quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

[Manlio Dinucci] A China e não só o Irão, sob fogo no Médio Oriente

[Nota de Manuel Banet: também Federico Pieraccini refere a importância do papel da China, que explicaria a decisão, do «Estado profundo» americano, de assassinar Soleimani. Mas, Pieraccini refere também que o primeiro-ministro do Iraque estava a ser fortemente pressionado por Trump devido a ter adjudicado a reparação da rede eléctrica iraquiana aos chineses. Incapaz de conter o deslizar em direcção à China do Irão, Iraque, Síria, e até a Turquia e a Arábia Saudita, Washington opta por semear o caos na região, que já não consegue dominar]
                         

FRANÇAIS ITALIANO PORTUGUÊS
O assassínio do General iraniano Soleimani autorizado pelo Presidente Trump desencadeou uma reacção em cadeia que se propaga para além da região do Médio Oriente. Esse objectivo estava nas intenções daqueles que decidiram esse acto. Soleimani estava sob a mira dos Estados Unidos há muito tempo, mas os Presidentes Bush e Obama não haviam autorizado a sua morte. Por que é que o Presidente Trump o fez? Há vários motivos, incluindo o interesse pessoal do Presidente em salvar-se do ‘impeachment’, apresentando-se como um firme defensor da América diante de um inimigo ameaçador. O motivo fundamental da decisão de assassinar Soleimani, tomada pelo ‘Estado Profundo’ antes da Casa Branca, deve ser procurado num factor que se tornou crítico para os interesses dos EUA só nos últimos anos: a progressiva presença económica chinesa, no Irão.
O Irão desempenha um papel de primeira importância na Nova Rota da Seda, lançada em Pequim em 2013, numa fase avançada de realização: ela consiste numa rede rodoviária e ferroviária entre a China e a Europa através da Ásia Central, do Médio Oriente e da Rússia, combinada com uma rota marítima através do Oceano Índico, do Mar Vermelho e do Mediterrâneo. Para as infraestruturas rodoviárias, ferroviárias e portuárias em mais de 60 países, estão previstos investimentos de mais de 1 trilião de dólares. Neste contexto, a China está a efectuar um investimento no Irão, de cerca de 400 biliões de dólares: 280 na indústria petrolífera, do gás e da petroquímica; 120 em infraestruturas de transporte, incluindo oleodutos e gasodutos. Prevê-se que estes investimentos, realizados num período de cinco anos, sejam renovados sucessivamente.
No sector energético, a China National Petroleum Corporation, sociedade de propriedade estatal, recebeu do governo iraniano um contrato para o desenvolvimento da jazida ‘offshore’ de South Pars, no Golfo Pérsico, a maior reserva de gás natural do mundo. Além do mais, juntamente com outra empresa chinesa, a Sinopec (três quartos da mesma são propriedade estatal), está empenhada em desenvolver a produção dos campos petrolíferos de West Karoun. Desafiando o embargo USA, a China está a aumentar as importações de petróleo iraniano. Ainda mais grave para os USA é que, nesses e noutros acordos comerciais entre a China e o Irão, prevê-se o uso crescente do renminbi chinês e de outras moedas, excluindo cada vez mais o dólar.
No sector dos transportes, a China assinou um contrato para a electrificação de 900 km das linhas ferroviárias iranianas, como parte de um projecto que prevê a electrificação de toda a rede até 2025 e, provavelmente, também assinará um para uma linha de alta velocidade de mais de 400 km. As linhas ferroviárias iranianas estão ligadas à estrutura ferroviária de 2.300 km que, já a funcionar entre a China e o Irão, reduz o tempo de transporte de mercadorias para 15 dias, contra os 45 dias de transporte marítimo. Através de Tabriz, grande cidade industrial no noroeste do Irão - de onde parte um gasoduto de 2.500 km que chega a Ancara, na Turquia - as infraestruturas de transporte da Nova Rota da Seda, poderão alcançar a Europa.
Os acordos entre a China e o Irão não pressupõem componentes militares, mas, segundo uma fonte iraniana, para proteger as instalações serão necessários cerca de 5.000 guardas chineses contratados pelas empresas construtoras para os serviços de segurança. É significativo também o facto de que, no final de Dezembro, ocorreu no Golfo de Omã e no Oceano Índico, o primeiro exercício naval entre o Irão, a China e a Rússia.
Neste contexto, está claro por que razão, em Washington, foi decidido o assassínio de Soleimani: foi deliberadamente provocada a resposta militar de Teerão para reforçar o controlo sobre o Irão e poder atingi-lo, afectando o projecto chinês da Nova Rota da Seda, ao qual os USA não conseguem contrapor-se no plano económico. A reacção em cadeia desencadeada pelo assassínio de Soleimani também envolve a China e a Rússia, criando uma situação cada vez mais perigosa. 

