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sábado, 8 de outubro de 2022

FRANCISCO CORREA DE ARAÚXO E A MÚSICA IBÉRICA NO SÉCULO XVII


A ideia de que a Península Ibérica não trouxe nenhum compositor notável, antes do século XIX, é totalmente falsa e fabricada. Na verdade, avaliando por aquilo que se salvou dos desastres naturais ou provocados por humanos, põe-se em evidência uma arte dos sons requintada,  com tradições e escolas diversificadas, sinal de maturidade e sofisticação.

A Península Ibérica, na música para órgão (e outros instrumentos de tecla, como o cravo e clavicórdio) pode mesmo reivindicar uma grande precocidade, em relação a outras escolas europeias. Pode dizer-se que - desde cedo - a Península Ibérica esteve aberta e teve conhecimento da música que se fazia na Europa. A tradição ibérica  recebeu influências e ela própria influenciou as escolas europeias, nomeadamente, da Itália, da França, dos Países Baixos, da Inglaterra. 

Gosto especialmente de Francisco Correa de Araúxo. Em Portugal, um eminente  musicólogo muito fez para dar a conhecer a obra de Araúxo, o Prof. Macário Santiago Kastner

O mestre organista de Sevilha deixou uma obra monumental que é um repositório dos processos de composição que eram aplicados, no seu tempo, à música para órgão. 

O órgão ibérico tem a particularidade de apresentar com frequência um teclado «partido», ou seja, a metade mais grave tem um conjunto de registos, e a metade mais aguda, outro conjunto.  Assim, é possível fazer vozes solistas, graves ou agudas, sem ter as dimensões bem maiores em tubaria e com vários teclados, que já nessa época (séc. XVII) caracterizavam os órgãos das catedrais e igrejas importantes do Norte da Europa. O «tiento de medio-registro», tornou-se, com as "Batalhas" e os "tientos de Falsas" ( = com cromatismos e dissonâncias),  uma forma quase exclusiva da literatura para órgão ibérica. 


Claro que a música de Araúxo, embora de excecional qualidade, estava inserida na grande tradição coral polifónica, tanto em Portugal como em Espanha. Muitos outros, seus antecessores e contemporâneos, participaram no florescimento da música para tecla (sobretudo órgão). Os séculos XVI e XVII, são ricos em grandes compositores para órgão, tanto em terras de Portugal (António Carreira, Manuel Rodrigues Coelho, Pedro de Araújo...), como de Espanha (António de Cabezón, Sebastián Aguiler de Heredia, Pablo Bruna, Juan Cabanilles...). 

A música ibérica no século XVIII foi demasiado «seguidora» das modas de além Pirinéus, sobretudo de França e de Itália. Embora alguns traços ibéricos típicos se conservem, a música italiana tornou-se a referência: Os monarcas e as cortes de ambos os países importavam músicos italianos (Domenico Scarlatti, é o mais famoso); as óperas eram ao gosto italiano. Assim, a grande tradição ibérica de música para órgão não teve o desenvolvimento, ou a continuidade da tradição, que o século anterior prometia. 

De qualquer maneira, o legado da música de órgão ibérica, foi redescoberto no século XX. Atualmente, organistas profissionais de todo o mundo incluem nos seus discos e programas de recitais para órgão os compositores ibéricos dos séculos XVI e XVII. Entre eles, destaca-se (justamente) Francisco Correa de Araúxo.

terça-feira, 13 de novembro de 2018

CARLOS SEIXAS - SONATAS

Interprete: Cremilde Rosado Fernandes

               


Sonata XIX Em Ré Menor: Moderato - 0:00
Sonata XIX Em Ré Menor: Minuet - 4:03
Sonata VII Em Ré Menor - 6:27
Sonata XXVII Em Lá Maior - 10:19
Sonata XXII Em Mi Menor: Allegro - 14:09
Sonata XXII Em Mi Menor: Adagio - 16:21
Sonata XXII Em Mi Menor: Minuet - 17:58
Sonata XXVIII Em Lá Menor: Allegro - 19:10
Sonata XXVIII Em Lá Menor: Minuet - 22:00
Sonata V Em Ré Menor: Moderato - 23:34
Sonata V Em Ré Menor: Minuet - 29:02
Sonata 43 Em Fá Menor - 30:18
Sonata 44 Em Fá Menor - 34:43
Sonata XVII Em Dó Menor: Andante - 39:24
Sonata XVII Em Dó Menor: Minuet - 45:52
Sonata II Em Dó Maior - 47:34
Sonata VI Em Ré Menor: Allegro - 54:17
Sonata VI Em Ré Menor: Adagio - 57:46
Sonata VI Em Ré Menor: Minuet - 59:13


Carlos Seixas, um dos nomes mais conhecidos da música barroca portuguesa é, na verdade, muito pouco conhecido... 
Sem dúvida, foi celebrado em vida, durante a curta vida, em que lutou para obter o título de «Cavaleiro» que lhe permitia entrar na corte e assegurar o futuro das suas filhas. Filho de um organista de Coimbra, cedo ficou órfão e teve de procurar sustento em Lisboa. 
Caiu nas boas graças do rei D. João V, que nessa altura tinha o grande Domenico Scarlatti ao seu serviço. Muito influenciado teria sido o Rei por Scarlatti, o mestre de música da Infanta Bárbara e futura rainha de Espanha. 
D. João V enviou a Roma e a Nápoles vários músicos para se aperfeiçoarem na música italiana, então favorecida na corte portuguesa e em todas as cortes europeias.

