sábado, 12 de novembro de 2022

TOP 20 de «MANUEL BANET, ELE PRÓPRIO»


Abaixo, uma lista dos 20 artigos mais visitados, neste blog. 

Os números da coluna à direita referem-se a visualizações nos últimos seis meses, apenas. Para consultar um artigo, podes transpor seu título para o motor de busca, no canto superior esquerdo acima do cabeçalho. 

Se estiveres interessado/a em receber regularmente as publicações de «Manuel Banet, ele próprio» (apenas um post por dia, no máximo), envia-me resposta para  manuelbap2@gmail.com, com a palavra «concordo» no título.


Boas leituras!
Manuel Baptista

sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Fantasia Cromática e Fuga BWV 903 de J. S. BACH

 ( ANDRÁS SCHIFF ao vivo)


Pode acompanhar a audição da peça lendo a partitura no vídeo seguinte: 



Esta obra para o cravo só se tornou conhecida muitos anos após a morte do seu autor, em 1802; a partitura completa (incluindo a fuga), ainda mais tarde. O manuscrito* que serviu para a primeira edição por Forkel, é do discípulo  de Bach, J. F. Agricola
A transcrição para piano foi efetuada por vários compositores, incluindo Liszt e Brahms, ao longo do século XIX. A transcrição aqui interpretada por András Schiff, é a de Busoni 

Podem ler-se muitas análises desta peça, em vários sites. O que escrevo abaixo é antes a minha apreciação estética, subjetiva.

Não posso deixar de colocar a Fantasia e fuga cromática, no cume da arte de Bach e mesmo, entre as mais geniais peças para teclado de todos os tempos. 
Pertence a um tipo de composição em díptico: Fantasia e fuga; Tocata e fuga;  Prelúdio e fuga. 
- Na primeira parte do díptico, predominam escalas ascendentes e descendentes, arpejos, etc., figuras típicas que simulam uma improvisação.  Quanto à escala cromática, esta proporciona dissonâncias e dramatismo, que se resolvem em harmonia. 
Este tratamento extrovertido, exuberante, corresponde ao «Stylus Fantasticus», uma designação dada pelo crítico musical Matheson contemporâneo de Bach.
- A segunda parte do díptico contrasta pelo  rigor matemático da fuga. Com efeito, esta é como «peça de ourivesaria», de artesanato musical requintado e subtil. Nesta fuga, em particular, verifica-se uma tensão permanente entre as vozes, uma incerteza que apenas se resolve nas últimas barras de compasso da peça.  Esta fuga sai bastante fora do que se considera típico em Bach, como nas fugas do «Cravo Bem Temperado». 

A interpretação ao piano desta composição é um exercício de virtuosismo, não só pelas dificuldades técnicas inerentes ao texto musical, como pela importância de se conservar uma certa contenção, de não se cair na excessiva exposição de sentimentos. No barroco, não se nega a sensibilidade da alma,  mas o «bom gosto» é de que os sentimentos sejam contidos, codificados.  Não se procura exibir os sentimentos numa efusão descontrolada mas, em vez disso, a sua representação sublimada.
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*Não se conhece nenhum manuscrito autógrafo de Bach para esta peça, mas a atribuição da autoria ao Mestre de Leipzig é segura.

quinta-feira, 10 de novembro de 2022

O MUNDO VISTO ATRAVÉS DAS PAREDES DUM AQUÁRIO

 


Estamos num mundo dividido, mas não segundo as linhas ideológicas traçadas por Biden num discurso recente, entre «autocracias» e «democracias». Ele queria de facto que as pessoas identificassem «autocracias» com todos os governos que não se conformam com a «rules based order» ou seja, o que os EUA consideram como «ser-se bem comportado». Pelo contrário, seriam «democracias» todos os que alinham com o imperialismo americano, seja qual for o seu registo de violações dos direitos humanos mais básicos, a começar nos próprios EUA!

