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sexta-feira, 23 de agosto de 2024

HISTÓRIA GENÉTICA DAS POPULAÇÕES EUROPEIAS (Prof. Dr. Johannes Krause)


 O prof. J. Krause é diretor e membro cientifico do Instituto Max Planck para a Ciência da História Humana em Iena.

A conferência gravada está incluída num ciclo de conferências promovido pela Fundação Eugène Dubois, o famoso e importante antropólogo holandês que descobriu a calote craniana do Homo erectus, na ilha de Java ("Homem de Java").
O diretor de tese de Krause foi Svante Paabo, inventor da técnica de obtenção e sequenciação de ADN antigo, a partir de fósseis, de quem já reproduzimos uma conferência, neste blog.

Na introdução, o Prof. Krause refere-se ao facto de ter descoberto (pelo ADN antigo) a espécie humana fóssil  Homem de Denisova e homenageia Dubois.
Mas, a maior parte da conferência é dedicada à visão que tem da Pré-História, especialmente dos períodos que antecedem os primeiros relatos escritos, de cerca de -8000 a cerca de -3000, antes do presente. 
Ele ilustra o facto do estudo do ADN antigo, conjugado com a amostragem do ADN de populações contemporâneas,  ter contribuído para esclarecer as incógnitas que se colocavam sobre essas épocas, em arqueologia e antropologia. 
O estudo das migrações humanas no continente euroasiático, utilizando os instrumentos da genética  molecular, permite compreender melhor o passado remoto do continente europeu, milhares de anos antes do registo escrito da História.

domingo, 20 de setembro de 2020

ADN ANTIGO E A NOVA CIÊNCIA DO PASSADO HUMANO


                                    Uma magnífica lição pelo Prof. David Reich


[David Reich, Professor, Department of Genetics, Harvard Medical School; Investigator, Howard Hughes Medical Institute; Senior Associate Member, Broad Institute of Harvard and MIT]

Conferência importante pelo seu conteúdo. Os avanços recentes da ciência mostram com clareza que não existe nem nunca existiu nenhuma «raça pura», ou seja, que o conceito de «raça» é um conceito vazio de sentido em termos biológicos. Penso que isso deveria ser mais enfatizado nesta época em que são assoprados os ventos do ódio «racial». Realmente, a biologia diz-nos que somos todos um puzzle de traços genéticos de muitas origens. Devia ser consensual - não apenas entre biólogos mas toda a gente - que a aparência física superficial não traduz a profundidade da nossa herança genética.

sábado, 8 de junho de 2019

ANTIGOS POVOS SIBERIANOS NA ORIGEM DOS POVOS AMERÍNDIOS



A descoberta de um sítio arqueológico datado de cerca de 31 mil anos, revelando um povo antigo, povoando a Sibéria oriental, durante a época do máximo glaciar era, por si só, uma notícia de grande relevância antropológica.
Com efeito, nessa época do paleolítico como era possível os caçadores-recolectores viverem numa estepe gelada, caçando o mamute e o rinoceronte lanígero, com as tecnologias rudimentares da época?
 Mas, como se não bastasse, dois dentes de leite de dois indivíduos distintos aí recolhidos forneceram o ADN para sequenciação total dos genomas. 

                              Image result for DNA from 31,000-year-old milk teeth leads to discovery of new group of ancient Siberians
                                     

A sequenciação revelou a existência de um povo desconhecido, aparentado aos Homo sapiens do paleolítico da Europa, mais do que aos Homo sapiens da Ásia. 
Noutro sítio arqueológico siberiano, entretanto, um esqueleto fóssil de cerca de dez mil anos, revelava o seu ADN ser de um homem com características muito semelhantes aos mais antigos exemplares americanos cuja sequência do ADN foi obtida. 
Ora, neste exemplar com 10 mil anos, cerca de metade dos genes aparentavam-se com os dos dentes de leite acima citados, sendo os restantes genes provenientes de populações asiáticas. 
As populações de origem da América seriam provenientes de populações siberianas antigas, geneticamente aparentadas com europeus, que se tinham cruzado com populações asiáticas.
A descoberta da existência deste povo siberiano arcaico vem portanto resolver o mistério da origem do povo que passou pelo Estreito de Behring, então uma faixa de terra chamada Beríngia, que estava emersa devido à descida do nível do mar em centenas de metros, causada pela glaciação. 
Note-se que os siberianos antigos, vivendo em plena época glaciar, eram povos nómadas, percorrendo longas distâncias em perseguição da caça. Não admira que, juntamente com a fauna que caçavam, tenham passado pela Beríngia e para lá desta, para o continente americano. 

