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terça-feira, 4 de março de 2025
sábado, 7 de março de 2020
[António Garcia Pereira] TAP: SAQUEADORES À SOLTA
Publico este texto de Garcia
Pereira, conhecido advogado e dirigente de um partido de esquerda. Recebi
o texto de «Grazia Tanta» ao qual agradeço o envio.
Neste «Portugal dos
pequeninos», costuma dizer-se que «a culpa morre solteira». Estou em desacordo
com o autor do texto abaixo somente num ponto: quando ele conjura a História
para fazer justiça *. Efectivamente, a «justiça» da História é a justiça que nunca
chega em tempo útil de ressarcir as vítimas e condenar os culpados, porque
quando ela profere a sua sentença, já morreram uns e outros, ou pelo menos
estão de malas aviadas....
(*«A História julgará decerto
todos os executantes e beneficiários deste autêntico “golpe do baú” e, mais até
do que eles, os governantes e dirigentes responsáveis por ele ter podido ser
pensado, executado e mantido durante todos estes anos e anos a fio.»)
A situação actual da TAP é de
uma enorme gravidade e representa um problema de particular importância de que,
todavia, quase ninguém parece querer falar.
É que uma companhia aérea de
bandeira, ou seja, gerida pela lógica da defesa dos interesses gerais do país e
não pelo objectivo do lucro de interesses financeiros privados, é um
instrumento estratégico fundamental para o desenvolvimento económico e social
de qualquer Estado.
Mas é-o seguramente ainda mais
para um país como Portugal, que tem não só cinco milhões dos seus cidadãos
espalhados pelo mundo, como também duas regiões autónomas constituídas por
ilhas atlânticas e ainda relações privilegiadas – que, aliás, podiam e deviam
ser mais desenvolvidas – com as suas antigas colónias. Isto, por facilmente
compreensíveis e inegáveis razões quer de unidade política nacional, quer de
coesão económica e social e de promoção da igualdade e solidariedade entre
todos os cidadãos, quer enfim do propiciar e do fomentar de relações políticas,
económicas e culturais, em pé de igualdade e reciprocidade, com tais países.
Se a todas estas razões
somarmos ainda o facto de Portugal ser o país mais ocidental da Europa e, logo,
o primeiro a ser sobrevoado pela maior parte do tráfego aéreo que vem do outro
lado do Atlântico, torna-se então absolutamente evidente a utilidade e, mais do
que isso, a necessidade de o nosso país dispor de uma companhia aérea que sirva
adequadamente todos aqueles objectivos. E é precisamente para isso que a TAP –
fundada em 14 de Março de 1945 – deveria servir. Mas não serve!
Desde logo,
a verdade é que a teoria de que gestores vindos do sector privado, como Fernando
Pinto (que já conduzira a Varig à falência e veio para a TAP em 2000
com a confessada missão de vender a companhia a privados) seriam os mais
competentes e eficientes para assegurar a boa administração da TAP levou foi a
que esta acumulasse sucessivos prejuízos[1], os quais serviram depois de
pretexto para defender a sua privatização.
O certo é que Fernando Pinto e
as suas administrações conduziram sucessivamente a TAP ao desastre financeiro
com as medidas absolutamente inaceitáveis mas adoptadas para aumentar de
qualquer modo as receitas, tais como a prática de preços astronómicos nas
viagens de e para as regiões autónomas, a eliminação de voos (sob a habitual não-razão
das “razões de ordem técnica”) para juntar num só deles os passageiros de dois
ou três diferentes, a redução das tripulações para o número mínimo de segurança
mas obrigando-as a desempenhar tarefas comerciais, a completa degradação do
serviço de bordo (designadamente de refeições) e a adopção de cavernícolas
medidas laborais como a de prejudicar na progressão na carreira e nos salários
os trabalhadores que exerceram, por exemplo, os seus direitos de parentalidade.
O desastre financeiro da TAP
começou desde logo com o famigerado negócio da compra da VEM (a empresa de
manutenção da Varig), celebrado em 2007 por Fernando Pinto com a decisiva
intervenção do amigo do peito de António Costa,
Diogo Lacerda Machado
(através da empresa Geocapital) e que representou seguramente uns milhões para
os bolsos de alguém, mas sobretudo um buraco de 500 milhões de euros nas contas
da TAP[2]!
