LADRÕES DE COFRES

LADRÕES DE COFRES: O saque dos bens dos bancos centrais é especialidade dos «civilizados» EUA, quando ocupam um país. Fizeram isso no Afeganistão em 2001, no Iraque 2003, na Líbia em 2011. Na Ucrânia, dias após o golpe de Maidan (2014), puseram «a salvo» as reservas de ouro de Kiev, algures num cofre-forte dos EUA. Os britânicos também confiscaram há alguns anos, o ouro do Banco Central da Venezuela, depositado na LBMA sob o pretexto falacioso de que Guaido (e não Maduro) seria agora o legítimo presidente da Venezuela!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2025

APOSTILAS / POESIA

 Uma apostila é um pequeno texto acrescentado a uma obra. Decidi chamar assim os textos que submeto ao vosso olhar, pois eles se enquadram dentro do espírito de várias produções minhas anteriores sem, no entanto, possuírem unidade autónoma. 

São textos em prosa ou em verso, que me apeteceu escrever em vários momentos. São também comentários para mim próprio. Cada um deles sinaliza meu estado de espírito ao longo do ano de 2025. 

Esta pequena recolha deve, portanto, ficar como «Apostila» das anteriores OPUS I, II e III que agrupam a minha produção poética no Blog «Manuel Banet, Ele Próprio» de 2016, até final de 2024. Outras recolhas de poesia inéditas anteriores ao ano de 2016 ficam por divulgar, à espera que algum editor se interesse por elas. 


PERANTE OS TEMPOS DE ESTUPIDEZ

 

 Em vez de prefácio


 Desesperadamente procuro o sentido; não procuro por pensar que o irei encontrar, mas por impulso irracional,  no que existe de humano, no âmago do meu ser.

Não sei se isto é defeito ou virtude, sinceramente. Mas, de facto, talvez seja defeito, pois sofro e nada ganho, nem meu sofrimento a outros aproveita.

Gostava de ser como a árvore ou como o rio que se estende sem perguntar para onde corre, sem se importar com as pedras nas margens.

Mas não sou árvore, nem rio, nem pedra.  Gostava de ser animal e sentir. E meu saber ser instinto, e minha vida ser instantes sucessivos.

Mas também não sou o animal, simples produto da Natureza, nela imerso e dela participante. Sou homem, por isso sofro, pois vejo a degradação da espécie e o sofrimento de muitos, sob a opressão sádica e violenta de alguns.

Mas como posso fazer face a esta monstruosidade? - Deus não tem plano nenhum para a nossa espécie, nem para todas as outras. Esta é a conclusão a que cheguei, por agora.

Confortável ou não, esta conclusão parece-me o princípio de racionalidade neste tempo de violência, de desprezo pelas leis dos homens e da Natureza, do triunfo da morte, a par da estupidez e da vaidade...



FORTUNA


Poderia pôr a teus pés, Deusa gloriosa,

Cestas de fruta e flores odoríferas

Das mais exóticas espécies

Que seja possível alcançar.


E poderia declamar a teu ouvido

Versos em rimas obscuras, ofegantes

Sem outra lógica que a do sonhar


Mas tudo em vão seria, Fortuna

Tens ouvidos e cabeça de bronze

Teu gesto amplo ficou para sempre

Parado, na suspensa promessa...


Para lá da Tua casa, velejo em mar

Denso e fluido, no ocaso demente

Enfunando as velas em tributo

À sombra que traça o Sol.

Fortuna seja nome de barco

Destino humano sempre igual.



O MUNDO


O mundo está fora de mim, no sentido trivial

Mas também se pode dizer que ele penetra

Em todos os poros da minha pele,

Pelo ar que respiro, pela comida que ingiro

Pela água e pelo vinho,

Pelas letras, os sons e os cheiros

Ele penetra por todos os canais

Dos sentidos.

Eu não recuso este fluxo constante

De sensações. 


Porém, ficar cativo,

É outra coisa; estar cativo das coisas materiais

Ou até das ideias, das que se originam 

Nas agitações fúteis, sempre procurando

O novo; como se, perante a novidade,

Devêssemos baixar a cabeça, curvar a espinha!


Se quiseres argumentar que eu «estou fora do mundo»

Tens razão, num certo sentido:

No sentido antigo e caído em desuso

da palavra «mundo»... 