Mas, para mim, não existe diferença onde Biden quer colocar a grande divisão. Existem países com governos que se comportam razoavelmente dentro do que se convenciona ser a «democracia representativa» no outro lado da «nova cortina de ferro», enquanto -do lado de cá - há bastantes cujo governo e as práticas se podem claramente identificar como «autocráticos». A visão dicotómica é falsa, pois qualquer país pode virar de ser uma relativa «democracia», para uma autocracia, quando existe um reforço das tendências autoritárias. Estas tendências, digam o que disserem, existem mesmo nas chamadas democracias ocidentais e nós temos abundantes provas disso, com a crise do COVID e com a histeria instrumentalizada contra a Rússia, não só contra o governo, como contra as pessoas e a cultura russas. Temos aqui uma prova cabal de que muitos governos do ocidente, dito «democrático», se comportaram como autocráticos, em relação à sua própria população. Em relação ao exterior, têm assumido posturas agressivas, belicistas e imperialistas, ou auxiliares da potência imperial.

Perguntarão: E do outro lado? Não há atropelos aos direitos humanos, não há governos autocráticos? Os que assim argumentam, provavelmente não se estão a aperceber de que é uma falácia, ou seja, não é um verdadeiro argumento. Sobretudo, não anula quaisquer dos factos comprovados em relação aos regimes do que convencionamos chamar «Ocidente», que inclui a Austrália, o Japão e outros, e que deveríamos antes chamar «Alinhados com os EUA». 

Demonstração da falácia

Primeiro, existe uma barragem de propaganda tal, que aqui, nos nossos países não somos informados mas desinformados, intoxicados de propaganda contra os países e governos que não se conformam ao modelo americano, sobretudo a China, a Rússia, o Irão e outros. Como tal, é impossível distinguir, em muitos casos, a realidade da propaganda. A não ser que cada um de nós se transformasse em jornalista e fosse visitar esses países, fazendo inquéritos e avaliando o pulsar da vida dessas populações. Isso é impossível, claro. Mas, pessoas que são jornalistas profissionais, não estão nos diversos pontos do globo a fazer um trabalho sério. A sua objetividade - sem viés ideológico ou partidário - deveria ser inquestionável, sobretudo, onde existam governos «autocráticos». Mas eles, quase sempre, só enviam - pelos seus media respetivos - uma visão distorcida, onde os aspetos negativos são amplificados e os positivos minimizados, ou passados sob silêncio. 

Segundo, mesmo que a imagem desses regimes, por eles enviada, fosse rigorosa e objetiva (hipótese infelizmente só teórica), tal não seria argumento válido: Se um determinado indivíduo se portar muito mal, não é por isso que eu sou um «santo». O mesmo se passa com os governos, os regimes dos diversos países: Não é por um regime A perseguir cidadãos ou não respeitar direitos humanos dos mesmos, que o regime B, onde nos encontramos, tem legitimidade para fazer igual, até mesmo que num grau menor. A legitimidade das ações do Estado e do governo, do ponto de vista formal e jurídico, é o que caracteriza um Estado de Direito. Este existirá, de facto, se os governos respeitarem e fizerem respeitar as constituições respetivas, se não permitirem derivas, nem desrespeito pelos direitos dos cidadãos. 

Em terceiro lugar, faço notar que a democracia não é nem nunca foi, artigo de consumo que se possa exportar. Não foi nunca assim. Os exércitos da República Francesa triunfante não exportaram a «democracia» na ponta das suas baionetas. O mesmo se pode dizer com todos os governos coloniais, que supostamente iriam «civilizar» os povos, o que implicava ensiná-los a viver em «democracia», segundo a metrópole. Mais recentemente, a invasão do Afeganistão pelas tropas da NATO, chefiadas pelos EUA, não trouxe senão devastação, nenhum bem-estar ou progresso e, sobretudo, o regime que ficou após o fim de 20 anos de ocupação dos ocidentais, foi o governo Talibã, ou seja, da mesma natureza que eles tinham derrubado na «guerra-relâmpago» de 2001... O mesmo descalabro (1) se pode verificar com o resultado de guerras na ex-Jugoslávia, Líbia, Iraque, Síria, etc.  Note-se que isto não é um argumento formal, mas substancial.

