Carlos Seixas, um dos nomes mais conhecidos da música barroca portuguesa é, na verdade, muito pouco conhecido...
Sem dúvida, foi celebrado em vida, durante a curta vida, em que lutou para obter o título de «Cavaleiro» que lhe permitia entrar na corte e assegurar o futuro das suas filhas. Filho de um organista de Coimbra, cedo ficou órfão e teve de procurar sustento em Lisboa.
Caiu nas boas graças do rei D. João V, que nessa altura tinha o grande Domenico Scarlatti ao seu serviço. Muito influenciado teria sido o Rei por Scarlatti, o mestre de música da Infanta Bárbara e futura rainha de Espanha.
D. João V enviou a Roma e a Nápoles vários músicos para se aperfeiçoarem na música italiana, então favorecida na corte portuguesa e em todas as cortes europeias.
Apesar do italianismo reinante, Seixas tem uma forma de compor as sonatas que, embora reminiscente da escrita de Scarlatti, é por demais distante, para que se possa dizer que o português tomou como modelo o italiano. Nomeadamente, as sonatas seixianas, numa forte proporção, possuem vários movimentos, tal como a sonata XXII aqui reproduzida, que se inicia com um Allegro, na forma da sonata bipartita típica das escolas italo-ibéricas, continua com um adágio e finaliza com um menuet, peça típica do gosto francês.
O fortepiano, presente nas casas mais ricas da corte, proveniente de Itália, é conveniente para interpretar esta música, toda ela em subtileza, tal como é apropriada no clavicórdio, instrumento mais modesto e presença banal nos lares burgueses ou nas celas conventuais, nessa época.
Santiago Macário Kastner, o musicólogo descobridor e primeiro editor destas Sonatas, costumava dizer que a música de Carlos Seixas flui como água de nascente. Dizia sobre a qualidade destas peças que elas eram como um cofre cheio de pedras preciosas: muitas maravilhosas e perfeitas, porém algumas tendo um pouco de «jaça» (aquela imperfeição ou impureza nas pedras preciosas, que lhes diminui o valor).
Muitas peças de Seixas são de uma sensibilidade muito para lá da época, ou seja, anunciam o final do barroco, o estilo chamado «rococó», presente na música para tecla de Carl Philip Emmanuel Bach.
Como exemplo, oiça-se a sonata XVII Em Dó Menor, com uma sensibilidade e um estilo que poderiam passar perfeitamente por composição das últimas décadas do século XVIII, da época pré-romântica.
Aliás, foram copiadas e executadas estas sonatas de Seixas, muito tempo depois da sua morte, o que - de certa maneira - apoia tal juízo.
A Professora Cremilde Rosado Fernandes, musicóloga eminente discípula do Prof. Kastner, é uma das mais conceituadas interpretes e mestras do cravo e do fortepiano, tendo leccionado na Escola Superior de Música de Lisboa (da qual foi Directora). Além de várias gravações discográficas, participou em recitais a solo ou com orquestra, em inúmeras ocasiões, em Portugal e no estrangeiro.