

Distinguir a realidade

Das suas narrativas 

Auto justificadoras.


Tenho pouca esperança

D'amanhãs que desencantam

Dedico-me a estudar e mergulhar

Na Natureza, ela me ensina


Meu otimismo está na fonte

D'onde a glória cósmica

Emana; nas sociedades

Contemporâneas

Em vão procurei

A fonte de Vida

Procurei longamente

No meio das trevas


Não tenhais ilusões

Procurai o bem e o justo

No interior de vós próprios

Não em discursos elogiosos

Mas no saber de si próprio


Só assim podereis 

Velejar na travessia

Do oceano turbulento.







terça-feira, 9 de abril de 2024

PLAYLIST: CHARLES AZNAVOUR - 20/20


 Procurei selecionar as canções que mais me agradam e que são do agrado geral. Mas também atendi aos fatores diversidade, criatividade, qualidade de interpretação. 
Este cantor/autor francês, de origem arménia, é o mais conhecido e cantado da sua geração. Faleceu em Outubro de 2018. Este ano, comemora-se o centenário do seu nascimento (a 22 de maio 1924 ).

 Aznavour, não só foi o autor da letra e música das canções - mais de duas centenas - como também foi um cantor excecional, com grande expressividade e nitidez na dicção.

Digam-me se concordam que os 20 sucessos de Aznavour desta playlist pertencem às suas vinte melhores composições/interpretações !

domingo, 7 de abril de 2024

OPUS. VOL. III 10. VENDAVAL DE ABRIL

 


Onde estão os dias da minha juventude

Em que dançávamos embevecidos pelos sons

Que nos pareciam dizer o que nos ia no coração

Em que as raparigas eram atraentes e prudentes

Para nos darem esperança de namoro somente

As infinitas discussões politicas, as ilusões 

Podeis rir ou desprezar; eu tenho boas recordações

São minhas, são vossas, rapazes e moças desses anos

Não importa que sejais avós, que estejais na reforma

Este período da nossa história coletiva foi

Entre exaltações, ilusões e trambolhões

O tempo único de florescimento

O desabrochar de mil canções

Que nos encheram corações e almas

De esperança

Não será isso o mais importante?

- Aquilo que nos faz viver,

Nos transporta além do nosso ego

- Aquilo que vence a estupidez

A mesquinhez e a cupidez?

Serei sempre adolescente

Na alma, não por passadismo

Mas por escolha, depois de ter

Visto a miséria em que se transformou

 Boa parte dos adultos de hoje:

O seu "ideal" é encaixar no sistema!


Perdoo tudo, menos a covardia 

O não ter coragem de fazer

O que seja preciso, para repor 

A justiça e dignidade no seu entorno

Podem ter muita "competência", etc. mas

 Onde está a vossa decência?

Se quiserdes, podeis viver "com a espinha direita"

É vossa escolha... 

Digo-vos ser bem pior

Viver rastejando e espezinhado. 


- Tudo o resto é bem pouco, indigno

E fracassado, não tenham ilusões:

O "vencer na vida" que eles apregoam

É vencer no concurso

Para escravo abjeto dos Senhores

Se é este  o vosso objetivo, lamento,

Mas não terei qualquer palavra de apreço

Pela vossa entrega ao serviço das bestas

Do momento;  só poderei lamentar.


Os outros que me seguem

Sabem que eu não lhes tento vender

Esta ou aquela ideologia

Apenas que sejam livres, humanos,

Dando e recebendo  amor

O amor verdadeiro que não 

Se vende nem compra

Que pode ter ou não ter

Uma componente física. 

Tem de ser genuíno.


sexta-feira, 5 de abril de 2024

O ESPELHO DE NARCISO

MITOLOGIAS (XIII*)

 

Narciso era um jovem muito belo, mas que vivia sob  um decreto do destino, revelado à nascença, a sua mãe: Ele viveria muito tempo, se nunca visse a sua própria imagem. Mas, num dia de grande calor, o jovem Narciso debruçou-se para beber água de uma fonte. Aí, viu o reflexo do seu rosto e ficou siderado pela sua própria beleza. Tanto se enamorou de sua própria imagem, que tal obsessão o levou a definhar e a morrer.

Esta história da mitologia grega, como todas as outras, é uma forma simbólica de descrever traços de personalidade, por vezes nefastos, dos humanos.   

                                           Jehan Georges Vibert: Narcisse

Cada um fará a leitura que mais lhe pareça adequada à sua visão: Sem dúvida, que a história indica algo profundo da alma humana. Por outras palavras,  não se trata de uma história «moralizadora».

Note-se a relação da história de Narciso, com a de Psyché (a jovem mulher tão bela, que fazia inveja a Afrodite) e Eros (o Amor, filho de Psyché). O reflexo, aqui, é devolvido a Psyché pelo amor heterossexual ou seja, apenas este pode funcionar como o real «espelho» da alma; não o próprio, não o autoerotismo, mas o confronto com o não-próprio, com o amor de outrem. 


