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sexta-feira, 12 de outubro de 2018

OS INCÊNDIOS FLORESTAIS DE GRANDES PROPORÇÕES: UMA FATALIDADE?

No fim de semana passado (6 e 7 de Outubro) no Parque Nacional de Sintra-Cascais , deflagrou um incêndio de grandes proporções. Não irei aqui especular sobre as causas próximas e se a origem do incêndio foi ou não criminosa. O facto de que na zona havia projectos de aproveitamento turístico, com investimentos já efectuados e aprovação (?) dos mesmos pelas autoridades camarárias - como foi relatado por alguma imprensa - será talvez um factor a considerar no inquérito da polícia judiciária. Porém, o meu objectivo é antes o de chamar a atenção para as causas profundas, por oposição às causas próximas.
O domínio florestal, mormente o que é propriedade do Estado ou das Autarquias, deveria ser um domínio que primasse pelo cumprimento das regras de boa gestão da floresta. Ainda por cima, havendo uma classificação de «parque nacional» associada a muitas destas áreas florestais estatais, é de todo indesculpável e criminoso, à luz da lei vigente, pois são criminosos os comportamentos de «deixa-andar», de não intervenção, muito antes das matas e florestas arderem. 


                                         [a- caminho pedestre, Sintra] 




                                     
                                        [b- zona ardida na Beira Interior]


                                    
[c - árvores autóctones, Mata do Buçaco]





Assim, o Estado e órgãos políticos estão directamente postos em causa, não por alguns «exaltados anarquistas», mas por eles mesmos, por manifesta e claramente violarem e ignorarem suas próprias leis! O Estado e órgãos políticos do mesmo, desde o governo central às autarquias, são efectivamente os responsáveis. Mas, não são os únicos: infelizmente, neste país a população ainda está a um nível de analfabetismo político muito primário, pois acaba por se satisfazer com «medidas» e promessas, solenemente anunciadas depois de cada fogo maior, que vão supostamente prevenir os fogos mas que, ou não são cumpridas, ou não têm real impacto ao nível da prevenção.

A hipocrisia consiste em atribuir exclusivamente a mãos de criminosos, a pirómanos, ou até ao desleixo de pessoas que deixaram uma fogueira mal apagada... a responsabilidade do que se passa. Não que seja falsa a existência desses casos; sabemos que eles existem, numa certa percentagem. 



Mas a responsabilidade de cuidar da floresta, de manter as matas limpas, de promover a renovação das espécies, aumentando a diversidade, reduzindo as áreas plantadas com eucalipto e pinheiro e aumentando as áreas com árvores folhosas autóctones, é colectiva: vai dos proprietários privados de terrenos florestais, das autarquias e do Estado central, aos cidadãos em geral, que deveriam exercer enorme pressão para que sejam realizados os trabalhos de manutenção e correcta gestão florestal. 
Do ponto de vista ecológico, evidentemente a questão é de primeira importância, mas também do ponto de vista económico: como emprego directo e indirecto, como fonte de matérias-primas importantes. Note-se que o eucalipto e o pinheiro são madeiras com pouco valor, o primeiro serve apenas para fabrico de pasta de papel e o segundo para carpintaria, sobretudo. 
Os terrenos plantados com estas espécies são maioritariamente deixados ao abandono, vê-se um crescimento de forma desordenada, tendo plantas com os mais variados tamanhos, não havendo espaçamento entre as várias árvores, nem recolha do restolho, nem corte e remoção do mato rasteiro, tudo isto formando uma enorme pira de combustão, pronta a incendiar-se quando as condições climáticas sejam favoráveis.  
Haveria, por isso, que desenvolver um programa de replantação com espécies autóctones, menos susceptíveis ao fogo, com maior valor comercial e conferindo maior diversidade ecológica.
Muito poderia ser transformado, com enormes vantagens. Mas a opção dos parasitas que nos governam é sempre de produzir «lindas e boas» palavras, mas fazer o menos possível! 
Porém, os investimentos estatais ou os incentivos fiscais, de crédito bonificado, etc. para que privados invistam seriamente na renovação da floresta portuguesa, poderiam ser uma enorme alavanca para o desenvolvimento do país. 
O turismo, que tanto é acarinhado, teria muito  a ganhar. Actualmente, os turistas típicos já não são do género de ficar nas praias, no litoral apenas, durante toda a sua estadia: gostam de fazer excursões no interior, de visitar lugares com beleza natural, de fazer caminhadas em floresta...