E fizeram-no depois com a
desvalorização e degradação do justamente prestigiado sector de manutenção da
companhia, com a imposição da política do “stock 0” dos sobresselentes e com a
utilização dos equipamentos e das tripulações no limite (ou mesmo para além
dele) da sua capacidade normal, fazendo com que, ao mínimo problema com uma
aeronave ou com uma tripulação numa dada operação de voo, todas as seguintes
caíssem como peças de dominó, tal como sucedeu de forma gritante no Verão de
2014. E depois, para procurar apagar o fogo com gasolina, ir contratar,
designadamente em regime de wet-lease, aviões e tripulações a outras
companhias, algumas delas cujos parâmetros de segurança não eram propriamente
fiáveis ou sequer conhecidos, mas a preços exorbitantes, agravando assim e
ainda mais a situação financeira da empresa.
As várias administrações da TAP
Esta era, pois, a “excelência”
dos métodos e das lógicas da gestão privada numa empresa pública, mas levada
consecutivamente a cabo para justificar a privatização que foi inicialmente
defendida em 1991 pelo governo de Cavaco Silva, que aprovou mesmo a sua
transformação em sociedade anónima pela Resolução do Conselho de Ministros de
20 de Junho desse ano,
ideia
depois retomada por António Guterres (em 1995), Santana Lopes (em 2004) e
José Sócrates (em 2006, aqui já com a ideia da dispersão do seu capital em
bolsa).
Com o chamado “memorando da
Tróica” – assinado em Maio de 2011 pelo governo de Sócrates com o acordo do PSD
e do CDS e que previa no seu ponto 3.31, a venda (privatização) da TAP até ao
final desse mesmo ano – esse processo foi acelerado, embora não à velocidade
que o FMI, a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu pretendiam. E, assim, foi o governo
Coelho/Portas – cujo mandato, recorde-se, decorreu de 21/06/ 2011 até à tomada
de posse do primeiro governo de António Costa em 30/10/2015 – que levou a cabo
a respectiva consumação.
Após
o falhanço em 2012 da primeira tentativa de venda (a qual chegou ao fim
com um só candidato, o empresário Gérman Efromovich,
com um currículo mais que duvidoso e com dupla nacionalidade, colombiana e
brasileira, o que o Direito da União Europeia não permitia), o governo de
Passos Coelho e Paulo Portas tratou, sobretudo através do então Secretário de
Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, de fazer consumar de qualquer maneira
o negócio da venda, autenticamente ao desbarato de 61% do capital social da TAP
à Atlantic Gateway, assinando o respectivo contrato em Junho de 2015.
E o que é a dita Atlantic
Gateway? É um consórcio formado propositadamente para este negócio pelo dono da
então praticamente falida companhia Azul, Linhas Aéreas Brasileiras, o
norte-americano David Neeleman. Para tal, este chamou Humberto Pedrosa,
empresário português do sector dos transportes rodoviários, para assim conferir
à nova dona da TAP uma pretensa natureza europeia e desta forma tornear as
normas de direito comunitário que impõem que uma companhia de aviação europeia
só por uma entidade europeia possa ser comprada.
Mas desde o início se percebeu
que o verdadeiro novo dono da TAP era, e é, um só, David Neeleman, como se
compreendeu ao que ele vinha – vampirizar a TAP para salvar a sua Azul e
posteriormente vender a sua parte do capital por um preço muito superior ao
valor do que pagara aquando da venda.
Apesar da complicada e habilidosa
engenharia jurídico-financeira construída precisamente para escamotear todas
essas realidades, aquilo que se foi constatando ao longo do tempo é agora por
inteiro confirmado com o anúncio das “adiantadas negociações” para a venda do
capital privado da TAP à alemã Lufthansa, a qual, muito significativamente, não
confirma, mas também não nega tais negociações.
É claro que, entretanto, e
perante a queixa-crime apresentada pela Associação “Peço a Palavra!”
