sexta-feira, 30 de setembro de 2016

DEBATE «25 ANOS DA QUEDA DA URSS» NA FÁBRICA DE ALTERNATIVAS

                  25 Anos da queda da URSS

Pelas 18:30 de Sábado, dia 1 de  Oubruro de 2016. 

Entrada livre. 

Haverá um jantar vegetariano a seguir [inscrição para o jantar até 30-09]

 email: fabrica.de.alternativas@gmail.com 


A Fábrica de Alternativas já é conhecida de muitos pela qualidade de seu trabalho em prol de uma cultura descomprometida com os poderes, feita em autogestão e cooperação entre todos os elementos da comunidade e aberta a todas as boas-vontades, independente - portanto-  de agendas partidárias e políticas. 

Penso que este conjunto de características permitirá um debate sereno e rico sobre assunto da mais vasta consequência na História contemporânea, com repercussões nas vidas de todos nós, até ao presente. 
Podemos debater sem preconceitos, nem desejos de afirmação dos egos, apenas com a vontade de partilhar e escutar. Assim também estaremos todos construindo uma cultura de diálogo e tolerância. Todas as opiniões são livres de se exprimir, desde que se exprimam dentro dos limites da cortesia e do civismo. 

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

[Joan Baez] There But For Fortune + So We'll Go No More A-Roving



... E surgiu uma voz que iluminou os palcos, mas sobretudo os espaços livres, os espaços públicos.
Era uma voz aguda, cristalina, sem afetação, com a segurança e expressividade de alguém com perfeita formação vocal. 
Em 1964-65 era simplesmente outra coisa, não era folk, não era clássico, não era blues, nem pop. Era simplesmente Joan Baez. 

Surgiu, como por encanto, na minha vida, como na vida de muitos milhares de jovens dos anos sessenta. Sempre me acompanhou na minha vida, o disco agora reproduzido; pelo menos, na minha memória auditiva. 



[Fui buscar à Poetry Foundation a  balada de Lord Byron, parece-me que é uma versão ligeiramente diferente da cantada pela Joan Baez, mas gosto de ambas!]

So We'll Go No More a Roving

Related Poem Content Details

So, we'll go no more a roving 
   So late into the night, 
Though the heart be still as loving, 
   And the moon be still as bright. 

For the sword outwears its sheath, 
   And the soul wears out the breast, 
And the heart must pause to breathe, 
   And love itself have rest. 

Though the night was made for loving, 
   And the day returns too soon, 
Yet we'll go no more a roving 
   By the light of the moon.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

CÂNTICO DO OUTONO

Tchaikovsky autumn song
                                     

Era uma vez no Outono e a erva estava húmida. 

Os pássaros cantavam, mas o canto já se fazia tímido, como que sabendo do invernal frio vindouro.

Quando despertei dentro da toca - enganado pelos odores do bosque - era outono e não primavera...

A luz tamisada pela folhagem oferecia-me poeira d'ouro manchado de ruivo 

E, nas manhãs, serenas e tristes, arrastavam-se nuvens pelo horizonte vermelho e chumbo.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

ECONOMIA LOUCA

«QUANTITATIVE EASING», «TAXAS DE JURO NEGATIVAS» E «QUANTO PIOR, MELHOR» 



POUCAS VEZES TENHO OUVIDO UM DISCURSO MAIS CLARO SOBRE O ESTADO DA ECONOMIA NOS EUA E NO MUNDO.
Curiosamente, o Prof. Richard Wolff, economista marxista, apresenta um ponto de vista claramente de «esquerda» e anti-capitalista e corresponde em parte à análise dos que estão bastante à direita, os libertarianos, que de facto terão mais tendência para votar Trump.
ESTAMOS TODOS REFÉNS DUM MUNDO CAPITALISTA ENLOUQUECIDO, DUMA CRISE CAPITALISTA GLOBAL, SEM ESPERANÇA DE UMA QUALQUER MUDANÇA REVOLUCIONÁRIA. APENAS PODE HAVER UM REFORÇO DO AUTORITARISMO, PELO MENOS NO CURTO-MÉDIO PRAZO.

24-09-2016: Sessão de lançamento dos "cadernos selvagens" Nº3 + Texto de Naná Rebelo



Por ocasião do terceiro número dos «Cadernos Selvagens» realizámos uma sessão na Fábrica de Alternativas em Algés, no Sábado 24 de Setembro. 
Nesta, foram lidos textos meus e de Naná Rebelo, selecionados de entre os publicados no Nº 3 dos referidos cadernos. 
A discussão geral, com cerca de 15 pessoas presentes, foi animada e participada
Os participantes foram encorajados a enviar-nos (por e-mail) originais que queiram publicar, sejam de poesia, contos, reportagens, etc. Ficou também decidido que os cadernos (em versão pdf) serão afixados na página facebook da «Fábrica de Alternativas». 

O texto abaixo, de autoria de Naná Rebelo, apareceu nos «Cadernos Selvagens nº3». Não resisto a transcrevê-lo no meu blogue.  


