sábado, 10 de setembro de 2016
sexta-feira, 9 de setembro de 2016
ALEGRIA DE VIVER - piano e percussões com Yuja Wang e Martin Grubinger
Ritmo, verdadeiro ritmo, percussão criativa, fusão de músicas do mundo e tudo isso na perfeição!
A POESIA ESTÁ NO OLHAR
Meu tio-avô, Édouard Honoré Gandon, pintou este quadrinho, talvez por volta dos anos 50, do século passado. Ele tem-me acompanhado, como que a lembrar-me, permanentemente, como são maravilhosas as coisas mais simples:
- Repare-se nesta fruta, um tomate e uma maçã, um copo de vinho tinto e uma toalha branca parcialmente arredada... Tudo o que há de mais banal, porém, como não ficarmos maravilhados perante tanta arte?
- É que ele nos diz - ontém, hoje e sempre - que as coisas mais simples são as mais belas... e que as coisas às quais não damos grande importância, as coisas familiares, banais, podem ser fonte de uma inesgotável soma de prazeres.
- Afinal, o que diziam os epicuristas? Para Epicuro, pão, umas fatias de queijo de cabra e uns copos de vinho, eram a substância do melhor banquete. Nada mais do que isto como manjar do corpo. Quanto ao espírito, a companhia de amigos com uma conversa animada e agradável, enquanto comemos... que mais queremos nós da vida?
Não podia estar mais de acordo com Epicuro, tanto mais que a filosofia silenciosa dos quadros de Édouard Gandon me tinham preparado, desde pequeno, para o prazer das coisas mais simples, do nosso entorno mais banal.
É pela educação do olhar que ocorre a interorização da noção de belo e portanto, da beleza que existe no nosso entorno imediato.
A beleza está afinal NO OLHAR. Está DENTRO. Nós somos a beleza do mundo, porque - na verdade - é nosso olhar que lhe confere beleza. A beleza não reside nas coisas, nos objectos, mas antes na nossa visão.
Haverá maior consolo? Se compreendemos isto profundamente, veremos como a nossa vida se vai transmutar, mas sem ruído, sem espalhafato. As coisas simplesmente estão, existem por si próprias.
Tenhamos então a sabedoria de ser COMO AS COISAS QUE VEMOS.
Por volta de 1984, no volume de poemas «Estórias de Estar e de Ser», refletia sobre uma FILOSOFIA POÉTICA DO OLHAR.
Abaixo, dois textos do referido volume:
COISAS
Agora sei que nada me
move.
... o que se me afigura passível de explicação:
Primeiro,
devemos dizer que de nada vale contemplar o voo das aves se a sua nomeação
fizer com que esqueçamos este simples facto: os objectos, as coisas, são.
Segundo,
devemos considerar que o nosso olhar reflecte os contornos pela luz que recebe
e quem diz luz, diz sombra.
Terceiro,
não precisamos de filosofar a evidência do nosso olhar porque sabemos que é
subjectivo e – logo – fugaz.
Quarto,
de bem pouco nos custa cerrar os olhos do espírito ao que nos cerca, para que
não restem dúvidas de que “só vemos o que queremos ver”.
Agora sei que as coisas se movem.
... O meu
espírito está dentro da sua gruta e olha para o exterior:
Se as ideias fossem
anteriores às imagens, nunca saberíamos distinguir uma árvore, concreta, real,
da ideia de árvore, abstracta, metafísica.
Se as imagens não fossem, por virtude do espírito,
transponíveis em ideias, que cego poderia jamais aprender?
Se as coisas ficam quando me ausento de sua presença, então
não posso dizer que não existem independentemente de mim próprio.
(Mas então... para que certeza caminho, se a dúvida se
instala a par e passo do meu passeio através do mundo das coisas?)
ESTAR
Estar atento ao ouvido do vento.
Estar nas horas de se perder o tempo na memória do ser.
Estar por debaixo da pele ou estar em posição horizontal ...
de qualquer forma, estar em si.
Entende mais o silêncio quem vence o medo de Estar.
Não colhe os frutos verdes quem está deitado sobre nuvens.
Quem colhe os frutos verdes em cima do soalho azul, pode vir
em Novembro, Janeiro ou Abril ... mas estará sempre prestes a nascer.
Estar no berço de espuma, por cima do ruído, em troca de um
poema.
Estar em configuração astral dos olhos pouco fixos.
