segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

ENTREVISTA COM O PROF. MICHAEL HUDSON (PARTE I)

Da última vez que falámos foi para o magazine alemão "Four" em junho.  Agora também trabalho para a MEGA Radio, uma estação rádio de notícias para a Alemanha, a Áustria e a Suíça. Emitimos a partir de Viena e estamos localizados em Berlim, Baviera e Áustria.

Gostaria de o convidar para uma entrevista, a gravar no ZOOM, para o programa de rádio. Seria uma atualização da nossa última entrevista. Talvez tenha uma duração de 20-30 minutos.

O leitor, que veja também a nossa conversa anterior.

Aqui estão as minhas perguntas:

(1.) Fez algumas previsões na nossa entrevista para o magazine «Four» que se realizaram.

Falou sobre a crise das companhias alemãs em relação à produção de fertilizantes.  Esse assunto ocupou as primeiras páginas poucas semanas após a nossa entrevista.

Também afirmou:  “O que caracteriza o bloqueio do Nord Stream 2, é realmente a política de comprar americano." Isto tornou-se agora mais do que claro após a destruição dos gasodutos Nord Stream.

Poderia comentar sobre isso?

MH: A política exterior dos EUA tem-se concentrado, há bastante tempo, no comércio de petróleo internacional. Este, é decisivo como contributo para a balança de pagamentos dos EUA e o seu controlo dá aos dirigentes dos EUA a capacidade de impor estrangulamentos noutros países.

O petróleo é um fornecedor chave de energia e o crescimento da produtividade e do PIB das economias principais tende a refletir o aumento de energia usada por trabalhador.  O petróleo e o gás não são apenas para serem queimados, produzindo energia, mas também são uma matéria-prima química básica para os fertilizantes e, portanto, para a produtividade agrícola, assim como para boa parte da produção dos plásticos e doutros produtos químicos. 

Por isso, os estrategas dos EUA reconhecem que cortar os países do petróleo e seus derivados irá bloquear a sua indústria e agricultura. A capacidade de impor tais sanções pode permitir que os EUA tornem os países dependentes das suas políticas como meio para não serem «excomungados» do comércio de petróleo.

Os diplomatas dos EUA têm estado a dizer à Europa, desde há muitos anos, para esta não se basear no gás e petróleo russos. O objetivo é duplo: por um lado impedem um fator decisivo para o superavit comercial da Rússia e, por outro, capturam o vasto mercado europeu para os produtores americanos de petróleo e de gás. Os EUA convenceram os dirigentes governamentais alemães a não aprovar o gasoduto Nord Stream 2 e finalmente, usaram a desculpa da guerra da OTAN com a Rússia na Ucrânia para atuarem unilateralmente e conseguirem sabotar os gasodutos 1  e 2 do Nord Stream.

(2.) Para o nosso público:  No seu novo livro “The Destiny of Civilization: Finance Capitalism, Industrial Capitalism, or Socialism”,

...postula que a economia mundial está a fraturar-se em duas partes, os EUA e a Europa, na sua parte dolarizada

...e que esta unidade neoliberal ocidental está a levar a Eurásia - e a maior parte do Sul Global - para um grupo separado. Acabou de afirmar isso numa entrevista dada em Novembro.

https://michael-hudson.com/2022/11/the-rentier-economy-is-a-free-lunch/

Poderia explicar isso para o nosso público?

MH:  A separação não é apenas geográfica, mas sobretudo reflete o conflito entre o Ocidente neoliberal e a lógica tradicional do capitalismo industrial. O Ocidente des-industralizou as suas economias ao substituir o capitalismo industrial pelo capitalismo financeiro, inicialmente na procura de conseguir manter salários baixos e depois ao tentar e estabelecer privilégios de monopólio e mercados cativos, ou ainda elementos essenciais de tecnologia, das armas (e agora de petróleo), transformando-se em economias de rentistas.

Há um século, o capitalismo industrial estava no ponto de evoluir para o socialismo, com os governos a fornecer as infraestruturas básicas (tais como sistemas de saúde, de educação, comunicações, investigação e desenvolvimento) para minimizar o custo de vida e a proporcionar os negócios. Aquilo que são hoje os EUA, a Alemanha e outras nações, construíram desse modo o seu poder industrial, o mesmo que a China e outros países euro asiáticos têm estado a fazer mais recentemente.

Mas a escolha do Ocidente de privatizar e financeirizar a sua infraestrutura básica, desmantelando o papel do governo e entregando a planificação a Wall Street, à City de Londres e a outros centros financeiros,  deixou-os com pouco para oferecer a outros países - salvo a promessa de não os bombardear ou a tratá-los como inimigos, caso eles procurem criar riqueza por suas próprias mãos, em vez de a transferirem para os investidores dos EUA e de corporações internacionais.