Como «mundano» ou «mundanidade»...


Se não sou deste mundo, estou contente

Estou mais aconchegado no mundo 

Da infância, das recordações

Dos momentos felizes, da pesquisa

Científica e intelectual,

Do prazer de conversar com iguais...


Sim, não é com naturalidade, nem com desembaraço

Que «falo» através de telefones móveis, ou de teclados

Digitando palavras, como agora...


Sou realmente antiquado e não tenho complexos! 

Sou capaz de compreender os mais jovens,

Mas duvido que a recíproca seja verdadeira.


Estou fora do mundo e ele está fora de mim.

Sim, do mundo fútil, coisificado e destruidor

Do que há de mais humano na humanidade,

Estou fora!


Por muito que vos custe, pensai de outro modo;

Já será um princípio de emancipação. 

Não pretendo que pensem como eu; 

Mas pensem!

Com alma, espírito e todo o ser, 

Libertos da prisão doirada da tecnologia

Que ambiciona encerrar nossas mentes.

 



Às Palavras Renunciei



 Gostava de construir novas palavras,

Delas fazer um vocabulário

Só meu, para meus leitores

Que pudesse partilhar

Como num dicionário

Mas sem o estafado sentido


Só me acodem palavras gastas

Daquelas que são ecoadas 

Em inúmeras canções

De amor ou desesperança

Lançadas ao desbarato

Enfim, palavras chãs


Se ao menos pudesse 

Com elas construir

Algo novo, inaudito

Seria o triunfo do som

Sobre a gramática fria

A síntese genial


Então, como bandeira

Envolveria teu corpo

De cores, sons e sentidos

Na imperfeita obra

Que o poema desvela

E  toda a nudez revela


Pois renunciei  ser

O mago dos versos

A Lua não me aquece

Prefiro o forte abraço

Do vento oceânico

No meu corpo tenso


Colhi todos os perfumes,

Cores e sabores da vida 

Como jardim de mistérios

Serei mais qu' uma ave

Improvisando seu canto

Em harmonia perfeita?


Somos frutos tardios

De jardins tranquilos

Nem mais, nem menos

Nenhuma pretensão

Tivemos de profetizar

A luz que se esvai


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Murtal, 05 de Junho 2025



GUERRAS SEM FIM


 Gostava de voar para um país distante, 

Muito mais distante, que a tecnologia atual

Nos pode transportar. Aí, pisaria o solo

e abraçaria as gentes; mas não teria ilusões:

Este país seria como os outros, apenas

Poupado aos horrores deste século moderno.


Não será algo assim que muitos de nós procuramos

Atingir? - O paraíso terreal ou refúgio

Contra a fealdade, a cobardia e crueldade

Dos nossos contemporâneos?


Estamos à procura do que não existe,

De uma utopia no sentido estricto

Não estamos porém errados, na essência:

É o nosso coração humano que nos diz


Outros procuram aconchego dentro da tribo

Dentro da família, do grupo a que pertencem

Não os critico pelo desejo de auto-preservação

Embora seja irrisório, neste Mundo em guerra


A guerra não poupa as simples gentes

Fustiga todos, todos nós somos sem-abrigo

Só os sanguinários poderosos têm meios;

Eles sabem-no e usam-se disso! 

 



O Barco Encalhado


Navegando ao longo de costa rochosa, avistei um dia os escombros dum barco encalhado.

Perguntei ao piloto do meu navio se tivera notícia dalgum naufrágio, nos tempos mais recentes.

Ao que ele me respondeu: "Não, Senhor. Este deve ter encalhado há bastante tempo."

O casco de madeira apodrecida, negra, era colonizado por lapas e mexilhões; carangejos pequenos corriam à superfície.

A carcaça em decomposição ainda exibia, no centro, um fragmento de mastro; como um braço erguido para o céu .

A vida borbulhava nos seus destroços, como num cadáver de cetáceo morto que dera à costa.

Este, lentamente, é descarnado pelas brigadas de criaturas oceânicas até nada mais restar senão o esqueleto.

A visão daquele esquife imóvel no meio de rochedos bravios, lentamente devorado pelo exército voraz dos mares...

Fez-me pensar...

A cena apareceu-me como perfeita analogia das construções intelectuais que navegam na sociedade, como navios nos oceanos.