il manifesto, 9 de Janeiro 2020






DECLARAÇÃO DE FLORENÇA
Para uma frente internacional NATO EXIT, 
em todos os países europeus da NATO


Manlio DinucciGeógrafo e geopolitólogo. Livros mais recentes: Laboratorio di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016, Guerra Nucleare. Il Giorno Prima 2017; Diario di guerra Asterios Editores 2018; Premio internazionale per l'analisi geostrategica assegnato il 7 giugno 2019 dal Club dei giornalisti del Messico, A.C.

Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos 
Webpage: NO WAR NO NATO

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

CHAVES PARA ENTENDER A CRISE FINANCEIRA E MONETÁRIA

A gestão das principais divisas ocidentais, tem como característica fundamental, nos últimos anos, estas serem constantemente diluídas pela compulsiva impressão monetária (de forma quase exclusivamente digital) pelos bancos centrais. 

Por outro lado, a compressão dos juros, ou mesmo os juros negativos, vai atribuir ao custo do dinheiro uma valoração anómala. Isto impede que se tenha em conta a preferência temporal: com efeito, (por hipótese) o emprestador aceita emprestar uma dada soma a juro X, sendo esse valor X o que pensa (e o mercado em geral, pensa) ser a justa compensação por diferir (por um certo prazo) a utilização desse mesmo dinheiro. 

Se o juro é praticamente nulo, ou mesmo negativo, os mercados ficam automaticamente incapazes de efectuar uma justa e apropriada avaliação de quaisquer investimentos. A preferência por opções especulativas é - em grande parte- resultante desta situação.

É o caso das acções, obrigações e derivados: trata-se sempre de um jogo de soma zero, ou seja, não existe, globalmente, qualquer acréscimo líquido de riqueza: o acréscimo de riqueza de uns, equivale - estritamente- a uma perda de riqueza de outros.

Os juros de referência dos bancos centrais, são os que eles podem realmente controlar. Estes, realmente, são apenas e somente os juros de curto prazo (o que inclui o «repo market»). Poucas pessoas se apercebem de que o juro de obrigações soberanas de longo prazo está, de facto, fora da capacidade de controlo dos bancos centrais. 


                                   
                
[Fig. 1: gráfico retirado do blog de Martin Armstrong; vê-se a descida do intervalo do juro de 10 anos para 2 anos até atingir uma inversão em Setembro de 2019] 

A preferência temporal obriga, em boa lógica, a que o emprestador de dinheiro a um prazo mais longo, queira um juro mais alto, do que a um prazo mais curto. Mas, quando a curva dos rendimentos (yield curve) se inverte, isso significa que os investidores têm grande desconfiança nas capacidades reais de pagamento das entidades emissoras de obrigações, no curto prazo.
 Foi exactamente o que se passou em Setembro de 2019. De cada vez que isso acontece, tem havido uma crise nos meses seguintes.  

                 
[Fig.2: gráfico retirado de artigo de Zero Hedge; mostra que o FED de Nova Iorque tinha quase cessado a intervenção no mercado de curto prazo, no final de Dez. de 2019. Mas, em Jan. 2020 voltou a colocar importâncias elevadas no mercado. No mercado de ainda mais curto prazo, o «over-night», a inversão é mais acentuada.]