O resultado é que, quando a China e outros países constroem as suas economias de modo idêntico ao que os EUA fizeram, desde  o pós Guerra Civil, até à IIª Guerra Mundial, são considerados como inimigos. É como se os diplomatas dos EUA vissem que o jogo está perdido e que a sua economia se tornou tão dependente da dívida, privatizada e com elevados custos de produção, que só esperam conseguir fazer que os outros países sejam seus tributários, dependentes enquanto for possível, até que o jogo chegue ao fim.

Se os EUA conseguirem impor o neoliberalismo financeiro no mundo, então as outras nações acabarão por ter os mesmos problemas que os EUA estão a sofrer.

(3.) Agora os primeiros terminais para gás liquefeito ( LNG) dos EUA estão abertos. Como é que isto afetará o comércio e a dependência /interdependência entre a Alemanha e os EUA? 

MH: As sanções dos EUA e a destruição de Nord Stream 1 e 2 tornaram a Europa dependente dos fornecimentos dos EUA, a um custo tal para o gás LNG (cerca de seis vezes o que os americanos e asiáticos pagam), que a Alemanha e outros países perderam a sua capacidade em competir no aço, no vidro, no alumínio e noutras manufaturas. Isto cria um vazio, que as empresas com sede nos EUA vão preencher com o seu investimento a partir de outros países, ou até dos próprios EUA.

A expectativa é que as indústrias pesadas, químicas e outras da Alemanha e doutros países europeus  tenham de se mudar para os EUA para conseguir petróleo e outros componentes essenciais, que lhes dizem para não comprar na Rússia, no Irão ou noutras alternativas. Assume-se que elas - indústrias europeias - não possam localizar-se na Rússia ou Ásia, pela imposição de sanções, multas e ingerências nas políticas europeias, pelos EUA.  Existem ONGs e satélites da «National Endowment for Democracy», como tem sido o caso desde 1945. Pode-se esperar uma nova Operação Gládio para promover os políticos que desejam manter esta nova Fratura Global e reorientar a indústria europeia para os Estados Unidos.

Uma questão é se o trabalho especializado alemão irá a seguir. Isso é aquilo que acontece tipicamente em tais circunstâncias. Este tipo de redução demográfica foi experimentada pelos Estados Bálticos. É um efeito colateral às políticas neoliberais.

(4.) Qual a sua visão sobre a situação militar atual na guerra Rússia/ Ucrânia? 

MH: Dá ideia que a Rússia irá facilmente vencer em Fevereiro ou Março. O que irá provavelmente criar uma zona desmilitarizada para proteger as áreas russófonicas (provavelmente, incorporadas na Rússia) do Ocidente pró-OTAN em ordem a prevenir sabotagem e terrorismo. 

Á Europa, irão continuar a obrigá-la a boicotar a Rússia e os seus aliados, em vez de procurar obter trocas mutuamente vantajosas por comércio e investimento recíprocos.  O EUA poderão incentivar a Polónia e outros países, a lutarem até ao último polaco ou lituano, à semelhança da Ucrânia. Isto irá pressionar a Hungria. Mas, antes de mais nada, haverá insistência para a Europa gastar somas imensas para se rearmar, sobretudo com armas dos EUA.  Estes gastos irão excluir muitas das despesas sociais, para que a Europa consiga suportar o aprofundamento da depressão industrial, ou distribuir subsídios para fazer reviver a sua indústria. Portanto, será crescentemente uma economia militarizada - ao mesmo tempo que a dívida dos consumidores e das empresas industriais vai aumentando, a par da dívida do governo.

Enquanto isto ocorrer, pode a Rússia decidir que a OTAN se deve retirar para as suas fronteiras de 1991. Este será, muito previsivelmente, um ponto de conflito.

(5.) Qual é sua opinião sobre a situação financeira nesta guerra.  O G7 e os governos da UE já falam de reconstruir a Ucrânia após a guerra. O que significa isso para os capitalismos de negócios e financeiros do Ocidente?

MH: A Ucrânia dificilmente poderá ser reconstruída. Antes de mais, muita população partiu e não é provável que regresse, dada a destruição de habitações, de infraestrutura ... e de maridos. 

Segundo, a Ucrânia é principalmente propriedade dum pequeno grupo de cleptocratas - que estão disponíveis para vender essa propriedade a investidores ocidentais da agricultura e a outros abutres (penso que sabe a quem me refiro).

A Ucrânia está já atolada em dívida e tornou-se um feudo do FMI (o que significa, na prática, da OTAN). Será pedido à Europa para «contribuir» e as reservas do Banco Central Russo apreendidas podem ser gastas a contratar companhias dos EUA, que irão fazer um negócio ótimo em fingir que estão a recuperar a economia da Ucrânia - deixando o país ainda mais enterrado em dívida.