(relativamente aos factos com relevância criminal que foram sendo praticados
para escamotear a verdadeira natureza da negociata da venda ilegal e ao
desbarato da companhia aérea nacional a um americano dono de uma companhia de
aviação brasileira), o nosso Ministério Público, depois de se limitar a ouvir
os intervenientes e defensores deste negócio e de não realizar uma só das
diligências de prova que se impunham para tratar de apurar efectivamente toda a
verdade dos factos, “engonhou” o processo durante cerca de três anos e depois…
tratou de o arquivar! Mas também, depois do que o mesmíssimo Ministério Público
já tinha feito com casos como os dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, dos
swaps, das parcerias público-privadas, tal, infelizmente, já não era de todo de
estranhar…
A “reversão” da privatização da TAP
O certo, porém, é que, hoje,
já se sabe bastante mais acerca daquilo em que, na prática, consistiu não só o
acordo de venda de Junho de 2015 como, mais do que isso, o acordo chamado de
“reversão” da privatização da TAP (estabelecendo 45% do capital da TAP para a
Atlantic Gateway, 50% para o Estado e 5% para trabalhadores) que o governo de
António Costa celebrou em 2016 com a Atlantic Gateway, ou seja, com David
Neeleman (e com Humberto Pedroso, uma vez mais, apenas a dizer que sim). Ou
seja, vai-se percebendo cada vez melhor que é o mesmo Neeleman quem, desde
2015, efectivamente manda na TAP e que o grande negociador desta “solução” foi
o amigo de Costa, Lacerda Machado, devidamente premiado logo depois com um
lugar na administração da companhia!
Ficámos também a saber que,
mesmo tendo ficado a deter apenas 50% do capital social da empresa, por força
de um acordo parassocial mantido secreto, a gestão da TAP é afinal
exclusivamente da Atlantic Gateway e, havendo lucros, esta terá direito a 90%
dos mesmos (ainda que só detendo metade do capital), enquanto o Estado, maior
accionista, terá apenas 5% dos respectivos direitos económicos.
Mais! Com a dita recompra da
TAP, o Estado – que assim rigorosamente nada manda na gestão da empresa –
assumiu diversas e gravosas obrigações: desde logo, e perante a banca, a
garantia da dívida financeira da empresa, no valor de 615 milhões de euros;
depois, a obrigação de garantir que os capitais próprios da TAP não sejam
inferiores a -571,3 milhões de euros, sendo o Estado o único responsável pela
capitalização sempre que os referidos capitais próprios desçam abaixo do limite
mínimo assim definido; e, finalmente, a obrigação de assegurar a substituição
da Atlantic Gateway na realização de prestações acessórias.
Como se não bastasse o valor
ridículo e ruinoso da venda da TAP em 2015 (150 milhões de euros que, mesmo
assim, não entraram de todo nos cofres do Estado pois foram integralmente
destinados ao reforço do capital da empresa), a farsa do novo acordo não
reverteu coisa nenhuma da lógica e do essencial do primitivo negócio:
compromissos e obrigações para o Estado português (ou seja, para os bolsos de
todos nós) e vantagens, prémios e lucros para os bolsos do Sr. Neeleman, da sua
empresa e dos seus amigos.
A sucessiva deterioração da TAP
Sob a gestão num primeiro
momento ainda de Fernando Pinto e depois do Sr. Antonoaldo Neves, a TAP foi
sendo completamente vampirizada pela Azul, que a usou desde logo para aceder a
rotas de que não dispunha (designadamente de e para a Europa e a África) e em
que, por si, não conseguia entrar. Depois, também serviu para, sob a capa da cedência
à TAP de inúmeras aeronaves da Azul (cuja frota estava então quase toda
parada), esta vir pôr essas aeronaves a fazerem as respectivas, e altamente
dispendiosas, operações de manutenção a cargo da TAP, para logo depois as
recuperar com essas operações feitas “à borla”.
Mais! Foi também noticiado – e
nunca desmentido pelos próprios – que terá sido a Airbus a disponibilizar a
Neeleman o dinheiro necessário (70 milhões de euros) para ele concorrer à
privatização da TAP, em contrapartida do compromisso de, conseguindo o mesmo
Neeleman ficar com ela, como ficou, adquirir depois à mesma Airbus dezenas e
dezenas de aeronaves A320 e A330 (em vez de uma encomenda inicial de 12 aviões
A350 já paga pela TAP).