Do cadeado e da sua morte

Superar, ultrapassar os limites, ser forte, ser mais forte, sorrir, abraçar, amar, amar-se. Estes são os slogans que encontramos ao virar de uma qualquer esquina virtual, no percurso da nossa vida.
É curioso como é fácil banalizar a força interior que cada pessoa possa ter, como se de uma qualquer receita se tratasse. Este é o poder das redes sociais, aquilo que eu chamo o muro das lamentações do século XXI. Um autêntico prêt-a-porter de emoções.
O passar de páginas inteiras com comentários tipo anúncio, do género «se eu não gostar de mim, quem gostará?» ou, «só sabes a força que tens quando mais nada te restar senão ter força». Podia ficar por aqui com um sem número de exemplos semelhantes, mas a redundância não é a minha figura de estilo favorita.
Pergunto-me diversas vezes, o que procuram as pessoas numa rede social? O que as move na decisão de criar uma página pessoal no meio tão inóspito que é a Internet? E digo inóspito porque é minha convicção que o é de facto. A Internet não é o nosso bairro, a nossa escola, a nossa família, os nossos amigos. A Internet é o mundo inteiro, a praça pública da aldeia global, onde todos se podem permitir dizer tudo o que lhes vai na alma, onde todos podem assumir uma qualquer personagem, onde todos podem saber tudo o que cada um quiser mostrar, literalmente, onde todos podem criticar, ser criticados, sem apelo nem agravo, onde espreitam perigos de toda a espécie para os mais incautos. Querem um meio mais inóspito que este? Mas atenção, mea culpa, que eu também faço parte do grupo e gosto!
Voltando à questão, o que as move, o que faz com que exponham a sua vida, por vezes ao mínimo detalhe, num sítio assim?
Lembro-me do tempo sem telemóveis, sem Internet, onde tudo acontecia como e onde tinha de acontecer, sem que o mundo inteiro soubesse. As acções ficavam no seio de quem as praticava.
Nesse tempo corria-se menos, falava-se mais, lia-se mais, escrevia-se mais. E este é o ponto, para mim, fulcral de toda esta conversa. Escrevia-se mais. Escreviam-se cartas, de amor e das outras, escreviam-se postais ilustrados nas férias para enviar aos amigos, à família. Também se sentia a solidão, também se escolhia um amigo para desabafar as mágoas mas, sobretudo, existia uma coisa chamada diário que servia de repositório de emoções, ao mesmo tempo que se descreviam os acontecimentos que as desencadeavam, ou vice-versa.
Eu nunca tive nenhum, embora sempre tivesse tido esse desejo. Lembro-me de os ver nas montras das papelarias, lindos, maiores ou menores, mas sempre com um cadeado e ficava fascinada. Para mim esse era o grande mistério dos diários: o cadeado! - Porque têm um cadeado, Pai? – Porque ali se escrevem coisas pessoais, coisas que só dizem respeito à pessoa que escreveu e que não se quer que mais ninguém leia.
Naquela altura, a resposta do meu Pai ainda aguçou mais a minha fantasia. Eu tinha de ter um diário. A vida não era fácil e as hipóteses de ter um, daqueles com cadeado, era remota, por isso improvisei. De um caderno escolar novinho em folha, fiz aquele que seria o meu 1º diário. Colori a capa, colei uns bonecos e acrescentei uma fita de ráfia que atava sempre, cuidadosamente, após cada acontecimento que ali descrevia. Era o meu cadeado e eu acreditava que era tão inviolável como os verdadeiros.
Hoje, sabemos, esse mistério fascinante morreu. Acabaram-se os segredos, tão nossos, acabaram-se os cadeados, improvisados ou não.
Mas aquilo que o meu Pai me disse naquela altura «Porque ali se escrevem coisas pessoais, coisas que só dizem respeito à pessoa que escreveu e que não quer que mais ninguém leia.», nunca me saiu da cabeça. Continuo a tentar perceber porque tudo isso acabou. E vou descobrindo, aos poucos.
Sem querer cair em lugares comuns e psicologia de cordel, acabou do mesmo modo em que as crianças deixaram de brincar na rua com os amigos; já não jogam aos «polícias e ladrões», nem ao berlinde, nem ao peão. Deixaram de esperar que as mães os chamassem para ir lanchar, que depois sempre podiam voltar à brincadeira. Passaram a “barricar-se” nos respectivos quartos a jogar consola e a comer as sandes ao mesmo tempo, atabalhoadamente, para não perderem “vidas” nos jogos. Deixaram de brincar com os amigos de sempre, deixaram de socializar, de dar o 1º beijo às escondidas atrás de um arbusto qualquer.
Começaram a crescer à frente do monitor de um computador, deixaram as consolas e começaram a namorar à distância, que o 1º beijo, esse chegaria de uma qualquer maneira bizarra, sem aquela atracção de antes, mas com a mesma curiosidade do proibido, tantas vezes decepcionante.
Assim têm vindo a crescer várias gerações, que hoje são pais e adoptaram precisamente o mesmo estilo de “convívio”. É o progresso, dizem, fazer o quê? Adapta-te ou morre…
E foram-se perdendo valores, como quem não quer a coisa. Perderam-se os amigos reais e ganharam-se milhares de “amigos” virtuais. Agora contam-se os amigos das redes sociais, quantos mais melhor (?) e diz-se à boca cheia que se é amigo do Brad Pitt ou de uma qualquer outra estrela. E vai-se alimentando assim a auto-estima.
E depois, quando finalmente se desliga o computador, vai-se dormir a pensar em que frase bombástica se há-de iniciar a nova sessão. Ler? Só se for para retirar alguma ideia passível de aprovação no próximo post.
Mas a próxima sessão tem imensos desafios e a adrenalina sobe quando se vão vendo as repercussões que teve o tal post. Afinal não agradou a todos! Agora demos largas à imaginação, ou falta dela, para defender a camisola. E vêm os “gosto disto” e vêm os insultos e lá se foi a glória. Mas há sempre a escapadela de ir ver quem faz anos, de entre as centenas de amigos e dar muitos parabéns a quem não conhecemos de lado nenhum ou, se conhecemos, nem nos lembraríamos, não fora o aviso dos aniversários do dia.
Depois vêm as lamentações do que correu mal ou a euforia do que correu bem. E aqui entram os tais “segredos” que outrora estavam bem guardados no tal diário do cadeado.