Um novo Secretário de Estado do Partido Democrata irá fazer eco a Madeleine Albright, dizendo que a morte da economia, das crianças e dos soldados da Ucrânia «mereceram totalmente a pena», enquanto custos para espalhar a democracia ao estilo dos EUA. 

(continua, veja Parte II)

Guerra da Ucrânia no Don, Estratégia da Rússia, Deriva da OTAN para Guerra Nuclear

Senador Richard Black entrevistado por Eva Bartlett (jornalista presente no Don)

Há um punhado de homens e mulheres, com altos cargos de senadores ou representantes, que dizem a realidade aos seus concidadãos. Infelizmente, mesmo no seu próprio país, são pouco divulgadas as suas posições. Tenho consideração pela retidão moral e coragem dos que tive oportunidade de ouvir em entrevistas, nomeadamente, o Coronel McGregor, a ex-representante (Democrata) Tulsi Gabbard, o Coronel e Senador Richard Black.
Este último, dá uma entrevista, onde esclarece a verdade do que se tem passado na Ucrânia, desde o golpe de Maidan de 2014. Oxalá que as pessoas comecem a acordar e percebam como têm sido submersas num monstruoso cortejo de mentiras, propaladas pelos meios de «informação» (de propaganda, na realidade) do Ocidente.

                                           https://www.youtube.com/watch?v=ys_lI6mXA_c


domingo, 18 de dezembro de 2022

SCHUMANN: CONCERTO PARA PIANO OP.54 [Martha Argerich & Zubin Mehta ]

                                          https://www.youtube.com/watch?v=IL8hK60EJbQ&t=35s

 Wiener Philharmoniker conducted by Zubin Mehta

September 18, 2022 Musikverein, Goldener Saal 00:35 I. Allegro affettuoso 16:00 II. Intermezzo; Andante grazioso 21:50 III. Finale; Allegro vivace Encore: Schumann Kinderszenen Op. 15 34:52 1. Von fremden Ländern und Menschen

Este concerto é, para mim, muito especial. Ouvi-o centenas de vezes em disco, conheço bem todas as suas passagens. Pude, por isso, apreciar a interpretação bela e rigorosa desta grande dama do piano, Martha Argerich. A sua pátria é a Argentina, a mesma de tantos valores, não apenas de Messi e outros no futebol, mas também na música:

- Alberto Ginastera, compositor que soube integrar de forma original as tradições musicais populares em composições de vanguarda modernista.
- Astor Piazzola, tão conhecido no contexto do tango e do bandoneón mas, mais do que isso. Foi quem deu à música popular do seu país uma audiência universal, com a imensa qualidade e criatividade das suas composições.
Não pretendo ser exaustivo; apenas mencionar artistas cimeiros desta pátria latino-americana, talvez a mais cosmopolita, a mais estimuladora do talento, a mais culturalmente mestiça ... do Mundo!

sábado, 17 de dezembro de 2022

IDADE de SAPIÊNCIA [OBRAS DE MANUEL BANET]




O azul do céu não me impede de sentir o fresco vento norte
A idade de prata e ouro é quando olhas o céu e vês
O voo da ave inscrito
A bruma matinal escorrendo pelo vale

A certeza de que a terra é redonda e que se entretém
Rodando sobre si própria
Indiferente às travessuras dos humanos
Não nos traz aquela vertigem!

A ti entrego este sonho cerrado
Sob as pálpebras fechadas
Abertas ao mundo interior
Aquele que conta e contém

Todo o universo numa gota
De bruma que se condensa
Essa gota uni em verso a ti
No ser sem tempo, que és

De tal domínio não há fuga
Mas também que fazer
Lá fora, remando entre estrelas?
Trazei-me a gota reflexiva

Das aves eu sempre serei
Adorador, sem asas coloridas
Extasiado pela sua sombra
Que me faz sentir invejoso

E depenado e descamado
Mas sempre maravilhado
Outrora dava importância
A outras aventuras

Mas a Terra é redonda e
Gira em torno do Sol:
Mau ano, bom ano
Sempre será uma certeza!


