sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

PREVISÕES PARA 2017: geo-estratégia, economia, política

A Terra vai continuar a girar em torno do Sol, mas tudo resto que se passa neste mundo é sujeito a mudança. Não existe ciência certa, além da matemática e o critério de verdade desta será sempre referido a um sistema axiomático.
Noutro patamar, temos as ciências ditas «naturais» que proclamam «leis», mas que apenas estão ao nível de hipóteses ainda não invalidadas e admitidas como boas pela comunidade científica, porque nos confortam na nossa visão do mundo, porque não entram em contradição com o que sabemos ou julgamos saber.
Quanto às ciências humanas, estas têm um estatuto de cientificidade muito diferente pois - embora possam empregar técnicas e métodos das ciências ditas «duras» - na sua especificidade, carecem de uma metodologia inquestionável, havendo portanto lugar para todas as apropriações e derivas. Já me referi por extenso à Economia, tida como «ciência rigorosa», apenas para melhor vender a visão dum mundo neoliberal (Ver artigo: «A Grande Ilusão», no meu blogue).

Sabendo quão falíveis são as previsões, não abdico porém de olhar e de ver o que teremos coletivamente de enfrentar em 2017:
Antevejo desde já um perigo notório, o de uma escalada nas relações entre grandes potências nucleares, EUA, China e Rússia. A tensão advém principalmente do facto de que os EUA não se resignam a abandonar o papel de potência hegemónica, sendo esta a profunda causa das guerras lançadas pelos EUA, nas primeiras décadas deste século. 
Os EUA estão a perder influência a olhos vistos, do ponto de vista estritamente militar, apesar da sua postura agressiva, sozinhos ou usando a NATO. 
Mas, sobretudo ao nível económico e geoestratégico, com a mudança dum grande eixo de desenvolvimento: deixou de ser o eixo Atlântico, para ser claramente o eixo que vai do Pacífico, pela Ásia central, até ao oriente do Mediterrâneo.  
Além dos países deste eixo, cerca de 60 países aderiram a uma organização nova, misto Banco Mundial/ novo FMI, não controlados pelos EUA, antes pela China e outros seus aliados. Trata-se de um banco destinado a financiar infra-estruturas em todo o mundo. 

Ao nível financeiro, Wall Street, a City de Londres e Frankfurt têm os seus dias contados: o sistema do petro-dollar está a desfazer-se diante dos nossos olhos. É significativo que a Arábia Saudita se entenda com a Rússia, sem pedir licença a Washington, para limitar a produção e fazer aumentar o preço do crude nos mercados internacionais.

Estou um bocado inquieto pelo facto de o Estado profundo, tanto nos EUA como em países da NATO, estar decidido a desencadear uma confrontação armada com os seus competidores. 
Na verdade, a guerra já existe, se considerarmos a corrida aos armamentos, iniciada e acentuada pelos EUA, que renegaram os acordos dos mísseis antibalísticos, firmados por Reagan e Gorbatchov, aumentando a despesa com armamento, actualizando o arsenal nuclear com bombas chamadas «tácticas», etc. 
A guerra já existe, se considerarmos o regime de sanções económicas e diplomáticas contra da Rússia, a pretexto da «invasão» da Crimeia, episódio que, na verdade, correspondeu a um processo democrático de escolha do seu povo (maioria de russos étnicos; cerca de 70%) para reintegrar a nação Russa, à qual pertenceu desde o século XVIII até que nos anos 50 do século XX, Krutchev decidiu «oferecer» esta península à Ucrânia, então uma das Repúblicas Soviéticas. 

Muitos ataques de falsa bandeira foram realizados em solo europeu, no ano que passou, claramente servindo-se de elementos djihadistas que, consciente ou inconscientemente, se deixam instrumentalizar pelos serviços secretos para cometer os seus atentados terroristas. 
Uma indicação segura de que assim é: os serviços especiais de polícia, com atiradores de elite, matam sempre os terroristas, seja qual for a circunstância em que se dá a perseguição e cerco. 
Não querem que eles se tornem incómodos num processo, dando indicações precisas sobre quem encomendou os actos terroristas. Pois bem, se as polícias tivessem como objectivo neutralizar mas capturar com vida os terroristas, isto seria indicação de que os poderes políticos - que controlam as polícias- desejam obter informações sobre as tais redes terroristas. Mas não querem, pois sabem muito bem que são meros instrumentos ao serviço dos globalistas.