Estar no entrecruzar do desejo, sem que suba da carne o
relento sofredor.
Estar como maresia e como urze.
Estar em fiel dissonância com o resto do Capítulo Social.
Estar ouvindo as pancadas das artérias, ouvindo o fluxo do
sopro, ouvindo o caminhar do cristal.
Estar no centro ou estar na periferia, em todo o lado por
onde se caminha, estar centrado.
Estar para si, nos outros, estar nos outros para os outros.
Estar ausente, mas por amor do presente.
Estar na dádiva da flor ou do insecto.
Estar na estação de mover as mós do rio, de colher os frutos
das árvores, de estancar a sede dos poços,
Estar a si mesmo
Estar a sua estanquidade
Estar o Ser.
quinta-feira, 8 de setembro de 2016
REFLEXÃO SOBRE UM QUARTO DE SÉCULO DE ALHEAMENTO E O FIM DA URSS
O seu ocaso estava já bem visível mais
de uma década antes, quando visitei a Polónia pela primeira vez, em 79 e
verifiquei a vivacidade do movimento clandestino Solidarnosc.
Testemunhei que se tratava de muito mais
do que uma onda passageira devida à eleição do papa João Paulo II.
Porém, quando regressei a Varsóvia no
ano seguinte, em 80, fui surpreendido pela amplidão e profundidade da revolução
pacífica, que começou com a greve nos estaleiros de Gdansk em 1980. Este
acontecimento iria inaugurar uma era de mudanças.
Tal como a Primavera de Praga, de 68/69,
esta abertura seria fechada brutalmente pelo golpe militar do interior do próprio
regime, liderado pelo general Jaruzelski.
Porém, as circunstâncias eram outras,
diferentes da Checoslováquia, que eu tinha visitado, onde a opressão do
partido «comunista» era bem visível em 75, nas ruas engalanadas com enormes dísticos
vermelhos e dourados em louvor da ditadura do proletariado, no medo dos cidadãos
em falar com os turistas e da omnipresença da polícia, em uniforme ou à paisana,
em todo o lado.
O triunfo do Solidarnosc acabou por
ocorrer, poucos anos depois do golpe autoritário de Jaruzelki. Era o evidente
sinal do fim da hegemonia soviética sobre os países do Leste europeu.
A tragédia de Chernobyl foi o seu golpe
de misericórdia: este acidente nuclear numa zona da Ucrânia que ficou
completamente inabitável e contaminou vastas zonas da Europa do Norte e do
Centro, não foi apenas uma tragédia humana e ecológica, mas também uma tragédia
política para os dirigentes soviéticos. Com efeito, a impossibilidade de
funcionamento do regime tornou-se patente, visto que na génese deste acidente
houve uma série de incompetências «convenientemente» ocultadas.
O regime soviético estava exausto pela
guerra do Afeganistão, o «Vietname» soviético. Estava a ficar para trás na
corrida aos armamentos face a um bloco Ocidental mais dinâmico e capaz de maior
investimento na investigação estratégica de ponta. Para cúmulo, observava
impotente a erupção de revoltas nos seus vassalos dos países do Pacto de
Varsóvia. Em breve, outros povos tomariam o exemplo da Polónia, como foi o caso
da Roménia e, por fim, da Alemanha de Leste, com a queda do muro de Berlim, em
89.
Não creio que devamos chorar pela queda
da nomenklatura da URSS e países satélites. Mas, nem por isso ficamos felizes
pela ascensão ao poder de uma outra cleptocracia, a das privatizações e das
suas máfias.
A grande mentira do «comunismo» ou
«socialismo» tinha historicamente que acabar. Mas este engano monstruoso, esta
deturpação vil de ideais, muito válidos em si mesmos, não podia ser explicado
por quase toda a esquerda ocidental. Ela estava infelizmente habituada a
«fechar os olhos» aos sinais inquietantes que vinham constantemente mostrar que
o tal «socialismo real» embora muito «real» não tinha grande coisa de
socialismo. A esquerda autoritária precisava de um modelo mítico para poder
avançar com a sua propaganda. Eles contribuíram para enganar as pessoas
simples, os operários e trabalhadores que eles diziam defender. Muitos,
cinicamente, diziam que «as massas» precisavam de ver uma concretização dos
tais ideais comunistas ou socialistas, naquilo que eles – quadros dos partidos
comunistas do Ocidente - sabiam que nunca tinham sido regimes assim, realmente.