Murtal, Parede 17 Dezembro de 2022



-----------------------------------

Poema anterior neste blog: «Quero Ser Animal»

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

Novo estudo fornece evidência direta de mortes por lesões cardíacas causadas por vacinas ARN-m

Jennifer Margulis & Joe Wang
Dec 12 2022


As vacinas usando ARN-m causam miocardites por levarem as nossas próprias células imunitárias a atacar o coração, o que pode causar morte súbita por taquicardia ventricular ou fibrilação. (Kateryna Kon/Shutterstock)


Patologistas médicos do Hospital Universitário de Heidelberg, Alemanha, publicaram provas diretas mostrando a causa da morte de pessoas, que tinham sido vacinadas com vacinas de ARN-m. Esta equipa de 6 cientistas investigou no seu estudo doentes que tinham sido vacinados com vacinas de ARN-m e que sofreram uma lesão cardíaca  devido a seus corações serem atacados pelas suas próprias células imunitárias. Este ataque autoimune nas células do coração, provoca danos e os corações vão acelerar tanto a sua batida, de muitas vezes por segundo, de tal forma que esta taquicardia, sendo desencadeada inesperadamente, leva à morte em minutos.
Leia a continuação do artigo de Jennifer Margulis e de Joe Wang para o «The Epoch Times»: AQUI


A ALEMANHA E AS MENTIRAS DO IMPÉRIO [por Patrick Lawrence*]



Por Patrick Lawrence

Original em  Consortium News:

https://consortiumnews.com/2022/12/13/patrick-lawrence-germany-the-lies-of-empire/


 “A Alemanha é Hamlet,” escreveu uma vez Gordon Craig. O grande historiador daquela nação (1913-2005) era famoso pelas suas frases sugestivas, intuições que mostravam sob nova luz os recônditos antros da psique alemã, o que fazia este povo pestanejar. 

Estará a Alemanha virada para o Atlântico ou para Leste, para a massa continental Eurasiática? De que tradição vai beber? Onde se situam as suas lealdades? Isto são questões de geografia, de uma cultura antiga e rica e de uma longa e complicada história que se colocam aos alemães. Não penso que Craig pretendia sugerir que esta condição fosse um fardo. Não, não havia nada para resolver. Neste estado ambíguo - no Oeste, mas não integralmente nele, no Leste mas não totalmente dele - a Alemanha era igual a si própria, verdadeiramente.

Os alemãs viveram assim, sem pedir desculpas, durante muito tempo. Podiam permitir que os EUA estacionassem 200,000 militares no seu território - efetivos presentes no fim da guerra-fria — enquanto prosseguiam com a Ostpolitik de Willi Brandt, a abertura da República Federal à República democrática alemã e por extensão a todo o Bloco de Leste. Foi a Alemanha que investiu juntamente com Gazprom, o conglomerado russo da energia, nos gasodutos Nord Stream I e II, mesmo durante as crescentes tensões Leste - Oeste.

No longo percurso para a entrada em Moscovo, a partir do aeroporto internacional de Domodedovo, as largas vias estão bordejadas com stands de negociantes de carros alemães, de guindastes de construção alemã, de fábricas de companhias alemãs. Os meios industriais alemães assim como muitos cidadãos alemães, têm sido críticos sonoros do regime de sanções que os EUA impuseram à Rússia  — e efetivamente à Europa, de facto — após o golpe de Estado em Kiev, orquestrado pelos EUA, ter desencadeado a corrente crise na Ucrânia.

Eu leio as duas extraordinárias entrevistas dadas por A. Merkel ao Der Spiegel e ao Die Zeit na semana passada com pano de fundo desta historia, deste assente, deste organizado estado de ambiguidade. Se existe uma verdade que possa erguer-se acima de todas as outras nas espantosas revelações que a ex-chanceler fez, sobre  duplicidade de Berlim em suas relações com Moscovo, é a de que a República Federal abandonou a sua herança — o seu estado natural, de facto — assim como as responsabilidade consideráveis que o passado e a geografia lhe atribuíram.

Separação Leste-Oeste

Seria difícil exagerar o significado desta mudança para todos nós. A separação global tornou-se mais ampla, agora. A Guerra Fria II também se tornou mais fria. A separação do Leste e Oeste tornou-se agora uma situação mais ou menos permanente. E o mundo acabou de perder aquele país que tinha a capacidade de mitigar as atuais circunstâncias péssimas, graças à peculiar posição, talvez única, na comunidade das nações.

É estranho considerar o Príncipe Henrique XIII, o aristocrata alemão que acaba de ser preso por liderar uma conjura para derrubar o governo de Berlin (uma coleção de alegações absurdas, devo referir desde já, não tomo nem por um minuto a sério esta ausência de provas credíveis e não espero que jamais venham a ser apresentadas) Consta que o príncipe teria desenvolvido argumentação de que a Alemanha não se tinha tornado uma nova nação, após a Segunda Guerra Mundial, mas uma colónia subsidiária e pertença dos EUA.

“Não somos alemães. Não somos um verdadeiro Estado alemão" isto é citado como declaração dos seus adeptos numa peça (muito enviesada) do New York Times, publicada Domingo. “Somos apenas um ramo duma SARL”, que significa «sociedade anónima de responsabilidade limitada».