Não serei eu a inocentar os que ateiam fogos com objectivo criminoso, nem tão-pouco os que por desleixo deixam que fogos acidentais de grandes proporções se declarem... Mas, afinal de contas, existem outros criminosos, nos governos sucessivos, nas vereações camarárias, assim como em muitos gabinetes do aparelho estatal, que deveriam ser responsabilizados. 
A conivência com um crime é crime; a indiferença com que se trata o património de todos, crime é....e também a gestão danosa, ou fraudulenta, ou incompetente. 
Enquanto ficarem impunes estes crimes e sobretudo, enquanto a população não acordar da sua letargia  e não tomar em mãos a resolução dos seus problemas, vamos continuar a assistir a incêndios como o de Pedrógão Grande e do Pinhal de Leiria, em 2017, ou como em 2018, de Sintra-Cascais !!!



quarta-feira, 25 de outubro de 2017

DUAS OU TRÊS COISAS SOBRE A DEMOCRACIA AO NÍVEL LOCAL

Sem dúvida os acontecimentos trágicos de Pedrogão Grande, no início do passado Verão deveriam ser um alerta muito sério sobre o estado calamitoso da floresta, do mundo rural e das diversas (ausentes) medidas de prevenção de incêndios neste retângulo  de terra chamado Portugal.
Porém, esse facto pesado não pesou realmente nas campanhas eleitorais dos partidos para os órgãos de gestão local . Ora, justamente aqueles que têm a primeira linha, ou deveriam ter, no que toca à prevenção de fogos florestais, são os poderes autárquicos. 


O debate, como sempre, dominado pelos candidatos dos partidos, foi centrado em questões das cidades. Mas mesmo nessas, evitou-se tocar na sacro-santa propriedade, mesmo quando abandonada: Esta propriedade desleixada  - nas zonas centrais das urbes -  mostra a sua ruína. Ela também priva as pessoas normais de habitação, reservada que está para construção de unidades de luxo ou hoteleiras, de duvidosa rentabilidade no longo prazo, mas cuja aprovação é garantida pela «impoluta probidade» de presidentes e vereadores camarários ...
Existe, porém, um ponto fulcral para a gestão de áreas rurais ou urbanas, de que nenhum poder político largou mão, desde os mais revolucionários aos mais conservadores. Este poder é o direito de expropriar, por manifesto interesse público. Não me digam que não existe o enquadramento legal para um executivo camarário fazer tal ato de boa gestão territorial, uma vez que se tenha verificado a condição de abandono. Quem diz isso é ignorante ou desonesto. Nada mais simples, dentro da lei vigente, dentro dos poderes que são conferidos (e bem) aos responsáveis camarários. 
Então porque não usam este instrumento? Porque não expropriam a propriedade abandonada, que é um fator de perigo iminente para as propriedades vizinhas (ou até nem tão vizinhas) e constante prejuízo em termos de estética, manchando toda a cidade ou região com os seus matagais nos jardins abandonados, as suas ruínas, a sua fealdade?  
A cidadania é mantida fora desse domínio por uma média prostituta, que nunca questiona os políticos nas verdadeiras questões, naquelas que têm de ser abordadas e resolvidas, no interesse global da população. 
Por muito estranho que pareça, as problemáticas dos fogos nos campos, transformados em bosques de eucaliptos e pinhais deixados ao abandono, até que alguém se lembre de os comprar e dos prédios nas zonas «nobres» das cidades que são deixados cair em ruína até que uma empresa de investimento imobiliário os transforme em edifícios destinados a alojamento local ou a condomínios de luxo... estão estritamente relacionadas.
A relação é evidente: o chamado «sacro-santo» direito de propriedade. Em Portugal ele atinge um absoluto como em nenhum outro país da Europa ocidental, onde cabe a comparação, obviamente, pois os regimes políticos são em muitos aspectos semelhantes, em que muitas normas e leis portuguesas são decalcadas de modelos de outros países ocidentais. 
A casta política portuguesa, passivamente apoiada pelo atavismo doentio de uma parte dos portugueses, dá à propriedade privada uma prioridade total: tanto os eleitos como eleitores, numa larga percentagem, vêem como legitimo que a propriedade (urbana ou rural) esteja ao abandono. Muitas vezes trata-se de questões entre herdeiros. E então? Será que a sociedade, no seu todo, deve suportar as consequências das questiúnculas entre herdeiros? 
Quaisquer que sejam os regimes políticos, a propriedade, em termos jurídicos, nunca é um absoluto. Não é preciso irmos para exemplos de regimes «socialistas» ou «comunistas» para que tal se verifique. É um facto que todos os regimes têm mecanismos legais para expropriação por interesse público. As propriedades abandonadas, sejam rurais ou urbanas, são um prejuízo objetivo às comunidades em torno, ou mesmo ao país no seu conjunto. A expropriação com pagamento de uma indemnização, com preço adequado, segundo estimativa de comissão independente e idónea, não apenas é legítima; é mesmo uma medida indispensável como ato de boa gestão municipal. 
Acerca destas questões e de muitas outras a cidadania é distraída; nunca tais questões figuram na «agenda» de políticos ou comentadores, por razões óbvias: O lóbi do imobiliário (nas cidades) e o lóbi dos madeireiros e do agro negócio (nos campos) têm esses na mão. São eles que dão dinheiro para a campanha dos partidos ou «independentes». Não tenham dúvida que os candidatos farão tudo para serem eleitos, para não perderem a hipótese de se sentarem no cadeiral que ambicionam!
A campanha útil da cidadania deste país - realisticamente - deve ser de desmascarar os políticos que permitiram - durante anos a fio - que propriedades rurais ou urbanas permanecessem abandonadas e nada fizeram, com os pretextos do costume. Fotografemos estas propriedades abandonadas há X anos, mostrando o estado de degradação a que chegaram. 
Talvez isto melhore a visão de autarcas «míopes», para o «belo» efeito destas. 
Há-de haver muita gente que vos argumentará com desculpas como a de que «o município não pode ficar com uma data de propriedades nos braços». Dirão que muitos dos prédios (urbanos ou rurais) estão «bloqueados por questões em tribunais», etc. 
Isso tudo são pretextos, pois a legislação atual permite ultrapassar todos esses obstáculos. 
O que eles/elas têm é um medo atávico de expropriarem aquilo que deve ser expropriado. Aliás, as propriedades urbanas podem ser reconstruidas e postas à venda/aluguer a preços controlados para travar (por ação do próprio mercado) a onda especulativa que se tem abatido sobre várias cidades de Portugal nos últimos tempos.  Nas zonas rurais, o loteamento correto das propriedades e sua venda a jovens agricultores, pode ser uma saída para a desertificação do interior. O Estado e o Governo, têm uma pesada responsabilidade neste deixar ao abandono as regiões do país que mais precisam de ajudas.
A perversão maior da «democracia representativa», além de não ser senão uma aristocracia, onde os que sempre tiveram privilégios têm muito mais fácil acesso aos comandos do poder, é a de que as hostes dos vários partidos trabalham «para o voto», para conquistar a simpatia do eleitor, não se irão investir em medidas, em políticas concretas que - embora consensualmente façam todo o sentido - apenas trarão resultados visíveis numa década ou mais. 
Mas a cidadania é igualmente responsável, não apenas por eleger estes políticos chico-espertos, mas porque clama contra a «corrupção» somente em abstrato: os atos de corrupção estão à vista de todo o povo, quer em zonas urbanas ou rurais, em prédios rústicos ou urbanos deixados ao abandono. São o testemunho silencioso de que ações que deveriam ser tomadas, não o foram em bom e devido tempo. 




