CIÊNCIA DO VINHO, ENOLOGIA
O vinho é um sumo de uva fermentado.
A fermentação realiza-se graças a leveduras que transformam os açúcares presentes na uva em álcool e dióxido de carbono.
As leveduras não são visíveis à vista desarmada, são micro-organismos. Estão naturalmente presentes na adega, na vinha, na superfície da uva e, geralmente, em todos os lugares onde exista o cultivo da vinha.
Foram estas, as leveduras ditas «indígenas» ou naturais, durante muito tempo utilizadas para produzir o vinho. As leveduras «indígenas» estão a regressar à produção vinícola - nomeadamente - nos vinhos ditos naturais.
A ciência do vinho é multissecular em Portugal.
As nossas vinhas e as castas de origem portuguesa são cuidadosamente inventariadas, catalogadas e experimentadas, em institutos públicos e nas grandes empresas do sector.
A genética molecular, as técnicas de recombinação, clonagem e de transformação de leveduras, têm encontrado ultimamente numerosas aplicações no domínio da vinificação.
Para se fazer vinho digno desse nome, são tão importantes as condições climáticas, do solo, das variedades de vinha, como os micróbios que fazem parte dum ecossistema.
Além destes factores, evidentemente, há toda uma série de saberes, de técnicas de cultivo da vinha, do processamento do vinho, transmitidos de pais para filhos, mas que também se podem ensinar e aprender, como parte integrante da cultura científica e técnica.
Do ponto de vista económico, o sector vinícola em Portugal tem três tipos distintos de empresas; as quintas familiares, onde se produz vinho para o auto-consumo e pouco mais; as pequenas e médias empresas, que têm frequentemente uma cooperativa vinícola a apoiá-las, onde se recolhem as uvas, se fermentam, se engarrafam e comercializam e por fim, as grandes empresas exportadoras, organizadas para a conquista dos mercados internacionais.
Estas grandes empresas estão «verticalizadas» ou seja possuem os terrenos, as vinhas, as adegas, os circuitos de comercialização. Tiveram origem, muitas vezes, em capitais estrangeiros, como na produção de vinho do Porto, na região do Douro.
Estas três tipificações mostram que há possibilidade de uma economia se diversificar e crescer a partir do sector agrícola e obter um rendimento apreciável, não apenas um auto-sustento.
A exploração familiar que faz vinho, além de outras produções, porém, não é de desprezar. Muitas famílias do Norte da Europa vieram para Portugal fazer este tipo de agricultura, usando seus conhecimentos técnicos e científicos para construir explorações viáveis e ecológicas. As explorações pequenas e médias para o mercado «bio» têm também futuro no nosso país.
O sector agrícola em Portugal tem futuro, obviamente, se as condições ambientais excepcionais forem preservadas.
ABANDONO DA AGRICULTURA
A vocação natural e histórica de Portugal é agrícola.
Porém, o país é um importador de alimentos; as exportações são muito mais baixas do que as importações, ano após ano, quer em termos de dinheiro, quer em volume de produtos. A produção agrícola e as pescas nacionais não chegam a cobrir 50% das necessidades do mercado interno.
Portugal é um país de clima atlântico sob influência mediterrânica. Possui os melhores solos para a vinha (solos xistosos) em várias zonas do território. Mesmo noutras zonas, a vinha pode ser cultivada, pois existem castas e técnicas adequadas a essas condições.
Em geral, o que a agricultura de Portugal precisa mais é de água.
Paisagem da Beira, perto de Monsanto
A água disponível, na maior parte do território continental, é suficiente para as diversas necessidades humanas, incluindo a agricultura, mas está irregularmente distribuída. Por outras palavras, uma irrigação apropriada é necessária para corrigir esta irregularidade.
Igualmente, as precipitações também estão irregularmente distribuídas no tempo; embora se possa usar, nalguns casos, uma «rega de emergência» para salvar culturas, numa altura de seca excepcional, o mais adequado será fazer-se a criteriosa selecção das espécies, variedades e cultivares, mais apropriados aos factores climatéricos. Tem também aqui lugar uma genética agrícola, respeitando e tirando partido das características do ecossistema.
Mas a escassez e/ou irregularidade das precipitações ao longo do ano, faz com que a água seja o factor limitante.
Pinheiros no campo, quadro a óleo de E. H. Gandon
O abandono dos campos, principalmente na Beira interior e no Alentejo, ao longo de meio século, fez com que se criasse e alargasse a mancha de «deserto verde» ou «floresta de produção», baseada no eucalipto, cujo único escoamento é a produção de pasta de papel.
Um motor deste fenómeno foi o facto de que, só assim, podiam obter das terras um rendimento pecuniário os proprietários absentistas, perante a quase ausência do trabalho assalariado. Desde a década de 1960 até hoje, os trabalhadores agrícolas têm emigrado massivamente para as cidades do litoral ou para países europeus com necessidade de mão-de-obra. A emigração rural, o abandono da agricultura, propiciou ainda mais o alargamento do «deserto verde», que impediu na prática a manutenção das comunidades, obrigando a um maior êxodo, num ciclo vicioso...
Quando penso nisto, fico muito triste, porque é um lento e frio assassinato de um país, de uma cultura, de um povo, de um saber agrícola (que deixou de estar...) enraizado na memória.
As pessoas jovens que estão sem emprego ou com um emprego de má qualidade (mal pago, precário) podiam formar cooperativas e reconverter-se à agricultura.
Penso que um país com boa sustentabilidade alimentar terá um melhor viver e guardará capacidade para se desenvolver nos restantes sectores. Pelo contrário, a indústria, nesta fase de transição energética, só poderá ter futuro, se não for baseada no petróleo.
A aposta «fácil» mas não sustentável (aqui, em Portugal) é o turismo, que se desenvolve no curto prazo. Deixa determinados sectores inflacionados, tais como o imobiliário e restauração, mas sem reprodução do capital e dos saberes. Pode o turismo ser uma alavanca, mas apenas se este sector for integrado com o sector agrícola e das pescas, numa visão de longo prazo.
Gostaria de saber a tua opinião sobre este assunto.
Escreve para manuelbap2@gmail.com
Obrigado!
Manuel Banet