É tão estranho ler isto na mesma semana em que Merkel removeu qualquer laivo de dúvida, de que isto é precisamente a condição da Alemanha, seria este o caso desde os anos pós- guerra, e certamente o foi desde que Washington se comprometeu a si própria e aos seus aliados nesta campanha de expansão e inclusão de novos países na OTAN, para a levar até às fronteiras da Rússia e com o objetivo último de subverter a Federação Russa. 

Embora eu não saiba muito sobre as posições políticas do príncipe, é deveras interessante ouvir um cidadão alemão ter objeções, d facto, de que a República Federal se atraiçoou a si própria e à sua herança histórica, na mesma semana em que a ex-chanceler disse aos mis lidos magazine e jornal da Alemanha, que a frutuosa ambiguidade do passado da nação foi abandonada, em favor de uma desonestidade manipulativa e russófoba, que está no centro da guerra por procuração que os EUA têm levado a cabo contra a Rússia na Ucrânia.

Tem sido amplamente referido e analisado — salvo na imprensa americana «mainstream» em que as palavras de Merkel , na semana passada, não foram mencionadas — que a ex-líder alemã tenha descrito a sua traiçoeira e cínica atitude com Moscovo, nas negociações dos dois protocolos de Minsk, o primeiro assinado em Setembro de 2014 e o segundo, no Mês de Fevereiro do ano seguinte.

 

Outubro de 2014: O presidente russo, Vladimir Putin, à esquerda, falando com o presidente da Ucrânia Petro Poroshenko, à direita, e com a Chanceler alemã Angela Merkel e o presidente francês François Hollande. (Kremlin.ru, CC BY 4.0, Wikimedia Commons)

Tanto Berlim como Paris, o regime de Kiev resultante do golpe e Moscovo, foram todos signatários dos acordos.  Lembro-me muito bem do empenho que o presidente russo Vladimir Putin pôs nestas conversações. Muitos de nós esperávamos que, tendo Kiev violado os acordos de Minsk I, o segundo acordo iria produzir aquilo que o presidente russo procurava - um acordo duradoiro que deixasse a Ucrânia unida e estabilizasse a segurança e ordem na fronteira sul-oeste da Rússia e no flanco leste da Europa.

Mais cedo, este ano, o primeiro presidente ucraniano pós- golpe Petro Poroshenko, chocou toda a gente quando afirmou publicamente que Kiev nunca tinha tido qualquer intenção de honrar os compromissos feitos quando assinou os protocolos de Minsk: As conversações na capital da Bielorrússia e todas as promessas queriam simplesmente dizer, para ele, um processo de ganhar tempo enquanto a Ucrânia construía fortificações nas regiões a leste e que treinava e armava um exército suficientemente forte para levar a cabo uma guerra de agressão total contra as  regiões com inclinações pró-russas, de Donetsk e Lugansk.

Nunca houve qualquer interesse em implementar a estrutura federal desenhada em Minsk II. Nunca houve qualquer intenção em fornecer às regiões separatistas a medida de autonomia reclamada, que a própria História da Ucrânia e seu mosaico linguístico, cultural e de tradições, justificavam. Tornou público que isto era uma astúcia para enganar Moscovo e as repúblicas do Donbass, enquanto a Ucrânia se rearmava e bombardeava estas repúblicas, em antecipação da guerra que rebentou em pleno em Fevereiro.

É chocante, sim. Mas Poroshenko é um magnate da doçaria que montou o regime, largamente irresponsável e furiosamente russofóbico que tinha tomado o poder em Kiev.  Portanto: Chocante, mas também conforme com a conduta desse bando de ninguéns, corruptos até às raízes dos cabelos, com nenhuma noção de sentido de Estado ou de governança responsável.

Tomam outra dimensão, para vincar o óbvio, quando as mesmas coisas são ditas por Merkel. Era suposto a ex-chanceler ter liderado a posição da diplomacia ocidental, juntamente com François Hollande, o presidente francês na altura e claramente formando equipa com a figura mais importante na política europeia. Pelo seu próprio relato, estava a usar a diplomacia exatamente como o fazia Kiev, para inviabilizar o acordo que, pretensamente, ela apadrinhava.

Convém lembrar os leitores de que os EUA não foram parte nas conversações de Minsk. Por um lado, posicionou-se totalmente contra qualquer acordo quer coma Rússia, quer com as Regiões Separatistas. Por outro lado, não fazia sentido convidar os EUA para Minsk porque a sua posição era óbvia e sua presença seria contraproducente. Agora, que Merkel falou nestes termos, a posição alemã era a de que o Ocidente precisava do acordo - que não interessava a ninguém, no Ocidente -  apenas como forma de ganhar tempo para a Ucrânia se rearmar. 