As construções defeituosas não vogam até muito longe. As correntes arrastam-nas, metem água e acabam por naufragar!

Depois, seus destroços presos nos rochedos, sob as furiosas vagas, ficam desconjuntados, irreconhecíveis.

Por fim, o que resta do navio, desfaz-se; só alguns pedaços a boiar, ou nem isso. O que sobra, vai para as profundezas.

Ninguém advinha que ali se ergueu um orgulhoso navio. Da praia ao horizonte, o mar permanece tão vazio como no começo do Mundo.



 «A GRANDE ILUSÃO» - PARTE II


Há cerca de 12 anos, escrevi um extenso ensaio intitulado «A Grande Ilusão». Este, está inserido neste blog, embora o seu aparecimento seja anterior à existência do blog. 

Mas, o que me importa mais agora é escrever uma espécie de apêndice ou postfácio, enfatizando aspectos da Grande Ilusão que não eram visíveis, na altura, pelo menos de forma representativa. Quero referir-me à persistente ilusão dos homens dominarem a Natureza, de serem eles a ditarem as regras, a imporem as leis e julgarem que estão no cerne do funcionamento dessa mesma Natureza. 

E digo que isto cabe perfeitamente sob o mesmo título, pois é uma tendência generalizada e os mais inteligentes caem na armadilha com maior facilidade ainda, que os estúpidos e os ignorantes.

Por isso mesmo, se verifica um tipo especial de estupidez, «a estupidez dos inteligentes», em que a sofisticação do raciocínio, a riqueza da argumentação, a erudição medida pelas numerosas referências, tudo isso junto, produz um resultado prático irrisório, ou manifestamente inoperante: Traduz-se numa incapacidade patológica de apreensão do real.

Porém, é essa mesma estupidez dos inteligentes, que tem maiores hipóteses de fazer carreira, de ter sucesso, numa sociedade plena de ilusões, incapaz de distinguir a realidade, da projecção da mente, sem qualquer outro critério de «verdade», que não seja essa filosófica nulidade chamada estatística.

A verdade não é nem pode ser uma questão estatística. Se todos errarem menos um, é este que tem razão, não importa quantos disserem que é esse indivíduo que está enganado. Em filosofia, o número não faz a prova e, sobretudo, não faz a razão. Verdades tão evidentes como esta, temos com frequência de voltar a enunciá-las, a reafirmá-las no nosso espírito, para mantermos a calma e a força da razão no meio do desvario. 

A ilusão mais perniciosa - ao fim e ao cabo - talvez seja a de quem se «colocar no lugar de Deus». Este facto mantém-se válido quer acredites em Deus, quer não: É completamente independente da nossa posição em relação à existência da Divindade Cósmica, pois postula a impossibilidade ab initio da posição peculiar dos indivíduos que pensam tudo saber, capazes de tudo equacionar, de terem solução para tudo e - se lhes for fornecido o que exigem - serem capazes de tudo fazer. Estamos aqui perante um delírio agudo ou crónico de inflação do ego, uma extrema confusão entre o limitado e falível, efémero e fraco, ser humano e aquilo que ele consegue se aperceber do Universo, na sua limitadíssima visão do mesmo. 

Mas, são esses indivíduos, inflados no seu narcisismo, que têm a maior probabilidade de arrastar as massas, as quais estão sempre em adoração do que elas consideram ser um «génio». As massas idólatras de super-homens e super-mulheres de pacotilha, são capazes de fazer as maiores loucuras, acreditar nos maiores absurdos, sendo estas crenças tanto mais fanaticamente defendidas, quanto mais absurdas forem.

Num mundo assim, é muito difícil ser-se racional, um pouco céptico e comedido. Num mundo assim, o sábio é frequentemente assimilado ao louco, ou ainda pior, ao dissidente. O seu destino não é invejável, pois vai do «gulag» para uns, até à fogueira, para outros. E porquê tanto ódio contra pessoas que pensam diferentemente da maioria? - Será que a grande maioria pensa, ou apenas repete slogans, lugares-comuns erigidos em grandes visões e todas as parafrenálias das ideologias? Se a maioria fosse composta por pessoas que pensam, elas não teriam problemas com os que têm um pensamento outro, dissidente. As suas capacidades cognitivas até ficariam estimuladas perante um pensamento dissidente e nunca lhes passaria pela cabeça «contrariar» uma teoria com uma sentença de morte ou de prisão, ou um linchamento.

