domingo, 30 de setembro de 2018

ALENTEJO PROFUNDO

Barragem de Sta. Clara - Poio Ruivo

Uma pausa de três dias permitiu-nos apreciar esta natureza pouco transformada pelos humanos. As vistas são magníficas, mas as sensações de plenitude e tranquilidade - essas - não se podem reproduzir.











sábado, 29 de setembro de 2018

EUROPA UNE-SE À RÚSSIA E À CHINA PARA CONTRARIAR AS SANÇÕES DOS EUA CONTRA O IRÃO



                            



A União Europeia, a Rússia, a China e o Irão anunciaram,  na ocasião da Assembleia Geral das Nações Unidas, que vão criar um Veículo de Propósito Especial, um canal soberano financeiramente independente, para contornar as sanções americanas contra Teerão e permitir que o acordo «JCPOA» (Joint Comprehensive Plan Of Action) possa sustentar-se.
Isto é um marco histórico, na medida em que a aliança dos EUA com a Europa está directamente a ser posta em causa. 
Além disso, pode significar que - noutros aspectos também - a UE estará pronta para (r)estabelecer acordos com o bloco Rússia-China, autonomizando a sua posição, quer no que toca ao comércio, quer no que toca a uma política de sanções, largamente ineficaz e contra-produtiva. 
Há demasiados pontos de divergência objectiva entre os membros da NATO, relativamente a um número crescente de assuntos. Apenas alguns exemplos, do que recentemente tem acontecido:
- A Turquia, estrategicamente importante, firmou acordos com a Rússia, inclusive no plano de fornecimento de armamentos. 
- A China não tem qualquer problema comercial com a UE e seus estados-membros pelo que, nas sanções e guerra comercial  contra a China, os EUA estão à partida isolados; também estão isolados na sabotagem dos acordos firmados no seio da OMC. 
- Quanto à Rússia e as sanções causadas pelo conflito ucraniano e a Crimeia, cada vez mais existem vozes governamentais (Hungria, Itália...) a propor o levantamento das sanções. Igualmente a Alemanha, que precisa do gás natural russo e não cedeu à tentativa de intimidação americana de interromper o gasoduto pelo Báltico, projecto Russo-Alemão de grande significado. 

No entanto, nem tudo são rosas para o regime de Teerão. 
O rial já perdeu dois terços do seu valor desde Maio, quando as primeiras sanções dos EUA foram accionadas. 
Várias grandes empresas ocidentais [Total, Peugeot, Allianz, Renault, Siemens, Daimler, Volvo...], apesar de terem negócios chorudos no Irão, foram obrigadas - pela pressão das sanções americanas - a retirar-se. Ficariam proibidas de actuar no mercado dos EUA se continuassem neste país.  
No fundo, trata-se de uma corrida de velocidade, para as autoridades iranianas: quanto mais depressa cortarem os laços de dependência em relação ao Ocidente, mais as sanções dos EUA e eventuais outros países serão ineficientes.
Nestes últimos anos temos visto o Irão aproximar-se da Organização de Cooperação de Xangai (uma espécie de embrião de «NATO euro-asiática»), tem participado na formação da zona de comércio livre euro-asiática e promovido a utilização das moedas respectivas dos países, nas trocas comerciais bilaterais (por exemplo, entre o Irão e a Índia). 

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

BOLHAS IMOBILIÁRIAS - FENÓMENO MUNDIAL

Em todo o mundo «desenvolvido», de Vancouver a Paris, passando por muitos outros grandes centros, os custos em termos reais dos apartamentos têm subido em flecha, fenómeno que não é explicável por um único factor, mas sim por um conjunto de factores complexos (1).

                     

- Os capitais que vêm adquirir o imobiliário nas diversas metrópoles não são «autóctones»: são de investidores internacionais que obtiveram grandes lucros nas bolsas ao nível mundial e querem segurar esses lucros, eventualmente potenciando-os com aluguer dos apartamentos a preços também especulativos.

- A descida a quase zero (na prática) das taxas directoras dos bancos centrais, tornou muito apetecível - a certos investidores - pedir dinheiro emprestado aos bancos, a juro muito baixo. 
Os grandes investidores têm beneficiado de juros muito favoráveis, pois podem usar o imobiliário (entre outros activos) como colateral dos empréstimos. 
As famílias ficam arredadas dos mercados da compra, principalmente porque não conseguem atingir o «score» exigido pelos bancos para emprestar uma determinada quantia.  O efeito é que as pessoas «normais», ou são lançadas para periferias cada vez mais distantes, ou são obrigadas a habitar em apartamentos arrendados, por valores igualmente inflacionados, mas não têm outra solução.

