Mostrar mensagens com a etiqueta Carlos Seixas. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Carlos Seixas. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 10 de setembro de 2024

MÚSICA EM PORTUGAL NA SEGUNDA METADE DO SÉC. XVIII

Na sequência do artigo sobre Carlos Seixas, decidi publicar este breve comentário, sabendo que seria necessário aprofundar muito mais sobre os compositores abaixo citados, sobre as suas características próprias e sobre a sua época. Quero apenas assinalar o interesse deste património que se salvou, tanto do Terramoto de 1755, como das incúrias do tempo e da devastação causada pelos homens. É preciso ter em conta as invasões francesas no início do século XIX e a guerra civil que envolveu liberais e miguelistas, no início da década de1830. 

Muitas obras se perderam, com certeza, pelo que nunca poderemos ter uma amostragem realmente representativa das obras dos compositores abaixo mencionados. 

Uma fração deste património encontra-se no Brasil, ou em bibliotecas de vários países europeus. 


 Francisco António de Almeida

Oratória «La Giuditta» - Aria "Sento Che Dice Al Cor":

https://www.youtube.com/watch?v=P4KWuIAh5TM


https://www.youtube.com/watch?v=aWHRJhVyHrU&list=PL5pgcJAzjI0uyiO1RCAv3KCurL_TG9PJi&index=5

Francisco António de Almeida foi um dos bolseiros enviados para estudar música em Roma, no reinado de João V. Apesar dele ter sido nomeado organista da Capela Real e da Sé Patriarcal, aquando do seu regresso a Portugal em 1726 e de ter sido professor de cravo da infanta Dona Bárbara (tal como Domenico Scarlatti), não lhe são conhecidas obras para órgão ou cravo. 

 Suas obras religiosas vocais e óperas são conhecidas, gravadas e executadas em concerto

.


Francisco Xavier Baptista

Francisco Xavier Baptista  compositor de sonatas para tecla, no final do século XVIII, muito ao gosto «rococó», que tanto podem ser executadas no cravo como no forte-piano. É interessante comparar as sonatas de Francisco Xavier Baptista com as de Carlos Seixas: No meio-século que medeia entre elas, há continuidade; Carlos Seixas foi bem conhecido dos músicos da segunda metade do século XVIII. 


João de Souza Carvalho

                        João Souza Carvalho: Abertura de «l'Amore Industrioso»

É este compositor considerado o mais importante da segunda metade do Séc. XVIII (1745-1798). As suas obras para cravo (ou pianoforte) assim como as suas óperas são frequentemente executadas em concertos e têm sido gravadas em discos.


                          João de Souza Carvalho: Sonata em Fá Maior - Allegro




segunda-feira, 9 de setembro de 2024

CARLOS SEIXAS - OBRAS PARA INSTRUMENTOS DE TECLADO (Segundas-f. musicais, nº16)





Carlos Seixas, músico do barroco, é de muitos conhecido em Portugal e também se tornou foco de interesse de musicólogos, instrumentistas e amadores de música internacionais.

A «redescoberta» da música de Carlos Seixas deve-se, quase exclusivamente, ao Prof. Macário Santiago Kastner. Ele transcreveu as Sonatas a partir de documentos manuscritos e fez estudos estilísticos e comparativos. Assinalou, desde os primeiros estudos, a originalidade de Seixas. Sublinhou que Seixas adaptara a sonata (ou toccata) bipartida, ao gosto e ao sentir lusitano. O Prof. Kastner iniciou seus trabalhos de musicólogo em Portugal nos anos 30 do século passado, tendo-se dedicado à musicologia, ao ensino e à divulgação da música antiga, até aos anos 1980.
Graças aos seus estudos, não apenas a música de Seixas começou a ser estudada e apreciada, como a de outros compositores portugueses dos séculos passados. Nomeadamente, tornaram-se conhecidos, pelos seus estudos: António Carreira (séc. XVI), Manuel Rodrigues Coelho (Séc. XVI-XVII) e Pedro de Araújo (Séc. XVII), importantes compositores de música para tecla dos séc. XVI e XVII.