Quantas mortes mais por actos terroristas ou por crimes de guerra e quantos mais países arruinados veremos no futuro próximo?
- Não se pode saber. Mas é bem possível que a situação mude um bocado, caso a liderança colectiva que no fundo dirige o governo Trump adopte uma visão estratégica global multipolar, com uns EUA deixando de tentar fazer de «polícia mundial». 
Apenas observando os actos da nova administração nós poderemos saber. A retórica não nos diz nada pois, como sabemos, é destinada a enfeitar discursos e convencer os ingénuos das boas intenções de quem governa.

Na Europa a descida do Euro aos infernos vai continuar, vai haver uma rotura em várias dimensões, como já se verificou neste ano que acaba, mas agora no interior de cada país, também; a instabilidade política e institucional vai crescer, à medida que a crise económica se agrava.

Em termos gerais, não haverá crescimento da economia mundial; haverá uma retracção, com vários países periféricos a sofrerem severamente, principalmente os exportadores de matérias-primas. 
Os países do extremo-oriente, China, Japão e Coreia irão experimentar dificuldades muito grandes, devido ao aprofundamento da crise das zonas para onde tradicionalmente exportam.

No plano financeiro global, a subida dos juros dos bonds do tesouro americano pode atingir ou ultrapassar os 3%: isso vai trazer consigo inúmeras falências e o esvaziamento das bolhas especulativas nas bolsas de acções e no imobiliário; pelo contrário, haverá uma subida dos metais preciosos e uma descida dos metais e matérias-primas industriais.

A mudança na Europa será - em geral - no sentido do extremo conservadorismo, nacionalismo e xenofobia, a par duma total dissociação da maioria das pessoas em relação aos que - supostamente - os «representam». 
A chamada democracia representativa continuará em crise e isso é desejado pelos oligarcas, pois assim podem fabricar um «consenso» manipulando os média, controlados pelos grandes grupos. Haverá um acentuar da tendência de criminalizar a dissidência sob todas as formas. 

Se o quadro é sombrio, não é porém sem esperanças, pois existe consciência cada vez maior - em particular na juventude - de que o sistema instaurado não se destina a servir os cidadãos e que terá de ser a própria população a tomar nas mãos o seu destino.

  


quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

NÃO ESCOLHO EFEMÉRIDES POR FASTIO...


Pessoa vive, na singela representação e dicção do saudoso Mário Viegas.

Pessoa vive, passado um século, com todo o seu cortejo de heterónimos, semi-heterónimos e até os vários Pessoa ortónimos, o nosso poeta mais cosmopolita e mais português, mais espontâneo e mais reflectido, a contradição encarnando a não-materialidade da poesia, a espiritualidade da Natureza, a Divindade do Verbo. 
Gostava que Pessoa descesse em 2017, numa manhã brumosa, à Baixa que ele conhecia como a palma da sua mão, e nos viesse fazer afinal o retrato deste povo sonhado antes que vivido, sempre pronto para partir, e sempre saudoso de ter partido...

Escrevi esta homenagem em 1985, ano em que houve um congresso internacional pessoano, que significou a consagração na Europa e no Mundo de um poeta português e universal. A minha homenagem, nesse tempo ou hoje, é a de um menino que deposita um ramo de flores campestres (açucenas?) aos pés da estátua de bronze.



                                   SINAIS*
     HOMENAGEM A FERNANDO PESSOA   
                  
 (* texto inédito, in ESTÓRIAS DE ESTAR E DE SER- 1985)  

Os sinos da tua aldeia do Largo de S. Carlos ouviam-se e não te restava outro remédio senão o de escrever.

-          O corpo complexo esvai-se de raiva quando o fogo retira o canto


-          O segredo não se resolve na poça em torno do menino deitado... Sabe-se lá se dormindo ou sonhando, pois seus olhos vazios azuis fitam o azul.

