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sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Fantasia Cromática e Fuga BWV 903 de J. S. BACH

 ( ANDRÁS SCHIFF ao vivo)


Pode acompanhar a audição da peça lendo a partitura no vídeo seguinte: 



Esta obra para o cravo só se tornou conhecida muitos anos após a morte do seu autor, em 1802; a partitura completa (incluindo a fuga), ainda mais tarde. O manuscrito* que serviu para a primeira edição por Forkel, é do discípulo  de Bach, J. F. Agricola
A transcrição para piano foi efetuada por vários compositores, incluindo Liszt e Brahms, ao longo do século XIX. A transcrição aqui interpretada por András Schiff, é a de Busoni 

Podem ler-se muitas análises desta peça, em vários sites. O que escrevo abaixo é antes a minha apreciação estética, subjetiva.

Não posso deixar de colocar a Fantasia e fuga cromática, no cume da arte de Bach e mesmo, entre as mais geniais peças para teclado de todos os tempos. 
Pertence a um tipo de composição em díptico: Fantasia e fuga; Tocata e fuga;  Prelúdio e fuga. 
- Na primeira parte do díptico, predominam escalas ascendentes e descendentes, arpejos, etc., figuras típicas que simulam uma improvisação.  Quanto à escala cromática, esta proporciona dissonâncias e dramatismo, que se resolvem em harmonia. 
Este tratamento extrovertido, exuberante, corresponde ao «Stylus Fantasticus», uma designação dada pelo crítico musical Matheson contemporâneo de Bach.
- A segunda parte do díptico contrasta pelo  rigor matemático da fuga. Com efeito, esta é como «peça de ourivesaria», de artesanato musical requintado e subtil. Nesta fuga, em particular, verifica-se uma tensão permanente entre as vozes, uma incerteza que apenas se resolve nas últimas barras de compasso da peça.  Esta fuga sai bastante fora do que se considera típico em Bach, como nas fugas do «Cravo Bem Temperado». 

A interpretação ao piano desta composição é um exercício de virtuosismo, não só pelas dificuldades técnicas inerentes ao texto musical, como pela importância de se conservar uma certa contenção, de não se cair na excessiva exposição de sentimentos. No barroco, não se nega a sensibilidade da alma,  mas o «bom gosto» é de que os sentimentos sejam contidos, codificados.  Não se procura exibir os sentimentos numa efusão descontrolada mas, em vez disso, a sua representação sublimada.
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*Não se conhece nenhum manuscrito autógrafo de Bach para esta peça, mas a atribuição da autoria ao Mestre de Leipzig é segura.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

George Frederic Haendel: PASSACAGLIA da suite em sol menor HWV 432



Haendel é tão essencial ao barroco, como Bach. 

A sua personalidade é totalmente diferente da do Mestre de Leipzig, embora os dois usem -afinal- os mesmos processos de composição e as mesmas técnicas de execução. 

Mas, não é justo acentuar o contraste até à caricatura.  Se Bach, por vezes, pode parecer pesado ou enfático, isso deve-se ao facto de retomar com frequência certas fórmulas. Mas o processo é muito banal, na época: Os compositores barrocos copiavam-se a si próprios e uns aos outros, profusamente. Não havia «copyright»; era um conceito não existente, sequer, na época. O artista que escrevesse uma passagem inspirada numa peça de outro, estava a homenagear esse mestre ou colega. Não era visto como «roubo», a utilização de certa melodia. Enfim, o «progresso » neste campo não existe. Porque a música, como todas as outras artes, se mercantilizou: E isso, queiram ou não, resulta em empobrecimento.  

Em milhares e milhares de páginas musicais, nem sempre a inspiração genial de um Haendel pode estar patente. Ele copiou-se a si próprio e copiou outros, tal como o fizeram Bach e muitos contemporâneos. Ele e seus colegas tinham de satisfazer encomendas para festas nos palácios, para as cerimónias religiosas e para os teatros e óperas Haverá algo de surpreendente, se uma ária de ópera era adaptada para integrar uma obra de caráter sacro, ou vice-versa?

Há quem -erroneamente - considere a produção de Haendel, fútil ou superficial. Mas, a meu ver, ele corresponde à melhor versão daquilo que chamo o «espírito otimista das Luzes», e que perpassa também em obras doutros músicos do barroco tardio:  Telemann, Rameau e Domenico Scarlatti. 

Ideologicamente, é a época de Newton e Leibniz, a do triunfo de nova visão do Universo. O homem sente-se confiante perante os mistérios do Cosmos. Note-se que a origem divina do mesmo não está em causa. No entanto, ao contrário de épocas anteriores, não hesita em considerar que o Cosmos é inteligível: Se existem mistérios, é porque o espírito humano é demasiado imperfeito para compreender as leis da Natureza, dadas por Deus na Criação.

Musicalmente, Bach e Haendel são ambos complexos e multifacetados: em muitas páginas musicais, podemos encontrar um Bach galante e um Haendel místico. O que implica, afinal, não nos deixarmos encerrar em «visões-clichés»! 




 A passacaglia em sol menor é uma das mais populares peças de Haendel. 
Ela tem sido interpretada por muitos cravistas e pianistas. Tive dificuldade em encontrar uma interpretação que me satisfizesse plenamente. A interpretação aqui transcrita, satisfaz as minhas exigências estéticas. Possui energia interna, e também qualquer coisa de nostálgico.

 Sou particularmente sensível às questões de tempo, de andamento. Através da escolha criteriosa do tempo, o interprete pode comunicar de forma adequada o espírito da música. Note-se que, na época de Haendel, a execução direta e ao vivo era a única forma de fazer ouvir uma peça de música.

Gosto particularmente desta Passacaglia, muito bela na sua simplicidade. Pode servir pedagogicamente, para ilustrar a forma «tema com variações».


Playlist "Haendel" AQUI