Música de tecla nos séc. XVII-XVIII

Importância do clavicórdio

Portugal, embora fosse uma potência europeia e mundial importante na época, estava fortemente dependente da Igreja Católica para todos os aspetos da instrução, assim como das artes. A arte dos sons não era exceção, pelo que raras são as expressões de música profana anteriores ao século XVIII, que tenham chegado aos nossos dias. A música sacra, direta ou indiretamente relacionada com os ofícios religiosos predominava. Os arquivos das Sés (catedrais) e as bibliotecas dos mosteiros recolhiam a maior parte dos manuscritos musicais.
A música que se fazia nos mosteiros estava relacionada com o manicórdio (ou clavicórdio), um instrumento de corda e tecla, de som delicado, muito utilizado como instrumento de estudo. Nos conventos, era frequente os religiosos possuírem um clavicórdio nas suas celas. Este instrumento não tinha o som estridente da espineta; possuía um som muito suave, que não atravessava as espessas paredes das celas conventuais.
Assim, no final do século 17, princípio do século 18, um organista na tradição do pai de Seixas, devia praticar no clavicórdio, para treino ou para compor peças destinadas ao órgão.

                  https://www.youtube.com/watch?v=VRoldp 

O órgão ibérico

O órgão ibérico era geralmente possuidor dum único teclado e não tinha pedaleira. Alguns órgãos possuíam dois teclados, mas eram pouco frequentes. Suas características são completamente diferentes dos órgãos do Centro e Norte da Europa. Não apenas pela riqueza em registos de palhetas, incluindo trombetas horizontais, mas também pela divisão do teclado. Uma peça polifónica típica tem cruzamentos de vozes, acima ou abaixo da linha mediana do «teclado partido». Somente uma escolha de registos muito simples, utilizando só um ou dois registos idênticos, para cada metade, permitirá a homogeneidade sonora, indispensável para as peças polifónicas. Um compositor de obras para órgão tinha de ter em conta que as peças seriam tangidas em órgãos com as limitações atrás enunciadas.

Elementos biográficos sobre Seixas

Sendo Carlos Seixas filho de Francisco Vaz, organista titular da Sé de Coimbra (que morreu quando Seixas tinha somente 14 anos), o cargo de organista titular da Sé foi assumido pelo adolescente. Mas, depressa se despediu da sua Coimbra natal. Foi para Lisboa aos 16 anos, procurando aí obter um lugar como músico da corte.

Há uma certa lenda em torno do encontro de Seixas com Domenico Scarlatti, o qual exercia o cargo de Mestre de Capela Real e professor particular da Infanta Dona Bárbara (depois, Rainha de Espanha). O certo, é que o jovem Carlos Seixas agradou ao ilustre Mestre Scarlatti. Penso que Scarlatti terá recomendado ao monarca que o jovem talentoso assumisse o posto de organista da Capela Real e, por extensão, da Sé de Lisboa. 

 
Órgão ibérico, na Sé do Porto

Alguns elementos da biografia de Carlos Seixas são conhecidos. Porém,  subsistem muitas lacunas, apesar da sua vida ter sido curta. Seixas morreu com 38 anos, apenas.

NB: Não é diminuir o valor da obra de Carlos Seixas, inseri-la no contexto do Reinado de D. João V, o qual foi, sem dúvida, um grande patrono da música. O Rei português pagou os estudos musicais, através de bolsas, a músicos jovens portugueses, em Roma e Nápoles, que se tornaram depois célebres nos finais do reinado de D. João V e no reinado de D. José I.
D. João V promoveu a introdução da ópera italiana em Portugal, tendo contratado vários músicos italianos (e outros estrangeiros) para integrar a Capela Real. É certo que, se Seixas aproveitou o ambiente generoso do Rei e da Corte para a arte dos sons, o reconhecimento do seu talento foi genuíno. Ele tinha concorrência de vários músicos estrangeiros que acorreram ao Reino.