Em quarto lugar, o argumento de que existe uma real «democracia», quando um regime tem eleições, é um sofisma. Pois estas podem muito bem ser falsificadas, pode haver restrições explícitas, ou não, a certos partidos concorrerem, ou não existirem liberdades de opinião e de imprensa, etc. E tudo isto, pode ser num grau maior ou menor, pois raramente as situações são classificáveis como «preto ou branco», «positivo ou negativo», «bom ou mau». A «democracia» nos EUA, entre outras vicissitudes, foi objeto de distorções eleitorais (2) muito graves. Por exemplo, em 2000 com a fraude que afastou Al Gore e permitiu a eleição de G. W. Bush ou com a fraude que permitiu afastar Trump, em 2020. Trata-se de fraude comprovada; Trump recebeu maior votação que qualquer outro presidente anterior, que se tenha submetido a sufrágio. Digo isto, não por simpatia por Al Gore, nem por Donald Trump: Mas, são comentadores políticos, dentro da sociedade americana, que o dizem.

A vontade do povo e a expressão desta, é que deveriam ser os fatores distinguindo a democracia, de todas as outras formas de governo. Por isso, sou convicto «abstencionista» nos assuntos internos dos outros povos. Eles são compostos por pessoas adultas, tão capazes como eu de raciocinar: Saberão bem o que é melhor para seu país.

As «intervenções solidárias», que significam apoiar grupos dissidentes em determinados países, são formas de ingerência. Note-se que estas ingerências não são realizadas por idealismo, mas para derrubar ou, no mínimo, colocar entraves aos governos dos países em causa. Ora, assim como as sanções, este tipo de intervencionismo funciona, na prática, como ponta-de-lança das ambições imperiais.

Não há dúvida de que a propaganda também é dirigida aos cidadãos do «império ocidental». Especialistas em informação encarregam-se de moldar a opinião pública dos próprios países, usando toda a panóplia, desde a difamação, a falsa informação (fake news), a repetição de «clichés» (por exemplo: «Putin é isto ou aquilo...»), até a uma tendenciosa seleção de notícias, onde nada do que contradiga a narrativa fabricada, é deixado filtrar.

Se os peixes de aquário falassem, eles diriam que vivem em plena liberdade e que seu universo os satisfaz plenamente.

Os cidadãos do «ocidente», que estão satisfeitos e consideram que seus governos estão do lado do «bem», da «justiça», da «democracia», etc. são como os peixes de aquário, acima referidos. Quanto a estes últimos, serão espécimes das nossas águas ou de ambientes exóticos. E quanto aos primeiros, serão como robots ou zombies, não genuínos cidadãos.

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(1) Veja o vídeo seguinte sobre as guerras secretas do império: U.S. Secret Wars EXPOSED  
(2) Gonzalo Lira comenta AQUI as eleições para o Congresso. O problema com as fraudes, é que perante denúncia, as consequências legais apenas serão extraídas se o sistema não estiver corrompido.

quarta-feira, 9 de novembro de 2022

MICHAEL HUDSON: PORQUE RAZÃO OS EUA TÊM UMA POSIÇÃO ÚNICA NA HISTÓRIA DO IMPERIALISMO?


 O Prof. Michael Hudson dá uma entrevista memorável, que não deverá deixar de ouvir/ver! (para melhor compreensão pode acionar as legendas automáticas em inglês)

terça-feira, 8 de novembro de 2022

SAM COOKE : «IF I HAD A HAMMER»

Há muitas maneiras de interpretar a célebre frase de Arquímedes (ou a ele atribuída...): "Dai-me uma alavanca e um ponto de apoio, e eu levantarei o mundo"
Eu sei que - fisicamente - a alavanca estende (multiplica) a força exercida numa extremidade embora... se assim se conseguirá «levantar o Mundo», não sei! 
Com certeza, que se podem levantar objetos muito pesados, que nós seríamos incapazes de deslocar, aplicando diretamente ao objeto a força dos nossos braços. 
Mas, metaforicamente, sim! Há alavancas que conseguem levantar o Mundo! Há canções e momentos mágicos que catalisam as energias de uma mole de gente. Gente que antes estava entretida com seus afazeres individuais, que se congrega e se põe a cantar, a dançar e a bater palmas ritmicamente. Este é um desses momentos. 


 No Copacabana de New York City, Sam Cooke num concerto memorável, em 1964. 