Assim, o Sr. Neeleman pôde
comprar a TAP com dinheiro que não era dele, mas sim da própria TAP e
disponibilizado pela Airbus a título de “desconto” no preço das prometidas
compras de novos aviões cuja aquisição tem, efectivamente, vindo a acontecer,
mas em escala cada vez maior, gerando para a TAP obrigações financeiras
verdadeiramente incomensuráveis[3].
Assim, o mesmo Sr. Antonoaldo
Neves, que se gaba de, em 2019, a TAP ter ao serviço 105 aeronaves (número
considerado pelos especialistas como manifestamente exagerado para a dimensão
da companhia e para as necessidades reais dos voos que estrategicamente lhe
deveria interessar realizar) e que “engaiola” um número cada vez maior de
passageiros em aviões com cada vez menos conforto para os passageiros e com
cada vez piores condições de trabalho para os tripulantes, é o mesmo que se
“esquece” de informar qual o custo da aquisição daquelas mesmas aeronaves
(cerca de 1 milhão de euros mensais por cada avião) e como é que esse custo vai
ser afinal suportado e por quem.
Os prémios da administração
E é ainda este mesmo
personagem que, do mesmo passo que vai acumulando enormes prejuízos (de 118
milhões de euros em 2018 e, apesar de todas as promessas, de 105,6 milhões de
euros em 2019), vai decidindo e distribuindo fabulosos prémios por si próprio,
pelos seus amigos da administração, a começar por Abílio Martins, administrador
da Área Financeira e homem de mão de Zeinal Bava e Miguel Relvas, e pelos
homens e mulheres da sua confiança, como já fez no ano passado e se prepara
para fazer de novo este ano[4].
O provocatório acinte desta
gente resulta de que ela bem sabe que, como os membros da Comissão de
Vencimentos e de qualquer dos órgãos sociais da TAP só podem ser substituídos
ou destituídos de funções pela maioria qualificada de 2/3 (66,7%) dos votos
representativos do capital social, maioria qualificada que o Estado não tem,
esses administradores e os seus amigos que lhes aprovam as remunerações e
prémios vão poder manter-se no “poleiro” até ao fim dos respectivos mandatos.
E, assim, é um autêntico “é
fartar vilanagem!” aquilo a que temos assistido, numa sucessão de
acontecimentos que são verdadeiramente criminosos, e não apenas do ponto de
vista dos interesses políticos, económicos e sociais do país, mas também e até
do ponto de vista criminal, não fora termos, também aqui, um Ministério Público
que, quando se chega a este tipo de criminalidade – que ele tanto diz combater…
– afinal não vê, não ouve e não fala nada.
Bolsos cheios, malas aviadas
E as mais que previsíveis consequências
de tudo isto aí estão já bem à vista: quando este autêntico saque terminar,
teremos uma companhia aérea absolutamente secundarizada e ultrapassada nos voos
internacionais e transformada numa mera companhia regional, numa espécie de
Portugália um pouco maior e, sobretudo, completamente endividada. E teremos
também um Estado a vir aos bolsos dos contribuintes para cumprir as tais
obrigações financeiras a que todos os governos dos últimos 30 anos, mas muito
em particular os da última década, e sempre nas nossas costas, trataram de nos
amarrar.
Entretanto, e aproximando-se a
hora do crash que este tipo de gestão torna cada vez mais inevitável, eis que
assistimos a um outro indecoroso (mas, em boa verdade, também previsível)
espectáculo: o Sr. Neeleman, bem mostrando uma vez mais que é ele quem manda na
Atlantic Gateway, trata de negociar a venda à Lufthansa dos 22,5% do… Sr.
Humberto Pedrosa (que, confessadamente, nem sequer falou ainda com a companhia
alemã porque quem disso trata é, claro, o dono da Azul…) por um montante de 180
milhões de euros, que pressupõe a avaliação da TAP em 800 milhões, ou seja,
quase seis vezes mais do que, há quatro anos atrás, os privados deram por ela!