Agora já não há nada a esconder e também não há o mínimo interesse nisso. Agora queremos que o mundo saiba que afinal já não se está numa relação e que fomos comemorar com pataniscas ao jantar, com a inevitável fotografia do repasto.
Assiste-se ao «show» dos treinadores de bancada e não é só de futebol que falo. Há especialistas em todos os assuntos. Fazem-se revoluções virtuais, incitam-se as massas, trocam-se insultos da esquerda à direita, criam-se grupos de banalidades e outros de utilidades e assim se vão preenchendo momentos de solidão.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

ANTIBIÓTICOS E RESISTÊNCIA BACTERIANA: UMA HISTÓRIA MUITO MAL CONTADA


Num universo dominado pelo fenómeno mediático, é necessário recuar e tomar uma perspetiva histórica, para reenquadrar tudo aquilo que se diz e comenta num dado momento sobre algum fenómeno, seja ele económico, político, de sociedade ou de saúde pública.
Fala-se muito agora de aparecimento de estirpes de bactérias resistentes aos antibióticos, porquê?
Faz muito tempo que na comunidade científica e médica se sabia deste fenómeno e se alertava os poderes públicos para os perigos da distribuição indiscriminada de antibióticos.
Agora, o motivo por detrás da campanha da ONU e OMS parece ser o facto de as grandes farmacêuticas acharem que não vale a pena investirem biliões em investigação para descobrirem e desenvolverem novos antibióticos. Elas próprias se especializaram no passado a promoverem a utilização, a propósito e despropósito, dos referidos antibióticos que comercializavam… que ironia!
Têm na manga «novos» tratamentos, por exemplo, os fagos: os bacteriófagos são um tipo de vírus específico de bactérias; existem muitas estirpes de fagos capazes de atacar determinadas bactérias, com exclusão de todas as outras. Isto é uma possibilidade de tratamento para pessoas padecendo de infeção com bactérias multirresistência a antibióticos.
Já se conhecia o potencial terapêutico concreto dos fagos desde há uma data de anos!



Já se discutia  na comunidade científica a possibilidade de sua utilização terapêutica, quando se começou a usar esses fagos como ferramentas, na nascente engenharia genética, por volta dos anos  1970, quando apenas se utilizavam as bactérias para clonar genes…
Não apenas a indústria farmacêutica é culpada por disseminar resistências bacterianas aos antibióticos, pela sua agressiva propaganda nos meios médicos e na população em geral, também as profissões médicas, veterinárias e agricultores contribuíram para isso:
Há cerca de meio século descobriu-se que o gado ao qual era administrado antibiótico (neste caso, para tratamento de infeções), tinha um crescimento mais rápido. 
Explica-se o fenómeno pela presença de um ecossistema no aparelho digestivo – o microbioma – cujo equilíbrio é rompido pela adição de antibiótico, dizimando alguns grupos de bactérias, enquanto poupa outros. 
Assim, nas vacas tratadas a antibiótico, «sobravam» mais ácidos gordos voláteis – produtos da fermentação bacteriana que ocorre principalmente no rúmen:
Isto, porque as espécies de bactérias consumidoras desses mesmos ácidos gordos, eram dizimadas, mas não as bactérias que as produziam. Estes ácido gordos voláteis são absorvidos pela parede do rúmen dos animais e são efetivamente o alimento direto dos ruminantes. Tinham portanto maior quantidade de nutriente por certa quantidade de ração, logo cresciam e aumentavam de peso mais depressa.

Toca a dar a todo o gado – doente ou não- doses de antibióticos, o que fazia com que nestes houvesse as condições ideais, especialmente nas concentrações industriais para produção de leite ou carne, para a seleção e propagação de estirpes resistentes aos antibióticos. 



Graças à criação industrial de gado, tivemos assim a formação dos primeiros «monstros», muito antes de haver «engenharia genética»! Tanto assim, que não foi preciso esperar pelos anos 70 para se ver surgir- na população humana e muito em especial, nos hospitais - as primeiras estirpes de bactérias patogénicas resistentes a certos antibióticos.
Existem estirpes de bactérias patogénicas e resistentes aos antibióticos e estas tornaram-se um grave problema de saúde pública: isto é consequência direta das indústrias farmacêutica e de criação de gado, com a conivência de profissionais de saúde (médicos e veterinários), terem promovido a utilização abusiva destes medicamentos «milagre», que tinham aparecido nos finais da II Guerra Mundial…
Agora, essa mesma indústria, servindo-se da OMS (Organização Mundial de Saúde), propaga uma visão muito mais moderada sobre a utilização dos referidos antibióticos. Só que propaga esta sabedoria após ELA PRÓPRIA ter sido a instigadora e conivente do uso desbragado e totalmente abusivo dos referidos antibióticos, sabendo pertinentemente que essa irresponsável utilização iria propagar as tais resistências! Agora, que os seus antibióticos perdem a eficácia que tinham há 30 ou 40 anos atrás, propõem «novas» soluções terapêuticas, que custarão muito mais caro, mas que serão eficazes, durante algum tempo, como é o caso dos referidos fagos, ou de outras soluções…
Cada vez mais, me viro para soluções naturais e preventivas, não descurando porém o que a ciência tem trazido de bom. Nomeadamente, os pró bióticos são «medicamentos naturais», sem efeitos secundários graves, que repovoam o intestino, com estirpes de bactérias benéficas. Estas impedem a colonização do nosso tubo digestivo por outras, eventualmente patogénicas, além de nos fornecerem substanciais quantidades de vitaminas, que teriam de ser obtidas por alimentos caso não tivéssemos essas bactérias no intestino. Eu decidi-me, desde há algum tempo, a tomar diariamente pelo menos um iogurte natural* (sem adição de açúcar ou de natas). 
Realmente, tenho-me dado muito bem com isso! Prevenir em vez de remediar!
Se tiver mesmo que tomar antibióticos, irei provavelmente complementar essas tomas quotidianas de iogurte, com um reforço de bactérias e leveduras liofilizadas (designadas por pró bióticos), que se vendem, livremente, sem receita médica, nas farmácias ou nos hipermercados...