Composições para instrumentos de tecla 

Seu catálogo pode parecer reduzido, à primeira vista: Cerca de 120 obras para tecla (apenas uma dúzia explicitamente para órgão), um Concerto para cravo e orquestra de cordas, uma "Overture", uma Sinfonia, uma Missa e alguns Motetes. Porém, é preciso ter em conta a destruição de muitos livros e documentos únicos nos incêndios de bibliotecas, em consequência do Grande Terremoto de 1755*.
De facto, temos de avaliar sua produção a partir das peças que chegaram até nós. As suas composições para tecla são, em geral, de qualidade acima da média, se comparadas com outras, da mesma da altura.
Seixas escreve num estilo galante e não recorre a imbricada polifonia. Só numa peça recorre ao contraponto imitativo, uma fuga para órgão. As sonatas são, geralmente, a duas vozes, sendo a voz do baixo, o sustentáculo harmónico.
A sua escrita tem a ver, por um lado, com a assimilação do estilo italiano: Na Itália, a música não litúrgica abandonara há muito o contraponto rigoroso, em particular, as tocatas e fantasias para órgão ou cravo**. 
Por outro lado, tal escrita tem um lado prático, visto que muitas das Sonatas de Seixas, tanto podem ser executadas em instrumentos de tecla encordoados (cravo, clavicórdio, pianoforte), como no órgão.


---------------------------
Relacionado: 

A Profª. Cremilde Rosado Fernandes gravou Sonatas de Carlos Seixas no forte-piano. Sabe-se que no reinado do D. João V foram importados de Itália «cravos de martelos», os forte-pianos.

Imaginei uma cena de encontro com o jovem Carlos Seixas, que me convidou a assistir a um sarau em Lisboa, numa casa da alta nobreza: 
-------------------
notas
* São fontes importantes de obras de Carlos Seixas vários manuscritos posteriores à morte do compositor (1742), que sobreviveram ao terramoto de 1755, ou que foram transcritos após este terramoto, contendo também sonatas doutros autores. Estes manuscritos são datáveis da segunda metade e alguns, mesmo, dos finais do século XVIII. Isto prova que as composições de Seixas continuaram a ser populares, para além do tempo em que viveu.

**Nos finais do século XVII, em Espanha e Portugal, a escrita contrapontística ainda predominava em Tentos, Fantasias e Obras, semelhantes às composições do século XVI, embora se notem evoluções.

terça-feira, 9 de abril de 2019

MÚSICA PARA TECLA - PORTUGAL E BRASIL, SÉC. XVIII-XIX


A qualidade da interpretação de Marcelo Fagerlande, numa espineta conservada no museu imperial de Petropólis, é das mais elevadas e corresponde aos critérios estilísticos e musicológicos adequados para esta música.
Por sinal, esta música é muito sensual e penetra muito facilmente no ouvido, pelo que as jovens gerações poderão praticá-la - no cravo ou no pianoforte - com imenso prazer e proveito, em paralelo com obras de J.S. Bach ou  Rameau... 
O estilo galante, que se ouve nesta gravação, era mais adequado ao temperamento meridional e tropical de portugueses e brasileiros, do que a austera ciência contrapontística do norte europeu.

Oiçam o delicioso Minueto em fá menor e digam-me se não soa muito como fado? A mim soa-me como tal, por mais que eu saiba que isto é um anacronismo, visto que só terá havido «fado» propriamente dito, de meados do século XIX em diante, mais de cem anos depois de Carlos Seixas. Porém, os ingredientes estavam lá: nas formas eruditas e populares, no sentimento da plebe e da aristocracia e, sobretudo, na forma como exprimiam esses mesmos sentimentos.

Um álbum cheio de sonoridades surpreendentes...

Carlos Seixas (1704-1742) - Sonata nº 37 - Sonata nº 27 - Minueto em fá menor
Francisco Xavier Bachixa (?-1787) - Sonata em ré maior
José Maurício Nunes Garcia (1767-1830) - Fantasia nº 2, Lições nº 11 e 12
João de Souza Carvalho (1745-1798) - Toccata em sol menor
Luís Alvares Pinto (1719-1779) - Lições de Solfejos nº XXII, XXII e XXIV
Francisco Xavier Baptista (?-1797) - Sonata II em sol maior

terça-feira, 13 de novembro de 2018

CARLOS SEIXAS - SONATAS

Interprete: Cremilde Rosado Fernandes

               