Os ditadores e demagogos de todas as espécies e variedades, sabem perfeitamente que uma maioria da espécie humana não pensa. Sabem que não é difícil enfiar-lhes na cabeça uma série de automatismos mentais, como aliás a «educação» se esmera a fazer, em todas as nações, de todos os continentes. 

Com as técnicas de condicionamento da psique, podem ver a massa das gentes, (no sentido próprio, por vezes...) executar os que se atrevem a não acatar, os que não se submetem à «verdade» da multidão furiosa. 

Estes comportamentos surgem, não espontaneamente, mas por condicionamento, aberto ou disfarçado, em muitas sociedades. Muitos fanatismos são completamente «reversíveis», no sentido em que se pode mudar-lhe etiquetas, sinais, protagonistas, mas continuam a ser reflexos pavlovianos. Trata-se, porém, de um ser humano na aparência, mas que o medo, o desejo de pertença, a imaturidade, fez submeter-se ao que lhe aponta um chefe.

engodo da «IA», tem servido para fazer passar as mais extremadas posições e manipulação dos factos e isto, ao bel prazer dos multimilionários que possuem as empresas de «IA». Nada deste extremismo induzido surge ao olhar do público como insano, como totalmente repelente, etc. porque foi emitido (supostamente) por um algorítmo «IA» o qual teria a virtude de «pensar mais e melhor» que a mente humana. 

Junta-se a ignorância do que sejam estas máquinas informáticas e os algorítmos, com o complexo de inferioridade frente àquilo que não se compreende, que se julga demasiado complexo. 

O resultado é uma regressão, não apenas à infância, como ao «estado larvar»: Os indivíduos estão dentro de casulos, são alimentados e mantidos, consumindo o que os mantém em vida, mas uma vida do tipo zombie...

Assim, a redução do número de efetivos nas diversas populações pode prosseguir (com vários métodos), até ao limite que os Senhores desejarem. O limite para a redução dos efetivos, é que deverá haver um número suficiente de escravos para manutenção do mundo de conforto dos Senhores. 

Quanto aos escravos, em breve, nem terão a capacidade de reprodução. Esta deixará de estar dependente de um «ato animal»; será um complexo de operações de tecnologia biológica. Logicamente, as pessoas «vulgares» (a plebe, os escravos), serão produzidas em série, por clonagem. Assim, por uma técnica muito simples, produzem-se «seres sem defeitos». Estes terão sua recompensa num pouco de comida, um mísero abrigo e serão «processados» e substituídos quando sua produtividade baixar.

Se olharmos retrospectivamente, compreendemos que muitos fenómenos sociais, muitas situações «aberrantes» até, já se podiam delinear, pois despontavam nas sociedades onde ocorreram, mas as pessoas contemporâneas desses fenómenos não deram por nada, aparentemente. Embora, de facto, haja sempre algumas pessoas que não se deixam iludir e tentam dar o alerta, este nunca é tomado a sério ou pior, é considerado subversivo, vindo dos inimigos da sociedade. 

É falso pensarmos que não existe mais religião, baseados na premissa errada de que as pessoas abandonaram os respectivos templos. Há uma religião e está mais viva do que nunca, embora as pessoas não consigam identificá-la como tal. Por um lado, é transversal às diversas religiões, tradicionalmente prevalecentes. Por outro, ela flui pelos interstícios da sociedade, confundindo-se com as atividades mais triviais e indispensáveis no dia-a-dia. Não é religião que erga templos explícitos para culto dos fiéis. No entanto, o seu culto é muito divulgado e tem um número de fiéis certamente maioritário, em relação a todas as outras. Falo da religião do dinheiro.

No passado, ela existia também, diga-se: mas era temperada por outras coisas, como seja uma moral (religiosa, ou com raízes religiosas), que prescrevia o que se devia fazer ou não fazer, além de toda uma moldura de valores, de virtudes, às quais os devotos deveriam se conformar. Ou, pelo menos, na aparência. 