Apesar do italianismo reinante, Seixas tem uma forma de compor as sonatas que, embora reminiscente da escrita de Scarlatti, é por demais distante, para que se possa dizer que o português tomou como modelo o italiano. Nomeadamente, as sonatas seixianas, numa forte proporção, possuem vários movimentos, tal como a sonata XXII aqui reproduzida, que se inicia com um Allegro, na forma da sonata bipartita típica das escolas italo-ibéricas, continua com um adágio e finaliza com um menuet, peça típica do gosto francês.

O fortepiano, presente nas casas mais ricas da corte, proveniente de Itália, é conveniente para interpretar esta música, toda ela em subtileza, tal como é apropriada no clavicórdio, instrumento mais modesto e presença banal nos lares burgueses ou nas celas conventuais, nessa época. 

Santiago Macário Kastner, o musicólogo descobridor e primeiro editor destas Sonatas, costumava dizer que a música de Carlos Seixas flui como água de nascente. Dizia sobre a qualidade destas peças que elas eram como um cofre cheio de pedras preciosas: muitas maravilhosas e perfeitas, porém algumas tendo um pouco de «jaça» (aquela imperfeição ou impureza nas pedras preciosas, que lhes diminui o valor). 
Muitas peças de Seixas são de uma sensibilidade muito para lá da época, ou seja, anunciam o final do barroco, o estilo chamado «rococó», presente na música para tecla de Carl Philip Emmanuel Bach. 
Como exemplo, oiça-se a sonata XVII Em Dó Menor, com uma sensibilidade e um estilo que poderiam passar perfeitamente por composição das últimas décadas do século XVIII, da época pré-romântica.
Aliás, foram copiadas e executadas estas sonatas de Seixas, muito tempo depois da sua morte, o que - de certa maneira - apoia tal juízo.

A Professora Cremilde Rosado Fernandes, musicóloga eminente discípula do Prof. Kastner, é uma das mais conceituadas interpretes e mestras do cravo e do fortepiano, tendo leccionado na Escola Superior de Música de Lisboa (da qual foi Directora). Além de várias gravações discográficas, participou em recitais a solo ou com orquestra, em inúmeras ocasiões, em Portugal e no estrangeiro.

quinta-feira, 9 de agosto de 2018

REPORTÓRIO PARA O CLAVICÓRDIO (SEC.XVI - SEC. XVIII )

Apresento aqui duas excelentes gravações, por interpretes de grande erudição e qualidade musical: S.M. Kastner e M. Thomas. 
Ambas, permitem-nos avaliar a subtileza e versatilidade do clavicórdio.  

O clavicórdio, um instrumento de tecla hoje pouco cultivado  e apreciado, foi o mais popular instrumento de tecla e corda na península Ibérica, até aos finais do século XVIII. Havia uma grande abundância de oficinas de construção de clavicórdios, nesta época. A construção de cravos, pelo contrário, nunca foi muito desenvolvida. Somente as casas mais ricas os possuíam. Eram instrumentos caros, normalmente importados de Itália. 
A Escola de Tecla Ibérica está representada em disco mas, sobretudo, em gravações no órgão ou no cravo. 
Existem poucas gravações no clavicórdio dos compositores portugueses António Carreira e Manuel Rodrigues Coelho, ou dos castelhanos Cabezón e Correa de Araúxo,  como no histórico disco abaixo, com interpretação pelo musicólogo Santiago Macário Kastner.  

                                


A popularidade deste instrumento foi grande, não só na península Ibérica. Houve até uma moda do clavicórdio do Norte da Europa, na segunda metade do século XVIII. 
Muito do que é hoje tido como literatura para cravo, foi realmente composto e executado ao clavicórdio; existem evidências claras disso.
O disco de Michael Thomas apresenta obras de J. S. Bach especialmente adequadas para execução neste instrumento. Sabe-se que Bach possuía vários clavicórdios, um deles com pedaleira. Seu filho, Carl Philip Emmanuelmestre de capela na corte de Frederico da Prússia, foi um excelente compositor e intérprete deste instrumento. Deixou um tratado sobre como interpretar a música de tecla - « Versuch über die wahre Art das Clavier zu Spielen» - cujo conteúdo se aplica perfeitamente ao clavicórdio.