(*) Este iogurte quotidiano tem bactérias vivas que vão colonizar o nosso intestino. Apesar de muitas das bactérias ingeridas serem mortas durante a digestão, algumas sobrevivem e essas são suficientes para se instalarem e colonizarem o nosso intestino, contribuindo muito positivamente para as etapas finais da digestão, fornecendo quantidades não desprezíveis de vitaminas e sobretudo ocupando «espaços ecológicos», ou «nichos», que de outra forma poderiam ser ocupados por bactérias patogénicas.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

AOS MEUS AMIGOS DE ESQUERDA...

O IMPOSTO SOBRE PATRIMÓNIO IMOBILIÁRIO DITO DE 

«LUXO» É UMA MENTIRA!


A causa apontada deste imposto é «fazer pagar os muito ricos»:
 mas os muito ricos têm o seu capital principal em off-shores! 
Em Portugal, os bancos TODOS proporcionam a quem tiver muito dinheiro (não importa como foi enriquecido!) abertura de contas em «filiais» nos diversos «paraísos fiscais». 
Deixem-se de fitas, este imposto destina-se a tapar à custa dos tostões da classe média (sempre ela) os buracos deixados nas contas públicas pelos dinheiros dos contribuintes INVESTIDOS em salvar os bancos, enquanto os responsáveis pelas suas atividades criminosas nem sequer têm qualquer mandato judicial. 
Ai, que triste país este!



POLÍTICA DE VERDADE APLICADA AO IMOBILIÁRIO 

SERIA ISTO: 



Precisamos de uma verdadeira lei do imobiliário social. Uma lei que puna os que deixam ao abandono casas, prédios inteiros, terrenos urbanos. Eles pagam quase nada de IMI e vão continuar a pagar quase nada, de acordo com a proposta de lei em discussão. 
O que precisamos é de uma lei que diga: ou restauram e põem no mercado de renda ou venda, ou estes prédios abandonados são expropriados pela autarquia. 
Tínhamos uma data de obras com consequente reabsorção do desemprego operário! 
Pensem nisso!

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

APRESENTAÇÃO DOS «CADERNOS SELVAGENS» Nº3

SÁBADO 24 DE SETEMBRO PELAS 18.30. 

(HAVERÁ JANTAR VEGETARIANO A SEGUIR - PRECISA SE INSCREVER EM FABRICA.DE.ALTERNATIVAS@GMAIL.COM)



Apresentação dos Cadernos Selvagens nº3

Na sequência da apresentação do 1º Nº dos Cadernos Selvagens – A Grande Ilusão, de Manuel Banet Baptista, e do debate sobre o tema «Escola sem Muros», em que também participou o João Mendes, a Fábrica de Alternativas vai servir de palco para a apresentação do Nº 3 dos Cadernos Selvagens.

Nesta edição, há rubricas tão distintas como contos/crónicas, prosa poética ou reflexões, que, sem pretensiosismo, queremos partilhar convosco.

O Manuel Banet Baptista, a Naná Rebelo e o João Mendes, co-autores desta edição, lançam-vos este desafio de falar “à desgarrada” e podem sair conversas interessantes, em jeito de tertúlia. Pese embora o facto de que as tertúlias estão na moda, e nós por cá não gostamos muito de modas, faz sempre bem a partilha de ideias e dar vida ao ditado que diz «as conversas são como as cerejas».

Venham ouvir contos, venham trocar ideias, venham participar no fabrico de novas ideias.

Às 20 horas haverá jantar vegetariano. Reservas para o mail
fabrica.de.alternativas
até sexta-feira dia 23.







domingo, 18 de setembro de 2016

MANUELA CARMENA: "UM ERRO É TAMBÉM APRENDIZAGEM"


«Gosto muito de falar de que os sucessos nascem sempre de erros...Não existe nada que acerte logo à primeira no alvo; temos de nos habituar à ideia de que em política temos de trabalhar com o erro e o sucesso. No entanto, habituaram-nos a um discurso político que vê o erro como um fracasso. Não; um erro é uma aprendizagem, também na política.»

Manuela Carmena, presidente do Município de Madrid

A ENTREVISTA «VALE O SEU PESO DE OURO», APENAS RECOLHI ESTAS PALAVRAS OU «PEPITAS» DE SABEDORIA ACIMA PARA INCITAR O LEITOR A VÊ-LA E OUVI-LA NA ÍNTEGRA...

domingo, 11 de setembro de 2016

O IMBRÓGLIO APPLE - IRLANDA




Como é que a Apple acaba por ser taxada com uma astronómica soma devida por impostos atrasados e seus juros?

Simplesmente porque a Irlanda, desleal em relação a seus parceiros da EU, aceitou que a Apple fosse considerada como «não residente» para efeitos de impostos, mas mantendo-se como «residente» no que toca a recebimento dos lucros de todas as suas sucursais europeias. 
- Assim, a Apple, com a colaboração da Irlanda, teve de pagar  apenas 0.04%  (sim!) da exportação dos seus lucros, em vez de 12.5%! 

Mas, como de costume, a media corporativa, em vez de nos dar os factos, os duros factos, vem com manchetes sensacionalistas, para  nos vender essas pseudonotícias que apenas são a espuma dos dias, mas que têm como efeito pernicioso e desejado justamente… a ocultação dos FACTOS!