-          Não queria tornar a descer o rio do silêncio e, por isso, todas as portas cercadas de palmas eram refúgio ou ancoradoiro do vapor da Real Companhia Britânica.

-          E... porém há sempre uma esperança feita de estrelas, coroando a fronte de Ti em odes mordidas e rasgadas no ventre

-          Não guardei rancor às ovelhas que desciam o monte em manhãs de neblina ...
... Os cais socorriam o meu andar funâmbulo como se fossem ignorantes do morticínio das baleias

-          Há sempre um além .. o que não fica inscrito no momento ... o que sonhamos para nunca atingir ... o que pesa, soturno, os contornos de Aurora.

-          “Bum! Truz! Catrapuz!”
“Sou eu, o Gigante Adamastor! Sou eu, o Novo redentor da Pátria!
Hei de varrer as cobardias que enlutam as Quinas da Bandeira, ó única mortalha virginal!
Fujam aves de bico longo! Fujam!
Deixem-me mover a rápida locomotiva em perseguição do Século!

-          “Deixei o tabaco sobre a mesa, repare, não tanto por esquecimento, mas antes
      como marca ou sinal do fumo que me contém!”

....

E, todavia …

                 “I know not what tomorrow will bring” (**)

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(**últimas palavras de Fernando Pessoa, no leito de morte...)


domingo, 25 de dezembro de 2016

TESTEMUNHOS DE UM PASSADO LONGÍNQUO

Sonhei, há alguns anos, que visitava povos da civilização megalítica. Este sonho fez-me pensar intensamente. 

Cheguei à conclusão de que a civilização mundial de hoje, que se constroí pacientemente, apesar dos brutais recuos episódicos ... resulta afinal da gesta dos nossos antepassados, da distante civilização megalítica, que ergueram os dolmens, menhirs e outros monumentos, que cobrem uma vasta extensão de território, desde os brumosos recantos da Irlanda e da Escócia até aos territórios do Extremo-oriente. 

Tive consciência clara desta realidade ao deparar-me, alguns anos depois, com os monumentos da civilização megalítica na Coreia


Esta península mágica preserva ciosamente os vestígios dum tesouro de sabedoria. 


                                          
                                                  Círculo de Menhires em Portugal, Évora

                                           
                                                        Dólmen numa ilha da Coreia

                                       
                              Monumento funerário, Normandia, França

A ciência megalítica dos povos euroasiáticos é igualmente a ciência dos astros, da verdadeira comunhão universal. 
Sabiam alinhar as pedras pelos solstícios, conheciam técnicas para transportar imensos blocos a grandes distâncias. 
Tinham uma devoção profunda, como se pode inferir pelo trabalho árduo, oferecido à Divindade, para erguer seus templos e outros locais de culto...

Pensei que, estudando e divulgando esta civilização megalítica, verdadeiramente transcontinental, iria abrir a compreensão de que, sem anular as variadas culturas, existe uma grande unidade na imensidão do espaço continental Euro-Ásia. A tomada de consciência destes factos poderia facilitar um horizonte de paz, de abundância e de trocas frutíferas entre povos. Se isso ocorreu há 3000 ou mais anos atrás, por que não agora?

A civilização megalítica partilhava as mesmas tecnologias da pedra e do metal em toda a extensão do Continente Euro-Asiático. Os mesmos processos técnicos resultaram em formas notavelmente semelhantes. 

Existem diferenças culturais nas decorações, mas são pouco relevantes para o nosso olhar de hoje. Não existem diferenças notáveis entre muitos artefactos da mesma época, recolhidos nas margens do Atlântico ou do Pacífico

Trata-se de um contínuo étnico, cultural: tal é o sentido da existência de obvias semelhanças nos monumentos ou utensílios produzidos na mesma época e separados por dezenas de milhares de quilómetros!

- Então, como foi possível, na ausência de meios seguros e rápidos de comunicação, estabelecer-se tal unidade? 