Segundo Jamie Dimon, director do banco JP Morgan, «os bancos estão cheios de cash, só que têm muitas dúvidas sobre onde aplicá-lo». Traduzindo: a crise do mercado «repo» revela a enorme desconfiança dos bancos uns em relação aos outros, no que toca à sua liquidez ou mesmo, à sua solvabilidade. É esta a razão pela qual eles não querem financiar-se uns aos outros, no curto prazo, como era costume e normal fazerem antes. 
A entrada da FED neste mercado é muito reveladora: trata-se duma manobra de emergência para evitar o congelamento do mercado do empréstimo inter-bancário de curto prazo. A FED quis evitar o que sucedeu logo no início da grande crise de 2008: o congelamento dos mercados de empréstimo inter-bancário. 
Está patente o resultado desastroso da política monetária dos bancos centrais ocidentais, após uma década de «quantitative easing» e  de supressão dos juros. 

Mas, se o mercado de capitais inter-bancário não funciona de forma satisfatória, o que é que poderá funcionar «correctamente»? 
Note-se que, numa economia mundial onde domina largamente o capital financeiro, os fluxos de capital monetário são de importância crítica para o funcionamento global do sistema. 
Note-se também, que o mercado obrigacionista tem um volume dez vezes maior que o mercado das acções. 
Além disso, o preço do dinheiro é indicador universal, quer para os Estados, quer para as empresas ou para os particulares. 
É sempre indispensável ter em conta o valor dos juros, na avaliação dum qualquer investimento. Estrategicamente, um bom investimento no curto prazo pode ser um desastre no futuro, se não houver uma boa estimativa da evolução mais provável dos juros.

A partir do grande colapso de 2007-2009, os bancos centrais decidiram fazer «experimentação monetária» em larga escala. Encontram-se agora na situação proverbial do aprendiz de feiticeiro: não sabem como retornar ao funcionamento normal dos mercados.
A crise, realmente, está em marcha, mas o grande público continua na ignorância.
É uma crise real de todo o sistema: maior que os bancos centrais, que os Estados, que o FMI.
Inevitavelmente, a crise financeira rebentará, expondo a verdade sobre o presente sistema. 

O desencadear da guerra entre o Irão e os EUA irá permitir efetuar o famoso «reset», em benefício dos grandes bancos e transnacionais, e com a ruína das pequenas e médias empresas, atribuindo as culpas do «crash» à guerra com o Irão e não à completa insolvabilidade do sistema. 

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

O QUE ESTÁ POR DETRÁS DO ASSASSINATO DO GENERAL SOLEIMANI

                             

Para além da decisão táctica de Trump e do Pentágono de eliminar Soleimani, o que está em jogo é o controlo da região mais rica em petróleo e decisiva para o abastecimento internacional. 

Até agora, os americanos contentaram-se em obter acordos de «protecção» dos reinos petrolíferos a troco da exclusividade da venda do petróleo em dólares. Lembre-se que as transacções em US$ são rastreadas pelos bancos dos EUA, e podem ser eficazmente embargadas por ordem de Washington. 
Lembremos também o papel decisivo dos petro-dólares na compensação do défice crónico e monstruoso do orçamento dos EUA. O défice é colmatado graças à compra de obrigações do tesouro dos EUA por parte das petro-monarquias. Além disso, com os dólares obtidos, a Arábia Saudita e outros, compram armamento sofisticado e sua manutenção à indústria bélica americana (o maior exportador de armamento mundial).

Se decidiram assassinar Soleimani, não foi certamente pelas razões invocadas. Mas antes, porque estão desesperados por não conseguir mais fazer funcionar o sistema do petro-dólar, pois demasiados actores estão a rebelar-se ou a - discretamente - virar a casaca, para garantirem protecção dos poderosos aliados Rússia e China. Esta é a realidade estratégica global a que os EUA estão confrontados. 

A resposta a esta situação foi - com certeza - cozinhada pelas forças que controlam Washington e que têm Trump na mão (chame-se complexo militar industrial, Estado profundo, militaristas do Pentágono...): Para eles, a solução longamente planeada era o confronto directo com o Irão, única forma que encaravam para contrariar a deserção de uma série de aliados na região e portanto, a perda de hegemonia e o fim do sistema do petro-dólar. Eis a lógica intrínseca deles: Como não conseguem mais obter, como dantes, a submissão dos seus aliados-vassalos no Médio-Oriente, têm de fomentar uma guerra. Assim, poderão obter o alinhamento forçado destes contra o Irão. 
Eventualmente, conseguirão - em caso de vitória - o controlo directo dos poços de petróleo iraquianos, o que revela sua ambição totalitária de domínio mundial. Esta ambição de guerra já existia há muito tempo, manifestou-se múltiplas vezes, mas muitas pessoas não conseguiam compreender a natureza verdadeira do jogo. 
Agora, com a pretensão de Trump de se apropriar (roubar) o petróleo, não só da Síria, como do Iraque, está-se perante uma afirmação clara e descarada de apropriar o petróleo do Médio-Oriente, como despojo de guerra. 

