A série de assassinatos (ou tentativas de) a que vimos assistindo e continuaremos a assistir, são operações da CIA, do MI6 e doutros serviços da OTAN, que contratam «homens de mão» para atentados terroristas. Desde 07 de Outubro de 23 assistimos a um horrível massacre contínuo de população inocente às mãos do exército IDF de Israel, cometendo crimes de guerra. Mas, também há uma multiplicação de atos de terrorismo contra alvos especiais, pelo «Grande Hegemon».

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

ARTHUR RIMBAUD / LÉO FERRÉ: «CHANSON DE LA PLUS HAUTE TOUR»

                                       Honoré Daumier: «A Revolta»

O JOVEM REVOLUCIONÁRIO RIMBAUD

No ano de 1872 Arthur Rimbaud parte de Paris, onde deixa Verlaine. Nesse tempo, este último tentava (em vão) refazer sua relação conjugal com a esposa, Mathilde. 
Mas Rimbaud, então com 18 anos, é também um «communard» que foge à repressão que se abateu sobre os que, de um modo ou de outro, participaram na gesta heroica da Commune. 

Tal como o poema «Les Corbeaux»*, esta canção alude ao desespero dos sobreviventes da Comuna de Paris. Ele evoca uma juventude que «perdeu a sua vida», ou seja, perdeu «o combate da sua vida». Isto, não no sentido de «perdição» moral, de ter ficado desgraçado pela vida de «deboche». Quem triunfa -por agora - são as «moscas varejeiras», os clericais que enchem a pátria «de incenso e de joio». Para mim, é claro o sentido anticlerical.
O isolamento do jovem explica-se como retirada, um auto- exílio político, até que a situação seja menos perigosa para ele. Parece-me bem mais verosímil do que uma retirada motivada por um suposto sentimento de frustração amorosa, na relação com Paul Verlaine.
A ambiguidade do poema foi desejada e conseguida graças ao génio de Rimbaud: De tal modo que, nos dias de hoje, muitos literatos fazem ainda uma leitura «intimista» e «analítica» dum texto, essencialmente político.
Uma prova em abono da minha tese é que as versões académicas, seguindo rigorosamente o manuscrito original, transcrevem «Ainsi la Prairie», o primeiro verso da 4ª estrofe. 
Ora, Prairie (= «prado»), não parece fazer sentido, nem sequer metafórico. Ainda por cima, a palavra vem com maiúscula, o que ainda faz menos sentido. A não ser que... o poeta quisesse referir outra palavra, parecida com «prairie», e esta aparecesse como um lapso, um erro.
Considero que a leitura correta, é a que faz Léo Ferré:             Ainsi la patrie / à l'oubi livrée (etc)

Creio que este verso-chave, com esta alusão dissimulada (através do falso erro) à pátria, uma vez corrigido, torna claro o significado do poema. É um poema político do revolucionário e communard, que tem de se abrigar na cidade natal de Charleville.






Chanson de la plus haute tour*
Arthur Rimbaud


Oisive jeunesse
A tout asservie,
Par délicatesse
J’ai perdu ma vie.
Ah ! Que le temps vienne
Où les coeurs s’éprennent.

Je me suis dit : laisse,
Et qu’on ne te voie :
Et sans la promesse
De plus hautes joies.
Que rien ne t’arrête,
Auguste retraite.

J’ai tant fait patience
Qu’à jamais j’oublie ;
Craintes et souffrances
Aux cieux sont parties.
Et la soif malsaine
Obscurcit mes veines.

Ainsi la patrie
A l’oubli livrée,
Grandie, et fleurie
D’encens et d’ivraies
Au bourdon farouche
De cent sales mouches.

Ah ! Mille veuvages
De la si pauvre âme
Qui n’a que l’image
De la Notre-Dame !
Est-ce que l’on prie
La Vierge Marie ?

Oisive jeunesse
A tout asservie,
Par délicatesse
J’ai perdu ma vie.
Ah ! Que le temps vienne
Où les coeurs s’éprennent !

Arthur Rimbaud, Derniers vers




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*Canção da Mais Alta Torre

Arthur Rimbaud

[tradução de Manuel Banet]


Juventude desocupada
A tudo submetida,
Por delicadeza
Perdi  minha vida.
Ah ! Que venha o tempo
Em que os corações se apaixonem!

Disse para comigo: deixa,
E que não te vejam :
E sem a promessa 
De mais elevados prazeres.
Que nada te retenha
Do augusto retiro.

Tanto exerci paciência
Que esqueço para sempre;
Receios e sofrimentos
Para os céus partiram.
E a sede doentia
Obscurece-me as veias.

Assim a pátria
Ao esquecimento votada,
Crescida, e florida
De incenso e de joios
Ao bordão obstinado
De cem nojentas moscas.

Ah ! Mil viuvezes
Da tão pobre alma
Que  só tem a imagem
Da Nossa-Senhora!
Será que se reza
À Virgem Maria ?

Juventude desocupada
A tudo submetida,
Por delicadeza
Perdi  minha vida.
Ah ! Que venha o tempo
Em que os corações se apaixonem!

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