A transmissão cultural é muito rápida e vários fatores podem ter sido propícios: Houve grandes migrações dentro do continente Euroasiático.  Nota-se a existência de um corpo de mitologias comuns, ou interconectadas. Verifica-se uma transmissão célere tanto dos saberes técnicos, como de crenças religiosas. 
Os mitos e as narrativas heroicas, as tradições orais, as línguas, os Deuses e seus atributos, são muito semelhantes e não podem ser fruto do acaso. Têm de resultar de tradições comuns ou afins, que se foram cristalizando em cultos, ciclos épicos, lendas, em práticas e ritos... Estas diversas manifestações de cultura dos povos têm tal ar de parentesco que não podem ser devidas a uma «convergência evolutiva». 
É muito mais sensato postular uma origem comum, pois não se trata de escassas coincidências pontuais; as culturas que brotaram nos espaços euro-asiáticos foram realmente todas descendentes do mesmo substrato, da civilização megalítica.
  
As sociedades desse tempo tinham uma densidade populacional fraca; quaisquer humanos que surgissem no seu território, se tivessem intenções pacíficas, como o comércio, eram bem-vindos.

Penso que o Continente Euroasiático é uno, não apenas em termos físicos, mas também de geografia humana. As montanhas dos Urais não constituem um verdadeiro obstáculo às migrações. Na Eurásia existem povos muito diversos, mas um elo ténue une os seus povos, de um extremo ao outro; ele existiu no passado e continua no presente, nunca se quebrou. 
A emergência de Estados e de impérios, impostos pela violência, veio ofuscar - transitoriamente- esta profunda unidade cultural.  

Porém, agora podemos viajar pelo vasto mundo, podemos nos maravilhar e nos reencontrar, numa escala nunca antes sonhada. 

Devemos celebrar este feito, mas não atribuí-lo ao «globalismo», que é uma ideologia. O respeito pela diversidade cultural é o contrário dele. O globalismo é destruidor da diversidade dos povos e das culturas, é a imposição dum modelo cultural único.

O meu voto para 2017 é que a luz do espírito e da fraternidade dos povos seja capaz de superar as forças da destruição e obscurantismo.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

ANTÍDOTO PARA A CONSPIRAÇÃO GLOBALISTA

                                   

Os políticos e os banqueiros não gostam de pessoas que realmente expõem à luz do dia e denunciam as CONSPIRAÇÕES que os mantêm no poder...


quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

NATAL… NÃO É AQUILO QUE PENSAS

O Natal é celebrado nos diversos recantos do mundo, não apenas nos sítios em que existe devoção cristã e prática assídua dos ritos, como em muitos outros sítios, por muitas pessoas que não estão a pensar no nascimento do Menino Jesus, ao comemorarem o Natal.
O Natal paganizou-se ao longo do século XX, perdendo o cariz estrito de festa religiosa, nos nossos países ditos cristãos, na exata medida em que eles mesmos se paganizavam.
A nova «religião» do consumismo ia progredindo, à medida que eles se tornavam países mais ou menos afluentes ou onde os elementos mais afluentes da sociedade exibiam o seu poder de compra, a sua alegria de consumir, comprando prendas, fazendo festas e cometendo excessos de comida e bebida. Não creio que estivessem conscientes de que reproduziam, embora com adaptações, a festa pagã do «Sol Invictus», que era celebrada na Roma antiga e no Império Romano: Este culto solar era universal, de uma forma ou outra era celebrado em todas as grandes religiões pagãs da antiguidade... Esta festa, em Roma, estava associada às Saturnalia, em honra do patrono da Cidade e era pretexto para excessos de toda a ordem.  
O Deus Sol, segundo os primeiros cristãos seria uma antevisão confusa do Messias. O símbolo do solstício de Inverno, propiciador de ritos em adoração ao Deus, foi assim subvertido completamente pelos teólogos para que o povo recém-cristianizado deixasse de celebrar as Saturnalia e adorasse o nascimento da Luz do Mundo, de Cristo Redentor. 
Nestas épocas, em que as pessoas comuns tinham uma vida curta e bastante dura, em que a tradição oral era poderosa, tal conversão de símbolos foi eficaz. Também o foram a cristianização de símbolos de fertilidade pagãos (os ovos, os coelhos de Páscoa), por ocasião da Páscoa. Embora, neste caso, a tradição da Páscoa judaica impôs-se naturalmente na religião recém-constituída, tendo sido associada à Paixão e Ressurreição de Cristo.