Claro que, tanto os inimigos como os amigos dos EUA, vêm isto tudo e estão a posicionar-se em conformidade.

[Manlio Dinucci] Qual é a verdadeira ameaça nuclear no Médio Oriente?

                         

ITALIANO PORTUGUÊS
«O Irão não respeita os acordos nucleares» (Il Tempo), «O Irão retira-se dos acordos nucleares: um passo em direcção à bomba atómica» (Corriere della Sera), «O Irão prepara bombas atómicas: adeus ao acordo sobre o nuclear »(Libero): é assim apresentada por quase toda a comunicação mediática a decisão do Irão - após o assassinato do General Soleimani ordenado pelo Presidente Trump - de não aceitar mais os limites para o enriquecimento de urânio, estabelecidos pelo acordo assinado em 2015 com o Grupo 5 + 1, ou seja, os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia, China) e a Alemanha. Portanto, não há dúvida, segundo estes meios de divulgação de “informação”, sobre qual é a ameaça nuclear no Médio Oriente. Esquecem-se que foi o Presidente Trump, em 2018, que fez com que os EUA se retirassem do acordo definido por Israel como “a rendição do Ocidente ao Eixo do Mal, liderado pelo Irão”. Silenciam o facto de que existe apenas uma única potência nuclear no Médio Oriente, Israel, que não está sujeita a nenhum controlo, visto que não adere ao Tratado de Não-Proliferação, assinado pelo Irão.
O arsenal israelita, envolto numa espessa capa de segredo e de silêncio, é estimado em 80-400 ogivas nucleares, além de plutónio suficiente para construir outras centenas. Israel também produz, seguramente, trítio, o gás radioactivo com o qual fabrica armas nucleares de nova geração. Entre estas, mini-bombas nucleares e bombas de neutrões que, provocando menor contaminação radioactiva, seriam as mais adequadas contra alvos não muito distantes de Israel. As ogivas nucleares israelitas estão prontas para serem lançadas em mísseis balísticos que, com o Jericó 3, atingem de 8 a 9 mil km de alcance. A Alemanha forneceu a Israel (sob a forma de um presente ou a preços promocionais) quatro submarinos Dolphin modificados para o lançamento de mísseis nucleares Popeye Turbo, com um alcance de cerca de 1.500 km. Silenciosos e capazes de permanecer imersos durante uma semana, atravessam o Mediterrâneo Oriental, o Mar Vermelho e o Golfo Pérsico, prontos 24 sobre 24 horas, para o ataque nuclear.
Os Estados Unidos, que já forneceram mais de 350 caça-bombardeiros F-16 e F-15 a Israel, estão a fornecer-lhe pelo menos 75 caças F-35, também com dupla capacidade nuclear e convencional. Uma primeira entrega de F-35 israelitas entrou em operação em Dezembro de 2017. As Israel Aerospace Industries produzem componentes de asas que tornam o F-35 invisível aos radares. Graças a essa tecnologia, que também será aplicada nos F-35 italianos, Israel potencia a capacidade de ataque das suas forças nucleares.
Israel - que tem apontadas contra o Irão 200 armas nucleares, como especificou o antigo Secretário de Estado dos EUA, Colin Powell, em 2015 - está decidido a manter o monopólio da Bomba no Médio Oriente, impedindo o Irão de desenvolver um programa nuclear civil, que poderia permitir-lhe um dia fabricar armas nucleares, capacidade essa que hoje é possuída no mundo por dezenas de países. No ciclo de utilização do urânio, não há uma linha divisória clara entre o uso civil e o uso militar do material físsil. Para bloquear o programa nuclear iraniano, Israel está determinado a usar todos os meios. O assassinato de quatro cientistas nucleares iranianos entre 2010 e 2012 é, provavelmente, obra do Mossad.
As forças nucleares israelitas estão integradas no sistema electrónico da NATO, como parte do “Programa de Cooperação Individual” com Israel, um país que, embora não seja membro da Aliança, tem uma missão permanente no quartel general da NATO, em Bruxelas. Segundo o plano testado no exercício USA-Israel Juniper Cobra 2018, as forças USA e NATO viriam da Europa (sobretudo das bases em Itália) para apoiar Israel numa guerra contra o Irão. Ela poderia iniciar-se com um ataque israelita às instalações nucleares iranianas, como o que foi efectuado em 1981 contra o reactor iraquiano de Osiraq. O Gerusalem Post (3 de Janeiro) confirma que Israel possui bombas não nucleares anti-bunker, utilizáveis ​​especialmente com os F-35, capazes de atingir a instalação nuclear subterrânea em Fordow. O Irão, no entanto, apesar de estar livre de armas nucleares, possui uma capacidade de resposta militar que a Jugoslávia, o Iraque ou a Líbia não possuíam no momento do ataque USA/NATO. Nesse caso, Israel poderia usar uma arma nuclear pondo em movimento uma reacção em cadeia de consequências imprevisíveis.