Agora, o fator mais importante de ascenção social é o dinheiro. Não importa como foi obtido, nem como é gasto... É a sua acumulação que provoca «respeito religioso», da parte da multidão. Assim, ser rico - muito rico, na verdade - tornou-se virtude. Claro que as pessoas sempre admiraram e cobiçaram os ricos, no passado. Porém, a passagem do dinheiro a culto religioso, fez dos detentores do capital, simultâneamente, sacerdotes, magos, semi-deuses...  

Bem podemos dizer e demonstrar que por este andar, a Terra fica esgotada, que os equilíbrios estão rompidos, que a diversidade biológica se vai reduzindo perigosamente, que  ecossistemas estão a entrar em ruptura, que o esgotamento dos recursos ou sua contaminação vão tornar muito difícil a vida das gerações vindouras. Não, as pessoas estão viradas exclusivamente para «ganharem mais», para consumir agora, aquilo que antes estava acima de suas posses, e só conseguem equacionar a felicidade ou o sucesso dentro de sua comunidade, com seu enriquecimento. 

Não procurei ser futurólogo no texto inicial de «A Grande Ilusão». Aqui, nesta segunda parte, atrevi-me a descrever tendências, que já se podem ver despontar no presente e têm já uma repercussão, mas que não se tornaram ainda, lugares-comuns.  

 



CARTILHA ELEITORAL


Querem que tu decidas sobre as coisas da tua vidinha. Quanto a assuntos complexos, envolvendo os destinos da nação, do mundo, da civilização, podes opinar, dizer os teus disparates, dá-te uns ares de bem informado, de alguém com 'ideias'... Mas, não vai influir em nada no decurso dos acontecimentos.
Podes também votar em quem entenderes, sem problema. O teu voto será contabilizado religosamente.
As eleições serão correctas, tecnicamente falando. Mas não genuínas, pois nos põem numa posição de dar o voto em total ignorância do que os eleitos farão.
É pior do que dar um cheque em branco, pois as pessoas convencem-se que estão - de algum modo - envolvidas nas políticas que resultam dessa eleição. Mas isso é falso. E faz com que muitos teimem que «a democracia» é aquilo que existe nos nossos países.

As verdadeiras regras da sociedade são as não-escritas, mas que tens de saber. Quanto às escritas, ninguém as sabe exactemente. São feitas para os juristas destrinçarem; eles e somente eles, decidem sobre o sentido preciso da legislação.
Dizem: Não te preocupes com nada, não vale a pena e não te serve de nada... Quem nos diz isto são os Senhores, apoiados por um cortejo quase unânime de seguidores.
O desencorajar da tua participação começou muito cedo, acompanhado com declarações solenes do contrário. Como se a tua participação fosse a atitude mais desejada pelos políticos. A hipocrisia está no poder!
Nisso, eles mostram talento: Montam o circo eleitoral e consegem convencer-te que és tu o soberano. A ilusão é bonita; dá-te esperança, aquele ingrediente que nos ajuda a aturar o quotidiano.
Se queres tomar a vida em tuas próprias mãos, não delegues nos outros o que tens de fazer. Se não tiveres as condições para o fazer, cria essas condições, em conjunto com os outros: A família, os amigos, os colegas...
Não caias em ilusões:
O voto não te dá poder; mas, tira-te o poder. É assim que os sistemas políticos estão organizados. Deves ser adulto e ver as coisas tal como são, na realidade. A polarização da atenção em torno de figuras-líderes, é um meio subtil de nos fazer esquecer que nós somos tão capazes como os políticos, de definir o que desejamos para o nosso futuro.
Pois o futuro está inteiramente nas nossas mãos. Delegar isso nos outros, é perder o sonho...





O GRAU ZERO


É que chegámos mesmo ao grau zero;
o grau zero absoluto:
Não da Física; esta tem limites 
mas, nas Ciências Sociais e Humanas.
O grau zero da reflexão política,
da filosofia, da sociologia e de tudo
o que implica esforço, trabalho
interior, aprofundamento do que
havia antes da nossa ínfima existência.
Mas, isso é demasiado esperar
dos espertos que por aí abundam:
Conhecimento do passado? - Sim, 
vão buscar citações, fica bem, 
mostra «cultura»...