Os regimes que foram varridos do mapa
político eram totalitarismos, fascismos vermelhos. Usavam uma linguagem socialista
nos discursos, na propaganda, na ideologia; nos factos eram indistinguíveis dos
regimes autoritários fascistas de que tínhamos sido reféns na Península Ibérica,
até há bem pouco tempo.
A mentira de que existiu um qualquer socialismo
ou comunismo nesses países do Leste Europeu e do espaço da ex-URSS continua,
não apenas mantido por nostálgicos do bolchevismo, mas também pelos arautos do chamado
neoliberalismo. A razão destes é simples de se compreender: querem um
espantalho para prevenir as pessoas de terem simpatias por correntes socialistas
ou comunistas verdadeiras.
Aqueles poucos intelectuais que
fundamentam as suas visões em raízes socialistas libertárias praticamente nada influenciam
o pensamento contemporâneo, pois este está tomado pela comunicação de massas, serventuária
do grande capital, proprietário dos grandes jornais e cadeias de informação.
Paradoxalmente, a queda de um poderoso
império veio afinal hipertrofiar as tendências autoritárias ou mesmo
totalitárias da nossa época. Triunfaram as forças portadoras de «não-valores», da
ausência total de valores. Refiro-me aos adeptos da «ideologia de mercado», um
totalitarismo de novo figurino, embora muito antigo na sua essência.
Servem-nos «o mercado» a toda a hora mas,
às vezes, polvilham o seu discurso com açúcar dos direitos humanos. Assim se
contribui para a continuidade da exploração dos humanos e da Natureza.
terça-feira, 6 de setembro de 2016
CONTO: DOIS IRMÃOS MUITO DIFERENTES & poema *
Um conto delicioso pelo grande Prof. e Cientista
DOIS IRMÃOS MUITO DIFERENTES
Era uma vez um aprendiz de vidraceiro chamado Domingos. O seu trabalho de todos os dias, como voluntário, naquelas férias de verão, entre os 11º e 12º anos, era aprender a arte de cortar vidro para vidraças de janelas, quadros com gravuras e tudo o mais que precisasse daquela operação. Dos restos que iam ficando, tinha autorização para cortar pequenos rectângulos para molduras que ele próprio fazia, num jeito de brincadeira, para grande satisfação do patrão, que as vendia a bom preço.
A um canto da grande mesa de trabalho, muito plana e lisa, forrada a feltro, onde se esquadravam e cortavam as grandes chapas, além da régua e da fita métrica, estava sempre o riscador, uma espécie de caneta em latão, polida do uso, terminada numa ponta de diamante com que riscava o vidro, o que permitia o corte certeiro.
Bem seguro, atrás da orelha, e numa imitação do mestre, o Domingos trazia agora, também ele, o lápis muito afiado, com que tomava nota das encomendas, fazia contas ou escrevinhava apontamentos próprios da sua aprendizagem. Só o tirava em casa, findo o trabalho, para voltar a pô-lo, na manhã seguinte, ao sair. Fazer o percurso a pé, de ida e volta, de lápis na orelha, era uma maneira de mostrar ao mundo que era alguém que já trabalhava.
Um belo dia, à hora de ir almoçar, fora do que era o seu costume, o rapaz deixou lápis sobre a mesa de trabalho, mesmo ao lado do riscador, e saiu, fechando a porta atrás de si. Foi no silêncio da oficina deserta, que a ponta de diamante, dirigindo-se ao bico do lápis, começou por dizer:
- Até que enfim que te tenho aqui ao pé. Há que tempos que te vejo lá de cima, da orelha do rapaz, sem poder falar contigo.
- É verdade. – Concordou a ponta do lápis. – Os objectos, como nós, só podem falar quando não há ninguém por perto. É por isso que as pessoas nem sonham que nós falamos uns com os outros.
Ao retomar a conversa, a ponta do riscador, com o seu ar de importância, apresentou-se.
- O meu nome é diamante. Nasci há muitos milhões de anos, lá bem no interior da Terra, a mais de 200 quilómetros de profundidade, onde a pressão é cerca de 60 000 vezes superior à que temos aqui à superfície, e a temperatura ultrapassa os 1600 ºC. Sou o mineral mais duro que se conhece, sou quase exclusivamente feito de carbono, o mesmo elemento do vulgaríssimo carvão. Praticamente, nada me destrói. Só o fogo, mas é preciso que a atmosfera seja bem rica em oxigénio e a temperatura atinja valores muito elevados, superiores a 800ºC. Tenho também o meu calcanhar de Aquiles, a que os estudiosos chamam clivagem perfeita.