                           Image result for DNA from 31,000-year-old milk teeth leads to discovery of new group of ancient Siberians

Entretanto, com o aquecimento do clima, a fusão dos glaciares e a subida do nível dos oceanos, as populações que se encontravam na América há cerca de 15 mil anos, ficaram isoladas das suas congéneres siberianas. 

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

DESVENDADAS ORIGENS E MIGRAÇÕES NO CONTINENTE AMERICANO GRAÇAS AO ADN ANTIGO

No artigo da Science  cuja ilustração reproduzimos abaixo, dá-se conta dos resultados da análise de  64 exemplares de ADN antigo, extraído de ossadas de habitantes do continente americano, desde cerca de 14 500 anos a 500 anos atrás. 
Estes resultam de sítios arqueológicos, datados conforme se pode ver no mapa abaixo, desde o Alasca, no extremo norte, à Patagónia no sul do continente. 


                               



Uma das mais interessantes descobertas é a de múltiplas migrações cujo registo ficou inscrito no ADN dos indivíduos e outra, a existência de uma misteriosa população de origem austral-asiática:
Primeiro Reich tinha descoberto sinais dela em pessoas vivas do Brasil; agora, Willerslev, fornece mais evidências graças ao ADN de uma pessoa que viveu em Lagoa Santa (Brasil) há cerca de 10 mil e 400 anos. 
Pergunta-se como é que uma tal marca genética foi mantida isolada, durante dezenas de milhares de anos, em todo um enorme percurso de migração desde a Beríngia, até ao Brasil?  A alternativa seria uma «invasão» por mar o que - à primeira vista- parece demasiado improvável. 
Com efeito, a Beríngia, durante a última idade do gelo, era uma ponte natural entre o continente euro-asiático e o continente americano. Verificou-se que sepulturas na estepe siberiana de cerca de 15 mil anos revelaram indivíduos cujo ADN estava mais próximo de ADN nativo americano, tendo também parentesco com o ADN antigo europeu. 
Quanto à origem austral-asiática de tais marcadores, não se pode excluir que estes resultem duma distribuição muito mais larga, tendo depois ficado confinado apenas a populações austral-asiáticas, analogamente ao que se passou com o ADN de origem «denisovano», cuja maior percentagem na população actual, se encontra precisamente nessa região (aborígenes australianos e nativos da Papuásia-Nova Guiné) 

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

DO NEOLÍTICO À IDADE DO BRONZE (Parte II)

sábado, 20 de outubro de 2018

DO NEOLÍTICO À IDADE DO BRONZE (Parte I)

                                  

“I am especially interested by one issue: It is possible, maybe even likely, that an important fraction of the genetic medical variation that we find in our species arose in the last 10,000 years. Such variation/adaptation may be the result of the intense cultural development that led to agropastoral economies, a lifestyle that introduced major differences in the lives of large sections of humanity in almost every part of the world.”

Cavalli-Sforza (1922-2018)


Penso que não podia haver citação mais apropriada para encabeçar o tema em estudo, que a de Cavalli-Sforza, que morreu a 31 de Agosto deste ano.
Com efeito, ele liderou um projecto internacional em que se tentava fazer a «história dos povos sem história». Tendo, por um lado, marcadores genéticos (de amostras sanguíneas de populações contemporâneas)  e por outro, as famílias linguísticas a que pertencem esses mesmos povos; suas afinidades, quer genéticas, quer linguísticas, permitiam fazer uma gigantesca árvore da família humana. 
Era notória a sobreposição das árvores construídas apenas com dados de genética, com as que utilizavam os dados da linguística. 
O conhecimento das migrações, por outro lado, era a dimensão geográfica indispensável, quer para compreender as afinidades e diferenças genéticas, quer as de língua e cultura. 