As entrevistas de Merkel com o Der Spiegel e o Die Zeit foram efetuadas como retrospetivas, em que os correspondentes amistosamente proporcionavam à ex-chanceler um olhar para o passado. Os tópicos de Minsk e da Ucrânia eram apenas dois entre muitos. Os textos dão a impressão de que Merkel falou deles de forma casual e sem reticências. Os fragmentos em causa, são curtos, mas muito claros.

Der Spiegel:

Ela pensa que… depois, durante as conversações de Minsk, ela conseguiu comprar tempo que a Ucrânia precisava para melhor enfrentar um ataque russo. Ela diz que é agora um país forte e bem fortificado. Nessa altura, ela tem a certeza de que seria varrido pelas tropas de Putin.

No Die Zeit, na segunda das das entrevistas, Merkel descreveu as negociações de Minsk como “um meio para dar tempo à Ucrânia... para ela se fortalecer,” mais adiante exprime satisfação de que esta estratégia - um claro abuso dos procedimentos diplomáticos - tenha tido sucesso.

Há várias interpretações das palavras de Merkel. São, em geral, tomadas como o reconhecimento sem máscara da sua duplicidade - e por extensão, do Ocidente - na sua forma de lidar com a Rússia sobre a questão da Ucrânia. O «Moon of Alabama», um blog feito por um alemão, vê as entrevistas como a tentativa de Merkel em proteger sua reputação, junto dos meios de liderança da Alemanha, onde há uma viragem para posições de russofobia, comuns nos EUA, mas não o eram, até agora na Alemanha.

Acho ambas as leituras plausíveis. De qualquer modo, o grande assunto que enfrentamos agora é  o prejuízo causado por Merkel em 2014 e 2015 e as consequências das suas declarações na semana passada.  

Muito se disse e escreveu sobre o golpe fatal que Merkel desferiu na confiança em assuntos diplomáticos, e penso que «fatal» é a palavra adequada. Ray McGovern foi esclarecedor neste assunto, trazendo a sua experiência profissional a esta questão, numa longa conversa com Glenn Diesen e com Alexander Mercouris, na semana passada.

Um certo grau de confiança era essencial entre Washington e Moscovo, mesmo durante as etapas mais perigosas da Guerra Fria. A Crise dos Mísseis de Cuba foi resolvida porque o Presidente John F. Kennedy e Primeiro-ministro soviético, Nikita Khrushchev, foram capazes de confiar o suficiente um no outro. Esta confiança já não existe, como Putin e outros membros do governo russo deixaram claro em declarações feitas em resposta às duas entrevistas alemãs.

Moscovo e Pequim disseram repetidamente que, desde que Joe Biden assumiu o cargo, nem sequer há dois anos atrás, já não existe confiança com os americanos. A consequência disto, é que não vale a pena negociar com eles num contexto diplomático. Para os diversos membros do governo russo, desde afirmações de Putin, até figuras menores, as declarações de Merkel parecem ter confirmado, lamentavelmente, as conclusões anteriores. 

Trata-se de uma viragem maior, que Moscovo agora inclua os europeus e em especial os alemães, nesta avaliação. Agora os alemães dizem as mentiras de que o império americano  é feito - um motivo de ansiedade e tristeza, juntas. Se a diplomacia da terra-queimada é nome adequado para as manobras que o Ocidente tem estado a fazer no relacionamento com a Rússia desde 2014, como eu penso que seja, então a ponte alemã entre o Ocidente e Leste foi queimada.

A gravidade destas conclusões, as suas implicações à medida que avançamos, são imensas para o Ocidente e para o que não seja Ocidente, de igual modo. Um mundo cheio de hostilidades é o que nós todos conhecemos. Um mundo destituído de confiança e de diálogo será outro patamar. Tal como vemos no contexto ucraniano, não há possibilidade de diplomacia, de negociação ou de diálogo de qualquer espécie, sem confiança. Nós lemos quotidianamente os resultados disso nas poucas publicações que descrevem com honestidade esta guerra.

*Patrick Lawrence, tem sido correspondente estrangeiro durante muitos anos, principalmente para International Herald Tribune, ele tem escrito colunas, ensaios, é autor de livros e conferencista. O seu livro mais recente é intitulado «Time No Longer: Americans After the American Century».


segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

HOLANDA: MODELO DE ECOMODERNISMO E UTOPIA TECNOCRÁTICA? [por Colin Todhunter]




O capitalismo de desastre e as narrativas da crise são presentemente usadas para manipular o sentimento popular e empurrá-lo para uma série de políticas desagradáveis que - de outro modo - não teriam aceitação política suficiente.


Tais políticas são promovidas por opulentos interesses que decidiram fazer biliões graças ao que está sendo proposto. Eles procuram obter controlo total da alimentação e de como esta é produzida. A sua visão relaciona-se com uma agenda mais vasta, que pretende moldar como a humanidade vive, pensa e atua.