- A gentrificação está associada ao fenómeno de esvaziamento das zonas centrais das grandes metrópoles de comércios e serviços, que antes eram aí comuns. O resultado, é que existe desertificação humana, restando apenas pessoas envelhecidas, muitas vezes vivendo em condições  deploráveis. Os jovens e as famílias com filhos em idade escolar desertam estes bairros mais centrais. Os serviços e infraestruturas sofrem uma descida de qualidade. Embora haja cada vez mais restaurantes, ou lojas especialmente vocacionadas para vender aos turistas, nota-se a ausência de muitos serviços essenciais para o quotidiano dos habitantes permanentes.
   
- A pressão da indústria turística é demasiado forte: os governos, cujo principal objectivo é agradar ao eleitorado para serem reeleitos no termo seguinte,  preferem deixar correr, a intervir com medidas reguladoras e refreadoras, porque o turismo tem um efeito de alavanca nas economias. 
Infelizmente, o turismo, se não for muito bem enquadrado e integrado harmoniosamente com as restantes actividades económicas, tem um aspecto depredador. 
Além disso, como é um fenómeno sujeito a ciclos e modas: quando determinado destino deixa de estar na moda, os hotéis ficam vazios, dá-se uma rápida involução dos preços do imobiliário e uma descida dos negócios directamente relacionados com o turismo, como a restauração. É previsível que - em situação de crise mundial - os centros turísticos mais populares sofram as maiores perdas, pois o retraimento do turismo de massa será instantâneo e numa maior proporção. 

- A ausência de políticas viradas para uma distribuição harmoniosa das populações, com uma diversificação geográfica das diversas indústrias, com apoio significativo - em infraestruturas e também em crédito bonificado para a implantação de novas unidades agrícolas - tem levado à desertificação do interior, das zonas rurais, das pequenas aglomerações regionais. 

Todos os casos apontados devem-se, ou são agravados, pela gula de poder dos políticos, que acenam com «soluções» miraculosas, mas não promovem políticas de longo fôlego, de um desenvolvimento regional e de uma verdadeira planificação territorial.
 A sua agenda é serem eleitos ou reeleitos, o que faz com que as obras ou investimentos têm de ser visíveis e/ou dar resultados palpáveis no intervalo de tempo até à próxima eleição, ou seja, num período de dois a cinco anos. 
Com uma agenda assim, a planificação de longo prazo - projectando investimentos cujos frutos serão visíveis somente numa ou mais décadas - está completamente posta de lado.

                     
Tabela acima: Número de anos que um trabalhador especializado tem de trabalhar para comprar um andar de 60 m2, perto do centro de uma cidade.

Muitas outras razões e factores complexos se poderiam trazer para a discussão sobre as causas destes desequilíbrios. 
Ao nível mundial, assusta ver-se que a maioria da população vive nas grandes cidades. Isto é agravado pelo facto de que os que restam no campo para fazer agricultura, não proporcionam muitas vezes os excedentes agrícolas, capazes de abastecer os mercados urbanos. 
Os bens alimentares vêm de cada vez mais longe, de países em desenvolvimento, cujas populações são sobre-exploradas e onde muitas vezes não existe qualquer preocupação ecológica nas culturas (uso maciço de insecticidas, por exemplo).  

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

QUAIS AS CONSEQUÊNCIAS DA SAÍDA NÃO NEGOCIADA DO REINO UNIDO DA UE?

                         

A cimeira de Salzburgo, na semana passada, para tentar aplanar problemas na negociação entre o governo britânico e a Comissão europeia, saldaram-se por um fracasso. Pior ainda, Theresa May saiu do encontro com a sensação de que a Comissão europeia não está a tomar a sério a posição do seu governo. 
Por outro lado, observadores com diversas inclinações políticas, apontam incoerências ao governo britânico. 
Embora o governo britânico queira fazer passar a mensagem de que a Comissão europeia não deseja verdadeiramente negociar, isso não é verdade
Esta Comissão propôs que a Grã-Bretanha integrasse o grupo da Área Económica Europeia, grupo que inclui a Noruega e a Islândia. 
A reacção da chefe do governo britânico foi de que isso seria trair o voto do Brexit. 
Seis meses depois, o governo britânico rejeitou outra proposta da Comissão, para um acordo de comércio. De novo, o governo da Grã-Bretanha, recusou pois queria apenas uma livre circulação de mercadorias, não dos serviços e muito menos de pessoas. 