… Aprendi a realidade do enredo Apple-Irlanda ouvindo o excelente show do «Max Keiser report», na RT.


sexta-feira, 9 de setembro de 2016

ALEGRIA DE VIVER - piano e percussões com Yuja Wang e Martin Grubinger




Ritmo, verdadeiro ritmo, percussão criativa, fusão de músicas do mundo e tudo isso na perfeição! 


A POESIA ESTÁ NO OLHAR



Meu tio-avô, Édouard Honoré Gandon, pintou este quadrinho, talvez por volta dos anos 50, do século passado. Ele tem-me acompanhado, como que a lembrar-me, permanentemente, como são maravilhosas as coisas mais simples: 
- Repare-se nesta fruta, um tomate e uma maçã, um copo de vinho tinto e uma toalha branca parcialmente arredada... Tudo o que há de mais banal, porém, como não ficarmos maravilhados perante tanta arte? 
- É que ele nos diz - ontém, hoje e sempre - que as coisas mais simples são as mais belas... e que as coisas às quais não damos grande importância, as coisas familiares, banais, podem ser fonte de uma inesgotável soma de prazeres. 
- Afinal, o que diziam os epicuristas? Para Epicuro, pão, umas fatias de queijo de cabra e uns copos de vinho, eram a substância do melhor banquete. Nada mais do que isto como manjar do corpo.   Quanto ao espírito, a companhia de amigos com uma conversa animada e agradável, enquanto comemos... que mais queremos nós da vida? 


Não podia estar mais de acordo com Epicuro, tanto mais que a filosofia silenciosa dos quadros de Édouard Gandon me tinham preparado, desde pequeno, para o prazer das coisas mais simples, do nosso entorno mais banal. 
É pela educação do olhar que ocorre a interorização da noção de belo e portanto, da beleza que existe no nosso entorno imediato. 
A beleza está afinal NO OLHAR. Está DENTRO. Nós somos a beleza do mundo, porque - na verdade - é nosso olhar que lhe confere beleza. A beleza não reside nas coisas, nos objectos, mas antes na nossa visão. 
Haverá maior consolo? Se compreendemos isto profundamente, veremos como a nossa vida se vai transmutar, mas sem ruído, sem espalhafato. As coisas simplesmente estão, existem por si próprias. 
Tenhamos então a sabedoria de ser COMO AS COISAS QUE VEMOS.

Por volta de 1984, no volume  de poemas «Estórias de Estar e de Ser», refletia sobre uma FILOSOFIA POÉTICA DO OLHAR.
Abaixo, dois textos do referido volume:


COISAS

 Agora sei que nada me move.
... o que se me afigura passível de explicação:

             Primeiro, devemos dizer que de nada vale contemplar o voo das aves se a sua nomeação fizer com que esqueçamos este simples facto: os objectos, as coisas, são.
             Segundo, devemos considerar que o nosso olhar reflecte os contornos pela luz que recebe e quem diz luz, diz sombra.
             Terceiro, não precisamos de filosofar a evidência do nosso olhar porque sabemos que é subjectivo e – logo – fugaz.
             Quarto, de bem pouco nos custa cerrar os olhos do espírito ao que nos cerca, para que não restem dúvidas de que “só vemos o que queremos ver”.

Agora sei que as coisas se movem.

           ... O meu espírito está dentro da sua gruta e olha para o exterior:

 Se as ideias fossem anteriores às imagens, nunca saberíamos distinguir uma árvore, concreta, real, da ideia de árvore, abstracta, metafísica.

Se as imagens não fossem, por virtude do espírito, transponíveis em ideias, que cego poderia jamais aprender?

Se as coisas ficam quando me ausento de sua presença, então não posso dizer que não existem independentemente de mim próprio.


(Mas então... para que certeza caminho, se a dúvida se instala a par e passo do meu passeio através do mundo das coisas?)



  


ESTAR


Estar atento ao ouvido do vento.
Estar nas horas de se perder o tempo na memória do ser.
Estar por debaixo da pele ou estar em posição horizontal ... de qualquer forma, estar em si.
Entende mais o silêncio quem vence o medo de Estar.
Não colhe os frutos verdes quem está deitado sobre nuvens.
Quem colhe os frutos verdes em cima do soalho azul, pode vir em Novembro, Janeiro ou Abril ... mas estará sempre prestes a nascer.
Estar no berço de espuma, por cima do ruído, em troca de um poema.
Estar em configuração astral dos olhos pouco fixos.
Estar no entrecruzar do desejo, sem que suba da carne o relento sofredor.
Estar como maresia e como urze.
Estar em fiel dissonância com o resto do Capítulo Social.
Estar ouvindo as pancadas das artérias, ouvindo o fluxo do sopro, ouvindo o caminhar do cristal.
Estar no centro ou estar na periferia, em todo o lado por onde se caminha, estar centrado.
Estar para si, nos outros, estar nos outros para os outros.
Estar ausente, mas por amor do presente.
Estar na dádiva da flor ou do insecto.
Estar na estação de mover as mós do rio, de colher os frutos das árvores, de estancar a sede dos poços,
Estar a si mesmo
Estar a sua estanquidade
Estar o Ser.






  









quinta-feira, 8 de setembro de 2016

REFLEXÃO SOBRE UM QUARTO DE SÉCULO DE ALHEAMENTO E O FIM DA URSS


Faz, por estas alturas, 25 anos que ruiu o império soviético.