                                   Psyché e Cupido, por Canova

Nos dois mitos, o sujeito - quer seja Narciso, ou Psyché - está perante si próprio/a, está a ver a imagem de seu corpo, de sua alma (eidolon ; «ídolo»). Quando Psyché observa a sua perfeição ao espelho, dá-se aí oportunidade para o enamoramento narcísico. Mas, Eros vem durante a noite: Eles fazem amor em sonho, satisfazendo-se o desejo de Psyché, de amar e ser amada. 

No caso de Narciso, porém, o percurso de vida é descendente; o auto-amor conduz à auto-destruição. Segundo uma versão do mito, Narciso tanto se enamorou da imagem, que acabou por mergulhar no lago que a reflectia e afogar-se, no vão desejo de se unir a ela. 

Quando observo os meus contemporâneos, especialmente as pessoas que se transportam para todo o lado com smartphones e que os utilizam - entre outras funções - como câmara fotográfica portátil, não posso deixar de me surpreender pela frequente realização de selfies, ou seja, de imagens de si próprios. Estes selfies podem também ser com outrem, ou até em grupo, sem dúvida. Porém, o mais frequente é tratar-se de autorretratos singulares, em geral, com alguma paisagem ou monumento por detrás, como para imortalizar o momento. Trata-se de uma glorificação do ego, sem dúvida. Que estas pessoas afinal sejam narcisistas, isso não se pode inferir pelo simples gesto de fazer um «selfie». Mas, simbolicamente, creio que o gesto dá a imagem do tempo em que vivemos; a exaltação do ego, o amor de si próprio, o egoísmo e hedonismo glorificados.

Seria injusto inferir que todas as pessoas que tiram selfies, sejam necessariamente egolátricas. Porém, é expectável que se observe tal comportamento, se alguém for egolátrico, narcisista. Não nos podemos admirar que ele/ela se comporte desta maneira, que se mire e remire ao «espelho» do smartphone e queira "eternizar" sua imagem, associando-a à paisagem magnífica, ou a um monumento célebre.  

Lembro-me duma publicidade a uma marca de leite (há mais de uma dezena de anos, creio). Uma jovem mulher, de corpo esbelto e cara sorridente, afirmava: «Se eu não gostar de mim própria, quem gostará?» (ou algo semelhante, se a memória não me falha). 

Lembro também, há alguns anos, do aparecimento e propagação de uma daquelas frases-feitas: «de que é preciso cultivar a auto-estima».  Francamente, a auto-estima é cultivada  até à exaustão, até à desmesura de muitos se sentirem legitimados a pisar os direitos dos seus vizinhos, ou colegas, ou familiares, sob pretexto de levarem a cabo seu «projeto pessoal». Vi, com preocupação, tal «auto-estima» ser apresentada como algo de positivo, algo que se deveria cultivar nas crianças e adolescentes. 

Tal mentalidade conjuga-se com a tendência hedónica: «O ter aquilo que se deseja, de imediato, sejam quais forem as consequências; apenas atender ao prazer do momento.» 

Narcisismo e hedonismo são chaves para entender esta sociedade. Um comportamento é tanto mais interiorizado, quanto menos conscientes as pessoas estejam dele.

Não podemos viver sem espelhos no sentido próprio e figurado. Porém, os «espelhos» de Narciso ou de Psyché, são deformantes: Não revelam os segredos do corpo e do espírito, a quem olha sua imagem neles refletida. O «selfie» é somente uma imagem superficial.

-----------

*Consulte aqui os números anteriores desta série


terça-feira, 2 de abril de 2024

Concerto para Piano No.3, Op.37 de Beethoven (POLLINI/BÖHM)


 Uma singela homenagem aos Mestres falecidos... que vivem na música que escreveram ou executaram.


Escrito entre 1800 e 1803, este concerto em Dó menor deve muito a Mozart, que Beethoven venerava. O estilo característico do músico de Bonn transparece, porém, com a profusão de variações dos temas e contra temas, como mais ninguém faria no seu tempo. Beethoven, já famoso compositor, estreou este concerto executando, ele próprio, a parte solista. 
Não me parece que  este concerto, com tanta verve, tanta riqueza temática e o notável recurso a uma orquestra com dimensão sinfónica, seja justamente avaliado. Porque considero estarmos perante uma das obras-primas do romantismo nascente. 
Em artigos anteriores, referi as características estilísticas das composições de Beethoven, a sua rutura com os padrões clássicos e a inauguração de uma nova linguagem musical, que veio a receber o nome de «romantismo». 
Mas, os nomes, meras classificações, obscurecem a inteligência das obras. Podemos encontrar traços românticos nesta peça, naturalmente. Porém, estamos perante uma obra que não se afasta dos cânones clássicos. Porque, é preciso que se esclareça, o «classicismo», por sua vez, também é uma etiqueta cómoda, designando a tendência musical predominante dos anos 1770 a 1810, mais ou menos.  Nesta época, justamente, o estilo «Sturm und Drang» (um movimento literário «romântico») veio a afirmar-se, incluindo mesmo em obras de músicos ditos clássicos. Mozart tem sido considerado um músico que transcende as classificações mas, em todo caso, tem havido consenso em apontar várias obras suas como sendo «pré-românticas». 
A afirmação do génio de Beethoven não se deveu a uma rejeição do passado, mas à assimilação criativa do mesmo, com a preocupação de alargar o seu âmbito, para uma maior  expressão dos sentimentos.

