Quando os primeiros-ministros de Israel estão em dificuldades, enfrentando eleições difíceis ou um escândalo de corrupção, a tentação tem sido - tipicamente - de desencadear uma operação militar para fortalecer a sua posição junto do eleitorado. Nos anos recentes, Gaza tem sido o alvo preferido.
Benjamin Netanyahu confronta-se com ambas as dificuldades ao mesmo tempo: a segunda volta das eleições em Setembro, que ele terá dificuldade em vencer; e um procurador-geral que se espera irá processá-lo com acusações de corrupção, imediatamente depois destas.
Netanyahu está numa posição de aperto particularmente grave, mesmo segundo os padrões de um sistema político israelita, usualmente caótico e faccioso. Após uma década no poder, o seu charme eleitoral pode estar a desfazer-se. Já se notam sinais de descontentamento entre os seus aliados da extrema-direita.
Dadas as circunstâncias de aperto, alguns observadores receiam que ele se lembre de tirar um tipo diferente de coelho da cartola.
Nas duas eleições passadas, Netanyahu cavalgou para o triunfo depois de ter produzido declarações dramáticas nos últimos minutos de campanha. Em 2015, agitou o papão do quinto dos cidadãos de Israel, que são palestinianos, garantindo que eles iriam usar os seus direitos democráticos de voto, avisando que "eles viriam votar em massa".
Em Abril passado, declarou a sua intenção de anexar largas áreas da ocupada Margem Ocidental, em violação da lei internacional, no decurso do próximo período parlamentar.
Amos Harel, um analista de assuntos militares e jornalista veterano no Haaretz, observou - na semana passada -que Netanyahu pode decidir que as palavras já não chegam para vencer. Será necessário entrar em acção, sob forma de um anúncio, na véspera da votação de Setembro, de que a extensão da anexação da Margem Ocidental atingirá os dois terços.
Não consta que Washington se irá colocar como obstáculo deste acto.
Pouco tempo antes da eleição de Abril, a administração Trump ofereceu a Netanyahu um bónus na campanha ao reconhecer a anexação ilegal de Israel nos Montes Golan, território tomado por Israel à Síria em 1967.
Já neste mês, o embaixador dos EUA em Israel, David Friedman, um dos arquitectos do longamente incubado plano de paz de Trump, o «acordo do século», veio oferecer um apoio precoce para as eleições.
Em entrevista, argumentou que Israel "estava do lado de Deus" - ao contrário, assim estava implícito, dos palestinianos. Argumentou, além disso, que Israel tinha o «direito de reter» muito da Margem Ocidental.
Ambas as posições sugerem que a administração Trump não irá colocar objecções a movimentações israelitas no sentido da anexação, especialmente se isso garante que o seu candidato preferido regressará ao poder.
Independentemente do que Friedman sugeriu, não é Deus que interveio em favor de Israel. As mãos que têm cuidadosamente preparado o terreno em muitas décadas para a anexação da Margem Ocidental são todas muito humanas.
Os governantes de Israel têm estado a preparar este momento há mais de meio século, desde que a Margem Ocidental, Jerusalém Leste e Gaza, foram tomadas no ano de 1967.
Este facto é sublinhado por um mapa interactivo dos territórios ocupados. Esta importante fonte de informação é um projecto conjunto do grupo B'Tselem israelita de direitos humanos e da equipa londrina «Forensic Architecture», que utiliza nova tecnologia para visualizar e mapear a violência política e a destruição ambiental.
Sob o título Conquer and Divide [Conquista e Divide], revela no pormenor como Israel tem “dilacerado o espaço palestiniano, dividindo a população palestiniana em dúzias de enclaves desconectados e destruindo a sua estrutura social, cultural e económica.”
O mapa prova, para além de qualquer dúvida, que a colonização da Margem Ocidental por Israel nunca foi acidental defensiva ou relutante. Foi friamente calculada e planeada com um fim em vista - e o momento para atingir este fim está a aproximar-se rapidamente.