A ética, a coisa mais declamada 
e mais negada. Seria caso de dizer,
estamos na nulidade transcendente
do zero à potência zero, ou ao infinito.
A arrogância e o cinismo vão de par.
Acompanham ou adiantam-se
às nulidades que se passeiam, 
e, cientes da sua importância,
vão polindo, solenes, os cadeirais 
académicos...

Hoje em dia, são inúmeras as instâncias 
de nulificação no plano intelectual
mas, também nas coisas materiais.
A qualidade do que é feito
é só aparente; se queres qualidade,
terás que procurar objetos da era
industrial; não os frívolos dejectos
desta enganosa «pós-modernidade».

Serei reaccionário? - Sim, porque reajo! 
À estupidez eregida em saber
À fraude de vender falsas jóias
À mentira como maior virtude!
Tudo isto mereceria um simples
encolher de ombros, se...
fosse apenas o trági-cómico
folclore duma pseudo elite. 
Ela vai-se babando e cacarejando
medíocre, boçal e obscena
a conspurcar o quotidiano

Disse e redigo: A melhor resposta
perante a estupidez cósmica
é de erguer uma muralha
real contra a fealdade
não apenas exterior, mas do espírito
Senão, acabamos afogados,
entascados no lodaçal imundo
de vaidades e canalhices
onde prosperam exemplares
típicos da pseudo-civilização.





MAIS UM DEVANEIO



Como vivem as pessoas
São iguais a ti e a mim
Mas elas parecem movidas
Por estranhos impulsos

Movia-me num sonho
Daqueles em que a pessoa
Vive como na realidade
Onde tudo acontece

Eu falava com as pessoas
E elas respondiam-me
Naturalmente, sem mistério
O sonho, denso, parecia real

Tudo se movia no quotidiano
Nem estranho, nem encantado,
Somente a banalíssima
Vida que todos nós tecemos

Porém, algo, não sei bem o quê,
Apoderou-se do meu espírito,
Quis rasgar o véu ilusório
Daquela realidade fictícia

Ao abrir uma porta, recebi
O fôlego poderoso do espaço
E do tempo, das cores e dos sons
Dos movimentos das ondas

... Das falas entrecruzadas
Num mercado ao ar livre
Do brouhaha indistinto num café,
Do caminhar da sombra...

Senti então um imenso desgosto
Como se tivesse abandonado
O verdadeiro mundo
Como se ele não fosse sonhado

Durante algum tempo senti
Nostalgia dos meus devaneios
Mas, por fim fiquei em paz
Com o mundo e o meu ser:

Tudo o que existe é sonho
Sonhado. Podemos dele sair
Para logo entrar noutro.
A realidade é um efeito

Ela tem o poder da ilusão
Tudo o que se vê acordado
É uma representação
Nada mais, um teatro


Se nos conformamos
Com o nosso papel,
Seremos bons atores
Na peça chamada Universo



UM HOMEM


Nem alto, nem baixo

Nem Adonis, nem Herói 

Mediano em tudo, vulgar

Esse homem que desprezais

Foi quem arriscou a vida

Para salvar muitas outras

Num ato sem dramatismo

Fez o que era preciso 

Não se vangloriou,

Nem tentou aproveitar-se.

- Quantos, homens e mulheres

Cumpriram seu destino

Sabendo o que os esperava?



SE EU PUDESSE VOAR


Se eu pudesse voar, levantava voo

De cada vez que troassem os céus;

Que reflexos metálicos, meus olhos

Subitamente captassem.

Não deixaria nem pluma

Nos pavimentos de sangue

Mental escorrendo dos carrascos.

Nem hesitaria procurar

Abrigo nas sombras do arvoredo

Certo de que a sombra é aliada

Quando o Sol ilumina

Infâmias, traições e cobardias




Se eu pudesse voar

Estaria numa ilha deserta

Junto dos meus semelhantes.

Com eles, mesmo doutras espécies,

Faria como que uma sociedade,

Mas nunca poderia integrar

As tropas de rapinadores

Só procurando destruição

Só interessados em sangue




Se eu pudesse voar

Não iria nunca descer

Aos antros das hienas

Em que se rasgam as carnes

Pelo prazer da destruição.

Ficaria junto de minhas gentes

Aladas, sobrevoando cidades

Campos, colinas e rios

...

Ah, se eu pudesse voar!