E quando tiver decorrido o prazo de cinco anos durante o qual ele tem de se
manter como associado do consórcio Atlantic Gateway, o Sr. Neeleman também
decerto fará o mesmo e regressará então aos Estados Unidos com os bolsos ainda
mais cheios à culpa dos papalvos dos portugueses, iludidos e burlados cem
vezes…
A impunidade e a cumplicidade
A História julgará decerto
todos os executantes e beneficiários deste autêntico “golpe do baú” e, mais até
do que eles, os governantes e dirigentes responsáveis por ele ter podido ser
pensado, executado e mantido durante todos estes anos e anos a fio.
Mas a cumplicidade dos
silêncios ensurdecedores a este respeito é ainda mais revoltante.
Na verdade, porque é que, face
a esta ignomínia, ninguém, a começar pela Comissão de Trabalhadores e pelos
Sindicatos da TAP e a acabar nos partidos e organizações que se dizem de
esquerda ou, pelo menos, minimamente preocupados com o futuro do país, diz
rigorosamente nada sobre isto?
Perante o saque e a destruição
da TAP, antes de mais os seus próprios trabalhadores, mas também todos nós,
cidadãos em geral, ainda que aqueles que se dizem nossos representantes nada
digam e nada façam a este respeito, devemos arrogar-nos o direito, que é também
um dever, de dizermos “NÃO!” a todo este escândalo, de pormos cobro a este
roubo e de tudo fazermos para que todos os seus autores (que hoje se riem na
nossa cara) tenham que assumir as suas responsabilidades e pagar pelos seus
crimes!
António Garcia Pereira
[1] Em 2009, eles atingiram os
290 milhões de euros. Segundo as contas oficiais, e com todas as cosméticas
contabilísticas, os prejuízos foram de 42,2 milhões de euros em 2012, de 5,9
milhões de euros em 2013 e de 85,1 milhões de euros em 2014.
[2] Diogo Lacerda Machado foi
quadro e administrador da empresa Geocapital, Investimentos Estratégicos, SA,
com sede em Macau. Em 2005, a TAP e a Geocapital compraram a já então
semi-falida Varig, Engenharia e Manutenção (VEM) para, dois anos depois, a
Geocapital vender à TAP a sua participação no capital social da VEM por 25
milhões de dólares, ou seja, pelo valor de 21 milhões inicialmente previsto,
acrescido de um “prémio” de 20%, que foi para os bolsos de alguém. Depois de
ter sido nomeado consultor pelo Primeiro-Ministro António Costa e de ter
negociado o acordo com Neeleman e Humberto Pedroso, Lacerda Machado foi nomeado
vogal do Conselho de Administração da própria TAP.
[3] Em Abril de 2018, por
exemplo, foi tornado público pela própria TAP que a encomenda por ela feita à
Airbus de 71 (!?) novos aviões implicaria o custo de, pelo menos, 9.970,2 milhões
de euros, num custo médio por avião de mais de 140 milhões de euros. E em
Fevereiro de 2020 foi anunciada a chegada de dois aviões A-330 Neo, sendo
esperados mais dez até final do ano.
[4] Depois de, em Maio de
2019, e não obstante o gigantesco prejuízo de 2018 (118 milhões de euros), ter
decidido atribuir prémios no valor global de 1,171 milhões a apenas 180 dos
7000 trabalhadores da TAP, pagando, a título desses mesmos prémios, 110 mil
euros quer ao CEO Elton de Souza, quer ao administrador Abílio Martins, bem
como 88 mil euros ao Director Técnico Mário Lobato Faria e 17,8 mil euros à
Directora do Departamento Jurídico da TAP, e mulher do Presidente da Câmara de
Lisboa Fernando Medina, a administração da TAP, mesmo depois dos mais 105
milhões de euros de prejuízos em 2019, prepara-se para fazer algo similar em
2020, até encher os bolsos dos próprios administradores e seus amigos.
sábado, 6 de julho de 2019
«A NOVA ESCRAVIDÃO DA CLASSE TRABALHADORA» - ENTREVISTA COM PAUL CRAIG ROBERTS
"The reason Noam Chomsky and I can speak freely is because we don’t want anything from the establishment. We are not depended on them. If we were, we would be shut down. So, you have a situation in the West where there is hardly anybody who can afford to speak freely."