Ao longo de grande parte de 2022, as manifestações dos agricultores holandeses estiveram presentes nos cabeçalhos. Os planos para diminuir para metade a produção de azoto na Holanda pelo ano de 2030, originaram os protestos de massa. O governo fala de que é preciso abandonar a agricultura baseada na produção animal e suas emissões com impacto no clima. 

Esta «transição nos alimentos» está frequentemente associada com a promoção da agricultura de «precisão», da engenharia genética, de um menor número de agricultores e explorações agrícolas e dos alimentos sintéticos. Esta transição é promovida sob a bandeira de ser «amiga do clima» e entronca na narrativa da «emergência climática».

 Willem Engel, que defende a agricultura tradicional, considera que o governo holandês não  procura eliminar os agricultores da paisagem por razões ambientais. Trata-se antes do projeto da «Cidade dos Três Estados», uma megapolis com uma população de cerca de 45 milhões, estendendo-se por áreas da Bélgica e da Alemanha.

Engel sugere que a «crise do azoto» está a ser manipulada para levar a cabo políticas que irão resultar numa reconfiguração da paisagem do país. Ele faz notar que o principal emissor de azoto na Holanda não é a agricultura, mas a indústria. No entanto, a terra atualmente ocupada com explorações agrícolas é estrategicamente importante para industrias e para habitação.

O conceito de uma megapolis dos três Estados, baseia-se numa região «verde» urbana gigantesca, conectada por «tecnologias inteligentes» que podem competir de forma rentável com as metrópoles gigantes que existem na Ásia, em especial na China. 

O governo holandês anunciou recentemente planos para compra de até 3 000 explorações agrícolas num lance destinado a satisfazer os objetivos controversos de reduzir a emissão de substâncias azotadas dos adubos sintéticos. A ministra holandesa do azoto Christianne van der Wal diz que serão oferecidos aos agricultores mais de 100 % do valor das suas explorações. Mas existem planos para expropriações em 2023, caso as medidas voluntárias falharem.

O que vemos agora na Holanda, será o passo inicial para tentar fazer o público aceitar cultivos GM (Geneticamente Modificados), «alimentos» feitos em laboratório e 90 % da humanidade ser enlatada em megacidades?

E será só coincidência que a seguinte visião do futuro eco-modernista surja em holandês no site baseado na Holanda, RePlanet.nl?

Diz que por volta de 2100 haverá dez milhares de milhões de pessoas no planeta:

"Mais de 90 %  destas viverão e trabalharão na cidade, comparados com 50 % em 2000. Em volta da cidade há grandes quintas cheias de culturas geneticamente modificadas que dão um rendimento quatro vezes maior em relação ao do início do século 21. ”

Também assinala que - para além das terras cultivadas - começa  a natureza, que então ocupará a maior parte da superfície do nosso planeta. Enquanto em 2000, metade da superfície terrestre era usada pelos humanos, em 2100 será somente um quarto.  O resto será devolvido à natureza, à biodiversidade e as emissões de CO2 regressarão ao nível anterior a 1850, enquanto quase ninguém sofrerará de pobreza extrema.

Aqui está o plano: Expulsai dos agricultores das atividades agrícolas, tomai suas terras para urbanização e reservas naturais; viveremos felizes para sempre, alimentados por culturas geneticamente transformadas e alimentação sintética produzida em fermentadores gigantes. Nesta terra tecno maravilha, ninguém será pobre, todos serão alimentados.

É a visão tecnocrática, onde o domínio dos atuais conglomerados da indústria alimentar permanece intacto e fica mais solidamente enraizado. As políticas são reduzidas a decidir-se como melhor manipular o sistema, de modo a obter ganhos (lucros) otimizados.

Neste futuro, as plataformas digitais irão controlar tudo, serão o cérebro da economia. A plataformas de e-comércio estarão embebidas no sistema, quando a Inteligência Artificial (AI) e os algoritmos planearem e determinarem o que vai ser produzido e distribuído, e como vai ser.

Seremos reduzidos a pouco mais que o estatuto de servos, enquanto uma mão-cheia de megacorporações controla tudo. Conglomerados como a Bayer, Corteva, Syngenta, Cargill e outros, trabalharão com a Microsoft, Google e as grandes tecnológicas que irão gerir as culturas dirigidas por AI, sem agricultores; o comércio será dominado por gigantes do retalho, do género de Amazon e Walmart. Um cartel de donos dos dados, de fornecedores de elementos com copyright e megagrupos de retalhistas, estarão ao comando supremo da economia, regurgitando alimentos industriais tóxicos. 

E quanto a representantes eleitos (se é que ainda existam em tal visão distópica)? O seu papel será fortemente limitado enquanto vigilantes tecnocráticos destas plataformas.