- E o que é que isso quer dizer? Perguntou a ponta do lápis, curiosa.
- Quer dizer que em algumas direcções da minha rede cristalina, os átomos ligam-se por forças mais fracas, o que faz com que eu me parta facilmente segundo essas direcções. Portanto, se me derem uma pancada com a orientação correcta, lá me separo eu em dois bocados. Mas, tirando esta minha fragilidade, sou indestrutível. O meu nome, que vem do grego antigo, adamans, quer dizer isso mesmo. Sou incorruptível, como dizem os mais eruditos.
- É curioso que eu também sou um mineral mas não tão velho como tu. Sofro do mesmo mal e até bem mais do que tu. Se me baterem ou apertarem, desfaço-me toda. – Interrompeu a ponta do lápis. – Também sou quase exclusivamente feita de carbono, chamo-me grafite e não sou mesmo nada dura. Pelo contrário, sou quase tão macia como a manteiga, a ponto de ser usada como lubrificante. Também venho do interior da Terra, embora de muito menor profundidade. Dado o facto de eu ser assim tão escura, quase preta, e de a minha dureza ser muito baixa, desde há muito que me usam para escrever e desenhar sobre o papel. É por isso que me baptizaram de grafite, tendo por base a raiz grega, graph, que traduz a ideia de escrever. É essa tua fragilidade, a que chamas clivagem, que, em mim, é um dom que me torna importante. É, precisamente, por eu me separar tão facilmente por esses planos de fraqueza que me torno útil no desenho, pois vão ficando no papel esses meus minúsculos bocadinhos, registando o traço.
Nós, os da minha espécie, – retomou o diamante – somos, no geral, incolores. Mas há diamantes de quase todas as cores e, até, pretos - acrescentou. - Somos todos muito apreciados pelo excepcional brilho que temos. Tão especial que lhe foi dado o nome de adamantino. Temos também, depois de facetados e polidos, uma dispersão da luz e uma cintilação únicas entre os minerais! Ninguém nos fica indiferente! Eu, como não era assim muito branquinho nem muito transparente, não fui parar à bancada do lapidador, não tendo sido usado para fazer jóias. Mas, dada a minha grande dureza, viram-me utilidade na indústria, e aqui estou!
Seguro da sua importância, o diamante não parava de falar das qualidades que a mãe Natureza lhe dera.
- Duros, indestrutíveis e com este brilho, muito valorizado pela lapidação, há muito que somos tratados como pedras preciosas, ao lado das esmeraldas, das safiras e dos rubis. Temos grande procura como uma das gemas de maior cotação no mercado e lapidam-nos desde o século XIV.
- De facto – anuiu a grafite, – eu pertenço a uma espécie mais humilde mas muito trabalhadora. Não ando nas coroas e tiaras de reis e rainhas nem nos colares e anéis das estrelas de cinema, mas tenho muita utilidade em importantes indústrias, como são as do aço, dos refractários, dos lubrificantes, das baterias eléctricas e a dos lápis, claro. – Respirou fundo, como que a tomar folgo, e continuou. - Ficas agora a saber que as minas dos lápis de escrever são feitas com grafite. Do bico do lápis já saíram grandes obras de arte no desenho e na escrita. Olha, os desenhos originais de, Leonardo Da Vinci ou os de Picasso são tão valiosos que, em leilão, rivalizam com os melhores diamantes! A lápis, muitos arquitectos como Vitúrbio, Le Corbousier, Oscar Nimeyer ou o português Eugénio dos Santos, esboçaram projectos de grandes obras que fizeram história. Olha, - disse por fim – ficas também a saber que ainda hoje na América, os alunos, nas escolas, e os adultos, no seu trabalho, preferem o lápis à caneta.