O que os poderes civis e religiosos sempre fizeram e continuam fazendo é estabelecer e perpetuar uma série de comemorações, de feriados e de rituais, que têm como efeito imediato marcar o tempo vivido, o tempo subjetivo das sociedades em geral, mas também de todos os indivíduos, seja qual for o seu credo religioso. Também num país muçulmano os feriados marcarão o calendário e os não seguidores desta religião terão de se conformar com tais ocasiões, mesmo que não partilhem esses significados simbólicos.

Nos países de capitalismo de Estado, quer na defunta URSS e satélites do Leste, quer na China e outros, houve campanhas oficiais para abolir a religião, sobretudo no período do estalinismo, mas essas campanhas não tiveram o resultado esperado: o povo permaneceu, em segredo, profundamente religioso.

Podemos ver que, em geral, a repressão da religião traz sempre um reforço da mesma, fanatismo gera fanatismo, intolerância gera intolerância, é assim que se originam as divisões no seio dos povos, que se originam conflitos com base religiosa.

No Islão, conflito entre sunitas e xiitas - sempre latente desde o grande cisma – estava adormecido e foi reavivado na sequência das invasões ocidentais do Iraque e dos outros países do Médio Oriente. Aí, os EUA e vassalos da NATO (países ditos «cristãos», com excepção da Turquia) têm tentado impor a sua «democracia» a ferro e fogo.
Embora as circunstâncias sejam diferentes, vemos que existem analogias mais do que superficiais com as guerras de religião que assolaram a Europa dos séculos XVI e XVII.
Tanto os países de religião oficial católica como protestante, tinham uma política de total intolerância e discriminação dos cidadãos do próprio país que tivessem o credo minoritário. Perseguiam e suprimiam com enorme crueldade toda a dissidência religiosa. Iniciavam guerras religiosas que devastavam grande parte dos países, comparáveis às guerras contemporâneas. As alianças entre chefes de Estado seguiam, no geral, a linha divisória Católicos/Protestantes. 
Muito do comportamento político-religioso dessa época reproduz-se agora, no mundo de hoje.

O conceito de laicidade, que o filósofo Espinoza defendeu no seu «Tratado Teológico Político», foi uma resposta inteligente da elite intelectual da época, retomada pelas sociedades e por fim pelos próprios Estados a esta vaga de intolerância destruidora do tecido social, económico e das relações internacionais.

A laicidade não significa que as diversas religiões estejam «em pé de igualdade». No sentido inicial que lhe deram Espinoza e outros filósofos políticos era antes a neutralidade estatal perante a religião: O Estado não se imiscuía nos assuntos religiosos, as leis não refletiam as escolhas pessoais dos monarcas por esta ou aquela religião.
Em caso algum, se tinha o objetivo de colocar no mesmo pé, dar igual oportunidade nos media do Estado, às diversas confissões religiosas, ou ter aulas de religião nos estabelecimentos de ensino do Estado, ministradas pelas diversas religiões.
Essa interpretação da laicidade é realmente muito falsa, pois significa realmente a perpetuação da «mão do poder estatal» nos assuntos religiosos.
Penso que é muito importante, compreender que a paz civil, a concórdia entre pessoas com credo religioso diverso ou sem religião, é um valor positivo muito importante agora, não apenas no século XVII e aqui também, na Europa, não apenas no Médio Oriente.
Especialmente, quando as fanatizações político-religiosas de diversos elementos conduzem a intensificar os ataques terroristas, dirigidos indiscriminadamente a pacíficos cidadãos.
A ideia de que se deve dar uma tribuna às diversas religiões, nos meios de comunicação públicos estatais é mortífera. Bem entendido, considero essencial para o exercício da liberdade de imprensa e de opinião, que toda e qualquer corrente religiosa tenha o direito de produzir e difundir sua propaganda, como entender. Mas que o faça com seus meios próprios, não com os meios do Estado. Não considero lícito que o Estado censure e persiga judicialmente alguém ou uma entidade, apenas por fazer ataques contra a religião A ou B. 
Defendo que é ao nível da sociedade civil, na opinião pública,  que tais comportamentos devam ser energicamente combatidos pelas pessoas esclarecidas da sociedade, cientes do risco dos elementos fanáticos tomarem a dianteira da cena e desencadearem vagas de intolerância.