No caso de não haver acordo, a saída acontecerá em Março de 2019, sem que se saiba ao certo como é que os muitos europeus continentais continuarão a trabalhar no Reino Unido. Provavelmente precisarão duma autorização de trabalho. 
-Os bens alimentares, importados em grande parte da União Europeia, sofrerão aumentos bruscos, pois serão aplicadas tarifas da ordem dos 22%, o que originará graves perturbações.
- Outros domínios susceptíveis de perturbação, vão do tráfego aéreo, passando pela comercialização de medicamentos, até às normas do manuseamento e transporte de materiais radioactivos.
- Uma fronteira «rígida» (hard border) poderia ser instalada entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte.  
É difícil prever todas as perturbações no sector financeiro, «a City» e como iriam dar continuidade a toda uma série de serviços. 
A ruptura não ordenada iria fazer com que vários negócios, com importante clientela do continente europeu, se retirassem do Reino Unido antes de sofrer (de um e doutro lado) toda uma série de restrições, de impostos e tarifas... 

«Querendo guardar o bolo e comê-lo simultaneamente», ou por outras palavras, querendo que o Reino Unido usufrua de privilégios e não sofra contrapartidas, o governo britânico tem estado a negociar da pior maneira possível, arrastando o seu país para uma crise.

No curto prazo, quem ganhará com isso será o dólar e Wall Street. A libra esterlina e o euro sofrerão inevitavelmente. Em termos de captação de negócios tanto a City, como Frankfurt e outras praças financeiras do continente, ficarão a perder. 

Se o governo britânico der o dito por não dito, desautoriza-se perante a ala mais dura dos Tories e do eleitorado conservador. Se teimar com as mesmas posturas até ao final das negociações, arrisca uma saída sem acordo e todas as consequências acima apontadas. 

 É provável que, perante tão grande inabilidade ou casmurrice, financeiros e grandes industriais do Reino Unido queiram afastar May da chefia do governo.

Se houver eleições antecipadas em Novembro, isso não quer dizer que prevaleceu a vontade de Theresa May, antes o contrário: de que foi pressionada no interior do seu partido e pelo sector dos negócios (sobretudo o sector financeiro) e não lhe deram outra escolha. Assim, isso será a maneira de provocar a saída do desastroso governo Tory.

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

HAENDEL - «DA TEMPESTE»

                        Amanda Forsythe/Apollo's Fire


Aprecio esta interpretação de Amanda Forsythe na ária de Cleópatra, da ópera «Julius César». 
Privilegio sempre a qualidade e o bom gosto sobre quaisquer outras considerações. 

domingo, 23 de setembro de 2018

OLHANDO O MUNDO DA MINHA JANELA (PARTE I)

                          Resultado de imagem para tsunami


Olhando para o Mundo da minha janela, reparo que o jogo da grande política e estratégia não pára; mas - à superfície - tudo é feito para que as pessoas tenham uma percepção de que «tudo está na mesma». 

Bastam-me dois exemplos para ilustrar esta tendência:

Primeiro, a enorme perda de influência do dólar, o qual já não tem o domínio que teve outrora sobre os mercados financeiros, sobre as trocas comerciais e, sobretudo como moeda de reserva inquestionável, com a qual amigos e inimigos tinham de contar, nos cofres dos seus bancos centrais, sem o que muitas operações vitais deixavam de poder realizar-se. 
Hoje em dia, não apenas se desenvolve o sistema da nota de crédito em Yuan, dando muito maior flexibilidade a trocas efectuadas fora do dólar em África e no Médio Oriente, mas a China e Rússia estão a adquirir uma quantidade recorde de ouro, o que só pode significar que claramente estão a preparar a transição multipolar, como também vão-se livrando do dólar. 
A Rússia praticamente não tem mais «Treasuries» (obrigações do tesouro dos EUA, normalmente usadas como meio de reserva de dólares), lançou-as no mercado em Abril-Maio deste ano e avisou que o dólar já não era um activo «confiável». 
Quanto à China, com a sua «Belt and Road Iniciative» (as Novas Rotas da Seda), tem vindo a fazer empréstimos em dólares (uma maneira inteligente de se livrar deles) a países africanos, os quais podem pagá-los de volta, sob forma de Yuan ou de matérias-primas. 
A China tem usado também «Treasuries» para financiar mega-projectos de infraestruturas -caminhos-de-ferro, portos, aeródromos, estradas, etc. - em todo os espaço euro-asiático, para criação de um espaço único de circulação de mercadorias, desde a península coreana até às margens do Atlântico. 
Poderia continuar a dar exemplos de perda de influência americana e de perda de controle da situação geoestratégica relacionadas com ocaso do dólar, como moeda de reserva universal.  
Basta-me referir que as sanções económicas e as tarifas punitivas decretadas por Trump, apenas indicam fraqueza, não impressionam por aí além, fazem mais mal à população dos EUA e dos seus aliados europeus, do que propriamente aos países alvo das mesmas, nomeadamente o Irão e a China. Têm, ambos os governos destes Estados, meios para circunscrever  e tornear os prejuízos causados e sabem que as ditas sanções são fruto do desespero e susceptíveis de se transformarem em «tiros pela culatra». 
O mundo inteiro vê isso e pensa que os dias do Império do dólar estão contados.