- Alto aí! – Interpôs a ponta do riscador. - É verdade que alimentamos a vaidade dos poderosos e ricaços, mas também é certo que evitamos a fome em países como a Namíbia e o Botswana. É verdade que temos sido causa de guerras, roubos e grandes crimes contra inocentes, mas nem te passa pela cabeça a importância dos diamantes na indústria, em especial, na de equipamentos de corte e perfuração e de abrasivos. Não há nada, desde o aço à pedra mais dura, que nós não consigamos cortar, perfurar ou desgastar. São as serras diamantadas, as cabeças das sondas que procuram as águas subterrâneas ou o petróleo, são as lixas especiais e muitas outras moderníssimas aplicações.
Entusiasmado com esta também sua utilidade entendeu acrescentar:
- A nossa importância é tal neste sector da sociedade moderna, que a extracção de diamantes naturais não chega para as necessidades do consumo. Há, pois, que produzi-los industrialmente, o que já se faz desde meados do século passado. Até te digo mais. Hoje em dia, a produção de diamantes artificiais ou sintéticos ultrapassa, de longe, a sua exploração na natureza. E já somos produzidos para outros fins, tirando partido de outras propriedades que temos. O nosso muito baixo coeficiente de expansão térmica e elevadíssima condutividade térmica faz-nos ideais como dissipadores de calor em sistemas computorizados de alta performance; se formos tratados com boro, tornamo-nos semicondutores e isso coloca-nos numa posição privilegiada para os novos chips informáticos. E mais: já nos fazem em placas transparentes com alguns milímetros de espessura que são ideais para janelas em diversas indústrias, desde a aeroespacial à investigação de ponta em física.
- Também nós! – Contrapôs a ponta do lápis. – É muito mais a grafite produzida artificialmente do que a que se extrai como minério por esse mundo fora.
- Deixa-me dizer-te mais uma coisa. – Interrompeu a ponta de diamante. – Há uns anos a esta parte já se fazem diamantes sintéticos em muitas cores e com tamanho e qualidade suficientes para serem usados em joalharia.
- Mas eu - atalhou a grafite - não te esqueças nunca disso, eu tenho tudo o que é preciso para me transformar em diamante, mas não estou nada interessada nisso. Posso, perfeitamente, ser a fonte do carbono utilizada na síntese do diamante, a altas pressões e altas temperaturas, e só de pensar nisso fico com arrepios! Mas o que é facto é que, se quiser, saio de lá como se fosse tua irmã gémea.
- Bem vistas as coisas, – disse o diamante, - nós pertencemos à mesma família.
- Para já, temos a mesma composição química. Ambos somos feitos de carbono. – Anuiu a grafite que continuou, explicando. - As grandes diferenças entre nós só têm a ver com a profundidade a que fomos gerados. Eu sei isto – continuou – porque um dia, o Domingos me deixou em cima da mesa onde costuma estudar, ao lado de um livro de Geologia, aberto precisamente na página onde se falava de nós. É apenas a forma e a energia com que se ligam os átomos de carbonos que nos distingue.
- Eu também sei – interrompeu o diamante, não querendo ficar atrás desta sua parente tão chegada. – Lá na mina, na província do Cabo, perto de Kimberley, na África do Sul, onde me apanharam, havia um engenheiro que gostava de explicar tudo isso a quem quer que estivesse por perto. Foi aí que aprendi que, antes de ser diamante, fui, talvez, um simples carvão fóssil que, em conjunto com outras rochas da crosta terrestre, fui arrastado para níveis muito profundos de uma zona do interior da Terra a que se dá o nome de manto. Foi aí que fiquei transformado naquilo que sou. Estava eu muito sossegado, anichado numa rocha chamada eclogito, quando, passados mais alguns milhões de anos, lá vim eu cá para cima numa viagem super-rápida. Percebi, então, que estava a ser arrastado pela lava que ia brotar num vulcão. Nem tive tempo para me adaptar ao novo clima. Acostumado àquele forno imenso e sob grande pressão, vejo-me, agora à temperatura e à pressão normais â superfície da Terra. Depois de tanta aventura, eu bem gostava de ter sido lapidado e colocado num anel de noivado, ao lado de uma pérola, - desabafou, num doce suspiro - mas quando dei por mim ia num grande vapor, a caminho da Irlanda, de onde parti para França, o país da fábrica onde fui cravado nesta espécie de caneta de metal amarelo, tão polidinha, do uso, que mais parece feita de ouro.
- Pois olha, - retorquiu a grafite. - A minha história não é muito distinta dessa. A única diferença foi eu não ter sido arrastada lá para tão fundo, como tu foste. Não cheguei a descer abaixo da crosta, tão fundo como tu desceste e é só por isso que não sou um diamante. Mas insisto em afirmar que tenho muito orgulho naquilo que sou e faço.