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Propaganda 21 nº16: TWITTER E GUERRA DA INFORMAÇÃO

A saga da aquisição de Twitter por Elon Musk encheu as  parangonas dos jornais e redes da Internet durante vários meses. Isto, no fluxo incessante de notícias, é percebido por muitos como uma eternidade. Mas, na realidade, o que moveu tanta curiosidade foi, basicamente, o facto do multimilionário prometer «limpar» o Twitter da vergonhosa censura, com motivação política e mesmo partidária (favorável ao Partido Democrata* dos EUA). Que as esperanças de muitos (mas não a minha), se depositem num multimilionário que venha salvar a liberdade de expressão moribunda na Internet e redes sociais, deveria ser um claro aviso sobre a progressão do totalitarismo na sociedade globalizada do «ocidente». 



Agora, um estudo académico da Universidade de Adelaide, vem mostrar que os bots pró-ucranianos inundaram o twitter e o espaço cibernético nos primeiros tempos da invasão russa, enquanto os favoráveis a Putin tinham uma presença muito modesta. Exatamente o contrário do que a media corporativa nos queria fazer crer: 

 https://consortiumnews.com/2022/11/06/researchers-find-massive-anti-russian-bot-army/

Veja-se o excelente artigo de Philip Giraldi, que desmascara a tendenciosa e propagandística escrita de jornalistas do NYT. Este órgão era tido como uma espécie de farol do jornalismo de qualidade, independente. Pois, hoje isso é somente um mito:

https://www.unz.com/pgiraldi/naughty-russians/

Muito mais se poderia acrescentar, mas seria necessária fazer-se a atualização constante dos artigos da série «PROPAGANDA 21», que eu iniciei a 20 de Julho de 2021. 

Sabia que a 3ª guerra mundial, na qual estamos metidos, há algum tempo - há mais de 30 anos -  tem sido uma «guerra híbrida»? 

Uma guerra de informação (de propaganda) e cinética, que se alternam ou sobrepõem. A estas, juntam-se a guerra económica, de sanções, biológica, alimentar, sanitária, etc. 

Veja abaixo, qual poderá ser o papel da guerra da informação ou cognitiva, no dispositivo bélico da OTAN:  

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2022/01/estamos-metidos-numa-guerra-de.html

«Numa sociedade em que tudo o que dê lucro é privatizado e em que é classificado como subversivo tudo o que escapa ao poder e controlo tanto dos grandes consórcios, como dos políticos corruptos (... que sabem que nós sabemos), o controlo da Internet surge como um objetivo essencial para ambos.» 

Escrevi o texto acima num artigo sobre o exercício do tipo «jogo de guerra» (War Game) organizado pelo WEF, sobre aspetos de guerra cibernética e de informação, chamado «Cyber Polygon»:

https://manuelbaneteleproprio.blogspot.com/2021/08/o-que-e-o-cyber-polygon.html

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* A perceção que certas pessoas têm sobre o partido democrata nos EUA está longe da realidade. Uma propaganda continuada convenceu muitos que ele era historicamente o defensor dos direitos civis e da não-discriminação com base na raça. Porém, as coisas não são assim tão lineares, veja:

 https://www.zerohedge.com/news/2022-11-05/racist-history-democratic-party-1863-2020

PS1: Como eu dizia, o que se passa ao nível do controlo da informação está sempre a merecer atualização, pois os governantes e outros poderes nunca param, na sua «cruzada» de censura por aquilo que consideram «desinformação, terrorismo» etc, na Internet. Vejam agora o governo alemão (uma coligação de «Verdes» e «Social-Democratas») não se lembra de nada melhor, do que colocar entraves à livre informação no Twitter.   Vivemos num universo orwelliano, protofascista, em que o preto é branco, a ignorância é sabedoria, a guerra é paz, etc. Os governantes, que deveriam preservar a liberdade de informação, querem preservar-se (a si próprios!) da liberdade de informação porque temem -acima de tudo- o povo, sobretudo se bem informado.

PS2: O governo dos EUA, discretamente diz para os bancos NÃO cortarem com os russos. Veja o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=-m0x4ocs6EA Toda a charada das sanções está desenhada por um lado para agradar aos eleitores que ficam (alguns) satisfeitos por uma atitude «firme» contra a Rússia e... uma forma de liquidarem a concorrência europeia, que foi forçada a cortar os elos económicos com  Rússia, incluindo energéticos, entrando assim numa crise de desindustrialização, em benefício dos EUA.

domingo, 6 de novembro de 2022

O GRANDE JOGO: COMO SERÁ O NOVO SISTEMA MONETÁRIO MUNDIAL?