O REMANESCENTE SÃO PALAVRAS


Deixa a ridícula miragem

De sermos perpétuos, eternos

Não desprezes um suspiro

Um olhar, ou gesto inacabado


Sermos aquilo que somos

Parece o mais difícil, afinal:

Neste mundo, enganados somos

Pelos espelhos da nossa vaidade


Afinal, a felicidade está no instante,

No efémero, no real ao nosso alcance;

Nesta curvatura do espaço-tempo

Onde cegos e surdos caminhamos


Mas ouvir os sons naturais,

Apreciar uma paisagem intacta

Sem «monumentos» que plantaram

Os humanos na sua ébria vaidade


Colher tais impressões não cansa:

Levo-as para casa, nelas renovo

A misteriosa e potente força

Que a Vida nos oferece



Fecho os olhos e vejo a realidade

Transmutada em sonho único

Que nenhum artifício captaria

Porque o sonho é meu guia


 



SABEREI...?



Saberei eu... sorrir?

Quando, vestidos de branco

Partilharmos instantes

Poucos, dum último olhar


Saberemos nós guardar

Intimidade num hospital

Indústria de morte asseptizada

Que nos vê como corpos?


Saberei eu ... no momento

Da separação, que seja

Realmente a nova etapa

De nosso amor?


Amor, que seja eu

O primeiro a partir.

Deixa-me adormecer

Sob teu carinhoso olhar


Não consigo viver sem ti

Não por ter necessidades

De qualquer espécie

No vazio da tua ausência


Mas, não saberei

Viver sem ti

Tão simples como isso;

Sem ti, nada faz sentido


Eu não temo a morte,

Mas tua ausência

Porque, agora sei,

És meu fluído vital


Deixa-me crer que a morte

Seja, afinal, a transição.

Pois, Amor, se assim for

Não terei queixumes


Não precisarei de nada

Sabendo que nos veremos

De novo noutra dimensão

As almas emparelhadas



PROSA POÉTICA




1-Novembro


... Quando as folhas caídas do Outono , sussurantes aos nossos passos, formam um tapete castanho-dourado, cobrindo a terra dum manto protetor das geadas invernais. 
É este o mês do negrume e melancolia que me invadem, sem que eu possa evitá-lo. 
Meu espírito, em consonância com o Cosmos, retira-se para dentro do seu envólucro corpóreo. O espírito também se recolhe ao abrigo da casa, perto da lareira.

Novembro chega-me com pensamentos que eu gostaria de domar, mas são eles que me invadem, me dominam e me sufocam.
 Saberei algum dia fazer com os sentimentos o trabalho do alquimista? Quanto mais se possui de chumbo no cérebro, mais se desejam asas de andorinha!

Na contemplação da Natureza concentro todo o meu ser. Minhas fibras - como arcos tensos - projetam-me para fora, para a realidade do mundo. 
Posso olhar, sereno, o mar revolto. Sei que é uma justa metáfora da vida: As ondas te empurram, queiras ou não, no esquife do teu ser; tens de tragar muita água salgada durante o percurso caótico; acabas por ser lançado à praia da vida, a Vida nunca antes vivida, nem sonhada.




2- Atmosfera


Choveu e o ar ficou mais leve! Mais fresco! As nuvens caprichosas desfilam sobre o telhado, a prometer mais chuva. Todas as plantas do jardim se regozijam da abundância e espairecem as folhas sob um tímido raio de sol.

Aprecio este céu mutável, ora trazendo chuva, ora apenas sua promessa não cumprida. As paisagens animam-se em dias assim; não apenas a cor do céu se veste de inúmeros tons de cinzento, também a luz, que ilumina o casario e os campos, faz sobressair as suas verdadeiras tonalidades.

Quando o sol de Verão nos ilumina com seus implacáveis raios, tudo ele desvenda, mas nos satura, também. As cores reverberam; não nos cegam, mas recortam brutalmente a paisagem, em luz e sombra. Agora, na estação das chuvas, o próprio ar vibra com as moléculas de água que se agitam, os pingos irisados que refletem e a névoa que recobre de seus farrapos montes e vales.

A superfície do solo também fica com cores mais variadas, já não o cinzento-amarelo do pó no Verão; Agora, destacam-se as cores: Os castanhos profundos, os verdes translúcidos, os salpicos de amarelo e os reflexos multicolores das poças, refletindo o céu.