O segundo exemplo, é o da movimentação da Itália para fora da zona euro. Os italianos não querem mais sofrer com o euro. Sabem que o seu caminho é o da saída. 
Mas, querem fazer as coisas de maneira mais inteligente que os gregos, que ficaram entalados com uma dívida impagável e uma espoliação de muitos activos e propriedades (incluindo portos e aeroportos) dados em contrapartida de «resgates» mais que dúbios. 
A Itália tem possibilidade de decretar a saída do Euro mas, para isso, terá de proteger-se de efeitos secundários que poderão ser demasiado penosos, tanto política como economicamente. Só será possível fazerem a transição se tudo for preparado em segredo e no último instante decretarem o controlo de capitais e o fecho  dos bancos (com a possibilidade da população retirar algumas centenas de euros por semana  das suas contas-correntes nos ATM). 
Isto, a acontecer, automaticamente criará uma crise de confiança no espaço europeu,  pelo que todos os países da «eurolândia» serão arrastados para soluções similares se não quiserem logo ver seus próprios bancos colapsar, por insolvência manifesta. 

Estes dois exemplos não me tiram o sono, felizmente, porque eu não detenho meios para influenciar os acontecimentos: só teria se fosse um grande bilionário ou trilionário, dono de bancos  e de ramos inteiros de indústrias.

Mas tenho o bom-senso de me precaver destas eventualidades, que parecem como uma enorme vaga, um tsunami, que se vai aproximando cada vez mais da costa, enquanto as pessoas despreocupadas, não ligam, continuam na praia a apanhar sol e a brincar... 

Não é somente por compaixão e solidariedade humana mais básica, que não tenho vontade que essas pessoas sejam vítimas de uma tal desgraça. Quanto maior número de pessoas souberem precaver-se, melhor estarão - colectivamente - para reconstruir as coisas. 
Não sei como nem quando irá rebentar, mas uma catástrofe económico-política de grandes dimensões está fermentando, somente a media hipócrita, ao serviço dos seus donos, mantém todos distraídos. 

Tenho poucas esperanças numa revolução mundial, que varra de vez este capitalismo depredador e monstruoso: Seria bom que, ao fim e ao cabo, esta crise vindoura assinalasse a morte e enterro do sistema capitalista mundial. Mas isso, embora não seja inverosímil, não me parece provável. 

Em qualquer circunstância, para retomar a analogia da vaga gigante ou tsunami, não perdemos nada por subir para colinas, a umas centenas de metros acima do nível do mar. 
Mesmo que a minha análise seja demasiado sombria e afinal não aconteça nada de muito grave, o que se perdeu, fazendo essa pequena retirada? 
Se, pelo contrário, as minhas previsões se realizarem, aqueles que - por ignorância ou desleixo -  ficam na praia a brincar... com certeza serão varridos e arrastados pelo tsunami, sem salvação possível. 

sábado, 22 de setembro de 2018

TULSI GABBARD: UMA VOZ DE PAZ E BOM SENSO NO CONGRESSO DOS EUA

Tulsi Gabbard é uma mulher corajosa. Antes de ser representante pelo Estado do Hawai, foi militar nas forças americanas de ocupação do Iraque. Provavelmente, isso permitiu-lhe ver a realidade em frente. 
Agora, diz aquilo que é preciso dizer sem nenhum «filtro», de forma que os americanos percebam. Também aponta o dedo ao poder, à conivência e incoerência de transformar a Al Quaida de maior inimigo, em aliado dos EUA.  
Tulsi tem apoio numa minoria de pessoas nos EUA, que não é assim tão pequena, simplesmente a completa vassalagem da poderosa media corporativa, impede que suas vozes sejam ouvidas e seus pontos de vista expressos. 
É uma forma encoberta de censura: 
Dum lado (o da guerra) há uma total cobertura nos media, para apoiarem e mesmo reforçarem com argumentos dos mais falaciosos, incluindo campanhas de propaganda enganosa. 
Do lado da paz, apenas alguns meios com circulação restrita dão voz aos que defendem a paz. Os media mainstream, ou omitem completamente declarações e tomadas de posição pacifistas ou noticiam, mas de forma esporádica e sem  darem especial relevo. 
Perante este regime aristocrático, em que muitos cobardes e corruptos estão conscientemente a fazer o jogo sujo dos detentores do poder, é de saudar a coragem e senso de justiça desta congressista. 
Ela consegue congregar vozes dentro e fora do Congresso Americano, no sentido de impedir o lançamento de mais guerras de agressão (sob falsos pretextos humanitários) por parte dos EUA.