il manifesto, 7 de Janeiro 2020







DECLARAÇÃO DE FLORENÇA
Para uma frente internacional NATO EXIT,
em todos os países europeus da NATO
DANSK DEUTSCH ENGLISH ESPAÑOL FRANÇAIS ITALIANO NEDERLANDS
PORTUGUÊS ROMÎNA SLOVENSKÝ SVENSKA TÜRKÇE РУССКИЙ


Manlio DinucciGeógrafo e geopolitólogo. Livros mais recentes: Laboratorio di geografia, Zanichelli 2014 ; Diario di viaggio, Zanichelli 2017 ; L’arte della guerra / Annali della strategia Usa/Nato 1990-2016, Zambon 2016, Guerra Nucleare. Il Giorno Prima 2017; Diario di guerra Asterios Editores 2018; Premio internazionale per l'analisi geostrategica assegnato il 7 giugno 2019 dal Club dei giornalisti del Messico, A.C.

Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
Email: luisavasconcellos2012@gmail.com
Webpage: NO WAR NO NATO

domingo, 5 de janeiro de 2020

No imediato, SAÍDA DO IRAQUE. Depois, DERROTA TOTAL

A «hubris» é o termo grego que designa a embriaguez do poder absoluto, a sua arrogância e incapacidade para se dar conta da realidade. Tudo isso, e a ausência total de moral, desencadeiam a fúria dos deuses, que lançam decretos fatais para castigar a personagem e todos aqueles que a seguem.