Gosto de passear com a minha cadela por bosques e campos, nestas ocasiões. Ela tem a alegria de descobrir novos odores e aromas, tão intensos para ela, como as cores o são para nós.

Nestas caminhadas não perturbamos a ordem natural, estamos inseridos nela, estamos na «catedral». Com respeito, visitamos seus inúmeros recantos. Trazemos de volta para casa uma renovada colheita de sensações, sem retirar nada, sem perturbar nada.





NOVE SENTENÇAS



A dormência da hibernação  propicia o renovo.

A força, sem critério nem sabedoria, vira-se contra o seu autor.

Dizer dum qualquer objeto, que ele é eterno, é uma falsidade.

A melhor das doutrinas políticas, uma vez posta em prática, facilmente pode degenerar numa monstruosidade.


Quem ama, não encerra o ser amado. A "Posse" nunca é sinónimo de amor, em nenhuma circunstância.


Caminhamos na escuridão; vemos ao longe uma luz, através do nevoeiro. Cremos estar a ver o Sol mas, é somente uma miragem.

Deixo a Natureza guiar os meus instintos. Mas, exerço um controlo severo sobre o meu modo de os satisfazer.

O manipulador faz nascer um desejo na mente da sua presa, para melhor a dominar.

O muito poderoso torna-se o mais fraco deste mundo, quando se convence de que o mundo está ansioso por satisfazer seus desejos.



ENQUANTO...


Enquanto a música  fluir no ar

e para os meus ouvidos

e nos circuitos neuronais

o meu cérebro poderá nutrir-se

de surpresa, fantasia e liberdade;

Enquanto intérpretes fizerem reviver

as ideias de compositores 

nos seus instrumentos 

e vibrar as cordas

das sensíveis almas;

Enquanto houver

aves selvagens

e cantos de pastores

que os cães reconhecem;

Enquanto a vida florescer

a cada manhã de sol

erguendo os rostos

para o calor suave ...

haverá razões para estar

aqui , ser testemunho

das coisas belas

e efémeras que vejo

e recolho no meu ser.






APOSTA


Sempre tive grande relutância

Em apostar nalguma coisa

Ou acontecimento. Pensava:

Se podes calcular a probabilidade

Dessa coisa, apostar é fútil,

E se não podes, é suicidário.


Mas hoje declaro que aposto.

Aposto pela vida, face ao caos

Face à extinção, ao domínio

Absoluto, incontroverso;

Face à capitulação, também

À fraqueza dupla do querer.


Aqueles que hesitam, calculam

Mas calculam mal; o cálculo 

É simples: Escolhes lutar 

Ou sofrer a humilhação 

Antes de morreres esmagado.

Só os fracos hesitariam


Porque quem luta, quem se ergue

Usando seus meios e inteligência

Está a ganhar a partida;

Se ganhou, salvou-se e salvou-nos

De uma secular servidão.

Se perdeu, não perdeu... pois

A sua semente vingará.

Se não luta,  é certo:

Perderá de certeza.


Por isso, aposto que o tempo

Trará uma nova geração

Bastante mais comprometida

Perante a urgência 

De salvar a humanidade

De quem pretende dominá-la.

Se eles fizerem esta aposta

Terão meu apoio e participação

Na medida em que puder ser útil


A esperança reside no humano

Que subsiste em cada um.

Que este ascenda à consciência,

É A MINHA APOSTA 


Murtal, Parede

A 5 de Dezembro de 2025




Nas neves sujas de dezembro


Nas neves sujas de Dezembro

Corpos caídos,  manchas escuras

Ao cair da noite, o uivar de lobos

Eram jovens ou menos jovens

Tinham  esperança de viver


Corpos imóveis, apodrecendo

Os estrondos do canhão 

Os clarões dos impactos

Os céus riscados de fogo

Nada os impressiona.

Suas faces azuladas 

Serenas, os olhares vazios

As estrelas já não vêem

A rígidez dos músculos

Induziu posturas insólitas

Aos corpos gélidos


Serão enterrados

Mais tarde, com missa

Cemitério e choro de Mães

Esposas ou noivas,

Discursos solenes,

Placas em memória,

Condecorações póstumas...


Mas nada pode curar

A dor da ausência

Nem os corpos e almas

Torturados, humilhados 

 Para este inglório fim.