O seu ocaso estava já bem visível mais de uma década antes, quando visitei a Polónia pela primeira vez, em 79 e verifiquei a vivacidade do movimento clandestino Solidarnosc.
Testemunhei que se tratava de muito mais do que uma onda passageira devida à eleição do papa João Paulo II. 
Porém, quando regressei a Varsóvia no ano seguinte, em 80, fui surpreendido pela amplidão e profundidade da revolução pacífica, que começou com a greve nos estaleiros de Gdansk em 1980. Este acontecimento iria inaugurar uma era de mudanças.
Tal como a Primavera de Praga, de 68/69, esta abertura seria fechada brutalmente pelo golpe militar do interior do próprio regime, liderado pelo general Jaruzelski.
Porém, as circunstâncias eram outras, diferentes da Checoslováquia, que eu tinha visitado, onde a opressão do partido «comunista» era bem visível em 75, nas ruas engalanadas com enormes dísticos vermelhos e dourados em louvor da ditadura do proletariado, no medo dos cidadãos em falar com os turistas e da omnipresença da polícia, em uniforme ou à paisana, em todo o lado.  
O triunfo do Solidarnosc acabou por ocorrer, poucos anos depois do golpe autoritário de Jaruzelki. Era o evidente sinal do fim da hegemonia soviética sobre os países do Leste europeu.
A tragédia de Chernobyl foi o seu golpe de misericórdia: este acidente nuclear numa zona da Ucrânia que ficou completamente inabitável e contaminou vastas zonas da Europa do Norte e do Centro, não foi apenas uma tragédia humana e ecológica, mas também uma tragédia política para os dirigentes soviéticos. Com efeito, a impossibilidade de funcionamento do regime tornou-se patente, visto que na génese deste acidente houve uma série de incompetências «convenientemente» ocultadas.
O regime soviético estava exausto pela guerra do Afeganistão, o «Vietname» soviético. Estava a ficar para trás na corrida aos armamentos face a um bloco Ocidental mais dinâmico e capaz de maior investimento na investigação estratégica de ponta. Para cúmulo, observava impotente a erupção de revoltas nos seus vassalos dos países do Pacto de Varsóvia. Em breve, outros povos tomariam o exemplo da Polónia, como foi o caso da Roménia e, por fim, da Alemanha de Leste, com a queda do muro de Berlim, em 89.
Não creio que devamos chorar pela queda da nomenklatura da URSS e países satélites. Mas, nem por isso ficamos felizes pela ascensão ao poder de uma outra cleptocracia, a das privatizações e das suas máfias.
A grande mentira do «comunismo» ou «socialismo» tinha historicamente que acabar. Mas este engano monstruoso, esta deturpação vil de ideais, muito válidos em si mesmos, não podia ser explicado por quase toda a esquerda ocidental. Ela estava infelizmente habituada a «fechar os olhos» aos sinais inquietantes que vinham constantemente mostrar que o tal «socialismo real» embora muito «real» não tinha grande coisa de socialismo. A esquerda autoritária precisava de um modelo mítico para poder avançar com a sua propaganda. Eles contribuíram para enganar as pessoas simples, os operários e trabalhadores que eles diziam defender. Muitos, cinicamente, diziam que «as massas» precisavam de ver uma concretização dos tais ideais comunistas ou socialistas, naquilo que eles – quadros dos partidos comunistas do Ocidente - sabiam que nunca tinham sido regimes assim, realmente.
Os regimes que foram varridos do mapa político eram totalitarismos, fascismos vermelhos. Usavam uma linguagem socialista nos discursos, na propaganda, na ideologia; nos factos eram indistinguíveis dos regimes autoritários fascistas de que tínhamos sido reféns na Península Ibérica, até há bem pouco tempo.
A mentira de que existiu um qualquer socialismo ou comunismo nesses países do Leste Europeu e do espaço da ex-URSS continua, não apenas mantido por nostálgicos do bolchevismo, mas também pelos arautos do chamado neoliberalismo. A razão destes é simples de se compreender: querem um espantalho para prevenir as pessoas de terem simpatias por correntes socialistas ou comunistas verdadeiras.
Aqueles poucos intelectuais que fundamentam as suas visões em raízes socialistas libertárias praticamente nada influenciam o pensamento contemporâneo, pois este está tomado pela comunicação de massas, serventuária do grande capital, proprietário dos grandes jornais e cadeias de informação.
Paradoxalmente, a queda de um poderoso império veio afinal hipertrofiar as tendências autoritárias ou mesmo totalitárias da nossa época. Triunfaram as forças portadoras de «não-valores», da ausência total de valores. Refiro-me aos adeptos da «ideologia de mercado», um totalitarismo de novo figurino, embora muito antigo na sua essência.

Servem-nos «o mercado» a toda a hora mas, às vezes, polvilham o seu discurso com açúcar dos direitos humanos. Assim se contribui para a continuidade da exploração dos humanos e da Natureza.

terça-feira, 6 de setembro de 2016

CONTO: DOIS IRMÃOS MUITO DIFERENTES & poema *

Um conto delicioso pelo grande Prof. e Cientista
DOIS IRMÃOS MUITO DIFERENTES
Era uma vez um aprendiz de vidraceiro chamado Domingos. O seu trabalho de todos os dias, como voluntário, naquelas férias de verão, entre os 11º e 12º anos, era aprender a arte de cortar vidro para vidraças de janelas, quadros com gravuras e tudo o mais que precisasse daquela operação. Dos restos que iam ficando, tinha autorização para cortar pequenos rectângulos para molduras que ele próprio fazia, num jeito de brincadeira, para grande satisfação do patrão, que as vendia a bom preço.
A um canto da grande mesa de trabalho, muito plana e lisa, forrada a feltro, onde se esquadravam e cortavam as grandes chapas, além da régua e da fita métrica, estava sempre o riscador, uma espécie de caneta em latão, polida do uso, terminada numa ponta de diamante com que riscava o vidro, o que permitia o corte certeiro. 
Bem seguro, atrás da orelha, e numa imitação do mestre, o Domingos trazia agora, também ele, o lápis muito afiado, com que tomava nota das encomendas, fazia contas ou escrevinhava apontamentos próprios da sua aprendizagem. Só o tirava em casa, findo o trabalho, para voltar a pô-lo, na manhã seguinte, ao sair. Fazer o percurso a pé, de ida e volta, de lápis na orelha, era uma maneira de mostrar ao mundo que era alguém que já trabalhava.