Leiam a entrevista no link abaixo, dada a James Carden e publicada em «The Nation»

                           Tulsi Gabbard TPP

https://www.thenation.com/article/tulsi-gabbard-on-the-administrations-push-for-war-in-syria/

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

POPULISMOS e AS POLÍTICAS DO «OCIDENTE»

                         
Sim, escolho o plural «populismos», pois a identidade e propósitos dos movimentos contraditórios que são etiquetados debaixo deste termo depreciativo, são realmente muito diversos.
Na origem, temos a crise da chamada «democracia ocidental», que não é de ontem, nem de anteontem, sequer: foi consubstanciada num modelo de governança pelo establishment, em que a participação real e autêntica dos cidadãos na vida pública foi afastada, de forma sistemática e sub-reptícia, durante décadas:
- Ao cidadão com direitos políticos e com participação na vida política, modelo clássico e ideologicamente utilizado como montra do «Ocidente democrático», foram substituindo o consumidor-rei, o cidadão cujo verdadeiro e único «direito» era o de consumir, consumir o que desejasse. Para tal, a publicidade, baseando-se na ciência psicológica mais avançada, foi talhando um «Homo consumisticus» à medida da saúde dos mercados.
Mas quando o mercado ele próprio entrou em crise, devido à impossibilidade de absorver todos os gadgets e o consumo supérfluo que tinham sido o apanágio da fase áurea do capitalismo de consumo, foi necessário inflectir as regras e o discurso, sempre com o objectivo de preservar o sacro-santo lucro. 
Surgem então as políticas de austeridade, no dealbar do século XXI, especialmente mais virulentas nos países do sul da União Europeia. Tudo foi feito: a chantagem do emprego, a inoculação do complexo de culpa de «demasiado gastadores», a comparação com os miseráveis dos países pobres, empobrecidos pelo neocolonialismo da civilizada Europa e pelos bombardeamentos humanitários contra os regimes que em África (Líbia) ou no Médio Oriente (Síria) resistiam à vaga neoliberal...
A reacção de um público inculto politicamente, em vez de se revoltar e derrubar a sua própria classe dirigente, foi de ser arrastado pelo discurso demagógico das extrema-direitas de diversos países europeus, que viram a sua oportunidade na conjugação de vários factores: as vagas sucessivas de refugiados, as dificuldades cada vez maiores de emprego e o retraimento do Estado Social (Wellfare State).

Especial papel coube aos políticos franceses, em especial a Miterrand e seus seguidores, que fizeram o (mau) cálculo político de proporcionar o desenvolvimento da extrema direita do «Front National», para contrariar os avanços da direita clássica, evitando assim a possibilidade de alternativa a governos P«S», de neoliberalismo disfarçado com as cores socialistas, em que se tornara o PSF.
Infelizmente, o PSF serviu de modelo a diversos partidos homólogos pela Europa fora. 
Foram tão bem sucedidos, ao ponto de que muitos ex-votantes nos partidos «clássicos» da esquerda, PC e PS, se viraram para os «populistas»: 
Houve emergência de populismos de extrema-esquerda; mas estes, apenas fizeram uma actualização das teses clássicas do leninismo e não foram além do terreno eleitoral habitual da extrema-esquerda... 
Muito mais graves são os populismos de extrema-direita, em vários países. Agora, tem-se o culminar de tão «inteligente» estratégia, a tal artimanha de deixar tais movimentos crescer e adquirir respeitabilidade e sobretudo audiência junto de grande parte do eleitorado operário: movimentos deste calibre estão agora no poder, ou em situação directa de disputar o poder com partidos políticos tradicionais, nos mais diversos países, desde a Suécia à Itália, passando pela Alemanha, Áustria e muitos outros. As consequências disto, no curto prazo, serão eleições para o parlamento europeu marcadas pelo avanço da extrema-direita. 
Os que pensam que o contexto vai também no sentido de favorecer o extremo oposto, ou seja, a extrema-esquerda, estão auto-iludidos. Os mais míopes de todos são aqueles, da extrema-esquerda, que apenas vêem o que as suas lentes com filtragem «marxista», deixam ver... Por isso - nos últimos 20 anos - eles e os que têm confiado neles, só tiveram derrotas, tanto no campo da luta social, como política.
Quanto às classes dominantes, elas estão absolutamente  deliciadas com a subida do «populismo», da extrema-direita: nada melhor para elas do que governos que preconizem a «união nacional», o «sacrifício necessário» face à ameaça externa (a pseudo ameaça dos outros globalistas, do eixo russo-chinês). 