O processo de isolar, purificar e sequenciar ADN antigo, desenvolvido pelo Prof. Svante Pääbo no laboratório de Antropologia Evolutiva do Instituto Max Planck de Leipzig, permitiu um avanço espectacular na paleo-antropologia e trouxe-nos uma maior compreensão dos mecanismos de humanação: 
- quais foram os processos genéticos, populacionais, evolutivos, que levaram as espécies ancestrais - homininos - a se transformarem na nossa espécie? 
Pelas estimativas mais recentes, a espécie Homo sapiens existe há cerca de 300 mil anos, enquanto as várias espécies da linhagem «Homo» surgiram há milhões de anos. 
A grande surpresa decorrente dos trabalhos de Pääbo e colaboradores, sobre ADN de Homo neanderthalensis é a de que parte significativa do seu ADN (1 a 3%) está presente  nas populações europeias e asiáticas contemporâneas. Isto significa claramente que, num passado remoto, houve cruzamento dos humanos «modernos» com os neandertais. 
Além de neandertais, existem provas de que houve cruzamento com outras espécies... O nosso ADN é, afinal de contas, um «puzzle» de ADN originário de várias espécies ancestrais.

No entanto, o desenvolvimento da tecnologia com ADN antigo não se ficou pelas formas mais ancestrais da nossa espécie, ou das espécies extintas aparentadas. A inovação técnica permitiu recuperar e purificar ADN fortemente danificado e contaminado e isso permitiu estudar genomas de muitos restos humanos  fósseis, contendo ADN em más condições de conservação, o que antes seria impossível. 
Assim, ADNs de ossos fossilizados de muitos e diversos povos, com 12 mil a  4 mil anos em relação ao presente, correspondentes ao neolítico (idade da pedra polida), ao calcolítico (idade do cobre) e à idade do bronze, foram sequenciados e fizeram-se estudos estatísticos da disseminação de variantes de genes e de «loci» particulares, os SNPs (Single Nucleotide Polimorphisms). 
As partes mais interessantes do genoma, para este género de estudos de genética, correspondem a dois tipos particulares de material genético: 
- O ADN mitocondrial, de transmissão materna exclusivamente: somente recebemos mitocôndrias, com seus genes próprios, das nossas mães; dos espermatozóides, apenas recebemos o ADN dos 23 cromossomas nucleares.
- O ADN do cromossoma Y, que apenas é transmitido de pai para filho. 
Isto tem a ver com a possibilidade de isolar tais moléculas, relativamente pequenas, por isso, menos danificadas, mesmo quando o ADN cromossómico restante está demasiado danificado. Por outro lado, este ADN permite traçar linhagens em intervalos de tempo longos. Com efeito, não existe, nem no ADN do cromossoma Y, nem mitocondrial, possibilidade de recombinação.

David Reich e sua equipa trouxeram dados muito interessantes nesta investigação: compararam o ADN ancestral proveniente de sítios arqueológicos da região do Cáucaso, onde se crê que foi originada a grande migração «indo-europeia», com amostras de diversas populações contemporâneas, por toda a Europa, Médio-Oriente, Pérsia e Índia.

A propósito das migrações destes povos nómadas, já se possuíam dados sobre disseminação linguística, assim como artefactos e técnicas (cultura material), indicando que uma nova cultura «invadiu» o espaço europeu, num espaço de tempo breve. 
Mas não se podia discriminar, com as técnicas tradicionais da arqueologia, se tinha havido apenas uma propagação cultural ou, em alternativa, migrações propriamente ditas. 

                   Bronze Age warriors


- Como é que surgiram e se disseminaram as práticas agrícolas, como viviam as primeiras comunidades agro-pastoris?
- Como se transformaram estas, de forma que tenham surgido as primeiras cidade-Estado, das primeiras civilizações propriamente ditas, com poder centralizado, com religião formalizada em templos, com castas, etc.? 

... Sobre a  «revolução neolítica», estas e muitas outras questões se podem colocar...