Sonata XIX Em Ré Menor: Moderato - 0:00
Sonata XIX Em Ré Menor: Minuet - 4:03
Sonata VII Em Ré Menor - 6:27
Sonata XXVII Em Lá Maior - 10:19
Sonata XXII Em Mi Menor: Allegro - 14:09
Sonata XXII Em Mi Menor: Adagio - 16:21
Sonata XXII Em Mi Menor: Minuet - 17:58
Sonata XXVIII Em Lá Menor: Allegro - 19:10
Sonata XXVIII Em Lá Menor: Minuet - 22:00
Sonata V Em Ré Menor: Moderato - 23:34
Sonata V Em Ré Menor: Minuet - 29:02
Sonata 43 Em Fá Menor - 30:18
Sonata 44 Em Fá Menor - 34:43
Sonata XVII Em Dó Menor: Andante - 39:24
Sonata XVII Em Dó Menor: Minuet - 45:52
Sonata II Em Dó Maior - 47:34
Sonata VI Em Ré Menor: Allegro - 54:17
Sonata VI Em Ré Menor: Adagio - 57:46
Sonata VI Em Ré Menor: Minuet - 59:13


Carlos Seixas, um dos nomes mais conhecidos da música barroca portuguesa é, na verdade, muito pouco conhecido... 
Sem dúvida, foi celebrado em vida, durante a curta vida, em que lutou para obter o título de «Cavaleiro» que lhe permitia entrar na corte e assegurar o futuro das suas filhas. Filho de um organista de Coimbra, cedo ficou órfão e teve de procurar sustento em Lisboa. 
Caiu nas boas graças do rei D. João V, que nessa altura tinha o grande Domenico Scarlatti ao seu serviço. Muito influenciado teria sido o Rei por Scarlatti, o mestre de música da Infanta Bárbara e futura rainha de Espanha. 
D. João V enviou a Roma e a Nápoles vários músicos para se aperfeiçoarem na música italiana, então favorecida na corte portuguesa e em todas as cortes europeias.

Apesar do italianismo reinante, Seixas tem uma forma de compor as sonatas que, embora reminiscente da escrita de Scarlatti, é por demais distante, para que se possa dizer que o português tomou como modelo o italiano. Nomeadamente, as sonatas seixianas, numa forte proporção, possuem vários movimentos, tal como a sonata XXII aqui reproduzida, que se inicia com um Allegro, na forma da sonata bipartita típica das escolas italo-ibéricas, continua com um adágio e finaliza com um menuet, peça típica do gosto francês.

O fortepiano, presente nas casas mais ricas da corte, proveniente de Itália, é conveniente para interpretar esta música, toda ela em subtileza, tal como é apropriada no clavicórdio, instrumento mais modesto e presença banal nos lares burgueses ou nas celas conventuais, nessa época. 

Santiago Macário Kastner, o musicólogo descobridor e primeiro editor destas Sonatas, costumava dizer que a música de Carlos Seixas flui como água de nascente. Dizia sobre a qualidade destas peças que elas eram como um cofre cheio de pedras preciosas: muitas maravilhosas e perfeitas, porém algumas tendo um pouco de «jaça» (aquela imperfeição ou impureza nas pedras preciosas, que lhes diminui o valor). 
Muitas peças de Seixas são de uma sensibilidade muito para lá da época, ou seja, anunciam o final do barroco, o estilo chamado «rococó», presente na música para tecla de Carl Philip Emmanuel Bach. 
Como exemplo, oiça-se a sonata XVII Em Dó Menor, com uma sensibilidade e um estilo que poderiam passar perfeitamente por composição das últimas décadas do século XVIII, da época pré-romântica.
Aliás, foram copiadas e executadas estas sonatas de Seixas, muito tempo depois da sua morte, o que - de certa maneira - apoia tal juízo.

A Professora Cremilde Rosado Fernandes, musicóloga eminente discípula do Prof. Kastner, é uma das mais conceituadas interpretes e mestras do cravo e do fortepiano, tendo leccionado na Escola Superior de Música de Lisboa (da qual foi Directora). Além de várias gravações discográficas, participou em recitais a solo ou com orquestra, em inúmeras ocasiões, em Portugal e no estrangeiro.