Nesta fase do diálogo ente as duas pontas de carbono, abriu-se a porta da oficina. Apanhadas de surpresa, calaram-se imediatamente como se a conversa tivesse cristalizado ali. O Domingos dirigiu-se à grande mesa e os seus olhos brilharam, satisfeitos, ao ver o lápis que julgara ter perdido. Pegou nele e, num gesto automático, colocou-o atrás da orelha.



DE SACRAMENTO A
PORTOMELOS*
A carapaça cantante
Jorrando salinas de recifes
Engalanados como meliantes
Pirogas de Sacramento
Contando os cabelos das Ondinas
No fluxo da maré...
Jaspe, âmbar, grafite,
Carvão, diamante ...
A vulcânica guarida
Furor do meu pendão
Na esfíngica apelação
De Portomelos
Melodia de profunda dor mesclada.
[* Escrito dos anos 80 e incluído em «Um Corpo Merece Sempre Viver» de
Manuel Banet]
Parte
superior do formulário
Parte
inferior do formulário
quinta-feira, 1 de setembro de 2016
«LIBERTANGO» - TATYANA RYZHKOVA (À QUARTA POTÊNCIA!)
Dedico esta postagem à corajosa Dilma Rousseff e ao povo brasileiro, que tiveram e terão de lutar para arrancar o seu país das garras dos golpistas... A Tatyana Ryzhkova é excelente e realizou aqui um trabalho «em quarteto», a não perder!
terça-feira, 30 de agosto de 2016
FILME DE TERROR ECONÓMICO: A LOUCURA COMO «NORMA»
(VEJAM ENTREVISTA COM JIM RICKARDS, EM BAIXO)
Todos nós sabemos que existe uma anulação deliberada e centralmente planeada na origem da supressão das taxas de juro. Os bancos pagam quase nada às pessoas que têm depósitos a prazo e isto em todos os países. A redução é efetivamente coordenada pelos bancos centrais e governos dos países, especialmente dos que pertencem à OCDE. Têm, como «gurus» da economia e finanças, pessoas que se identificam como «economistas», porém mais não são do que sacerdotes do «culto Keynesiano». Para mais esclarecimentos sobre esta curiosa seita, consulte-se neste blogue, A Grande Ilusão
Só alguns sites , como «Zero Hedge» vão dando conta da enorme catástrofe que tem sido desencadeada desde o topo da pirâmide, como que um colapso controlado, uma implosão controlada do sistema.
Com efeito, a decisão de juros negativos, que incidia não apenas em bonds ou obrigações soberanas (isto é, emitidas pelos Estados), como também sobre depósitos à ordem ou a prazo, iria desencadear, segundo os brilhantes keynesianos, uma corrida ao consumo por parte das pessoas. Eles argumentavam que as pessoas, vendo que não interessava nada conservar o dinheiro de pequenas poupanças em depósitos bancários, acabariam por gastá-las, havendo assim uma «chicotada» no consumo e portanto em toda a economia. Simplesmente, este modelo de comportamento omitia que as pessoas com psicologia de «amealhar», não se iriam converter de um momento para o outro em «despesistas». Os reformados, por exemplo, sabem que não têm grandes hipóteses de gerar entradas de dinheiro; portanto, tentam gerir o que têm com prudência, favorecendo uma poupança pois só esta pode resgatá-los se vierem (quando vierem) dias maus. Eles têm muita prudência e sabedoria, ao contrário dos loucos que governam as nossas economias!
O Japão e a Alemanha experimentam uma corrida à compra de cofres individuais, pois as pessoas simplesmente deixaram de guardar as suas poupanças nos bancos e preferem guardar as suas poupanças em casa, num cofre, ou mesmo «debaixo do colchão». Os modelos de cofres a 700 dólares já se esgotaram no Japão, estando os comerciantes de cofres à espera de novos fornecimentos das fábricas, para os clientes em lista de espera.
Eu creio que esta evolução - de consequências tão nefastas para o próprio capitalismo - foi prevista e planeada; não foi realizada por acidente, como obra de proverbial «aprendiz de feiticeiro». Mais concretamente, a elite globalista do dinheiro e do poder pretende levar a cabo o grande «reset» - ou seja: a reestruturação do sistema monetário internacional, sem perda de seus privilégios e fortunas e com a total submissão das massas, sempre devotamente crentes.