Não é difícil construir um blogue e colocar lá fotos de abandono urbano ou rural. Não é difícil falar nos mercados, nas praças públicas, com vizinhos ou em reuniões de assembleias de freguesia ou de assembleias de município. 
Os cidadãos em cada conselho podem facilmente evidenciar as provas materiais de corrupção e devem exigir - imediatamente - que a situação mude. 

sábado, 13 de agosto de 2016

FOGOS FLORESTAIS: FATALIDADE OU DESÍGNIO


Nos noticiários sobre os fogos florestais estivais, que periodicamente assolam este país, são sempre postos em primeiro plano aspetos que, não sendo em absoluto falsos, são realmente epifenómenos, são realmente marginais.
Aqui, irei desvendar as causas profundas que são omitidas, ou apenas citadas ao de leve na média, com uma horda de «opinadores» que apenas reforçam estereótipos com as suas banalidades, quando não falsidades, produzidas em tom doutoral.
As vozes populares indignam-se com o facto dos causadores diretos destes crimes poucas vezes serem apanhados e quando o são, terem sentenças excessivamente «leves». As pessoas vulgares esquecem, na sua legítima indignação que, quanto muito, são presos uns criminosos de baixo nível, os que executam os crimes. 

Um dos mitos que acompanha desde sempre as narrativas sobre fogo posto é que deveriam ser punidos os responsáveis, para o exemplo. Porém, as pessoas não consideram como criminosos uma série de comportamentos e de incentivos a adotar e manter certos comportamentos, ou, no mínimo, incentivando ou proporcionando as circunstâncias para que os tais atos criminosos ocorram.