Um belo dia, à hora de ir almoçar, fora do que era o seu costume, o rapaz deixou lápis sobre a mesa de trabalho, mesmo ao lado do riscador, e saiu, fechando a porta atrás de si. Foi no silêncio da oficina deserta, que a ponta de diamante, dirigindo-se ao bico do lápis, começou por dizer:
- Até que enfim que te tenho aqui ao pé. Há que tempos que te vejo lá de cima, da orelha do rapaz, sem poder falar contigo.
- É verdade. – Concordou a ponta do lápis. – Os objectos, como nós, só podem falar quando não há ninguém por perto. É por isso que as pessoas nem sonham que nós falamos uns com os outros.

Ao retomar a conversa, a ponta do riscador, com o seu ar de importância, apresentou-se.
- O meu nome é diamante. Nasci há muitos milhões de anos, lá bem no interior da Terra, a mais de 200 quilómetros de profundidade, onde a pressão é cerca de 60 000 vezes superior à que temos aqui à superfície, e a temperatura ultrapassa os 1600 ºC. Sou o mineral mais duro que se conhece, sou quase exclusivamente feito de carbono, o mesmo elemento do vulgaríssimo carvão. Praticamente, nada me destrói. Só o fogo, mas é preciso que a atmosfera seja bem rica em oxigénio e a temperatura atinja valores muito elevados, superiores a 800ºC. Tenho também o meu calcanhar de Aquiles, a que os estudiosos chamam clivagem perfeita.
- E o que é que isso quer dizer? Perguntou a ponta do lápis, curiosa.
- Quer dizer que em algumas direcções da minha rede cristalina, os átomos ligam-se por forças mais fracas, o que faz com que eu me parta facilmente segundo essas direcções. Portanto, se me derem uma pancada com a orientação correcta, lá me separo eu em dois bocados. Mas, tirando esta minha fragilidade, sou indestrutível. O meu nome, que vem do grego antigo, adamans, quer dizer isso mesmo. Sou incorruptível, como dizem os mais eruditos.

