quinta-feira, 15 de novembro de 2018

A TRAGI-COMÉDIA DO BREXIT

                        

Conforme eu tinha vaticinado há alguns meses, as forças centrífugas predominam nas fileiras pró-governamentais da Grã-Bretanha. Teresa May conseguiu um acordo de saída da UE que tem tudo para enfurecer uns e outros: uns, que votaram a favor do brexit, porque o acordo mantém em vigor muitas das leis e disposições que estiveram na base do descontentamento que levou ao voto no brexit. Outros, os pró-UE, que vêem que a associação com a UE vai continuar, apenas sem possibilidade dos britânicos terem voz e influência no seio dos órgãos de poder da mesma. 

Consequência imediata, 4 ministros do governo May demitiram-se, incluindo o próprio ministro encarregue do brexit. Se eu compreendi, o que se segue será que Theresa May deverá submeter ao parlamento um novo gabinete, que deverá votar - ou não - a nova composição do mesmo. Em alternativa, Theresa May pede à Rainha a dissolução do parlamento e eleições antecipadas.   
Os negócios em geral, especialmente os novos investimentos, serão afectados, pois este cenário deverá conduzir a um período de incerteza. 
Os EUA, que sempre contaram com o Reino Unido como o «cavalo de Tróia» dentro da UE, serão beneficiados no imediato, em termos de taxas de juro das suas «treasuries» e dum aumento do dólar, visto a instabilidade no continente europeu desencadear sempre um «reflexo de protecção» dos capitais em direcção aos EUA. 
A UE, ou melhor, aquilo que resta da UE, será mais frágil, apesar da Comissão Europeia ter averbado uma vitória parcial nestas negociações. Mas esta vitória pode transformar-se rapidamente em «vitória de Pirro», pois também não vejo este resultado como dissuasor de outros países seguirem as pisadas da Grã-Bretanha. 
A incapacidade da UE se definir como um super-estado federal, devido a razões profundas, não devido a caprichos de seus dirigentes, está na raiz de todos os problemas. 
Se não existe uma moeda comum sólida é porque a Alemanha se  negou sempre a colectivizar as dívidas soberanas europeias, porém tem arrecadado - em anos sucessivos - superávits que apenas são possíveis em face dos défices dos seus parceiros de «união». 
A inoperância das instituições europeias faz com que não existam condições, apesar de múltiplas tentativas, de forças armadas comuns dos países da UE, nem mesmo dentro dum «pilar europeu»  da NATO. Esta aliança militar mantém bases americanas um pouco por todo o continente, sendo um processo de «racket» sobre os destinos políticos e a economia europeias, embora a retórica seja de que os americanos estão no continente europeu para «proteger» os seus aliados. 
As oligarquias do poder e dos negócios que dirigem o continente, querem uma UE assim como está; um colosso em termos de população, de economia, de inovação, ciência e cultura, mas um anão militar e diplomático... É isso que lhes permite melhor controlar as massas, encurraladas nos seus países respectivos, ao contrário dos capitais que fluem livremente, não apenas entre países da UE, como atravessando sem restrições as fronteiras virtuais do espaço europeu.
A City de Londres constituiu-se, desde a adesão da Grã-Bretanha à CEE, como um imenso centro de lavagem de dinheiro, de fuga ao fisco dos países continentais e como coordenador doutros paraísos fiscais nas Caraíbas e também nas ilhas do Canal da Mancha.
Não me admirava que o acordo agora alcançado seja o que preserve ao máximo esse papel da City. 
A questão da existência ou não de uma fronteira física separando a Irlanda do Norte da República da Irlanda, por muito importante que seja para as pessoas e para a economia local, pode considerar-se a questão-pretexto que interessa agitar junto das opiniões públicas, para melhor calar aquilo que estava realmente em jogo: a manutenção dos privilégios exorbitantes e  descontrolo completo dos fluxos de capitais que passam pela City de Londres.

Enquanto não houver uma profunda tomada de consciência das pessoas, elas serão manipuladas, sobretudo usando-se a corda sensível do nacionalismo, para serem levadas a aceitar passivamente a continuação de uma oligarquia política, económica e financeira, ao comando dos seus países respectivos. 
A UE tem proporcionado, no fundo, as condições para a classe no poder exercer uma ditadura disfarçada, com o famoso TINA (There Is No Alternative!) 

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