(A razão porque Noam Chomsky e eu próprio podemos falar livremente é porque não queremos nada do 'establishment'. Não estamos na sua dependência. Se fossemos dependentes deles, seriamos calados. Portanto, temos uma situação no Ocidente onde quase ninguém pode permitir-se falar livremente.)
Sobre o Prof. Paul Craig Roberts e seu pensamento:
Entrevistas de P. C. Roberts a Hanne Nabintu Herland:
domingo, 4 de março de 2018
Richard D. Wolff: UM SISTEMA MONTADO CONTRA OS TRABALHADORES
Talvez já tenha conhecimento dos factos, mas a sua clara enunciação não deixa de ser uma «lição» notável.
terça-feira, 29 de agosto de 2017
EXPLORAÇÃO ACRESCIDA E AUSÊNCIA DE SINDICATOS COMBATIVOS
Leiam reportagens saídas hoje, «neste momento sinto-me escrava» e «risco de escravatura moderna»
Notícias deste tipo são quotidianas e basta olhar à roda, perguntar a familiares ou amigos, para constatar que estas notícias, longe de serem alarmistas reflectem aquilo em que se transformou o mercado de trabalho.
Os sindicatos estão ausentes dos locais de trabalho; as direcções estão fechadas nos seus gabinetes ou a fazer tudo menos aquilo para que foram eleitas. Sim, não falham uma «manif» da CGTP, se forem convocadas... mas fazerem o trabalho quotidiano e ingrato...
A ausência de sindicalismo sério e de classe torna as situações narradas impossíveis de defesa do ponto de vista dos explorados. Os patrões têm em Portugal um paraíso porque o «sindicalismo» se confunde com a militância política, que NÃO É.
A anexação e subordinação dos sindicatos por partidos (sobretudo de «esquerda») tem as consequências que se podem observar. Ninguém da «sacro-santa» esquerda quer dar o braço a torcer e reconhecer isto: os sindicatos são órgãos da classe trabalhadora toda. Cativá-los para lutas políticas e desmobilizá-los das lutas laborais é uma traição muito grave.
A anexação e subordinação dos sindicatos por partidos (sobretudo de «esquerda») tem as consequências que se podem observar. Ninguém da «sacro-santa» esquerda quer dar o braço a torcer e reconhecer isto: os sindicatos são órgãos da classe trabalhadora toda. Cativá-los para lutas políticas e desmobilizá-los das lutas laborais é uma traição muito grave.
Só quando a nova geração tiver varrido práticas enquistadas nos sindicatos; só quando houver um grau de consciência de classe que lhes proíba fazer como seus antecessores, poderão as coisas mudar no campo sindical e laboral.
sexta-feira, 14 de julho de 2017
A ESCRAVIDÃO* DE QUE NÃO SE FALA
*[ A condição de escravo não implica que a exploração seja violenta, brutal, penosa, mas apenas que o trabalho não é remunerado, é uma obrigação do trabalhador, mas não do seu patrão. Este pode decidir dispensar o escravo quando quiser, pois não existe qualquer tipo de contrato.]
TRABALHO GRATUITO DE MESTRANDOS E DOUTORANDOS, PARA VANTAGEM DOS «MANDARINS» NA UNIVERSIDADE
Muitos estudantes de mestrado e de doutoramento são «obrigados na prática» a darem aulas gratuitas e mesmo a classificar trabalhos de alunos de licenciatura (ambas atividades que envolvem evidentes responsabilidades profissionais).
Existe legislação suficiente para caracterizar como criminosas estas práticas, aliás perfeitamente documentáveis. No entanto, nem os agentes do poder, nem mesmo o «contrapoder» dos sindicatos intervém. Porquê?
A cumplicidade ou conivência generalizada com um crime, a complacência com ele, torna-o ainda mais grave e hediondo.
É um comportamento criminoso perfeitamente consciente o uso abusivo do trabalho gratuito de estudantes. O mais notório caso é o de atividades docentes, para as quais se exige legalmente qualificação e reconhecimento específico.
Sem darem um combate eficaz a estas práticas, sem as exporem, de tal forma que os atuais beneficiários delas tenham vergonha e se inibam de continuar, não é credível que políticos declarem «que querem combater injustiças, trabalho precário», etc.