                              General Qassem Soleimani 440f3

É portanto o momento da viragem, este 2 de Janeiro, em que Trump decide assassinar o general Qasem Soleimani, o militar de mais alta patente do Irão, em visita ao Iraque. Este ataque brutal, que matou outros destacados membros da comitiva assim como das milícias xiitas iraquianas, tem o cunho de uma hubris, de uma loucura sem qualquer justificação ética, ou até, meramente de oportunidade. 
Agora, o destino dos EUA na região está traçado. As condições de sua permanência vão ser tão gravosas em termos militares e diplomáticos, que terá de «aviar as malas» e abandonar esses países, que tem ocupado e martirizado ao longo das duas primeiras décadas do século XXI.
O papel de criador, fornecedor secreto e protector do ISIS por parte dos EUA e de seus serviços secretos, está agora mais patente do que nunca, sabendo-se que Soleimani foi o mais destacado inimigo dessa organização terrorista, tendo as forças iranianas por ele comandadas desempenhado um papel fundamental na derrota do «Estado Islâmico» no Iraque e depois na Síria. 
Fica também tristemente patente a relação de Trump à expressão mais brutal e descarada de «nazi-sionismo», do primeiro-ministro Natanyahu: «o que o primeiro-ministro de Israel deseja, o presidente dos EUA faz».
A guerra de genocídio no Iémene pelos Sauditas e Emiratos, apoiada pelos EUA e pelos seus lacaios, França e Reino Unido, vai tomar uma viragem muito significativa.
O Médio Oriente todo vai entrar numa fase de intensificação dos conflitos, aos quais os regimes clientes dos imperialistas não poderão responder, pois serão os próprios povos a entrar em guerra insurreccional contra os seus governos. 
Muito deste fervor é causado por sentimentos religiosos ou nacionalistas. Mas, na base  estão sentimentos de injustiça, de indignação, perfeitamente compreensíveis por quaisquer humanos. 
Embora o sofrimento de povos inteiros, sujeitos a odiosas campanhas de supressão e mesmo de genocídio, tenha até agora deixado indiferentes as massas ocidentais (Europa e América do Norte), perfeitamente anestesiadas no seu conforto egoísta, este sofrimento não pode deixar de se repercutir na perda total de imagem do Império, visto como aquilo que é, uma besta sanguinária, que nem sequer sabe cuidar dos seus próprios interesses. 
Com efeito, os EUA são a nação excepcional, no sentido de que não têm a mínima preocupação com leis, tratados, acordos internacionais, dos quais são - eles próprios - signatários. 
Julgam-se invencíveis, usando a ameaça da força e a força bruta militar, sempre que acham conveniente e sem dar conta das consequências dos seus actos. 
Destaca-se também como país excepcional, pela indiferença em relação aos seus pobres, aos fracos, até mesmo, no modo como trata os veteranos das suas guerras. 
São um país sem uma diplomacia digna desse nome, por isso mesmo, tido como não credível pelos outros. 
Conforma-se em tudo com a definição de «Estado pária» (rogue State), termo que seus dirigentes inventaram para descrever regimes (como o Iraque de Saddam Husein, a Coreia do Norte,  o Irão, ou outros), que eles derrubaram, ou tentaram derrubar. 
O facto mais importante nesta situação é que o Estado-pária EUA não pode apontar uma arma à cabeça dos regimes Iraniano, Sírio, ou Iraquiano ... Porque agora estes têm meios para resistir e têm o apoio, na retaguarda, da Rússia e da China. 
Estas duas grandes potências vão ganhando terreno em todos os planos: 
- financeiro: o dólar como moeda de reserva está sendo destronado, como se pode ver pela generalizada corrida ao ouro
- diplomático: China e Rússia estão  de boas relações com muitos países, incluindo os da órbita dos EUA e ganham maior simpatia internacional e firmam acordos importantes económica e estrategicamente , cada dia que passa, pela sua política de não ingerência nos assuntos internos dos outros países;
-militar: têm desenvolvido armas com um enorme alcance e não detectáveis pelos dispositivos dos EUA, o que torna os sistemas de armamento dos EUA obsoletos;
- económico: têm crescido em termos de PIB, de exportações e de auto-suficiência e isto tudo, apesar das sanções ilegais e unilaterais a que os EUA os têm sujeitado;
- geo-político: os EUA estão numa postura defensiva (especialmente, depois do assassínio do General Soleimani) enquanto o eixo Russo-Chinês, tem vindo a agregar potências da Ásia Central, na Organização de Cooperação de Xangai.

Como tenho dito noutros artigos neste blog, a besta ferida pode ainda causar muitas mortes, muita devastação, mas já não pode vencer. 
Quando uma grande potência chega ao ponto de cometer actos completamente estúpidos, com efeitos inteiramente negativos para o seu jogo, é sinal de que o fim está próximo.
  

CHIQUINHA GONZAGA - COMPOSITORA BRASILEIRA (1847-1935)

            


Hércules Gomes traz-nos uma famosa obra de compositora imprescindível da cultura lusófona e latina:    Chiquinha Gonzaga (Rio de Janeiro17 de outubro de 1847 — Rio de Janeiro28 de fevereiro de 1935).
As suas músicas fizeram sonhar nossas bisavós e bisavôs, em torno de 1900, para quem o Brasil era a «Terra Prometida», muito mais que a «América»  (... ou seja, os EUA). O público português estava bem ao corrente da vida na «alta sociedade» brasileira, das suas intrigas e paixões, que alimentavam a crónica dos jornais, de lá e de cá. 
Acredito que nos salões de festas de Portugal também se ouviam tais composições, ao som das quais se dançava alegremente, misturando valsas com chorinhos, tangos com lundus e maxixes com polcas!