O abandono a que são votados os campos desde há meio século foi incentivado pelo regime fascista quando este decidiu estimular a criação das celuloses, nos anos 60 do século passado. As razões históricas são o abandono dos campos devido ao surto migratório para as grandes cidades e para a emigração (França e Alemanha), estimulando o desejo de criar uma grande indústria (as celuloses) que iria reforçar os impérios industriais existentes. Veja-se a história da implantação e desenvolvimentos das celuloses, dos grupos a elas associados. 
Esta política conjugava-se bem com a transformação dos campos, em que uma grande faixa do território (grosso modo o centro norte do país) se transformava num enorme eucaliptal, o chamado deserto verde, enquanto algumas zonas particulares eram selecionadas para agricultura de alto rendimento, com forte investimento de capitais e forte retorno.

Os barões que já tinham posições-chave, quer em grandes empresas pertencentes a grupos económicos, quer em estruturas estatais, ministérios, institutos de investigação do Estado, continuaram a controlar o setor, depois do 25A. 
Assim se explica que se continuou a proteger a indústria de celuloses, fortemente poluidora dos rios, despovoadora ao destruir a agricultura nas aldeias, causadora de desastre ambiental  em larga escala, origem dos incêndios incontroláveis que assolam este país quase todos os Verões. 
Muitos centros de decisão, em ministérios como agricultura, indústria, etc. foram dominados e corrompidos pelo poderoso lóbi das celuloses e afins. Uma figura tristemente célebre foi Álvaro Barreto, do PSD. Mas há muitas figuras importantes no lobby, ativo até hoje.

Outro grande fator foi a nossa entrada na CEE. Até então, havia uma luta entre setores do Estado, por ou contra a extensão da mancha de eucaliptal, que refletiam interesses contraditórios de vários setores da agricultura. 
Mas, a partir da «pré-adesão», Portugal foi decidida e abertamente empurrado para uma eucaliptização a todo o vapor, pelos burocratas de Bruxelas. 
Estes burocratas vieram repetidas vezes, «incentivar» os investigadores das áreas de biotecnologia a se capacitarem de que o futuro e a fortuna de Portugal seriam o desenvolvimento da energia «verde»! O que era isso? Era simplesmente transformar as três quartas partes do nosso território em floresta de produção, ou seja um «deserto verde», não para produção silvícola de alto valor acrescentado, como espécies de árvores dando boas madeiras, mas apenas para combustível. 
Tal enormidade ambiental era feita em nome da ecologia! Claro que nessa altura não havia preocupação nenhuma com a eventualidade de um extraordinário aumento da produção de dióxido carbono, que decorreria fatalmente da transformação dessa biomassa em quilovátios de eletricidade...

O plano dos burocratas de Bruxelas e das potências que dominavam (Alemanha, e França, principalmente), era completamente absurdo, o que foi logo visível para um jovem cientista, que participou num debate, durante uma reunião dos burocratas da direção-geral da CEE que superintende a investigação e os responsáveis por projetos nos diversos laboratórios e universidades deste país, por volta de 1986. 
Nunca mais me esqueço desse debate: eles desprezavam explicitamente as soluções de aproveitamento dos subprodutos agrícolas, pois eles não queriam que Portugal desenvolvesse a sua agricultura, mas o oposto… pois assim teriam este país como fornecedor de matéria-prima para a tal «energia verde», tudo isso envolvido em roupagens muito ecológicas!

Se nós virmos o abandono do interior do país, virmos como é absolutamente impossível manter uma floresta saudável, bem tratada, por despovoamento excessivo, se interrogarmos qual a causa de termos extensões de floresta ao abandono, quilómetros infindáveis de mato altamente inflamável, podemos dizer que determinados interesses pontuais poderão ser o incentivo para atear os fogos. Porém, a «estopa» para os fogos não será um emaranhado de interesses, conivências, cobardias que envolvem não apenas industriais, como agricultores absentistas, governantes, ou mesmo dos cidadãos que dão oportunidade a que políticas ecologicamente criminosas prossigam sem qualquer sanção? 
Todos eles, sabendo ou não, são joguetes da União Europeia «imperial-soviética»! 
Infelizmente, muitas pessoas, que gostam de pavonear-se por «boas causas», não procuram saber quais as verdadeiras causas, as reais origens destas tragédias, contentam-se em mostrar «solidariedade» (mas o que é isso, afinal? – uma descarga da má consciência!).
A única maneira de sermos eficazes aqui - como em tudo - é lutarmos contra as causas de raíz:
- A dependência neocolonial de Portugal; a secular submissão das pessoas a políticos salvadores; o conformismo e o deixa-andar, que pressupõem uma conivência do povo.

Quando alguém se vem lamentar destes terríveis e trágicos acontecimentos que são os fogos florestais de Norte a Sul e do interior às Ilhas Atlânticas, deve-se perguntar: 
Que fizeste, que fizemos nós para prevenir isso? Como é que se previnem essas catástrofes? Que medidas concretas a tomar? 
Só assim se poderá começar a reparar males que já têm muitos decénios - ou mesmo séculos- de existência!