Combata-se já a exploração e o trabalho escravo e precário de milhares de estudantes na universidade.
Algumas pessoas dizem - e outras repetem - que «é o sistema» ou ainda que «instalou-se uma cultura»: isso são apenas desculpas lançadas pelos beneficiários do trabalho gratuito, eles próprios.
O facto de serem docentes universitários, não significa que tenham escrúpulos. Há pessoas que, quando atingem um certo estatuto, julgam que podem fazer praticamente o que quiserem e não ser incomodadas.
Julgam-se acima da lei; é exatamente um sistema feudal.
Julgam-se acima da lei; é exatamente um sistema feudal.
Mas num Estado de Direito isto é crime. Isto chama-se sobre-exploração / trabalho escravo / chantagem / assédio.
Em Portugal, não consegui obter reportagens sobre o assunto, o que não significa de modo nenhum que seja menos grave ou generalizado do que noutros sítios. Aqui, abaixo, deixo uma selecção de artigos que mostram várias facetas do problema.
Condição de escravo moderno:
Em Espanha, já a própria universidade reconhece em parte o problema:
Exploração miserável na Austrália:
Em França, estão organizados para combater este flagelo:
Em Portugal...nada! Se alguém, entretanto, souber de alguma notícia relativa ao assunto, peço me informe!
terça-feira, 25 de outubro de 2016
CRÓNICA DE UM CRIME SILENCIOSO
A
História da Segurança Social, a peça central do funcionamento do chamado Estado
Social, é desconhecida da maior parte das pessoas. Mesmo as pessoas com uma
formação cívica e política relativamente elevada têm falhas gritantes a esse
nível, tão essencial para a compreensão da nossa História coletiva. Certamente
não sou a pessoa mais indicada para retraçar essa História, que se poderia
fazer iniciar muito mais cedo, mas que em termos práticos, nos países da Europa
ocidental e América, se pode situar no pós-II Guerra Mundial.
Nestes
países, quer fossem vencedores, quer vencidos, ou mesmo «neutrais» como
Portugal, houve uma transformação das relações de trabalho e da relação dos
cidadãos com o Estado. Já não era possível o Estado ser indiferente ao que se
passava com os trabalhadores, com os pobres, com os doentes e inválidos, com os
idosos. O chamado Estado Social foi a resposta do «Ocidente» ao perigo
vermelho, ou seja, ao efeito sedutor da propaganda do socialismo «real» nos
países do bloco de Leste, conferindo direitos e condições de proteção social
inauditas do lado de cá da «cortina de ferro».
Houve
negociação com os sindicatos sobre toda uma série de assuntos, criando-se uma
ideia de «parceria»: o conceito de que os parceiros sociais poderiam entender-se, numa sociedade
onde o patronato e os trabalhadores teriam interesses contraditórios, por
vezes, mas compatíveis. O papel de «conciliador» caberia ao Estado e seus
representantes vistos como neutros, como «fiel da balança», etc. Esta ficção
convinha a uns e a outros, impedindo uma viragem dos trabalhadores para uma visão
revolucionária, contentando-se estes em reivindicar dentro do quadro
institucional.
Esta
política só começou a sofrer fraturas quando houve uma série de crises sistémicas
que abalaram a visão interclassista de «coesão nacional». Esse período ocorreu
na década que vai de 1968-69 a 1978-79, variando os momentos agudos de país
para país, mas no geral, em quase todos os países do «Ocidente» (e mesmo,
vários países do Pacto de Varsóvia) houve momentos de grande desestabilização
política e social nessa década.
A
resposta do capital internacional, que saiu vitorioso do confronto, foi logo a
partir de 1980 e não se fez esperar: desmantelamento programado do «Estado
Social», mas peça por peça… para não gerar convulsões.
Em
Portugal, com o 25 de Abril de 1974 houve, não só uma revolução política, como
também foram desmanteladas fatias importantes do tecido produtivo.