- É curioso que eu também sou um mineral mas não tão velho como tu. Sofro do mesmo mal e até bem mais do que tu. Se me baterem ou apertarem, desfaço-me toda. – Interrompeu a ponta do lápis. – Também sou quase exclusivamente feita de carbono, chamo-me grafite e não sou mesmo nada dura. Pelo contrário, sou quase tão macia como a manteiga, a ponto de ser usada como lubrificante. Também venho do interior da Terra, embora de muito menor profundidade. Dado o facto de eu ser assim tão escura, quase preta, e de a minha dureza ser muito baixa, desde há muito que me usam para escrever e desenhar sobre o papel. É por isso que me baptizaram de grafite, tendo por base a raiz grega, graph, que traduz a ideia de escrever. É essa tua fragilidade, a que chamas clivagem, que, em mim, é um dom que me torna importante. É, precisamente, por eu me separar tão facilmente por esses planos de fraqueza que me torno útil no desenho, pois vão ficando no papel esses meus minúsculos bocadinhos, registando o traço.
Nós, os da minha espécie, – retomou o diamante – somos, no geral, incolores. Mas há diamantes de quase todas as cores e, até, pretos - acrescentou. - Somos todos muito apreciados pelo excepcional brilho que temos. Tão especial que lhe foi dado o nome de adamantino. Temos também, depois de facetados e polidos, uma dispersão da luz e uma cintilação únicas entre os minerais! Ninguém nos fica indiferente! Eu, como não era assim muito branquinho nem muito transparente, não fui parar à bancada do lapidador, não tendo sido usado para fazer jóias. Mas, dada a minha grande dureza, viram-me utilidade na indústria, e aqui estou!
Seguro da sua importância, o diamante não parava de falar das qualidades que a mãe Natureza lhe dera.
- Duros, indestrutíveis e com este brilho, muito valorizado pela lapidação, há muito que somos tratados como pedras preciosas, ao lado das esmeraldas, das safiras e dos rubis. Temos grande procura como uma das gemas de maior cotação no mercado e lapidam-nos desde o século XIV.
- De facto – anuiu a grafite, – eu pertenço a uma espécie mais humilde mas muito trabalhadora. Não ando nas coroas e tiaras de reis e rainhas nem nos colares e anéis das estrelas de cinema, mas tenho muita utilidade em importantes indústrias, como são as do aço, dos refractários, dos lubrificantes, das baterias eléctricas e a dos lápis, claro. – Respirou fundo, como que a tomar folgo, e continuou. - Ficas agora a saber que as minas dos lápis de escrever são feitas com grafite. Do bico do lápis já saíram grandes obras de arte no desenho e na escrita. Olha, os desenhos originais de, Leonardo Da Vinci ou os de Picasso são tão valiosos que, em leilão, rivalizam com os melhores diamantes! A lápis, muitos arquitectos como Vitúrbio, Le Corbousier, Oscar Nimeyer ou o português Eugénio dos Santos, esboçaram projectos de grandes obras que fizeram história. Olha, - disse por fim – ficas também a saber que ainda hoje na América, os alunos, nas escolas, e os adultos, no seu trabalho, preferem o lápis à caneta.
- Alto aí! – Interpôs a ponta do riscador. - É verdade que alimentamos a vaidade dos poderosos e ricaços, mas também é certo que evitamos a fome em países como a Namíbia e o Botswana. É verdade que temos sido causa de guerras, roubos e grandes crimes contra inocentes, mas nem te passa pela cabeça a importância dos diamantes na indústria, em especial, na de equipamentos de corte e perfuração e de abrasivos. Não há nada, desde o aço à pedra mais dura, que nós não consigamos cortar, perfurar ou desgastar. São as serras diamantadas, as cabeças das sondas que procuram as águas subterrâneas ou o petróleo, são as lixas especiais e muitas outras moderníssimas aplicações.
Entusiasmado com esta também sua utilidade entendeu acrescentar:
- A nossa importância é tal neste sector da sociedade moderna, que a extracção de diamantes naturais não chega para as necessidades do consumo. Há, pois, que produzi-los industrialmente, o que já se faz desde meados do século passado. Até te digo mais. Hoje em dia, a produção de diamantes artificiais ou sintéticos ultrapassa, de longe, a sua exploração na natureza. E já somos produzidos para outros fins, tirando partido de outras propriedades que temos. O nosso muito baixo coeficiente de expansão térmica e elevadíssima condutividade térmica faz-nos ideais como dissipadores de calor em sistemas computorizados de alta performance; se formos tratados com boro, tornamo-nos semicondutores e isso coloca-nos numa posição privilegiada para os novos chips informáticos. E mais: já nos fazem em placas transparentes com alguns milímetros de espessura que são ideais para janelas em diversas indústrias, desde a aeroespacial à investigação de ponta em física.
- Também nós! – Contrapôs a ponta do lápis. – É muito mais a grafite produzida artificialmente do que a que se extrai como minério por esse mundo fora.
- Deixa-me dizer-te mais uma coisa. – Interrompeu a ponta de diamante. – Há uns anos a esta parte já se fazem diamantes sintéticos em muitas cores e com tamanho e qualidade suficientes para serem usados em joalharia.
- Mas eu - atalhou a grafite - não te esqueças nunca disso, eu tenho tudo o que é preciso para me transformar em diamante, mas não estou nada interessada nisso. Posso, perfeitamente, ser a fonte do carbono utilizada na síntese do diamante, a altas pressões e altas temperaturas, e só de pensar nisso fico com arrepios! Mas o que é facto é que, se quiser, saio de lá como se fosse tua irmã gémea.
- Bem vistas as coisas, – disse o diamante, - nós pertencemos à mesma família.
- Para já, temos a mesma composição química. Ambos somos feitos de carbono. – Anuiu a grafite que continuou, explicando. - As grandes diferenças entre nós só têm a ver com a profundidade a que fomos gerados. Eu sei isto – continuou – porque um dia, o Domingos me deixou em cima da mesa onde costuma estudar, ao lado de um livro de Geologia, aberto precisamente na página onde se falava de nós. É apenas a forma e a energia com que se ligam os átomos de carbonos que nos distingue.
- Eu também sei – interrompeu o diamante, não querendo ficar atrás desta sua parente tão chegada. – Lá na mina, na província do Cabo, perto de Kimberley, na África do Sul, onde me apanharam, havia um engenheiro que gostava de explicar tudo isso a quem quer que estivesse por perto. Foi aí que aprendi que, antes de ser diamante, fui, talvez, um simples carvão fóssil que, em conjunto com outras rochas da crosta terrestre, fui arrastado para níveis muito profundos de uma zona do interior da Terra a que se dá o nome de manto. Foi aí que fiquei transformado naquilo que sou. Estava eu muito sossegado, anichado numa rocha chamada eclogito, quando, passados mais alguns milhões de anos, lá vim eu cá para cima numa viagem super-rápida. Percebi, então, que estava a ser arrastado pela lava que ia brotar num vulcão. Nem tive tempo para me adaptar ao novo clima. Acostumado àquele forno imenso e sob grande pressão, vejo-me, agora à temperatura e à pressão normais â superfície da Terra. Depois de tanta aventura, eu bem gostava de ter sido lapidado e colocado num anel de noivado, ao lado de uma pérola, - desabafou, num doce suspiro - mas quando dei por mim ia num grande vapor, a caminho da Irlanda, de onde parti para França, o país da fábrica onde fui cravado nesta espécie de caneta de metal amarelo, tão polidinha, do uso, que mais parece feita de ouro.
- Pois olha, - retorquiu a grafite. - A minha história não é muito distinta dessa. A única diferença foi eu não ter sido arrastada lá para tão fundo, como tu foste. Não cheguei a descer abaixo da crosta, tão fundo como tu desceste e é só por isso que não sou um diamante. Mas insisto em afirmar que tenho muito orgulho naquilo que sou e faço.
Nesta fase do diálogo ente as duas pontas de carbono, abriu-se a porta da oficina. Apanhadas de surpresa, calaram-se imediatamente como se a conversa tivesse cristalizado ali. O Domingos dirigiu-se à grande mesa e os seus olhos brilharam, satisfeitos, ao ver o lápis que julgara ter perdido. Pegou nele e, num gesto automático, colocou-o atrás da orelha.








DE SACRAMENTO A PORTOMELOS*

A carapaça cantante
Jorrando salinas de recifes
Engalanados como meliantes
Pirogas de Sacramento
Contando os cabelos das Ondinas
No fluxo da maré...
Jaspe, âmbar, grafite,
Carvão, diamante ...
A vulcânica guarida
Furor do meu pendão
Na esfíngica apelação
De Portomelos
Melodia de profunda dor mesclada.

[* Escrito dos anos 80 e incluído em «Um Corpo Merece Sempre Viver» de Manuel Banet]

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