 

                https://mybaseguide.com/installation/fort-knox/community/inside-fort-knox/

Durante mais de seis mil anos, o ouro foi um metal monetário, junto com a prata. O que significa isso? Que as civilizações deram sempre um valor a tais metais preciosos e incluíram estes metais nas suas unidades monetárias, sobretudo nas mais valiosas. Assim, o mundo viveu debaixo de um «padrão-ouro» durante muitos séculos. Mais recentemente, houve a introdução do papel-moeda, com as características de um certificado convertível em ouro. Há um século, a unidade Dólar era confiável, pois se podia ir a um banco e trocar os dólares por uma quantidade fixa de ouro. Nessa altura, era verdade que os dólares eram «tão bons como o ouro».  

Porém, com a excessiva impressão de notas bancárias (certificados dando direito a determinada quantia em ouro, nominalmente), as principais potências «abastardaram» as suas divisas, imprimindo muito mais do que aquilo que possuíam sob forma de ouro, no banco central. O desfeche veio com a repudiação unilateral do Acordo de Bretton Woods, por Nixon em 1971, com o pretexto de que o dólar (a moeda de reserva mundial) estava a ser «atacado por especuladores» e «provisoriamente, tinha de ser desindexado do ouro». Até essa data, os outros países podiam trocar os seus dólares, que possuíssem em reserva nos seus bancos centrais nacionais, por ouro - na proporção de 35 dólares US/ onça de ouro.

O poder de compra de 1 dólar desde a criação da FED até hoje retirado do vídeo seguinte: https://www.youtube.com/watch?v=95-twYwB4c8

A desdolarização teria sido instantânea não fosse o acordo com os Sauditas, em 1973 (Acordo entre os EUA e Reino da Arábia Saudita) segundo o qual os preços do petróleo seriam exclusivamente em dólares (aparecimento do chamado «petrodólar»). Os sauditas e os outros Estados membros da OPEC, encheram-se então de dólares, aos quais deram sobretudo o destino de Obrigações do Tesouro dos EUA (Treasuries), os quais são uma forma segura e que dá um pequeno rendimento, de guardar os dólares.  Instaurava-se assim um ciclo, em que os compradores de petróleo forneciam dólares às monarquias do Golfo, estas compravam Treasuries, que são uma forma de financiar a economia americana. As obrigações são títulos de dívida, neste caso dívida do Tesouro dos EUA, portanto dívida «soberana». As "treasuries" vieram a encher também os cofres de outros países, nomeadamente, Japão e China.

Agora, chega-se ao ocaso do dólar como moeda de reserva mundial. A Rússia, há uns anos começou a despejar as suas "treasuries" e a reforçar outras divisas e ouro, nas reservas do seu banco central. A China, não subiu quase nada o seu stock de "treasuries", apesar de continuar a ter um enorme excedente nas trocas comerciais com os EUA. Os dólares obtidos foram canalizados sobretudo par financiar projetos de países terceiros, nomeadamente os que aderiram ao projeto das Novas Rotas da Seda. O próprio Reino da Arábia Saudita, sentiu o vento mudar e agora já aceita outras moedas que não o dólar para pagar o seu petróleo. Sobretudo não aceita que os americanos os pressionem para aumentar a produção de petróleo, sendo contrário ao seu interesse direto baixar os preços. Os americanos queriam forçar a diminuição do preço do crude no mercado mundial, «punindo» assim a Rússia: Mais um fracasso diplomático, estratégico e económico, para os EUA.

Os povos estão sujeitos à ditadura do dólar, quer queiram quer não, pois ele reina ainda com  cerca de 60% das reservas de moeda dos bancos centrais do mundo e um pouco mais do que isso, ao nível das trocas financeiras e comerciais internacionais.  Porém, um forte dólar, não significa «boa saúde» do sistema. Antes pelo contrário, significa que todos os parceiros da «zona dólar», mesmo os mais próximos aliados, são castigados por uma inflação que importam, têm de comprar mercadorias com um dólar alto. Mas os EUA exportam seus dólares: São os emissores de dólares em quantidades nunca vistas (mais dólares em poucos anos, do que em toda a história dos dos EUA). O dólar em papel ou, mais frequentemente, seu substituto eletrónico, é o quase exclusivo «produto de exportação» dos EUA.