A anexação não é um projecto direitista que se tivesse apoderado das intenções benignas da geração fundadora de Israel. Ela esteve nos planos da ocupação desde os princípios, em 1967, quando o dito centro-esquerda - agora apresentado como defensor da paz, em alternativa a Netanyahu – era governo.
O mapa mostra como os planificadores militares de Israel criaram uma rede complexa de pretextos para tomar as terras dos palestinianos: hoje, as zonas militares fechadas cobrem um terço do território da Margem Ocidental; exercícios de tiro afectam a vida de 38 comunidades palestinianas; as reservas naturais ocupam 6 por cento do território; cerca de um quarto foi proclamado terras do «Estado de Israel»; cerca de 250 colonatos foram instalados; dúzias de barreiras de controlo limitam os movimentos severamente; e centenas de quilómetros de muros e de vedações foram já construídos.
Estas tomadas de território entre-cruzadas foram insensivelmente retirando território, ao estabelecerem os muros de prisões estreitamente vigiadas para os palestinianos no seu próprio território.
Duas imagens de satélite da NASA, tiradas à região com um intervalo de 30 anos - de 1987 e de 2017 - revelam como os colonatos israelitas e as infraestruturas de transporte foram gradualmente desfigurando a paisagem da Margem Ocidental, removendo a vegetação natural e substituindo-a por betão.
As tomadas das terras não eram simplesmente acerca de adquirir território. Eram uma arma, ao mesmo tempo que aumentavam as medidas draconianas de restrição dos movimentos, para forçar a população palestiniana autóctone a submeter-se, a reconhecer a derrota, a abandonar a esperança.
No seguimento imediato da ocupação do território da Margem Ocidental, Moshe Dayan, o ministro da defesa, herói do momento de Israel e um dos arquitectos do projecto dos colonatos, observou que os palestinianos deveriam ter que «viver como cães e quem queira partir, pode partir - e veremos aonde este processo vai levar».
Embora Israel tenha concentrado os palestinianos em 165 áreas desconectadas por toda a Margem Ocidental, os seus actos conseguiram efectivamente obter o selo de aprovação da comunidade internacional em 1995. Os acordos de Oslo consolidaram o controlo absoluto de Israel sobre 62 por cento da Margem Ocidental, incluindo as terras principais agrícolas dos palestinianos e recursos hídricos, o que tinha sido classificado como Área C.
As ocupações são supostas serem temporárias - e os acordos de Oslo prometiam isso mesmo. Gradualmente, os palestinianos seriam autorizados a retomar o seu território, para construir um Estado. Mas, Israel assegurou-se que as ocupações e os roubos de terras sancionadas por Oslo iriam continuar.
O novo mapa revela mais do que os métodos usados por Israel para dominar a Margem Ocidental. As décadas de tomadas de terras mostram um trajecto, um propósito cuja finalidade ainda não foi completada.
- Se Netanyahu anexar parcialmente a Margem Ocidental - Área C - este será apenas outro passo nos esforços persistentes de Israel em tornar a vida da população palestiniana miserável e acossá-la a sair. É uma guerra de desgaste - que os israelitas, desde há muito tempo, vêm compreendendo como «uma anexação rastejante», levada a cabo discretamente, para evitar a condenação da comunidade internacional.
Os israelitas querem, em última instância, que os palestinianos se vão embora completamente, amontoados em Estados árabes vizinhos, tais como o Egipto e a Jordânia. Esse próximo capítulo está prestes a desenrolar-se em pleno, se Trump tiver oportunidade de desvendar o seu «acordo do século».
Uma primeira versão deste artigo apareceu inicialmente no jornal «National», de Abu Dhabi.
Jonathan Cook ganhou o prémio Martha Gellhorn Special de jornalismo. Os seus livros incluem "Israel e o Choque das Civilizações: Iraque, Irão e o Plano para Refazer o Médio Oriente” (Pluto Press) e “Palestina em desaparecimento: experiências de Israel com o Desespero Humano” (Zed Books). O seu sítio Internet é www.jonathan-cook.net.