Esta é a visão para onde nos quer conduzir a classe hegemónica do tipo da Gates Foundation, da Grande Agritec, da Grande Finança (digital), da Grande Farma e de «ambientalistas» do género do jornalista George Monbiot.

Ele dirão que é para o vosso bem. Para evitar a fome e carências e para garantir que a vida selvagem será protegida, que o planeta será «salvo», que pandemias devidas a zoonoses serão evitadas; qualquer cenário apocalíptico será impossível.

O sistema de produção alimentar atual está em crise. Mas, muitos dos seus problemas foram trazidos pelos mesmos interesses corporativos que estão por detrás do que foi delineado acima. Eles são responsáveis pelo regime alimentar fundamentalmente injusto, conduzido pelo Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio e pelo Fundo Monetário Internacional, cujas políticas são implementadas em benefício daqueles interesses corporativos.

Estas corporações são responsáveis pela degradação do solo, pela contaminação devida ao escorrimento de fertilizantes nas redes hídricas, pelo deslocamento das populações rurais e pela tomada de suas terras, a sua fuga para urbes sobrepovoadas e a proletarização (ex- produtores independentes, reduzidos a trabalho assalariado ou desemprego), a redução massiva do número de aves e de insetos, a menor diversidade nas dietas, a crise de saúde pública, em espiral crescente, devido à utilização intensiva de produtos químicos na agricultura, etc.

Porém, apesar dos problemas enormes causados por este modelo de agricultura, é uma verdade inconveniente que a agricultura dos camponeses (com baixo consumo de energia) – não a agricultura industrializada – continua a alimentar a maioria do mundo embora o modo industrial seja o principal devorador de subsídios e recursos.

Os que promovem a visão eco-modernista estão a usar preocupações genuínas em relação ao ambiente, para avançar sua agenda. Mas onde começa, então, o ambientalismo genuíno?

Ele não começa com a democracia sendo comprada (ver artigo How big business gets control over our food) ou coerção estatal (veja WikiLeaks: US targets EU over GM crops) para obter culturas GM e a sua comercialização.

Não começa com agricultura «de precisão», onde a técnica de «correção genética» e outras do género, são análogas a usar um enorme cutelo e constitui vandalismo genómico (segundo o professor de Harvard, George Church).

Não começa nem acaba com culturas geneticamente modificadas, que falharam em satisfazer suas promessas e plantas quimicamente nutridas, que são usadas como «fonte de alimento» para fermentadores consumidores de energia, onde tal matéria é transformada m alimentos.

Nem começa nem acaba com o Banco Mundial/ FMI a usarem a dívida (veja artigo Modi’s Farm Produce Act Was Authored Thirty Years Ago)  para provocar  dependência, para deslocar populações, para juntar as pessoas em cidades sobrepovoadas e retirar a humanidade da sua tradicional conexão com a terra.

Muitos dos problemas acima mencionados poderiam ser ultrapassados no longo termo, dando prioridade à soberania alimentar e de sementes, à produção localizada, às economias locais e aos cultivos agroecológicos. Mas isto não é do interesse da Bayer, Microsoft, Cargill e outras porque nada disso se encaixa no seu modelo de negócio - pois, é mesmo uma séria ameaça para ele.

Em vez de forçar os agricultores a abandonar a sua atividade, o governo holandês deveria encorajá-los a cultivar diferentemente.

Mas isso requer uma outra mentalidade dos que descrevem a agricultura como um problema em ordem  fazer avançar a todo o vapor uma agenda baseada em contos de fada tecno utópicos sobre o futuro.

O sistema de produção alimentar baseado em modelo industrializado, de elevado input, químico-dependente e corporativo, que está viciado por interesses geopolíticos, esse é o problema real.

Hans Herren, Premiado com o Prémio da Alimentação do Mundo diz:

«Temos de arredar os interesses ocultos que bloqueiam a transformação com argumentos vazios de “o mundo precisa de mais alimentos” e conceber e implementar políticas que olhem para diante...Possuímos todas as evidências científicas e práticas de que as abordagens agroecológicas à produção alimentar e à segurança na nutrição funcionam com sucesso.”

Estas políticas iriam facilitar os sistemas produtores localizados, democráticos e o conceito de soberania alimentar, baseado em otimização da autossuficiência, em princípios agroecológicos e no direito à propriedade cultural dos produtos alimentares e que as comunidades possuam e tenham a gestão comum dos recursos, nomeadamente, da terra, água, solo e sementes.»

Porque, quando se discutem alimentos e agricultura, aqui é que o ambientalismo genuíno começa.

Colin Todhunter é especialista em alimentação e agricultura e é Investigador Associado do «Centre for Research on Globalization» em Montreal. Pode ler o seu minilivro "Food, Dependency and Dispossession: Cultivating Resistance", aqui.