A não-ingerência do Estado nos assuntos religiosos tem um efeito benéfico na liberdade religiosa, em geral. Esta noção deveria ser compreendida pelos hierarcas das diversas religiões, minoritárias ou maioritárias. 
Nos países de tradição cristã, países que hoje se declaram «laicos», as hierarquias católica, ortodoxa, anglicana ou luterana estão muito imiscuídas em assuntos de Estado, embora em graus diversos, quando são maioritárias.
Argumenta-se em defesa deste estado de coisas com a tradição. Mas a tradição não pode ter maior importância do que a paz civil.

- Haverá algo pior do que uma guerra civil?

- Resposta: Não, nada pior ...a não ser uma guerra civil de religião.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

COMO SE INSTALA A CENSURA, HOJE EM DIA

Para se poder delimitar, isolar e combater esta hidra, devemos descrever as formas de que se reveste, os seus disfarces e pseudo justificações. 
A censura é a forma mais acabada de autoritarismo, vai de par com as derivas securitárias, pois quanto mais autoritário for um regime maior é o aparato de censura.
Porém, mesmo nos regimes onde - supostamente - é reconhecida a liberdade de expressão e de informação, existem formas de censura muito eficazes - ou mesmo mais - dos que nos regimes abertamente autoritários.
A auto-censura é um deles; é vulgar haver pressões em relação a este ou aquele assunto ou personagem. Essas pressões são subtis em muitos casos, não permitindo que, quem sofre o ato discriminatório ou censório, possa apontar uma ação concreta.
É muito banal a media ignorar um acontecimento, uma iniciativa, uma tomada de decisão coletiva, uma manifestação ou uma greve. Trata-se da técnica que designo de «não inscrição». Uma forma mais refinada da mesma técnica pode passar por referir esse acontecimento, mas de maneira que não permita ao público compreender a sua relevância.
Sobretudo, o poder tem sempre a palavra, a voz do poder está omnipresente, quer esse poder seja governo, oligarquia, ou até os cortezãos de uns e outros.
Este monopólio do poder faz com que o espaço-tempo não sobre para o que seria menos conveniente relatar. Isto, porém, tem de ser disfarçado; só assim conserva a eficácia junto dos espectadores/auditores: tem de haver de vez em quando, algumas referências ao anti-poder, senão o jogo torna-se demasiado óbvio.

A media corporativa está sempre disponível para distorcer, eludir, truncar, quando não mesmo, falsificar o discurso, a mensagem de entidades anti-sistema. Mas o melhor, para a média vassala do poder, é ignorar essas vozes. Só recorre à distorção quando já não pode ignorar

Na era da Internet, este joguinho tornou-se mais difícil
Trata-se agora de demonizar abertamente as fontes independentes, classificando-as como «pró-russas» (amanhã será outra etiqueta, se isso convier às oligarquias reinantes). 
Tudo o que essas fontes produzem como notícias é então considerado «fabricado» (fake) mas quem decide o que é ou não é fabricado? 
Temos a instalação de autênticas comissões de censura na Internet, nas redes sociais, por exigência dos poderes, que irão excluir certos blogues, certas páginas, certas fontes... 
Os pretextos são sempre os de «proteger» contra coisas que todos nós achamos horríveis, tais como «pedofilia, terrorismo, crueldade contra animais, etc.» São justificações que «passam» muito bem, que tranquilizam as pessoas meio-adormecidas. 
Será ingenuidade ou conformismo ou pior, não sei. Mas como se pode acreditar que os governos e meia-dúzia de corporações que dominam tudo (televisões, redes Internet, rádios, jornais, magazines) ...estão realmente preocupadas com nossa segurança?

Como dizia Benjamin Franklin: «Quem aceita perder a liberdade em troca de maior segurança, não merece nem uma, nem outra...»