O mais vantajoso, do ponto de vista da classe dominante, é que estas «mudanças» permitem manter a ilusão nas massas de que elas mandam, de que «o povo é soberano»! 
Absolutamente ridículo... porém é assim que os poucos conseguem dominar os muitos, ao ponto de que estes muitos elejam quem os vai esfolar e estrangular ainda mais!

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

«TOUCHEZ PAS AU GRISBI» GRANDE FILME, GRANDE MÚSICA!

  Grande filme de gangsters, realizado por Jacques Becker em 1954, com Jean Gabin e Jeanne Moreau. 

        
Jean Albert Wiener compôs a canção-tema do filme, que se tornou muito famosa, tanto a versão cantada, como a versão em harmónica.


   
 Liane Augustin interpreta abaixo o tema principal do filme. Esta cantora austríaca actuava num cabaret em Viena, após a 2ª Guerra Mundial. Gravou para a «Vanguard» mais de dez discos, com o «Bohème Bar Trio». Participou na versão filmada da «Ópera dos Três Vinténs» e representou a Áustria num dos primeiros festivais da Eurovisão.

terça-feira, 18 de setembro de 2018

«ENTRE A CHINA E A COREIA» POR EDUARDO BAPTISTA



Este pergaminho de caligrafia chinesa foi oferecido à escola pelo presidente sul-coreano Park Chung-Hee em 1969, Lê-se: “Coreia e China, amigos íntimos”. (韩中亲善)  

Á volta da capital sul-coreana de Seul, a influência da China é visível. Nos distritos centrais da cidade, empresas de consultoria de educação exibem cartazes gigantes que oferecem cursos que “garantem” levar os clientes, de um nível básico de Mandarim, até ao grau mais elevado do exame de proficiência em língua chinesa (HSK 6), tudo no intervalo de 30 dias.
Em Myeong-dong, o centro da indústria cosmética de Seul, vendedores sul-coreanos podem ser vistos a falar um chinês quase perfeito, enquanto tentam vender máscaras e perfumes aos milhares de turistas chineses, grande parte dos quais viaja para Coreia do Sul somente para comprar produtos cosméticos de alta qualidade.

Mas noutras paragens menos turísticas, é a vez dos imigrantes chineses fazerem a sua presença sentida. Tomando o metro em direcção sudoeste, chega-se ao bairro de Daerim-dong, conhecido por ter a maior concentração de imigrantes chaosienzu (), a minoria étnica coreana da China.
As principais ruas de Daerim-dong estão repletas de restaurantes que servem gastronomia de todas as regiões da China.


No entanto, um reduto da cultura e língua chinesas em Seul tem estado enfraquecido nas últimas duas décadas. Situada no distrito de Sodaemun, no noroeste da cidade, a Escola Secundária Chinesa de Seul foi estabelecida como escola básica em 1948, por um grupo de imigrantes chineses envolvidos no comércio sino-coreano. Depois do começo da Guerra da Coreia, a 25 de Junho de 1950, a escola foi rapidamente transferida para a Câmara de Comércio Chinesa de Busan, no sul da Península coreana. Mais tarde naquele ano, quando as forças sul-coreanas e da ONU foram encurraladas em Busan pelo exército norte-coreano, apoiado pelos soviéticos, a escola teve que ceder seu espaço para os soldados, transferindo-se para uma morada muito mais humilde: algumas tendas numas colinas situadas nos subúrbios de Busan. Após o fim da guerra, em 1953, a escola voltou para Seul, acrescentou o ensino secundário e em 1956 recebeu reconhecimento oficial do governo sul-coreano.




A entrada da Escola Secundária Chinesa de Seoul. O poster rosa, no lado esquerdo, diz, em coreano, "Agora é a Era da China" numa tentativa de atrair mais alunos coreanos para o currículo chinês oferecido pela escola.




Dois leões de pedra, uma característica comum da arquitectura imperial chinesa, flanqueiam as escadas que vão até o prédio principal da escola




“Fiel, filial, trabalhador, parcimonioso”. Valores confucianos exibidos na entrada do edifício principal da escola




Avisos bilingues passam pelo painel de LED da escola, exibindo frequentemente ditados confucianos como o da direita, "o valor da vida depende do que se contribui e não do que se adquire"




Os “quatro laços sociais” do sistema de valores confucianos - propriedade, justiça, honestidade e senso de vergonha - pintados na parede




Os altos e baixos desta escola secundária têm sido ditados por mudanças históricas nas relações sino-coreanas. Como o actual director Yu Zhisheng explica, na época da sua fundação, a escola era propriedade da embaixada taiwanesa na Coreia do Sul, que a financiou na esperança de encorajar os alunos a mudarem-se para Taiwan depois de se formarem. A cidadania taiwanesa fazia parte do pacote oferecido aos jovens imigrantes, assim como uma bolsa para estudar numa universidade taiwanesa.



Alunos e professores lamentam a morte de Chiang Kai-Shek, 6 de abril de 1975

O apoio financeiro do governo taiwanês foi decisivo no crescimento da escola. No final dos anos setenta, quando Yu era estudante, a escola atingiu o seu auge, com 2800 estudantes.
No entanto, após décadas de industrialização, a motivação inicial de Taiwan para financiar a escola começou a diminuir, trazendo uma diminuição gradual do financiamento governamental até 1992. Nesse ano, a decisão da Coreia do Sul de transferir o reconhecimento diplomático de Taiwan para a República Popular da China finalizou o corte de apoio económico à escola. Isto levou ao aumento anual das propinas que, no início dos anos 2000, ultrapassava a média das escolas privadas em Seul, causando uma diminuição gradual no número de estudantes; a escola hoje tem pouco mais de 500 alunos, o número mais baixo da sua história.

A escola teve que encontrar soluções para não entrar na insolvência. Perguntei a Yu porque é que o campo de futebol não tem relva sintética como a maioria das escolas secundárias coreanas: olhando para o chão, responde que foi decidido pelo Conselho de Administração há alguns anos que um campo de areia, por ser mais “natural” do que um campo relva sintética, teria uma melhor influência nos alunos, explicação que me parece ser desculpa para medidas de austeridade.
De qualquer maneira, a necessidade da escola encontrar alunos cujos pais estivessem dispostos a pagar as propinas levou o antecessor de Yu, Sun Shiyi a decidir em 2008 (quando o prestígio global da língua chinesa estava em ascensão), abrir a escola aos sul-coreanos e outros estrangeiros, que agora compõem cerca de vinte por cento do corpo estudantil.
Ainda assim, os problemas financeiros persistem, o que levou as instalações da escola a ficarem significativamente atrás dos concorrentes na mesma faixa de preço, como as escolas internacionais de estilo britânico ou americano.





O campo de futebol da escola




Muitas instalações na escola têm necessidade de renovação

A situação vulnerável da escola tornou a postura de neutralidade entre o governo comunista da República Popular da China e o governo democrático de Taiwan ainda mais necessária para a sua sobrevivência.
Desde 1992, Yu afirma que a escola seguiu “valores pluralistas, centrados na filosofia confuciana": a maioria dos professores são, como Yu, da República Popular e ninguém tem reservas sobre o uso de materiais escolares de Taiwan.
Quando representantes do governo taiwanês vêm em visita, Yu  recebe-os alegremente; quando a embaixada da República Popular da China convida a escola a participar no concerto de Ano Novo, Yu aceita sem hesitação.
A bandeira de Taiwan é erguida nos aniversários de Sun-Yat Sen e Chiang Kai-Shek, ao lado das suas estátuas, à frente do prédio principal da escola, mas nenhuma bandeira é içada quando o hino taiwanês é cantado todas as  segundas-feiras de manhã, depois da embaixada da República Popular da China ter tido uma “conversa amigável” com Yu.



 

Estátuas de Sun Yat Sen (acima)
e de Chiang Kai Shek (abaixo)
na entrada principal da escola
O declínio da escola parece estranho, dado os fluxos maciços de migração da China continental para a Coreia do Sul desde 1992. O número de imigrantes chineses, da China Continental, na Coreia do Sul aumentou 22,5 vezes entre 1990 e 2011. A KOSIS, o serviço de Informação Estatística da Coreia, revelou, no censo populacional mais recente dos residentes estrangeiros da Coreia do Sul, que 76% dos 245.000 imigrantes residindo em Seul são chineses, dos quais 71.4% são coreanos étnicos, ou chaosienzu (), 23.7% doutras etnias do Continente e 4,9% provenientes de Taiwan.

No entanto, uma análise mais detalhada dos imigrantes chineses em Seoul revela porque é que Yu continua a sentir dificuldades em aumentar o número de alunos matriculados. A maioria dos chaosienzu de Seul é composta por homens e mulheres solteiros que vêm para a cidade aproveitar-se dos salários relativamente altos oferecidos, para melhorar os padrões de vida das suas família no regresso à China. Quanto aos trabalhadores étnicos coreanos que adquirem vistos de residência permanente - como os proprietários de restaurantes de Daerim-dong - enviar os seus filhos para a escola coreana é a escolha lógica. A maioria dos jovens chineses da República Popular que decide morar na Coreia do Sul, chega a este país para estudos universitários, não do ensino secundário.

Preparar os alunos para competir com jovens coreanos, no exame ultra-competitivo de entrada universitária, conhecido como sunneung ( ), tem sido o principal desafio da escola, na última década.
No ano passado, o "Diplomat" escreveu sobre o número crescente de estudantes chineses que escolhem frequentar as universidades sul-coreanas, apesar das dificuldades que enfrentam no estudo da língua coreana.
Para superar este problema, a escola criou um programa, dez anos atrás, destinado a preparar estudantes chineses para o sunneung e o coreano de nível universitário.
Tanto Sun quanto Yu encorajaram os seus estudantes a considerar a possibilidade de se matricularem em universidades taiwanesas, devido ao seu processo de selecção ser menos competitivo, mas os pais temem que isso prejudique suas chances de encontrar emprego quando voltarem para a Coreia do Sul.

"Os estudantes e os seus pais estão tão preocupados em que não fiquem para trás, em comparação com os alunos coreanos, que estão sempre a pedir-nos para cancelar actividades relacionadas com a cultura chinesa, para terem mais aulas de preparação para o sunneung", afirma Yu, que tem persistentemente recusado acabar com aulas de caligrafia chinesa bi-semanais, bem como a viagem anual de "procura das raízes" na província chinesa de Shandong. Para Yu, a educação não pode centrar-se nos exames, especialmente, numa escola como a sua, que foi criada para ajudar os imigrantes chineses na Coreia do Sul a não esquecerem a sua cultura.

Cerca de 95% dos imigrantes chineses na Coreia do Sul, que não são etnicamente coreanos (chaosienzu), são de Shandong, incluindo Yu.
Quando a Coreia do Sul e a China se enfrentaram em Setembro do ano passado, devido à instalação na Coreia do Sul dos «THAAD», plataformas de defesa anti-mísseis com um radar poderoso, que Pequim temia fosse usada por Washington para espionar o espaço aéreo chinês, Yu sentiu-se deprimido; não por causa do conflito em si, mas porque as restrições de viagem subsequentes entre os dois países levaram ao cancelamento da viagem a Shandong.

Apesar da pressão académica, Yu está determinado a permanecer fiel às origens chinesas da escola. Num corredor, estão alinhadas fotografias emolduradas dos lugares mais belos da China; a fiel adesão da escola ao calendário chinês ao longo dos anos está documentada no corredor oposto. Uma outra parede exibe cerca de cinquenta peças de arte pintadas por estudantes; poemas da Dinastia Tang, como o icónico “Pensando numa Noite Tranquila” (夜思) de Li Bai (701-762), escrita elegantemente em chinês clássico, com aguarelas ilustrando as cenas descritas por um dos poetas mais famosos da história chinesa.

Yu acredita que no futuro haverá cada vez mais estudantes coreanos que, querendo estudar nas universidades chinesas, irão reforçar o corpo estudantil da escola.

“Eu quero que esta escola continue fazendo o que seus fundadores queriam: ajudar os imigrantes chineses em Seul a se integrarem. Mas isso não significa sacrificar o chinês pelo coreano. ”

No caminho, ele leva-me até à estátua de Confúcio, erguida ao pé do campo de futebol arenoso.


Estátua de Confúcio ao lado do campo de futebol da escola

“Isto”, aponta ele para a estátua imponente, “é a razão pela qual a nossa escola tem um significado, para além de servir os imigrantes chineses: O confucionismo é a raiz cultural dos dois países. Se um estudante coreano estudar aqui, ele não irá apenas aprender o chinês. Também perceberá mais sobre o seu próprio país, de uma forma que poucos têm a oportunidade de perceber. ”