Assim, as medidas apresentadas como «remédios», revelam-se como etapas do «reset», sob esta nova luz: a hiperinflação monetária (o «Quantitative easing» é apenas a produção de dinheiro sem contrapartida em riqueza verdadeira); o apontar para uma inflação de cerca de 2% como se isto fosse benéfico para a economia, quando - na realidade - apenas é benéfico para a redução da dívida enorme dos Estados e corporações; a eliminação progressiva do «cash» (numerário) já conseguida, em grande parte, na Suécia, mas com tendência a se alargar progressivamente a outras divisas (a eliminação das notas de 500€ é um passo nesse sentido); a experiência do «bail-in» - ou seja, do roubo dos depósitos dos bancos - em Chipre, transformou-se em «directriz» internacional, segundo a qual o resgate externo (bail out) de um banco só poderá ser encarado se estiverem esgotadas as possibilidades de um «bail in»... etc, etc.
O funcionamento em concreto do sistema capitalista depende da formação do capital: é necessário haver excedentes, capital disponível para investimento: é assim que se financiam negócios, empreendimentos produtivos. Isto gera riqueza material, o que se traduz em maior quantidade de bens e serviços. É evidente que uma parte importante desse capital disponível gerado, corresponde às poupanças das pessoas. Quase todas as pessoas contribuem para isso. Todos, numa medida maior ou menor, têm dinheiro disponível, durante algum tempo.
Se retiram o motivo para as pessoas manterem poupanças em depósitos à ordem ou a prazo, visto que passam a ser «remunerados» com juro zero ou negativo (o depositante tem de «remunerar» o banco por este deter o seu dinheiro!), estão a socavar a base da formação de capital. Mas estão também a criar suspeição em relação à banca e economia: estão a brincar com o fogo, visto que, muito depressa, esta suspeição pode transformar-se em perda de confiança geral do sistema.
É possivel que, de um dia para o outro, os bancos fechem e quando reabrirem, haverá uma nova divisa, a qual poderá ser adquirida -durante tempo limitado- pelas divisas que circulavam anteriormente.
A nova divisa poderá ser algo parecido com os «special drawing rights» (SDR) ou «direitos especiais de saque» como se chama a divisa que tem sido utilizada ao longo dos anos pelo FMI. Esta divisa contabilística é resultante de um cesto de divisas, o qual agora será alargado para conter o Yuan (divisa da Rep. Popular da China), além do Dólar, Libra, Euro e Yen. Outras pessoas pensam que será uma espécie de «bitcoin», mas sob contrôlo dos bancos centrais.
Pode ser muita coisa, mas não será algo que favoreça realmente os mais pobres, disso podemos ter a certeza. Muito provavelmente, irá completar e consolidar a espoliação «suave» das classes médias, que tem vindo a ocorrer ao longo dos últimos 20 anos.
O ouro e a prata, metais monetários, serão revalorizados «da noite para o dia». Nessa altura, haverá uma corrida para compra destes metais. Mas quem não os conseguir comprar, ficará com bocados de papel sem valor na mão, quer eles sejam designados por «euros», «dólares», ou outro nome de divisa qualquer.
A instalação do novo sistema monetário internacional está em curso, mas faz-se muito progressivamente, para não assustar as pessoas.
Temos assistido à transferência de riqueza em doses massivas sem que (quase) ninguém se dê conta disso. Por exemplo, quem tem acesso a empréstimos dos bancos centrais, com juros de praticamente 0% (é o caso dos grandes bancos) tem um enorme privilégio sobre o comum dos mortais, que têm difícil acesso ao crédito (juros de 6 ou 7% no crédito para habitação, com taxa de inflação oficial de 1 %).
Infelizmente, as pessoas mais afetadas por este «reset», serão as que menos se preocupam. Assim, não saberão certamente defender as suas parcas poupanças. Seja qual for a razão para o seu desinteresse, ficarão mais pobres.
Os globalistas, que dominam os mercados, os bancos, os ministérios e as organizações internacionais, não são inocentes, nem «aprendizes de feiticeiro»: eles sabem o que se está a passar e tentam pilotar o sistema para seu proveito próprio e com prejuízo muito direto dos 99%, em todo o mundo!
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