Esta gravação, com a Orquestra Filarmónica de Viena dirigida por Karl Böhm e com Maurizio Pollini ao piano, honra perfeitamente a grandiosa arquitetura musical do Concerto nº. 3 para piano  e orquestra de Beethoven. 

segunda-feira, 1 de abril de 2024

PERCORRENDO O CAMINHO DA ESTUPIDEZ


                                    Psicologia do totalitarismo: reunião do partido Nazi, presidida por Hitler


Será um caminho estreito e tortuoso, ou uma grande e larga avenida?

- Pelo que me é dado observar, estou mais inclinado a pensar que se trata de uma larga avenida, pois consegue facilmente acomodar uma mole de gente, que está sempre pronta a tomar este caminho e com entusiasmo!

Mas, afinal, as técnicas da informática e da Internet não foram potenciar a capacidade das pessoas aprenderem tudo, sobre quaisquer assuntos e até onde quisessem, e de se informarem livremente?

-Estes meios foram postos à disposição das massas, a partir dos anos 1990, como instrumentos para potenciar a sociedade de consumo. Os conteúdos, sendo ditados por mamutes mediáticos e sua disseminação potenciada pelos gigantes tecnológicos (Facebook, Google, etc, etc), a enorme maioria deixou-se facilmente enganar.

A linguagem, o vocabulário, o próprio médium empregue não são neutros, mas a imensa maioria dos utilizadores dos meios digitais não percebe isso. Os seus cérebros estão completamente feitos reféns. Estão encerrados numa prisão cognitiva, mas julgam-se livres.

A incultura galopa. As pessoas já não leem livros. O número de livros requisitados nas bibliotecas universitárias desceu a pique. Estudantes universitários apresentam textos como sendo seus mas, na verdade, são produzidos por algoritmos de IA (Inteligência Artificial). Os professores e os membros de comités de revistas científicas deixam passar; preferem ignorar, como cobardes que são.

A cultura será - em si mesma - subversiva ?

- Sim, hoje em dia, a cultura verdadeira está em contradição com todas as falsas produções, com os simulacros de saber, que proliferam. Porque a cultura verdadeira é crítica, veicula o espírito crítico e ensina as pessoas a refletir criticamente, nada mais perigoso para o status quo.

Chegámos ao ponto em que percebemos claramente os vários autores de ficções sociais e políticas (George Orwell, Aldous Huxley, etc.). Estão diante de nós, podemos perfeitamente identificar os traços desses regimes totalitários, que deixaram de ser ficções: São realidade.

O mesmo se pode dizer em relação às análises de Hannah Arendt e de outros filósofos políticos do século XX, que analisaram o fenómeno totalitário e seus efeitos nas sociedades. Hoje em dia, o novo totalitarismo é combatido por alguns intelectuais corajosos. Mas, grande parte, ou se submete integralmente e apoia os globalistas, ou fala, mas evitando tocar nos «assuntos sensíveis» para não alertar a cidadania.

A maior parte das pessoas crê, com fé totalmente ingénua, na «verdade da ciência». Mas, não têm verdadeiro treino em ciência e em pensamento crítico; elas aderem a quaisquer idiotias. Por exemplo: Os lockdown para «combater» a pandemia de covid; ou «combater» as alterações climáticas através da destruição das  pequenas e médias explorações agrícolas e concentrando ainda mais a produção nos gigantes da agroindústria, etc.

A política deixou de ter que ver com propostas para a gestão da pólis (a cidade-Estado dos gregos) em benefício e de acordo com os desejos dos seus cidadãos. Tornou-se um campo onde se digladiam paixões, tanto mais radicais e extremistas, quanto se fundamentam apenas em aparências, em sombras, no teatro de marionetas e nas pulsões dos egoísmos extremados da mentalidade hedónica atual.

Os órgãos de «informação» passaram a ser órgãos de influência (propaganda) do seu público. O jornalismo de investigação desapareceu, praticamente, da media corporativa. As pessoas continuam a engolir propaganda, disfarçada de notícias. Nunca questionam tais notícias, em particular, se estas reforçam os seus preconceitos. «É mais fácil um camelo passar pelo buraco da agulha, do que alguém do status quo dizer a verdade.»

Como explicar o comportamento das pessoas?

- As pessoas podem estar hipnotizadas, mas não terem consciência disso. Existem vários tipos de hipnose. Num deles, as pessoas levam a cabo sua vida normal, na aparência. Mas, comportam-se de maneira automática, estereotipada, em resposta a um certo estímulo, quando este é desencadeado pelos que controlam o jogo.