Esta situação não pode durar por muito mais tempo. Os povos, inclusive o americano, estão a sofrer com uma inflação em crescendo, mas  não podem fazer grande coisa ao nível individual, pouco mais do que «apertar o cinto». Mas, os Estados têm zero incentivo para conservar dólares em reserva, caso tenham a possibilidade de diversificar noutras reservas. Acontece que têm essa possibilidade, é o ouro: em 2022 (e ainda não acabou o ano) os bancos centrais globalmente aumentaram suas reservas em ouro em cerca de 700 toneladas (números oficiais). Muito ouro não contabilizado nessas 700 toneladas fica na posse de particulares. Muito do ouro adquirido por Estados não é declarado, mas mantido em segredo para anunciar quando politicamente conveniente (caso da China, mas não é o único).

É inevitável que se vá para um novo sistema monetário. A aposta dos Bancos Centrais Ocidentais e obviamente, dos governos e dos grandes interesses corporativos no Ocidente é de que haja uma digitalização a 100% do dinheiro em circulação. Esta seria a forma deles terem o controlo sobre tudo, literalmente: não só sobre quanto os cidadãos recebem, como quanto e onde o gastam e  mesmo com possibilidade de sua retenção, caso os cidadãos não sejam dóceis! Este tipo de deriva totalitária, tem o próprio BIS por detrás, como tenho vindo a chamar a atenção dos meus leitores. 

Mas, um grupo de países decidiu recentemente fazer uma nova unidade monetária de reserva,  juntando as suas divisas em cabaz, adossado ao ouro e a matérias-primas (a mais óbvia sendo o petróleo): Ele é protagonizado pelos BRICS e por países que se têm vindo a aliar a este bloco, que já conta com a maioria do população mundial. A sua força será tal que o projeto anglo-americano/Ocidental de nova moeda de reserva mundial, exclusivamente digital, com respetivas moedas nacionais também digitalizadas a 100%, terá seus dias contados, talvez não possa vingar de todo, porque essa nova unidade monetária de reserva projetada pelos ocidentais, além de ser digital, não estará apoiada em nada de concreto, será uma divisa «fiat», como as existentes agora. 

É este o verdadeiro grande jogo. Tristemente, é por isso que morrem pessoas, em todo o mundo, umas na guerra, outras de fome e doenças. Isto parece-me absurdo, na medida em que tudo isso é, somente, para determinar quem deterá o controlo, o poder, a hegemonia do novo sistema monetário mundial: Será somente o grupo submetido ao império americano (unipolaridade), ou umas grandes potências (além da americana), que se estabelecerão, em parceria e em concorrência umas com as outras. Este último, seria o mundo multipolar desejado pela China, pela Rússia e por seus aliados.

PS1: Uma possibilidade, compatível com ambos os cenários acima referidos, é a revalorização dos ativos em ouro dos vários bancos centrais. Assim seriam "liquidadas" todas as dívidas dos bancos centrais a todas as entidades, incluindo os Estados, portanto aos contribuintes desses Estados. Não esqueçamos que a dívida de uns é o ativo de outros. A digitalização a 100% seria paralela a uma revalorização do ouro, o que daria a impressão (falsa!) de que "está tudo na mesma". Mas, na verdade, não estará porque a relação do dinheiro Fiat ao ouro (o dinheiro verdadeiro) corresponderia a uma grande perda de valor desse mesmo dinheiro Fiat, quer seja digital ou não!

PS2: O petróleo, a matéria prima mais importante em termos mundiais, está a aproximar o maior consumidor mundial (a China) e a Arábia Saudita (com a Rússia e países da OPEP). O interesse de Riade em fazer parte dos BRICS é inegável. Esta viragem não parece ter sido antecipada pelos EUA. 

PS3: Portugal está relativamente bem situado com 382 toneladas de ouro no seu banco central. Mas teria de resgatar uma parte (quanto?), que está «reservada» devido a operações de «leasing». Veja a tabela seguinte: