30. DESTINO ERRANTE
Sonhos inacabados embotaram a memóriadeste imóvel viajante de viagens estelares
Arrastando ilusões entre fantasmas irónicos
destroço de barca encalhada em praia remota
Cego contando contos à criança sábia
em dias iguais confundindo os passos
Ou voando com as aves migratórias
sobre horizontes em brasa de ocaso
Cumprindo a promessa de peregrino
de ir por bosques, rios e mares, sempre
pela senda sem parar, até ao seu destino
Coração e alma nus, na ficção do real.
29. DESALMADA
Caminha pela rua, bamboleia-se
Ao ritmo da música dos auscultadores
Imagina-se a deslizar numa onda,
Surfando sobre a música, quase voando
Voando pelos ares irradiando energia
Não vê nada além do sonho
O sonho sem os limites do mundo
Tudo o que tem de fazer
É mover o corpo, esse avatar
Obedecendo ao ritmo
Que se desprende incessante
Obsessivo, hipnótico
E, muito mais que isso,
Um espesso vidro, inquebrável
Vive no simulacro do corpo
Mas habitado pelo som
Em todas as moléculas
Vibra e ondeia no espaço
No interior/exterior
Da sua fantasia
Evolui em espirais
Pelo espaço-tempo
Ao ponto muito elevado
De onde observa a rua
Com a sua banalidade
E as pessoas cansadas
Ou vagarosas, distraídas
Ou pensativas, raivosas
Ou sorridentes, enfim
Se elas soubessem
Se elas acordassem
Se elas escapassem
Coitadas...
Só que nunca o fazem!
Um vulto no passeio
Avança com passos
Cadenciados gestos
Nos dedos e nas mãos
Trejeitos na boca
Oscilando a cabeça
Possuído pela música
Indiferente ao resto
28. IMPENITENTE
Há um cadafalso que te espera
Impenitente verdadeiro
Fugidio relapso
Insensato herege
Amante da vida 'té à morte
"Ela que entre", dizes sorrindo
"E nos teus braços se extinga
O fraco pulsar do coração".
Murtal, Parede
Outubro, 2024
27. REGISTO
Vivi em parte incerta, em tempo remoto
Dos humanos desprezado, confidente dos bichos
Sua língua falei; foi também a minha
Desenhei quantas nuvens se desdobram no céu
Fui escrivão de sonhos, as palavras eu comi
E o vento, d'erva fresca temperado, eu bebi
Debaixo de terra permaneço; aqui fico
Tranquilo espero a eternidade.
26. METAFÍSICO
Ah, pudesse eu mais que em sonho abraçar-te
Se estivesses comigo agora, sentindo teu respirar
Ser ou não ser, não importa mais qu'este sofrer
O destino frio desta matemática ausência
Por que persigo o impossível com a aplicação
Dos loucos ou dos heróis, não posso desculpar-me.
A sombra que somente eu vejo não me esconde
É um sudário que recobre levemente o cadáver
Mas no espaço de infinitas dimensões, quem sabe?
Talvez nos encontremos, um átomo, um instante
Na impulsão de sonhar que nos propulsiona
Talvez nos encontremos em uma vida paralela
Á beira mar, com suave brisa e serena plenitude
Unida alma fluirá, bailando no céu de estrelas
25. SECRETOS PENSARES
SE outrora vivera em redoma de amor, há muito dela me esqueci
SE nosso espírito no corpo se compraz, é que estamos de boa saúde
SE pudesse voltar ao passado, já não seria o passado mas outro presente
SE hoje sou como sou, à história do mundo e do universo o devo
SE caminho pelos bosques e veredas, não admira que seja bicho do mato
SE a felicidade é ausência de dor, escolhi não ser feliz e loucamente amar
SE estes versos te parecem estranhos, percorre mais um pedaço da vida
SE o espanto da Natureza te assalta, é porque a criança em ti não morreu
SE alguém me ignora, eu não levo a mal; ele será incompatível comigo
SE a vida duns vale mais ou menos que a doutros, só Deus o sabe.
SE , no entanto, queres um conselho meu, segue o teu caminho
24. VERSOS RECOLHIDOS NOS ESCOMBROS
Tantas luzes se consumiram
Nos fogos fátuos, na escuridão
Tantos corpos se quebraram
Num sopro, rente ao chão
Tantas vidas viveram
No Universo eterno
Tantos amores escolheram
Serem felizes no instante
Tantos falharam. Dizem
Aqueles que nem tentaram
Descolar os pés do chão
Promessas dos Prometeus
Brotaram obras nos cumes
Que os deuses para si
Mesmos reservavam
Por tudo isto e muito
Mais, nos confrontam
Águias depenadas
Mas com fortes garras;
Dominam
Ovelhas humanas
E aos penhascos as lançam
Pelo prazer de rasgar
Suas carnes tenras
Algum dia virá o fim
Das pulsões de morte
Algum dia chegará
Em segredo o Eros
Que vencerá o obscuro
Dentro dos humanos
Algum dia regenere
A Terra-Mãe
Dos estragos
Causados apenas
Por alguns, poucos
Mas que todos
Estamos sofrendo
Só há dois possíveis:
Ou projetas o teu ser,
Tua energia no futuro
Ou constróis, instante
A instante, o presente
De cada um e de todos
A construção, aqui e agora
Do Mundo Humano
É sempre possível
Mas fizeram-nos descrer
Homens, desta saída
Atirando a felicidade
A justiça e igualdade
Para um futuro incerto
Os poderosos enganam
Os povos, arrastados
Por novas/velhas utopias
Á procura de paraísos
Na Terra ou no Céu
Só se podem libertar
Aqueles que percebem
Como seus corações
Foram escravizados
Logo, libertos
No cosmos infinito
Voarão como anjos
Mas de carne e osso
Ensinando aos outros
A voarem, também
23. ILUSÃO
Peguei no telemóvel
Marquei aquele número que me disseram
Uma voz maviosa respondeu
Ouvi um longo desfiar de frases
Que me preveniram supostamente
De todas as infrações / penalidades
Eximia-se de qualquer responsabilidade
E eu apenas tinha de dizer "sim"
Por fim, após uma musiquinha
Que se repetiu quinhentas vezes
Veio a voz (real) de alguém
Um homem que se identificou
Mas não percebi seu nome
Da maneira como o pronunciou
Apenas queria saber o meu nome
Completo, meu número da Seg. Social
Número fiscal, data de nascimento
E depois perguntou-me:
"O que deseja?"
Já não sabia se desejava
Falar com alguém assim.
Afinal, tinha sido impulsionado
Por um agudo sentimento
Como se fosse uma vertigem,
Um mal-estar, de impotência
Para continuar a arrastar
Comigo a sombra do passado
E de encarar o presente.
Estava realmente na ponta
Final da luta comigo próprio,
Mas a fatalidade jogava
Tudo para me empurrar
Para dentro dum poço
Sem fundo de meu
Desespero...
Não encontrei palavras
Para lhe responder.
Os pensamentos atravessavam
Meu cérebro como raios
U.V. e nem ouvia já
Aquela voz insistente
Ao meu ouvido
Que me repetia
De maneira polida
"O que desejava ?"
Por fim, disse-lhe:
- Desculpa , não é nada.
E desliguei.
22. DIÁLOGO ENTRE O REFLEXO E O REFLETIDO
- Se tu sabes, não digas.
- Confesso que não sei
Ignoro tudo, nada sei
Se olho prá Lua
Vejo um queijo
Cada coisa é nova
Inédita, um mistério
Um inexplicado
Movimento
Sem causa aparente
- Muito bem, rapaz:
Vejo que aprendeste
Bem e depressa;
Mas, ainda melhor
É ficares calado.
Arrastando ilusões entre fantasmas irónicos
destroço de barca encalhada em praia remota
Cego contando contos à criança sábia
em dias iguais confundindo os passos
Ou voando com as aves migratórias
sobre horizontes em brasa de ocaso
Cumprindo a promessa de peregrino
de ir por bosques, rios e mares, sempre
pela senda sem parar, até ao seu destino
Coração e alma nus, na ficção do real.
SE nosso espírito no corpo se compraz, é que estamos de boa saúde
SE pudesse voltar ao passado, já não seria o passado mas outro presente
SE hoje sou como sou, à história do mundo e do universo o devo
SE caminho pelos bosques e veredas, não admira que seja bicho do mato
SE a felicidade é ausência de dor, escolhi não ser feliz e loucamente amar
SE estes versos te parecem estranhos, percorre mais um pedaço da vida
SE o espanto da Natureza te assalta, é porque a criança em ti não morreu
SE alguém me ignora, eu não levo a mal; ele será incompatível comigo
SE a vida duns vale mais ou menos que a doutros, só Deus o sabe.
SE , no entanto, queres um conselho meu, segue o teu caminho
Tantas luzes se consumiram
Nos fogos fátuos, na escuridão
Tantos corpos se quebraram
Num sopro, rente ao chão
Tantas vidas viveram
No Universo eterno
Tantos amores escolheram
Serem felizes no instante
Tantos falharam. Dizem
Aqueles que nem tentaram
Descolar os pés do chão
Promessas dos Prometeus
Brotaram obras nos cumes
Que os deuses para si
Mesmos reservavam
Por tudo isto e muito
Mais, nos confrontam
Águias depenadas
Mas com fortes garras;
Dominam
Ovelhas humanas
E aos penhascos as lançam
Pelo prazer de rasgar
Suas carnes tenras
Algum dia virá o fim
Das pulsões de morte
Algum dia chegará
Em segredo o Eros
Que vencerá o obscuro
Dentro dos humanos
Algum dia regenere
A Terra-Mãe
Dos estragos
Causados apenas
Por alguns, poucos
Mas que todos
Estamos sofrendo
Só há dois possíveis:
Ou projetas o teu ser,
Tua energia no futuro
Ou constróis, instante
A instante, o presente
De cada um e de todos
A construção, aqui e agora
Do Mundo Humano
É sempre possível
Mas fizeram-nos descrer
Homens, desta saída
Atirando a felicidade
A justiça e igualdade
Para um futuro incerto
Os poderosos enganam
Os povos, arrastados
Por novas/velhas utopias
Á procura de paraísos
Na Terra ou no Céu
Só se podem libertar
Aqueles que percebem
Como seus corações
Foram escravizados
Logo, libertos
No cosmos infinito
Voarão como anjos
Mas de carne e osso
Ensinando aos outros
A voarem, também
21. AQUARELA
Recolhe mais tinta no tinteiro; aplica curtos traços
Nos intervalos brancos do papel; surge uma figura
Uma paisagem, um céu que se destacam do fundo
Como se sempre lá estivessem, mas invisíveis
Esta arte de pintar é toda em subtileza
A mais ambiciosa, na modéstia dos meios usados
Não admira que vejam nela meditação profunda.
Os esfumados que nos dão a espessura, os vazios
Que se enchem de luz, as linhas apenas sugeridas,
Os relevos de corpos gráceis ou pesados
As humanas formigas que descem a colina
Encosta abaixo, até aos telhados de colmo
Arte pensada, imaginada, antes de executada
Toda ela tensão entre o interior e o exterior
Poesia realista e onírica que mais aprecio
Mas que nunca alcançarei!
20. A CINZA DE GAZA
Já não restam lágrimas, só cinzas
Que sobre as cabeças caem
Vindas do céu mortífero
Da crueldade despejada
Sobre a cidade esventrada
Vê-se nos écrans digitais
Olhos vidrados já não veem
Outros olhos não querem
Outros são indiferentes
O sangue das vítimas
inocentes espalha-se
Sobre as pequenas cabeças
Ensopa-lhes os cabelos
Escorre pelas faces
A degradação humana
Atinge esta civilização
Ela perdeu o senso moral
Demasiado poderosa
Totalmente impiedosa
A monstruosidade
e a cobardia
Não se apagarão:
Estão para sempre
por cima das cabeças
Dos que cometem
Dos que abençoam
Dos que viram a cara
Haverá cinza suficiente,
Suficiente para enterrar
A cinza dela própria
Sua autodestruição
Material e simbólica?
19. IRREVERSÍVEL
Fotos desbotadas, imensa tristeza que vem da lonjura
Enterrada na presença pungente que dilacera o espírito
Viver com lastro de tantas recordações, tantas presenças
Ausentes para sempre, que povoam as memórias
Algo que nunca imaginei na juventude , o mundo
Parecia estável apesar de todos os redemoinhos
Mas foi retirando os entes que eu amava
Restando apenas a distância incomensurável
De um passado e todo o absurdo de sermos
Passageiro único de um imenso navio
De um longo comboio sem vivalma
Atravessando planícies monótonas
Para destino nenhum , velozmente.
E o passado, em sonhos esfarrapados
Que me agitam e fazem acordar,
Desfila em sequências caóticas .
Aprendi então a viver no meio
De meus fantasmas familiares
E , enquanto posso, vou saboreando
Os instantes poucos que me restam
De alegria e gratidão, que sabedoria
Me dá, agora que juventude se foi.
18. ASSIM OS LEVA O VENTO
Era um tempo sem bússola
De parte a parte parecia
Um mundo fictício
Porém era real
Para onde quer que olhasse
Já não reconhecia
Os meus amigos
Vivia num pesadelo
Acordando em suor
Com a memória
Misturando-se de sonhos
E estes não eram doces
Mas de calafrios
As lindas criaturas
Transformadas em hienas
Meus leais companheiros
Em verdugos sádicos
Oh! Meu Deus, serei
Eu o louco, afinal?
Não sei; as conversas
Com o Senhor do Universo
Têm estado difíceis
Ultimamente
Mas, ao acordar, recebi
Uma críptica mensagem :
"Assim os leva o vento"
17. AQUELE PUNHO FECHADO
Aquele punho fechado inspira coragem
E vem com o braço e o pulso
Finos, delicados e fortes da mulher
Dela erguem-se palavras
Soam e ressoam no meu espírito
Sem falsa retórica e sem ódio
Sabe falar da guerra e da paz
Não precisa de falsos argumentos
Só de três coisas precisa: Amor,
Coragem e Verdade.
Mais força tem que um exército
Mais pontaria que atirador de elite
Sua palavra abrasa corações
Invencível: Sendo impossível
De suprimir, brota da terra
Recobre o horizonte
É brisa ou vendaval
Sai do peito daquela mulher
Mas palavras assim poderosas
Outras vozes as pronunciam
Quem recebeu tais palavras
Pode fazê-las suas
E disseminar como semeador
Que lança na terra nova vida
16. VIAGEM
Fotos desbotadas, imensa tristeza que vem da lonjura
Enterrada na presença pungente que dilacera o espírito
Viver com lastro de tantas recordações, tantas presenças
Ausentes para sempre, que povoam as memórias
Algo que nunca imaginei na juventude , o mundo
Parecia estável apesar de todos os redemoinhos
Mas foi retirando os entes que eu amava
Restando apenas a distância incomensurável
De um passado e todo o absurdo de sermos
Passageiro único de um imenso navio
De um longo comboio sem vivalma
Atravessando planícies monótonas
Para destino nenhum , velozmente.
E o passado, em sonhos esfarrapados
Que me agitam e fazem acordar,
Desfila em sequências caóticas .
Aprendi então a viver no meio
De meus fantasmas familiares
E , enquanto posso, vou saboreando
Os instantes poucos que me restam
De alegria e gratidão, que sabedoria
Me dá, agora que juventude se foi.
Na poltrona viajo sem mexer
Ciente dos perigos da estrada
Enquanto os pesadelos do sonho
Só nos dão um mau acordar
Passageiro.
Só percorro vales e montes
Montado na imaginação e basta
A realidade já não é perigosa
Nem nos traz grandes surpresas:
Tornou-se chata.
Percorrendo avenidas e atalhos
Recolho imagens únicas e vivas
Mais vivas que as da vida real
De tão reais que as exteriores
Empalidecem.
E como a matéria colorida,
Também a matéria sonora
Um tango ou sinfonia,
Entra pelos ouvidos adentro:
Sublime
Não aconselho viagens
Com drogas ou licores
O viajante dos sonhos
Deve estar ao leme
Do navio
E quando acordo na realidade
Que tem de ser, quotidiana
Acordo com profunda tristeza
De visionar um mau filme
É o que é!
Na poltrona viajo sem mexer
Ciente dos perigos da estrada
Enquanto os pesadelos do sonho
Só nos dão um mau acordar
Passageiro.
Só percorro vales e montes
Montado na imaginação e basta
A realidade já não é perigosa
Nem nos traz grandes surpresas:
Tornou-se chata.
Percorrendo avenidas e atalhos
Recolho imagens únicas e vivas
Mais vivas que as da vida real
De tão reais que as exteriores
Empalidecem.
E como a matéria colorida,
Também a matéria sonora
Um tango ou sinfonia,
Entra pelos ouvidos adentro:
Sublime
Não aconselho viagens
Com drogas ou licores
O viajante dos sonhos
Deve estar ao leme
Do navio
E quando acordo na realidade
Que tem de ser, quotidiana
Acordo com profunda tristeza
De visionar um mau filme
É o que é!
15. Fábula: O CONSELHO DOS ABUTRES
Nota prévia:
Este poema foi escrito na sequência do 11 de Setembro de 2001.
Publiquei-o a 29 de Setembro desse mesmo ano.
Não tinha ilusão sobre a política de abutres grandes e pequenos
que iria desenrolar-se daí por diante.
Infelizmente, para todos nós, a minha intuição estava correta!---------------------------------
Reuniu-se o Conselho Supremo dos Abutres,
Para decidir de magna questão:
O Abutre-chefe, bateu as asas e disse:
"Senhores; a situação é grave.
Há grande falta de carniça no mercado!"
Virando-se para um dos seus generais,
Interrogou: "Não haverá para aí nenhuma
Guerra que se aproveite?"
Ao que o general abutre respondeu: "De momento,
Que se veja, não! Porém, temos planos para
remediar tão penosa situação "
"Dizei-me então", retorquiu o Abutre-Chefe,
"tem de ser algo em grande, que nos sirva
por muitos e bons anos!"
G: "Recebi informação dos nossos amigos Chacais
que um banho de sangue de carneiros se está
preparando pelos abutres do outro lado"
A-C: "Quais? Dizei-me tudo o que sabeis!"
G: Aqueles mesmos que nós preparámos e treinámos
durante longos anos e que agora se têm rebelado
contra o Vosso supremo comando;
Vão causar um genocídio, dentro da nossa coutada,
para mostrar que eles já não nos temem ou respeitam!"
A-C: " Dentro da nossa coutada !?"
Aí, pediu a palavra o velho Abutre que já tinha sido
Conselheiro em inúmeras empresas de carne para
canhão, e disse: "Pois bem, deixemos que atuem!
Assim teremos pretexto para desencadear as nossas
Operações!"
Grande algazarra se elevou então no Conselho:
Uns gritavam: "O quê? Deixar que soframos uma tal
Humilhação?!"
Outros: "Mas se desta vez os cachorros se puserem
A ladrar que estamos feitos com o outro lado?"
A maioria estava muito excitada, ao saber
Que a grande crise estava prestes a terminar:
Os abutres não se importam de onde vem a
Carniça, sempre é bem-vinda, para satisfazer
Suas grandes panças.
O Abutre-chefe ergueu-se então do seu trono,
Voejando em torno da mesa de conferências,
pousou no meio desta. Fez-se logo
um silêncio sepulcral. Então disse:
" Sim; este é o momento!
Agora estamos em condições de ter abastecimento
Copioso, tanto e tanto, que ainda vai sobrar pra
Satisfazer a gula dos falcões, hienas, chacais e
Todos os nossos amigos,
Eles são nossos aliados naturais!" Vamos organizar o cenário para uma guerra,
Com sua preciosa colaboração. O enviado dos falcões disse então: "Estamos
De alma e coração convosco! Temos as nossas
Esquadrilhas preparadas para atacar. Iremos
Vestidos de pombas, como é nosso hábito,
para que os cordeirinhos que estão cá dentro
da cerca fiquem quietos e calados!"
O Embaixador das Hienas, pediu a palavra
E disse: "Se Vossas Senhorias me permitem,
Devido aos longos anos que tenho de
Experiência com as hostes cornudas, penso
Que poderei dar um precioso contributo a tão
Nobre causa; temos esquadrões bem treinados
Para semear o terror nos rebanhos, receitas
Infalíveis para os desorientar, para confundir
Nossos dizeres com os apelos dos cães-pastores:
Assim eles serão voluntários para irem imolar-se
Pela nossa causa!"
"Muito bem!" Disse o Chefe-Supremo: "Ordeno
que ponham em marcha os preparativos
da grande guerra que irá marcar com o nosso
selo o início desta nova era! "
Todos aplaudiram entusiastas, fazendo juras
De eterna fidelidade Ao Céu dos Abutres,
À civilização da Carnificina,
Ao Modo de Vida Necrófago.
Uma voz rouca, do velho abutre, fez-se
Ouvir, após a gritaria ter acalmado:
"Amigos: que tal escolher uma data
simbólica?
Para início da grande campanha ficava
a calhar 11 de Setembro:
Sim , onze do nove de setenta e três!
Com certeza se recordam da data,
para a qual eu muito contribui
discretamente preparando
aquele magnífico holocausto!"
C-A: "Está bem, velho e fiel amigo abutre"
disse o Grande Chefe, "acho que é
uma ótima ideia!"
Dito isto, encerrou solenemente
O Conselho dos Abutres,
Com uma piedosa oração
Ao Céu dos Abutres,
E toda a assembleia se dispersou,
Cada qual indo de imediato
Cumprir a sua missão,
para dar seguimento às ordens
Emanadas do Chefe Abutre.
14. GRITO DOS OPRIMIDOS DA TERRA
Quase todos se designam como ambientalistas
Está na moda; mas, quantos estão genuinamente
A lutar pelo ambiente, o que inclui os humanos?
Onde estão os ambientalistas quando se trata
De manifestar contra a guerra
Exigindo paz imediata, salvando vidas
E salvando a ecosfera, impactada
Pelo desastre ecológico das guerras?
Que protesto contra a hipocrisia
Dos dirigentes que falam contra
Mas enviam armas e munições
A um dos lados, para eternizar
O bom negócio para a indústria
Dos armamentos?
Não lhes importa o ambiente
Nem tão pouco as pessoas
São ecologistas da treta
Que se indignam apenas
Com um dos lados e calam
Críticas a quem lhes paga!
A Terra, essa, não tem
Quem a defenda
Apenas a regeneração
Natural, no longo prazo
Se os homens entretanto
Não tiverem conseguido
Tudo destruir!
13. O POETA TRANQUILO
Escrevia como se respira
Muitas vezes o vi sentado
Naquela mesa de café
Olhando o vazio
Logo de seguida
Mergulhava num caderno
Onde rabiscava
Misteriosos signos
Depois, sorvia o café
E ia dar um passeio
Ou recolhia-se em casa
Se o tempo fosse agreste
Não sei o seu nome
Para mim, é «o poeta tranquilo»
12. ANTEVISÃO
Um tiro no escuro...
E o que restou desse tiro?
Estalido, ruído, tremor, temor?
Quando se alumiou a cena, o que ficou?
- Pois uma estranha peça de caça
Carcaça que estava congelada
E logo se desembaraçou do gelo
Mas sem miolos, feitos em papa
Ergueu-se à custa dos músculos
E quis esmagar tudo e todos
Mas, acabará em desaire
Inconsciente do que faz!
Deixá-lo! Já basta de bestas
Esta vai dar muitos socos
No vazio, coices nas paredes
Urrando ferozes ameaças
Mas, nós ficamos a olhar
Sem intervir, certos que ela
Desmiolada vai esgotar
As forças sem proveito
E que assim seja:
Que esmurre o vazio
Pois acabará por soçobrar
Ante seu próprio peso!
Deixá-lo! Já basta de bestas
Que nos atormentam
É tempo de regressar
À paz, à vida, sem mais dor
Este poema foi escrito na sequência do 11 de Setembro de 2001.
Publiquei-o a 29 de Setembro desse mesmo ano.
Não tinha ilusão sobre a política de abutres grandes e pequenos
que iria desenrolar-se daí por diante.
Infelizmente, para todos nós, a minha intuição estava correta!
---------------------------------
Reuniu-se o Conselho Supremo dos Abutres,
Para decidir de magna questão:
O Abutre-chefe, bateu as asas e disse:
"Senhores; a situação é grave.
Há grande falta de carniça no mercado!"
Virando-se para um dos seus generais,
Interrogou: "Não haverá para aí nenhuma
Guerra que se aproveite?"
Ao que o general abutre respondeu: "De momento,
Que se veja, não! Porém, temos planos para
remediar tão penosa situação "
"Dizei-me então", retorquiu o Abutre-Chefe,
"tem de ser algo em grande, que nos sirva
por muitos e bons anos!"
G: "Recebi informação dos nossos amigos Chacais
que um banho de sangue de carneiros se está
preparando pelos abutres do outro lado"
A-C: "Quais? Dizei-me tudo o que sabeis!"
G: Aqueles mesmos que nós preparámos e treinámos
durante longos anos e que agora se têm rebelado
contra o Vosso supremo comando;
Vão causar um genocídio, dentro da nossa coutada,
para mostrar que eles já não nos temem ou respeitam!"
A-C: " Dentro da nossa coutada !?"
Aí, pediu a palavra o velho Abutre que já tinha sido
Conselheiro em inúmeras empresas de carne para
canhão, e disse: "Pois bem, deixemos que atuem!
Assim teremos pretexto para desencadear as nossas
Operações!"
Grande algazarra se elevou então no Conselho:
Uns gritavam: "O quê? Deixar que soframos uma tal
Humilhação?!"
Outros: "Mas se desta vez os cachorros se puserem
A ladrar que estamos feitos com o outro lado?"
A maioria estava muito excitada, ao saber
Que a grande crise estava prestes a terminar:
Os abutres não se importam de onde vem a
Carniça, sempre é bem-vinda, para satisfazer
Suas grandes panças.
O Abutre-chefe ergueu-se então do seu trono,
Voejando em torno da mesa de conferências,
pousou no meio desta. Fez-se logo
um silêncio sepulcral. Então disse:
" Sim; este é o momento!
Agora estamos em condições de ter abastecimento
Copioso, tanto e tanto, que ainda vai sobrar pra
Satisfazer a gula dos falcões, hienas, chacais e
Todos os nossos amigos,
Eles são nossos aliados naturais!"Vamos organizar o cenário para uma guerra,
Com sua preciosa colaboração.O enviado dos falcões disse então: "Estamos
De alma e coração convosco! Temos as nossas
Esquadrilhas preparadas para atacar. Iremos
Vestidos de pombas, como é nosso hábito,
para que os cordeirinhos que estão cá dentro
da cerca fiquem quietos e calados!"
O Embaixador das Hienas, pediu a palavra
E disse: "Se Vossas Senhorias me permitem,
Devido aos longos anos que tenho de
Experiência com as hostes cornudas, penso
Que poderei dar um precioso contributo a tão
Nobre causa; temos esquadrões bem treinados
Para semear o terror nos rebanhos, receitas
Infalíveis para os desorientar, para confundir
Nossos dizeres com os apelos dos cães-pastores:
Assim eles serão voluntários para irem imolar-se
Pela nossa causa!"
"Muito bem!" Disse o Chefe-Supremo: "Ordeno
que ponham em marcha os preparativos
da grande guerra que irá marcar com o nosso
selo o início desta nova era! "
Todos aplaudiram entusiastas, fazendo juras
De eterna fidelidade Ao Céu dos Abutres,
À civilização da Carnificina,
Ao Modo de Vida Necrófago.
Uma voz rouca, do velho abutre, fez-se
Ouvir, após a gritaria ter acalmado:
"Amigos: que tal escolher uma data
simbólica?
Para início da grande campanha ficava
a calhar 11 de Setembro:
Sim , onze do nove de setenta e três!
Com certeza se recordam da data,
para a qual eu muito contribui
discretamente preparando
aquele magnífico holocausto!"
C-A: "Está bem, velho e fiel amigo abutre"
disse o Grande Chefe, "acho que é
uma ótima ideia!"
Dito isto, encerrou solenemente
O Conselho dos Abutres,
Com uma piedosa oração
Ao Céu dos Abutres,
E toda a assembleia se dispersou,
Cada qual indo de imediato
Cumprir a sua missão,
para dar seguimento às ordens
Emanadas do Chefe Abutre.
11. PALAVRAS OBSCURAS
Serão palavras obscuras,
As que eu tenho para te mostrar:
Amei a luz e o calor
Não vi o cortejo
De invejosos atrás de mim
Ofereci meu coração
E afeto, mas a quem
Não sabia dar de volta
Agora estou às voltas
Com o meu passado
Arrependimento?
Só de ter sido ingénuo
Pois amor não é pecado!
Neste mundo onde vivemos
Hipocrisia, cobiça e outros
Sentimentos venenosos
Involucraram-se
Nas massas cerebrais
Dos contemporâneos
Ao ponto de não saberem
Distinguir a realidade
Das suas narrativas
Auto justificadoras.
Tenho pouca esperança
D'amanhãs que desencantam
Dedico-me a estudar e mergulhar
Na Natureza, ela me ensina
Meu otimismo está na fonte
D'onde a glória cósmica
Emana; nas sociedades
Contemporâneas
Em vão procurei
A fonte de Vida
Procurei longamenteNão tenhais ilusões
Procurai o bem e o justo
No interior de vós próprios
Não em discursos elogiosos
Mas no saber de si próprio
Só assim podereis
Velejar na travessia
Do oceano turbulento.
10. VENDAVAL DE ABRIL
Onde estão os dias da minha juventude
Em que dançávamos embevecidos pelos sons
Que nos pareciam dizer o que nos ia no coração
Em que as raparigas eram atraentes e prudentes
Para nos darem esperança de namoro somente
As infinitas discussões politicas, as ilusões
Podeis rir ou desprezar; eu tenho boas recordações
São minhas, são vossas, rapazes e moças desses anos
Não importa que sejais avós, que estejais na reforma
Este período da nossa história coletiva foi
Entre exaltações, ilusões e trambolhões
O tempo único de florescimento
O desabrochar de mil canções
Que nos encheram corações e almas
De esperança
Não será isso o mais importante?
- Aquilo que nos faz viver,
Nos transporta além do nosso ego
- Aquilo que vence a estupidez
A mesquinhez e a cupidez?
Serei sempre adolescente
Na alma, não por passadismo
Mas por escolha, depois de ter
Visto a miséria em que se transformou
Boa parte dos adultos de hoje:
O seu "ideal" é encaixar no sistema!
Perdoo tudo, menos a covardia
O não ter coragem de fazer
O que seja preciso, para repor
A justiça e dignidade no seu entorno
Podem ter muita "competência", etc. mas
Onde está a vossa decência?
Se quiserdes, podeis viver "com a espinha direita"
É vossa escolha...
Digo-vos ser bem pior
Viver rastejando e espezinhado.
- Tudo o resto é bem pouco, indigno
E fracassado, não tenham ilusões:
O "vencer na vida" que eles apregoam
É vencer no concurso
Para escravo abjeto dos Senhores
Se é este o vosso objetivo, lamento,
Mas não terei qualquer palavra de apreço
Pela vossa entrega ao serviço das bestas
Do momento; só poderei lamentar.
Os outros que me seguem
Sabem que eu não lhes tento vender
Esta ou aquela ideologia
Apenas que sejam livres, humanos,
Dando e recebendo amor
O amor verdadeiro que não
Se vende nem compra
Que pode ter ou não ter
Uma componente física.
Tem de ser genuíno.
9. AS AÇÕES TÊM CONSEQUÊNCIAS
Há sempre um depois, isso tens de aceitar
quer gostes ou não, tuas ações têm consequências
Assim, quando te lamentas de que não «esperavas»
estás a enganar-te pois já sabias que nada é garantido
O que pode uma mente e uma vontade em face
do destino? Pode muito ... mas não lamentar-se
Na tua postura reside o problema; tomas-te
por outro, imaginas um personagem que não és tu
Mas vem o dia, um certo dia em que o teu sonho
se desmorona; podes tentar construir nova ilusão
ou varreres os escombros e construir algo novo
ou estás sempre a reproduzir os mesmos erros
ou tomas o leme e pões o teu ser noutra rota
A escolha é tua, mesmo que não te agrade escolher
sabes, no fundo, que podes sempre escolher
Embora fazer as escolhas no tempo certo seja o ideal
as oportunidades são mais que as marés
sobretudo para reerguer a tua vida e navegar
As escórias que nos dificultam o caminho
são fáceis de eliminar, só guardar o que tem valor
Os sentimentos e atitudes vitais e comuns
que permitem potenciar a vida em comum
A vida social, a transação não comercial
entre pessoas chama-se amor
Mas está-se numa época muito contrária
a este simples elemento da vida humana
Só podemos viver a vida em plenitude,
ultrapassando as imposições exteriores
que nós interiorizamos e são muitas!
Reconhecer quais são essas, examiná-las
rejeitando as que nos amesquinham,
aproveitando as que sejam de disciplina
pessoal saudável, selecionando
aquilo que há de bom e suspendendo
o nosso julgamento do que não sabemos
ao certo, ou com grau de certeza suficiente
sabendo que, se esperarmos, saberemos.
Poderemos deslindar e avaliar o valor
de ações, de juízos, de teorias, etc.
mas, não é possível avançar sem grande trabalho
sobre si próprio. Talvez esse seja o significado
profundo do mito de Sísifo. Ele rolava sempre
a pedra para o cume da montanha
Não foram os Deuses que o condenaram
a fazer isso e a repeti-lo incansavelmente
Era a lei da vida; de se procurar acumular
energia potencial,
que se dissipa, inevitavelmente,
rolando pela encosta abaixo.
Porém, nada nos pode demover de fazê-lo
ainda assim; porque se trata da lei da vida
e nós queremos estar vivos. Se perdemos
esta vontade de rolar a pedra encosta acima
então só nos resta nos deitarmos e morrer.
E o dia depois de morrermos, como seremos?
Não haverá energia para «rolar a pedra»
por isso precisa a natureza de fabricar
novos seres vivos, substituindo
os que se foram.
Mas os que se foram deixaram uma obra
ela existe, em torno de nós
e chama-se sociedade, civilização, cultura
Então, este é o verdadeiro potencial,
transcendendo várias gerações.
Por isso, devemos opor a nossa energia às forças de destruição
de anulação do potencial, construído pelas gerações presentes
e passadas; quem quer destruir tudo, são tresloucados
não se constrói, destruindo!
Sim, é preciso escavar para construir um edifício,
mas não se faz senão deslocar terra e rocha de um sítio para o outro!
A destruição que eu falo é bem pior,
traiçoeiras bombas que eliminam vidas, que as ceifam
a destruição de incontáveis gerações humanas
quer sejam edifícios, quer sejam vidas e todo seu potencial
As destruições que se tem diante dos olhos não são sentidas
verdadeiramente pelos que não estejam debaixo das bombas
A solidariedade real, escasseia: a indiferença e egoísmo
face ao sofrimento alheio é uma destruição do que existe
de humano em nós. Colocam-se as imagens de violência,
nos écrans das televisões e dos computadores, estão a ser
veiculadas ao nível subliminar como «espetáculo»,
mesmo os corpos mutilados e as cenas de desespero
perante as câmaras, não são vistas como algo que nos diga respeito,
no mais íntimo. É precisamente neste aspeto, além do imediato
que a guerra (todas as guerras) tem um efeito global destruidor:
Se a humanidade das pessoas desaparece, fica embotada, elas estão
transformadas em robots «de carne e osso», não são seres humanos,
pois deixaram de ter empatia, a capacidade de se colocar na pele do outro.
Tanto para os criminosos como para as suas vítimas, existe o depois:
Depois de feito o abjeto e criminoso ato, ele não será nunca apagado
seja qual for a sentença de tribunais humanos
O espírito universal não será condicionado por isso.
As consequências são incalculáveis para nós, humanos.
8. O VEREDICTO
Cada dia que passa,
7. VIVER É SOFRER
Mas a maior parte das pessoas
Está tão ocupada com a simples sobrevivência
Que não tem possibilidade de filosofar
A vida é sofrimento, sente-se de vários modos:
Com o corpo e com a mente
Em várias circunstâncias
A ausência de sofrimento é assimilado
Ao bem-estar, ao prazer
Mas tal não é assim;
Seria antes o sofrimento
A reinar sobre nós
Como tortura sobre o corpo
E o espírito.
Os sofrimentos materiais e morais
São menos intensos, não desaparecem
Mas podem ser esquecidos
Por instantes.
É nessas ocasiões que nos iludimos
E acreditamos que somos «felizes».
Além disto, quero dizer-vos
Que a ideia de que existem afortunados
Que não sofrem, ou sofrem pouco,
Porque são ricos, poderosos, inteligentes ...
É falsa. Não existe correlação entre o poder
E evitar o sofrimento.
Quem aguenta o sofrimento
e não fica tão traumatizado
Como os outros, tem maior resistência
Ou resiliência, a capacidade de enfrentar
As coisas duras da vida.
Não procuro sofrer. O sofrimento
Não me trouxe paz, trouxe-me
Um início de sabedoria
A vontade de evitar sofrimentos
Inúteis, em mim e nos outros.
Sei que soa a demasiado pouco
Mas, este evitar ou menorizar
Da dor e do sofrimento
É ensinamento de séculos e séculos
Da filosofia e da educação moral
Ouvi o Anjo da Morte;
falou-me ao ouvido
Serena, amistosa, disse-me estas palavras:
" Não temas, homem, esta passagem
Ela parece difícil e terrível
Porque os humanos
A descrevem como algo horrendo
No entanto, a vida (essa sim)
Pode ser horrível e bela
A morte é passagem, somente
Ela não te faz sentir nada
Tu deixas de sentir
Nem sentes, nem guardas consciência
Como poderias sofrer
Chega um momento de passagem
Para o Além
Não te posso dizer nada sobre o Além
Nem o que lá irás encontrar
Só te digo que as imagens
De todas as Religiões
São infantis, são projeções
Serena pois e prepara- te
Para esta jornada;
- Nada do que seja teu
Vai quedar-se tal qual
Teu corpo, teus pertences
Pessoais, teus bens, tua obra
Tudo vai cambiar e a marca
Da tua personalidade
Vai esbater-se, até mesmo
Nos entes queridos;
É assim e não vale a pena lamentar
A lei da vida inclui a morte:
Descansa sobre a sabedoria
Destas palavras."
Assim me falou ela.
E como anjo belo
Alevantou-se,
Retomando o caminho
Das nuvens.
5. NA ROCHA DO TEMPO
Na rocha do tempo contemplo o meu passado
Meço os meus passos pelo ritmo da asa
Que no céu bate até chegar ao destino
Sem o preconceito do homem civilizado
Mas com a certeza da vida e do querer
Na rocha do tempo estou realmente sozinho
Mas o sol também, e tal como o vemos
Ele não se ressente disso e continua
Imperturbável a iluminar o firmamento
Sempre, quer faça chuva ou nevoeiro
Na rocha do tempo me abrigo
Sei que sou transitório e isso
Isso afinal não me assusta
Quando estou contemplando
O tempo, o tempo que não tem prazo
4. SÓ O AMOR
NÃO HÁ NADA QUE POSSA FAZER-ME ESQUECER
O QUE VIVI CONTIGO
SEM TI, O MUNDO SERIA CHATICE
SEM TI, SÓ PODERIA SOBREVIVER
MAS ESTAREI CONTIGO SEMPRE
DE AGORA EM DIANTE
NEM A MORTE NOS PODE SEPARAR
ASSIM PROCLAMO AOS QUATRO VENTOS
E QUEM NÃO AMA, NÃO SABE
SÓ O AMOR NOS DÁ SABEDORIA
O VERDADEIRO AMOR
NÃO NOS PODE EXTRAVIAR
É LUZ QUE ALUMIA OS TÚNEIS
DO PASSADO, PRESENTE E FUTURO
E SERÁ ETERNO OU NÃO SERÁ
POIS ELE TRANSCENDE A FINITUDE DO CORPO
ELEVA-SE AO ESPÍRITO ETERNO, UNIVERSAL
O TEU AMOR É QUE ME LIGA AO UNIVERSO
O TEU E O DE MAIS NINGUÉM!
3. ODOR IRRESISTÍVEL!
Um odor que tresanda
Mistura de suor, sujidade, sangue, lixívia
E tanto mais forte, quanto as pessoas
Fingem não se aperceber de nada
De pouco serve perfume, desodorizante, ou loção
É fedor que se escapa de certos corpos
Por mais que disfarcem
De nada serve toda a técnica de ocultação
Atravessa os salões, insinua-se nos carros
Existem variantes, é certo
Mas, a camuflagem odorífera neles todos
Não disfarça a nota de fundo, o típico
Agridoce de cadáver no início do apodrecimento
Será fortuito encontro, numa mesa de anatomia,
De pedaços de corpo humano e de animal
Será essa a nutrição de requintes perversos
Mas nem todas as pessoas são assim
É preciso ter o estômago bem resistente
Esse odor que tresanda, mas encanta
Que ninguém repara, mas todos sentem
Que intoxica, mas que se respira
Material ou imaterial; em metal, papel
Ou digital, é disso que estou a falar:
O odor do dinheiro
( 02- 14 ANNUS HORRIBILIS 2024)
2. SUSSURRANDO
Ao teu ouvido
Amor
Estas palavras
Ofereço
São ínfimo som
Só tu ouves
Mais ninguém
Não partilho segredos
Dos nossos enredos
Sacode os medos
Ouve a melodia
Da canção nossa
A letra sabemos
De cor, la la la
di di ri di
Em exclusivo
Até ao fim
Só nós sabemos
Essa letra e guardamos
Seu significado
Tu e eu
Até que o Mundo acabe
(Murtal, 12 de Janeiro 2024)
1. PARA QUE CONSTE
Hoje, tempo de recordação. Hoje, tempo de ouvir os sons que me consolam na solidão. Hoje, só permito que beleza enforme o meu olhar. Para que conste, não estou a escrever senão pelo prazer de um improviso. Pelo prazer de levantar voo no dorso dum ganso de um conto de infância.
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