- O país foi
acumulando défices, que eram preenchidos, nos orçamentos sucessivos, com
receitas da Segurança Social, através de «empréstimos» mais ou menos avultados,
a juro muito inferior ao dos mercados. A reposição destas verbas forçadamente
emprestadas, era tardia e como o juro era irrisório, isso equivaleu a uma
descapitalização dos fundos próprios durante dezenas de anos. Recorde-se que, nalguns
anos, as taxas de inflação eram acima de 10 %; isto foi um dos fatores mais importantes
para socavar a sustentabilidade do modelo de Segurança Social,
herdado do regime de Salazar-Caetano.
- O outro fator foi a destruição programada
(pela entrada na então CEE) dum tecido produtivo frágil, mas do qual dependia a
sobrevivência da população portuguesa: destruição da agricultura, das pescas, da
pequena e média indústria. Os grandes interesses financeiros/industriais e as
grandes «coutadas» agrícolas reapareciam, mas numa perspetiva de saque, pondo
os despojos a salvo em «offshore», protegidos do olhar intencionalmente míope dos
governos …
A
proporção capital/trabalho, no que toca à sustentação do Estado, é
completamente desequilibrada neste país. Existe também esse desequilíbrio noutros
países; também noutros países as classes mais abastadas conhecem e usam todas
as artimanhas para diminuir legalmente impostos ou praticam fraudes. Mas
aqui, em Portugal, o que o Estado extrai sob forma de impostos, dos que
trabalham ou trabalharam, para alimentar o orçamento, é sem dúvida muito mais, proporcionalmente.
Costumo
dizer que o Estado Português sujeita o povo trabalhador a um regime de impostos
de nível semelhante ao da Suécia. Porém, para nosso infortúnio, a qualidade dos
serviços que o Estado presta em retorno aos cidadãos não corresponde - em nada - à do povo sueco! Em qualidade de serviços públicos, a população
portuguesa pode realisticamente ser colocada ao nível do «Terceiro Mundo».
Na
verdade, o Estado impõe esse pesado nível de impostos áqueles que não podem
fugir, fazendo a retenção obrigatória do IRS (Imposto sobre Rendimento de Singulares)
nos salários e pensões, tendo aí a base de sua receita.
A partir daí, não faz muito
esforço para ir buscar os impostos às empresas, aos acionistas, em especial à
banca. Porém, em caso de insolvência, os empresários e banqueiros podem contar com a
mão amiga do Estado, que irá recapitalizar – com os nossos impostos- os bancos
descapitalizados e mal geridos. É o modelo «assistencial» (ou «Welfare State») para
os ricos e o capitalismo mais inflexível para os pobres, em toda a sua
plenitude.
O
povo e os trabalhadores deste país devem tomar consciência de que a Segurança
Social é deles: Só poderão recuperar alguma dignidade e segurança económica se
não permitirem que o fruto do seu trabalho seja «gerido» por alguns
incompetentes ou criminosos, que nunca lhes prestam contas, que não lhe
devolverão nunca o devido!
A gestão da segurança social pelos próprios trabalhadores é possível: ela foi a
base do modelo, em vários países ocidentais, com participação dos sindicatos,
associações de reformados, etc.
Em Portugal, as «Caixas de Previdência» do
regime fascista de Salazar estavam nas mãos das «câmaras corporativas» e
portanto, nunca poderiam estar sob controlo dos trabalhadores.
Lamentavelmente, aquando
do 25 de Abril e anos subsequentes, perdeu-se a oportunidade das «Caixas
de Previdência» serem geridas pelos trabalhadores, através de seus legítimos
representantes.
Houve
preocupação de manter este manancial de dinheiro nas mãos de quem detivesse o
poder político, o governo. Os responsáveis da Segurança Social foram nomeados sempre
pelo poder político vigente, nunca foram eleitos pelos trabalhadores e
reformados.
Para
se conseguir mudar algo de significativo, terá de haver uma mudança profunda na
maneira como a população encara estes assuntos. A população portuguesa está muito alheada, para não dizer alienada do que se passa.
Ela terá de compreender que - de facto - a Segurança Social não é parte do governo, não é um ministério. Ela deveria ser devolvida ao povo, não privatizada, mas sim gerida por iniciativa e com participação do povo (através de sindicatos e outras associações). A Segurança Social, na verdade, é pertença dos trabalhadores ativos e reformados portugueses, tal como os capitais por ela geridos.
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